Educação e Intervenção Comunitária II Avaliação Contínua Animação Socioeducativa Escola Superior de Educação Coimbra, Novembro de 2006 Aluno João Pedro Moreira Gonçalves [email protected] Respostas à Ficha Prática Nº 1 Perguntas: 1.Com base nas informações (Aspectos, dimensões sociais e variáveis de análise teórica) que constam nos Capítulos 1 e 5 do livro Sociologia da Educação de Quintana, elabore: 1.Esquema de Análise Teórica da Educação enquanto facto e fenómeno social e cultural; 2.Com base nos textos, explique fundamentadamente as razões que determinam a Educação como um fenómeno social e não individual; 3.Dentre as diferentes perspectivas teóricas sobre as determinantes da personalidade, elabore um texto, explicitando de forma fundamentada, a sua perspectiva; 4.Partindo dos textos, elabore um texto que explicite a influência que o meio social e cultural exerce na educação, ou seja, na educação enquanto processo social; 5.Elabore um texto, demonstrando a forma como a sociedade e a cultura enquanto base do processo educativo, exerce a sua influência no processo social da personalização (socialização e enculturação). Resposta: O esquema de resposta, a estas perguntas, que propomos para articular as informações que constam nos Capítulos 1 e 5 do livro Sociologia da Educação de Cabanas, (informações que, por vezes, sugerem reificar ou atribuir um carácter concreto e volição a abstracções teóricas) e que distingue a Educação como processo, facto e fenómeno social e cultural, inclui: (i) uma consideração do Pluralismo Metodológico Integral proposto por Ken Wilber em “The Many Ways We Touch” e “Integral Spirituality”; (ii) sublinhar, no contexto do Pluralismo Metodológico Integral proposto por Ken Wilber, a importância de distinguir quatro tipos de fenómenos e mundos fenomenais, que resultam da actuação de 8 tipos de paradigmas científicos fundamentais; 1 (iii) a necessidade de considerar os processos biológicos e neurofisiológicos, que fazem surgir os processos mentais, como fenómenos relacionais comportamentais, como foi proposto a partir da Teoria da Autopoiese por Humberto Maturana, Jorge Mpodozis e Juan Carlos Letelier em “Brain, language and the origin of human mental functions“; (iv) a partir da perspectiva hermenêutica, uma consideração dos processos de interacção ou relacionais que o colectivo humano desenvolve entre si, e com o amplo ecossistema terrestre que o acolhe, como processos complexos e multidimensionais de elaboração, troca e interpretação de mensagens, isto é, como processos comunicacionais e de aprendizagem, que estão sujeitos a uma classificação lógico-formal, exemplificada na elaboração de Gregory Bateson em “The Logical Categories of Learning and Communication”. (i) O Pluralismo Metodológico Integral, proposto por Wilber, em “The Many Ways We Touch” e “Integral Spirituality”; apresenta 8 tipos de paradigmas científicos, fundamentais e abrangentes, que aqui consideramos aos pares: a fenomenologia e o estruturalismo, a hermenêutica e a etnometodologia, a autopoiese (ciências cognitivas) e o “empiricismo”, a autopoiese social e a teoria dos sistemas. Cabe aqui fazer a distinção entre teorias e metodologias ou paradigmas científicos. Sob a perspectiva de Wilber, “(…) a theory is a map of a territory, while a paradigm is a practice that brings forth a territory in the first place. The paradigm or social practice itself is called an "exemplar" or "injunction," and the theory is called, well, the theory. The point is that knowledge revolutions are generally combinations of new paradigm-practices that bring forth a new phenomenological territory plus new theories and maps that attempt to offer some sort of abstract or contoured guidance to the new territories thus disclosed and brought forth. But a new theory without a new practice is simply a new map with no real territory, or what is generally called "ideology." (…)” 2 Neste contexto, em que se apresentam os paradigmas e as metodologias geradores de mundos fenomenais, será também apropriado explicitar a distinção do mito do préexistente, feita também por Wilber, em “The many ways we touch”: "A essência da revolução pós-Kantiana, pós-moderna (subjacente a tudo, desde a hermenêutica passando pelo contextualismo ao construtivismo) é que os fenómenos (tal como o átomo de hidrogénio) não andam simplesmente por aí, esperando por todos e por cada um, para serem vistos, um ponto de vista agora considerado "desesperadamente ingénuo" e referido como o "mito do pré-existente" (sendo que, a questão é nenhum fenómeno ser meramente préexistente). Em vez disso, os fenómenos são enactivados, feitos surgir, revelados, e iluminados através de uma série de comportamentos de um sujeito com capacidades perceptuais. Do modo como o descrevemos, os fenómenos são enactivados e feitos surgir através de injunções, paradigmas, ou práticas sociais ("se queres saber isto, tens de fazer isto"). E aqui está a questão central: todos os paradigmas ou injunções são iniciadas por um sujeito (ou grupo de sujeitos), e todos os sujeitos têm à sua disposição diferentes estados de existência ou estados de consciência. Daqui que, um diferente estado de consciência fará surgir um mundo diferente. [...] Subjectividade (ou intersubjectividade, que discutiremos mais tarde) faz surgir um mundo fenomenológico no decorrer da actividade de conhecer esse mundo. [...] Não existe um mundo por cuja supremacia todos os paradigmas estão lutando, mas muitos mundos gerados por diferentes paradigmas, mundos que podem ser testemunhados pelo olhar pelos mesmos sujeitos se estes se submeterem à disciplina dos paradigmas necessários para enactivar esses mundos." 3 Quatro quadrantes e as “principais metodologias” (ii) Este esquema dos quatro quadrantes distingue as quatro dimensões, espaços ou mundos fenomenais: o espaço interior singular – a dimensão subjectiva, o espaço exterior singular – a dimensão objectiva, o espaço interior plural – a dimensão intersubjectiva e o espaço exterior plural – a dimensão interobjectiva. Segunda a perspectiva metaparadigmática do Pluralismo Metodológico Integral, a estes quatro espaços correspondem os quatro tipos de mundos fenomenais, que são constituídos pelos fenómenos enactivados, feitos surgir, através da actuação de 8 tipos de paradigmas científicos distintos (apresentados no esquema). Esta diferenciação, singular/plural e interior/exterior ocorre tendo em conta a especificidade da perspectiva/paradigma e dos fenómenos que cada uma destas metodologias ou paradigmas faz surgir, ou enacts, através das suas práticas, injunções, procedimentos, instrumentos, tecnologia particulares. Surgem assim, de acordo com a organização de Wilber, 8 tipos de fenómenos divididos pelos quatro mundos fenomenais: - Os dois primeiros tipos de paradigmas, Fenomenologia (introspecção, meditação, etc.) e estruturalismo (Spiral Dynamics, psicologia do desenvolvimento, etc.) fazem surgir uma gama de fenómenos que, nesta perspectiva teórica metaparadigmática, constituem 4 “um mundo fenomenal humano interior individual” (a fenomenologia distingue o interior da interioridade de um individuo, o estruturalismo distingue o exterior da interioridade de um indivíduo); - Como exemplos de fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano interior individual” e que podem ser considerados na análise dos sub-processos que constituem o processo que designamos por Educação: “o eu”, a consciência de si mesmo, a sinceridade, o sentido da existência, a vocação, as intenções, a subjectividade, a espiritualidade, a beleza, a vocação, a arte, a sensibilidade, a alegria, a confiança, o medo, a imaginação, a poesia, a consciência pré-convencional, convencional, pósconvencional, egocêntrica, etnocêntrica, mundocêntrica, biocêntrica e teocêntrica, os estados das capacidades cognitivas, emocionais, relacionais, as estruturas, as linhas e os níveis de desenvolvimento da consciência, os estados alterados da consciência e meditativos, etc. ; - A Hermenêutica (Contextualismo, Construtivismo) e Etnometodologia fazem surgir fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano interior plural” (a Hermenêutica define o interior da interioridade de um colectivo, a Etnometodologia define o exterior da interioridade de um colectivo); - Como exemplos de fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano interior plural” e que podem ser considerados na análise dos sub-processos que constituem o processo que designamos por Educação: o entendimento mútuo, a intersubjectividade / distinções subjectivas partilhadas, os sistemas de significados simbólicos, os dialectos e as línguas, as visões de mundo, a moral, os valores culturais, políticos, económicos ou corporativos, a democracia, a ordem social mítica, o universo antropocêntrico, o pluralismo cultural, a liberdade, a igualdade e a fraternidade, a justiça, a socialização, a enculturação, o ajuste cultural, as modas e as mentalidades, a Nova Era, o corporativismo, o materialismo, o fundamentalismo religioso, o individualismo, o consumismo, etc.; - A Autopoiese (entre as ciências cognitivas) e o “empiricismo” fazem surgir fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano exterior individual” (a autopoiese, como 5 ciência cognitiva, define o interior da exterioridade de um individuo, o empiricismo (fisiologia, neurociências) define o exterior da exterioridade de um indivíduo); - Como exemplos de fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano exterior individual” e que podem ser considerados na análise dos sub-processos que constituem o processo que designamos por Educação: os átomos, as moléculas, células, a pressão arterial, as doenças infecciosas, a homeostasia fisiológica, a autopoiese, a herança genética, o organismo, o cérebro, as ondas e a activação cerebral, o sistema o nervoso, os tipo de sangue, a anatomia, os impulsos e reflexos involuntários, o comportamento, os objectivos, metas, “os factos”, etc.; - A Autopoiese Social, a Teoria dos Sistemas e as Ciências Ecológicas fazem surgir fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano exterior plural” (a Autopoiese Social, como ciência social, define o interior da exterioridade de um colectivo, a teoria dos sistemas define o exterior da exterioridade de um colectivo). - Como exemplos de fenómenos que constituem “um mundo fenomenal humano exterior colectivo” e que podem ser considerados na análise dos sub-processos que constituem o processo que designamos por Educação: as nações ou países, as organizações, instituições, sistemas de governação, de assistência social e processos políticos, as alianças políticas e económicas, o sistema da segurança social, a militarização, o desarmamento nuclear, o sistema educativo, as redes de serviços públicos, produção e comércio, as infra-estruturas, os meios de transporte, os meios de comunicação, a Internet, os satélites artificiais, os sistemas de produção e de distribuição de energia, os mercados financeiros, o mercado livre, o sistema social marxista, a extinção das espécies, o clima, as correntes atmosféricas, a geografia, os ecossistemas, as correntes oceânicas, o ciclo do carbono, a teia da vida, o equilíbrio ecológico, o sistema solar, etc.; É com estes quatro tipos de fenómenos (relativos à consciência, ao organismo, ao fundo cultural, e à organização social e ecológica), que definimos sub-processos de um processo que classificaremos como um processo educativo, na medida em esse processo é constituído por fenómenos que sinalizam alterações significativas na psicologia ou desenvolvimento pessoal do indivíduo. 6 Com alterações significativas na psicologia do individuo, de acordo com a perspectiva Enactiva já apresentada na distinção do mito do pré-existente, queremos dizer que, de um modo particular e notório, no processo educativo se distingue a alteração ou evolução na co-definição observador-mundo, individuo e mundo surgem, simultaneamente acoplados estruturalmente e fenomenalmente, em permanente interacção e especificação mútua. Importante será aqui fazer a distinção de psicologia do ser humano adulto proposta por Clare Graves, “(…) a psicologia do ser humano adulto é um processo em espiral que se desdobra, emergente e oscilante, marcado pela progressiva subordinação de sistemas de comportamentos antigos e de ordem inferior a novos sistemas de ordem superior à medida que os problemas existenciais do indivíduo mudam. Cada estádio sucessivo, onda, ou nível da existência é um estado pelo qual as pessoas passam na sua caminhada para outros estados da existência. Quando o ser humano está centralizado num estado da existência, ele ou ela tem uma psicologia que é particular a esse estado. Os seus sentimentos, motivações, ética e valores, bioquímica, grau de activação neurológica, sistema de aprendizagem, sistema de convicções, concepção de saúde mental, ideias sobre o que a doença mental é e como deveria ser tratada, concepções e preferências sobre administração, educação, economia, e teoria e prática política são todos apropriados para esse estado.” Distinguimos, deste modo, o processo educativo como um processo complexo composto por sub-processos e fenómenos que possibilitam uma alteração da psicologia do humano. Salientamos, no entanto que: de acordo com perspectivas científicas actuais, a génese e as alterações da psicologia do ser humano têm início mesmo antes do nascimento, durante o período da gravidez; e salientamos a perspectiva Enactiva, também de acordo com Gregory Bateson, os processos de aprendizagem do indivíduo são compostos também por aprender a aprender, isto é, o humano traz para o presente um mundo fenomenológico, esquemas interpretativo, sistema de valores e capacidades 7 de performance prévias a partir das quais as novas experiências e fenómenos vão surgir e adquirir significado. (iii) A necessidade de considerar os processos biológicos e neurofisiológicos, que fazem surgir os processos mentais, como fenómenos relacionais comportamentais, tal como foi proposto por Humberto Maturana, Jorge Mpodozis e Juan Carlos Letelier em “Brain, language and the origin of human mental functions“, resulta de uma série de estudos destes autores, que teve como ponto de partida o trabalho científico de Humberto Maturana e Francisco Varela no campo da biologia, mais especificamente a formulação da sua teoria da Autopoiese. Do nosso ponto de vista, ao pretendermos identificar e caracterizar os fenómenos que constituem os sub-processos da alteração da psicologia humana ou o vasto processo educativo, é essencial a referência a esta perspectiva uma vez que ela explicita, numa linguagem objectiva, a importância fundamental das interacções dos humanos entre si, com o ambiente imediato, com as produções humanas e o vasto ecossistema natural. Começamos por referir que, Maturana e Varela definiram os sistemas vivos como “dynamic molecular Structure Determined Systems, organized as closed networks of molecular interactions that produce the same kinds of molecules that produced them, and specify dynamically at every instant the extension and boundaries of the network. Such a network is closed in terms of its dynamics of states of molecular productions, but is open to the flow of matter and energy through it. Maturana (1970) and Maturana and Varela (1973) have shown that those statements constitute a complete characterization of living systems as molecular systems, specifying their conditions of existence and autonomy. Maturana and Varela (1973) called this organization the autopoietic organization, and claim that living systems are molecular autopoietic systems.” E como sistemas determinados momento a momento pela sua estrutura biológica “(…) they are systems such that all that happens to them at any instant depends on their structure (which is how they are made at that instant). Structure determined systems are systems such that any agent impinging on them only triggers in them structural changes determined in them. This we know from daily life. Furthermore, structural determinism is an abstraction that we make from the regularities and coherences of our daily living 8 as we explain our daily living with the regularities and coherences of our daily living. So, the notion of structural determinism reflects the regularities and coherences of our living as we explain our living with the regularities and coherences of our living, and not any transcendental aspect of an independent reality.” Estes autores não só distinguem, deste modo, os sistemas vivos como entidades sistémicas, mais precisamente, sistemas determinados pela estrutura (biológica), que existem no domínio fisiológico da sua corporalidade, e que realizam a sua maneira de viver no domínio relacional em interacções recorrentes com o meio através da participação dinâmica simultânea da sua corporalidade e do comportamento, como propõem uma nova compreensão do fenómeno da linguagem como fenómeno biológico. Nas palavras de Maturana, “a linguagem como um fenómeno biológico é uma maneira de actuar em coordenações consensuais de coordenações consensuais do comportamento (Maturana, 1978)” ou como explica Juares Costa “O homo sapiens vivia e vive dentro de um processo repetitivo de interações, que Maturana denomina de coordenação de coordenações consensuais de comportamentos. Esta expressão, inicialmente difícil de ser entendida, significa que, em uma relação, quando um ser humano se comporta de um modo determinado, o outro reage ao comportamento inicial, e em seguida dá seqüência à interação, comportando-se de um modo que se refere à ação anterior. E seguem assim, em uma dança de comunicações, sempre se referindo à comunicação anterior. Este processo de interações se tornou a principal característica humana. Uma forma de viver, que fez com que significados fossem criados para todos os comportamentos. E estes significados, por sua vez, passaram a ser também compartilhados e transmitidos. Isto é o que hoje chamamos de viver em Linguagem.” Para Maturana, Mpodozis e Letelier “(…) language takes place in the relational domain as a manner of living, and not in the brain as a phenomenon of the operational or structural dynamics of the nervous system. Our existence as human beings takes place in our operation in language, the features of our existence that constitute our humanness, pertain to our relational domain and occur in our "Languaging", not in our bodyhood, Thus, notions such as consciousness, reflection in solitude, mind, thinking and intentionality correspond to distinctions that we make of different aspects of our relational dynamics in our operation as human beings, and as such they do not take place in our bodies, nor are they functions localizable in our brains.” 9 Estes autores salientam também que as distinções que ocorrem ao nível da linguagem, são distinções só, e sempre, em relação ao humano, em relação à sua vivência relacional em linguagem, não há, por isso, distinções de fenómenos que constituem uma realidade independente à nossa vivência humana em linguagem. Tudo o que distinguimos distinguimos no nosso viver, e distinguir o que distinguimos em coordenações de coordenações de comportamentos consensuais constitui o nosso viver em linguagem, de acordo com esta concepção biológica. É importante salientar que estas distinções, quaisquer, de fenómenos, de ordem comportamental e simbólica ou abstracta, que ocorrem na vivência em linguagem, (em coordenações consensuais de coordenações consensuais de comportamentos) surgem numa história humana específica de interacções, dizem respeito à experiência de um ser humano em particular. São distinções operadas na experiência quotidiana imediata ou numa experiência de reflexão intencional, que pode decorrer posteriormente, sobre distinções operadas numa experiência anterior. (iv) É importante, para um esquema de análise teórica da “Educação” como fenómeno social e cultural, além da perspectiva biofenomenológia objectiva de Maturana, uma consideração da interpretação, dos aspectos qualitativos e simbólicos, intersubjectividade e entendimento mútuo, na história das interacções humanas, processos relacionais, comunicacionais e de aprendizagem. Os fenómenos: percepção enactiva, (subjectiva e intersubjectiva, descrita por Wilber), a atribuição (voluntária/consciente ou involuntária/inconsciente) de significado às acções – interacções, gestos, posturas, movimento corporal, tom de voz, configurações faciais, podem ser distinguidos como fenómenos que constituem processos de produção, troca e interpretação de vários tipos de mensagens e meta mensagens (mensagens que interferem na interpretação de outras mensagens, as quais por seu turno poderão surgir como meta mensagens). Estes tipos de fenómenos são distinguidos por Gregory Bateson para elaborar uma teoria da aprendizagem, designada por “The Logical Categories of Learning and Communication”. Não apresentamos um resumo da sua elaborada classificação lógica 10 da comunicação e da aprendizagem, mas salientamos o rigor conceptual que esta perspectiva propõe e exemplifica, numa abordagem qualitativa, formal e lógica aos fenómenos que constituem os processos relacionais, de interacção, que constituem também o processo que designamos por processo educativo. Propondo uma fundação lógico-filosófica, Bateson faz de início uma breve introdução à “Teoria dos Tipos Lógicos” de Bertrand Russell: “it is appropriate to indicate the subject matter of the Theory of Logical Types: the theory asserts that no class can, in formal logical or mathematical discourse, be a member of itself; that a class of classes cannot be one of the classes which are its members; that a name is not the thing named; that "John Bateson" is the class of which that boy is the unique member; and so forth. These assertions may seem trivial and even obvious, but we shall see later that it is not at all unusual for the theorists of behavioral science to commit errors which are precisely analogous to the error of classifying the name with the thing named—or eating the menu card instead of the dinner—an error of logical typing. Somewhat less obvious is the further assertion of the theory: that a class cannot be one of those items which are correctly classified as its nonmembers. If we classify chairs together to constitute the class of chairs, we can go on to note that tables and lamp shades are members of a large class of "nonchairs," but we shall commit an error in formal discourse if we count the class of chairs among the items within the class of nonchairs. Inasmuch as no class can be a member of itself, the class of nonchairs clearly cannot be a nonchair. Simple considerations of symmetry may suffice to convince the nonmathematical reader: (a) that the class of chairs is of the same order of abstraction (i.e., the same logical type) as the class of nonchairs; and further, (b) that if the class of chairs is not a chair, then, correspondingly, the class of nonchairs is not a nonchair. Lastly, the theory asserts that if these simple rules of formal discourse are contravened, paradox will be generated and the discourse vitiated.” Bateson acentua a importância e a complexidade dos fenómenos que constituem os processos comunicacionais e faz um estudo aprofundado dos vários tipos de comunicações, dos vários tipos de mensagens, do modo como as mensagens se classificam mutuamente, na constituição de contextos e processos de aprendizagem, relações interpessoais, familiares, interculturais e internacionais. 11 Para Bateson, “it can be argued that all perception and all response, all behavior and all classes of behavior, all learning and all genetics, all neurophysiology and endocrinology, all organization and all evolution—one entire subject matter—must be regarded as communicational in nature, and therefore subject to the great generalizations or "laws" which apply to communicative phenomena. We therefore are warned to expect to find in our data those principles of order which fundamental communication theory would propose. The Theory of Logical Types, Information Theory, and so forth, are expectably to be our guides.” Este conjunto de considerações teóricas, configuram um esquema teórico no qual é possível distinguir o processo educativo como um processo constituído por fenómenos multidimensionais e que podem ser olhados a partir de várias perspectivas. Neste contexto, fazer a distinção de processos educativos predominantemente formais, não formais e informais, só pode surgir de uma análise e classificação lógico-formal de um conjunto intenções, interacções, relações sociais, comunicações e interpretações de mensagens, que o ser humano mantém. De acordo com o exposto no ponto (i) e (ii), compõem o processo da alteração da psicologia do indivíduo, ou educativo, fenómenos que constituem, pelo menos, quatro tipos de mundos fenomenais: subjectivo, objectivo, intersubjectivo e interobjectivo. É por vezes necessário considerar mais especificamente, ou olhar a partir de uma perspectiva em particular, qual a importância de um tipo de fenómenos nesse processo. Neste caso tentar perceber qual a importância dos fenómenos culturais – intersubjectivos e sociais – interobjectivos, na “Educação” entendida como processo educativo. Os fenómenos culturais – intersubjectivos e sociais – interobjectivos, estão intimamente relacionados, no entanto, tornam-se objecto de estudo, em primeiro lugar, pelos paradigmas que os fizeram surgir e depois por outras teorias. Ainda que, por exemplo, a fisiologia não se dedique ao estudo das estradas, a antropologia não estude os componentes electrónicos dos mísseis intercontinentais, a 12 sociologia não investigue o tipo de produtos químicos usados para restaurar quadros a óleo, é possível perspectivar a mitologia e os valores base de uma cultura tribal a partir da teoria dos sistemas, e fazer uma análise interpretativa contextualista da teoria ecológica materialista num espaço multicultural não antropocêntrico, contribuindo esta análise para uma ecologia das ideias. Considerações sobre a pergunta (2) A Educação surge, de acordo com Cabanas, como um fenómeno social e não (só) individual, ao verificar-mos que um conjunto de fenómenos, que compõe um subprocesso particular, que classificamos como sociais, exerce influência sobre o desenvolvimento da personalidade (altera a psicologia do indivíduo, expande o mundo fenomenal e o esquema interpretativo). Vamos de seguida identificar, nos dois capítulos, os nomes das classes de fenómenos que Cabanas enuncia, citando diversos autores, nomes de classes sugerem os fenómenos sociais determinantes. Sob a perspectiva sociológica, para designar uma classe de fenómenos sociais, são usados os termos: “o ambiente”, “o meio ecológico-social”, “a realidade circundante”, “o grupo social”, “a situação histórica concreta”, “a sociedade”, “contactos e comunicações sociais”, “situações ambientais”, “a herança cultural”, “modelos sociais do comportamento”, “os grupos”, “as situações sociais”; Sob a perspectiva psicológica, para designar uma classe de fenómenos sociais, são usados os termos: “o ambiente”, “os factores sociais”, “as experiências”, “condicionamentos externos”, “reflexos condicionados”, “pulsões e reflexos”, “relações sociais”, “constelação de circunstâncias ambientais”; Sob a perspectiva antropológica, para designar uma classe de fenómenos sociais, surgem os nomes: “condições de trabalho”, “aquisições exteriores”, “a sociedade”, “ideologia”, “dominação masculina”, “responsabilidade social e de poder”, “as elites”. 13 De acordo com as considerações apresentadas na resposta anterior, todos estes fenómenos, sugeridos por os termos usados nas diferentes ciências, indicam fenómenos que constituem sub-processos que compõem o processo educativo. Exposto isto, a “Educação” – processo educativo surge, de um modo notório, como um processo social e não individual, quando (1) no seio de organizações, comunidades ou sistemas de governo, se organizam intencionalmente (com os mais variados propósitos e motivações - humanísticas, económicas, religiosas, recreativas) instituições e infraestruturas, redes de comunicação, projectos, eventos, que se fazem constituir por processos de aprendizagem e experiências, no decorrer das quais se dá a alteração da psicologia do indivíduo e do seu mundo fenomenal, resultando na expansão da sua capacidade de performance, enactivar fenómenos e interagir no meio. Por seu turno o desenvolvimento da pessoa, a estruturação da personalidade vai a cada momento recursivamente participar e influenciar em processos simultâneos, intencionais, semelhantes aos iniciados em (1) e em outros não intencionais. Cada indivíduo vive simultaneamente participando em diversas histórias de interacção e aprendizagem, para Verden-Zöller, citada por Vincent Kenny “O self é aquilo que surge quando um corpo humano ocupa uma posição nodal numa rede fechada de conversações. O self individual não tem existência independente. O que há são muitos deles, diluídos em uma longa rede de histórias culturais e interpessoais. Verden-Zöller observa que Um self é uma dimensão social, que adquire existência por meio de um determinado corpo, isto é, de uma determinada corporeidade. É como um nó onde se encontram as conversações de uma comunidade humana de aceitação mútua.” Bibliografia: Bateson, Gegory. Steps to na Ecology of Mind, University of Chicago Press, 1999. http://www.oikos.org/baten.htm Costa, Juares. E a família, como vai? Texto introdutório ao encontro Biologia do Amar Brasil - Setembro de 2006 Graves, Clare. Summary Statement: The Emergent, Cyclical, Double-Helix Model of the Adult Human Biopsychosocial Systems, Boston, May 20, 1981. [citado por Ken Wilber em Endnotes to Boomeritis, Chapter 1. Disponível on-line] http://clarewgraves.com/ 14 Kenny, Vincent. A Noção do Sagrado em Gregory Bateson (O que ela nos pode dizer sobre uma vida construtiva?) Este artigo apareceu no número 72 da publicação de ensaios Thot, da Associação Palas Athena, em São Paulo, Brasil. Para entrar em contato com a Palas Athena, clique: www.palasathena.org Maturana, Humberto. Metadesign, Instituto de Terapia Cognitiva, 1998 http://www.inteco.cl/articulos/metadesign.htm Maturana, H., Mpodozis, J., e Letelier, J.C., Cérebro, linguagem e as origens das funções mentais humanas http://cipres.cec.uchile.cl/~jusaenz/BLOHMF.HTM Wilber, Ken. The many ways we touch http://wilber.shambhala.com/html/books/kosmos/excerptB/intro.cfm Wilber, Ken. Integral Spirituality, Shambhala Publications, Boston, 2006 15