Reforma agrária: as medidas paliativas do governo federal no vale do Ivinhema/MS (1950 e
1960)
REFORMA AGRÁRIA: AS MEDIDAS PALIATIVAS DO GOVERNO FEDERAL NO
VALE DO IVINHEMA/MS (1950 e 1960)
ANTONIO, Rogério Ribeiro/FACINAN
Resumo
O presente artigo é parte de um anteprojeto de pesquisa feito como requisito de ingresso ao
programa de mestrado em História da Universidade Federal da Grande Dourados UFGD.
Abordamos aqui uma rápida análise da questão fundiária brasileira no que tange à reforma
agrária. Utilizamos para isso a análise de uma empresa particular de colonização, a
SOMECO S/A, que realizou tal projeto de colonização no Vale do Ivinhema/MS.
Palavras chave: Colonização, Reforma Agrária, SOMECO S/A.
Abstract
This article is part of a preliminary research done as a requirement for admission to the MA
program in History at the Federal University of Grande Dorados UFGD. Our approach here is
a quick analysis of the Brazilian land issue in regard to agrarian reform. We use it for the
analysis of a particular company of colonization, SOMECO S / A, which held such
colonization project in the Valley Ivinhema.
Kewords: Colonization, Land Reform, SOMECO S/A
A história econômica do Brasil foi durante muito tempo ligada exclusivamente
à economia agrária. Brevemente podemos citar a exploração do pau-brasil, a
economia açucareira, a cafeeira, e mais recentemente a pecuária e a produção de
grãos.
Contudo essa economia agrária também esteve relacionada ao latifúndio,
onde por vezes, foi motivo de grandes conflitos entre fazendeiros e pessoas sem
terras.
Podemos observar também que, ao longo da história brasileira, o governo não
contribuiu - às vezes até impediu – o acesso dessas pessoas à propriedade rural.
Um exemplo disso é a primeira lei de terras, lei nº. 601 promulgada pelo governo
imperial em 1850, que dificultava a sua aquisição.
Conforme observamos no artigo 5º:
Art. 5º Serão legitimadas as posses mansas e pacificas, adquiridas
por ocupação primaria, ou havidas do primeiro ocupante, que se
acharem cultivadas, ou com principio de cultura, e morada,
habitual do respectivo posseiro, ou de quem o represente,
guardadas as regras seguintes:
§ 1º Cada posse em terras de cultura, ou em campos de criação,
comprehenderá, além do terreno aproveitado ou do necessário
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para pastagem dos animaes que tiver o posseiro, outrotanto mais
de terreno devoluto que houver contiguo, contanto que em
nenhum caso a extensão total da posse exceda a de uma
sesmaria para cultura ou criação, igual ás ultimas concedidas na
mesma comarca ou na mais vizinha. (lei no. 601, de 18 de
setembro de 1850).
Dentro dessa mesma perspectiva, podemos citar, já no século XX, as
medidas adotadas pelo governo de Getúlio Vargas, no período do Estado Novo, com
o decreto-lei nº. 2009 de 9 de fevereiro de 1940, nele o governo Federal tentou
implantar uma política expansionista rumo ao oeste com intenções econômicas e de
proteção às fronteiras, distribuindo terras às pessoas que se enquadravam no perfil
de agricultor.
Observemos então o decreto:
Art. 11. Satisfeitas as exigências previstas no artigo 23 e a
legislação de entrada de estrangeiros, os lotes rurais dos núcleos
coloniais serão distribuídos individualmente a:
a) nacionais que queiram se dedicar a agricultura;
b) estrangeiros agricultores. (decreto-lei nº. 2009 de 9 de fevereiro
de 1940).
Neste contexto o governo, ainda conforme do decreto-lei, incentiva os
agricultores com certos benefícios que queiram se aventurar rumo ao oeste:
Art. 12. O governo Federal entrará em acordo com os estados e
municípios em que se encontre situado o núcleo colonial, no
sentido de ficarem isentos os concessionários de lotes rurais,
durante os cinco primeiros anos de sua localização no núcleo, de
todos os impostos e taxa [...] (decreto-lei nº. 2009 de 9 de fevereiro
de 1940).
No entanto, na prática, o governo não proporcionou condições
necessárias para a fixação das pessoas que se aventuraram nessas regiões – cito
aqui a Colônia Agrícola Nacional de Dourados CAND – Ana Paula Menezes
menciona:
é sabido que no tocante aos recursos necessários para o
desenvolvimento da colônia, não se pode dizer que a CAND teve a
mesma sorte quanto às suas condições naturais. De fato, a
legislação garantia aos colonos, além do lote gratuito de 30 ha
alguns incentivos iniciais, para a fixação na terra e o início do
trabalho agrícola. Tais incentivos incluíam: assistência médica e
educacional, implementos agrícolas, envolvendo sementes,
ferramentas e até animais fornecedores de alimentos e força de
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trabalho [...] (MENEZES. Artigo de pesquisa do programa de
mestrado da UFGD, 97).
Porém, em outra passagem, conclui:
Sabemos que nem todos os colonos tiveram mesma sorte, os que
chegaram após a década de 1950 não receberam tais incentivos,
isto devido ao grande número de migrantes que a CAND recebeu
o que supostamente teria impedido a administração, que contava
com precária infra-estrutura, (NAGLIS, 2008) de atender a todos,
[...] (Idem).
Diante destas passagens, podemos afirmar que o problema agrário
brasileiro perdura há muito tempo. Principalmente no que diz respeito à distribuição
de terras, resultando em sérios problemas com a reforma agrária.
Ainda dentro da história econômica brasileira, observamos que a partir da
década de 1930 com o governo Vargas, a economia brasileira dá os primeiros
passos rumo a uma industrialização, e já no fim da década de 1940, a economia
nacional se torna predominantemente industrial.
Conforme afirma Priore,
[...] por volta de 1945 a economia brasileira torna-se
predominantemente industrial. A partir dessa época, as discussões
se voltam para a aceleração do processo de desenvolvimento
econômico. Pois bem, uma das soluções propostas implica a
associação com o capital internacional, enquanto a outra consiste
em proteger a economia desse tipo de intervenção, valorizando a
ação do Estado como promotor da industrialização. Entre
numerosos defensores desta forma de desenvolvimento, havia os
partidários da reorganização de nosso mundo rural. Para eles, o
campo brasileiro mantinha estruturas econômicas pré-industriais,
impedindo a integração da população aí existente ao mercado
consumidor. Mais ainda, nossa agricultura, baseada em grandes
propriedades e na lavoura de exportação, abastecia precariamente
a cidade, elevando o custo de vida e fazendo com que, entre os
trabalhadores, sobrassem poucos recursos para a aquisição de
produtos industriais. A formação de latifúndios improdutivos tinha
outro efeito negativo: desvia capitais das atividades econômicas
mais dinâmicas. Em outras palavras, sem a reforma agrária, a
economia brasileira estaria fadada à estagnação ou então a uma
crescente dependência em relação aos investimentos
estrangeiros. (PRIORE, 2010, 272-273).
Observamos então que havia sérios problemas enfrentados pela
economia agrícola como o velho fantasma do latifúndio que encarecia a alimentação
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dos brasileiros, uma vez que grande parte da produção agrícola das grandes
fazendas era destinada à exportação, diminuindo assim o poder de compra dos
brasileiros.
Sendo assim, alguns grupos políticos, tanto do governo de Juscelino
Kubitschek, quanto do governo de João Goulart, propõe reforma agrária profunda,
uma vez que para estes grupos apenas com a reforma agrária, o Brasil poderia
atingir um alto grau de desenvolvimento econômico.
Contudo, “nem mesmo governos transformadores, como os de Getúlio
Vargas e Juscelino Kubitscheck, instituíram projetos dessa natureza.” (PRIORE,
2010, 273).
No entanto, algumas medidas adotadas pelo governo brasileiro vão de
encontro com esta proposta de reforma agrária. De fato algumas medidas
desestimularam e até incentivaram o êxito rural, provocando assim graves
consequências.
Neste sentido Priore afirma:
Desde os anos 1930, a ênfase dada à industrialização leva, na
maioria das vezes, a restrições ao crédito rural e a uma política
cambial desfavorável aos produtores agrícolas. Assim, para a
manutenção das taxas de lucro, deve-se aumentar o nível de
exploração dos trabalhadores, o que estimula, por sua vez,
movimentos migratórios e sentimentos de revolta. (PRIORE, 2010,
273).
Na verdade o governo brasileiro, em relação ao campo, tomou mais
medidas paliativas do que de fato criou políticas eficazes. Até mesmo poderíamos
afirmar que em certos momentos, o governo foi omisso em certas situações.
Para corroborar com esta ideia, damos a palavra novamente a Priore,
[...] após a abolição, o campo brasileiro nem sempre adota o
trabalho assalariado. Em várias partes, colonos, rendeiros,
meeiros e moradores de favor é que de fato substituem o braço
cativo. Nesse meio, fazendeiros cobram prestações de serviços
em troca de moradia, alteram livremente os acordos de partilhas
das colheitas ou despedem trabalhadores sem indenização
alguma. Em 1955, a revolta contra essa situação cristaliza-se na
forma de Ligas Camponesas, organizadas por Francisco Julião,
advogado com longa experiência na defesa dos trabalhadores e
pequenos proprietários rurais. Inicialmente, as Ligas se
estabelecem em Pernambuco e Paraíba, para depois se
espalharem por outras regiões brasileiras, como Rio de Janeiro e
Goiás. Seu lema é levar “justiça ao campo” através da reforma
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agrária, “na lei ou na marra”, o que implicava invasões de
propriedades rurais, criando um clima de terror em parte da elite
brasileira. (PRIORE, 2010, 273).
Este cenário descrito por Priore, ocorreu pela omissão do governo em
criar políticas eficazes para o campo. Porém diante deste clima de terror sentido
pela elite brasileira, é que serão tomadas medidas para amenizar os conflitos rurais
e consequentemente, os problemas das ameaças de invasões de terras.
É neste contexto que no fim da década de 1950, o governo incentiva as
colonizações nos oestes brasileiros principalmente por meio de empresas
particulares. Surge então uma empresa de colonização que se interessa por
promover a integração de algumas regiões à economia nacional, a SOMECO S/A.
Vejamos então como foi esse processo.
Em um relatório enviado em 7 de março de 1957 para o senhor Reynaldo
Massi a fim de informá-lo sobre as terras ao sul do então estado de Mato Grosso, as
quais o senhor Reynaldo Massi estava prestes a adquirir, relata o chefe da
expedição:
Aproveitando a ida a Dourados do piloto Hugo Simione, meu
particular amigo, fiz um vôo de exploração sobre a região a fim de
localizar alguma via que de Amandina désse acesso às glébas, o
que, apesar do tempo de vôo em diversas altitudes, não conseguí,
apenas localizando muito bem as glébas. Em Dourados,
posteriormente, tive a oportunidade de avistar-me com um
engenheiro do Estado, que por lá passou em transito para o sul.
Garantiu-me esse engenheiro, a existência de uma estrada desde
Amandina até as glébas, a qual certamente eu não vira durante os
vôos de exploração, por ser uma via sinuosa que serpeava
atravez das matas densas, e, cuja visibilidade vertical estaria
prejudicada pelas copas da vegetação alta e frondosa. [...]”
(RELATÓRIO, 1957, 3).
Pelo que tudo indica a expedição comandada por este agrimensor,
percorreu estas terras, com a intenção de conhecer sua geologia e suas qualidades
para uma futura colonização.
Essas terras, no entanto, não eram desconhecidas há algum tempo, pois
a Mate Laranjeira já havia passado por estas terras. Como podemos observar no
relatório:
[...] No caso de não ser encontrada a picada ou mesmo o marco,
voltariam ao ponto de partida, de onde, ficou bem claro, seguiram
abrindo caminho pela velha „carretera‟ da Mate (Laranjeira) até o
Vitória, onde em sua margem, começariam as picadas de
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levantamento até a chegada do grosso da expedição por esse
lado. (RELATÓRIO, 1957, 5).
Isso por volta de janeiro do ano de 1956, cinco anos antes da colonização
oficial de Ivinhema. Esta situação nos levanta uma indagação, essas terras eram
devolutas? Se não, a quem pertenciam? E como o senhor Reynaldo Massi as
adquiriu?
Além do mais, o resultado desta expedição nos mostra um fato curioso,
alguns meses após esta expedição surge a SOMECO S/A e em 1961 a colonização
oficial de Ivinhema. (por isso a delimitação temporal desta pesquisa. Em 1961, início
da colonização e em 1978, elevação do município de Ivinhema a Comarca).
Também para comprovar que esta região é de muito tempo conhecida por
colonizadores, José de Melo e Silva menciona em seu livro Canaã do Oeste, “Mais
ou menos nessa última data (1593) e certamente indo de arrepio às águas do
Paraná, do Ivinhema e do Pardo, outros jesuítas da mesma procedência atingiram
as vertentes deste último, no altiplano de Maracaju, onde se fixaram. [...]” (SILVA,
1947, 42).
Não só era conhecida, mas também essa região fazia parte de um
cenário econômico relativamente importante na economia nacional, como menciona
Silva em outra passagem do livro:
[...] quem se deu o trabalho de examinar um pouco a questão dos
ervais mato-grossense, sabe que a Companhia Mate Laranjeira
organizou uma considerável rede de navegação fluvial, para o fim
de coletar o produto da maioria dos ervais, seus ou de estranhos.
Através das águas do Iguatemi, do Pirajuí, do Mbaracaí, do
Amambaí, do Laranjaí, do Guiraí do Pirabebê e do Ivinhema
(incluídos os formadores deste, o Brilhante e o Dourados). Cruza
um grande número de embarcações, rebocadas por lancha a
vapor e a motor de explosão. Desembocando no Paraná e
descem em direção a Guaira, levando a erva coletada naquela
emaranhada floresta [...] (SILVA, 1947, 68).
No relatório feito pelo agrimensor, observamos também alguns indícios de
moradia já naquele momento, em 1956, pois por várias vezes este agrimensor
menciona caminhos e moradores na região conhecida como Amandina, próxima
onde hoje situa a cidade de Ivinhema.
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Amandina era, aparentemente, um posto de abastecimento que deveria
servir aos poucos moradores da região, e que por sinal, foi de grande contribuição
para que esta expedição, e consequentemente a colonização atingisse êxito.
Conforme afirma o agrimensor a respeito desta localidade,
O abastecimento ficou a cargo do Snr. Sebastião Vaz de Mélo,
paulista de Cafelandia e estabelecido em Amandina que,
fidalgamente, no decorrer dos trabalhos, não só acudiu com o que
tinha em estóque como, também, adquiriu de terceiros muitos
artigos a fim de poder atender aos pedidos, sabendo de antemão
que só receberia no final do serviço, [...] (RELATÓRIO, 1957, 7).
Em outra passagem, onde o agrimensor juntamente com uma equipe
parte rumo ao porto São Luiz, próximo a Amandina, observa-se que eles saíram da
região de Dourados rumo às terras a serem conhecidas: “Dia 21, em caminhão,
conduzí pessoal e traia para o porto Brilhante, onde, em duas barcas-motor
previamente contratadas, embarcamos iniciando assim, às 12,45 horas (local), a
etapa fluvial Brilhante abaixo.” (Idem, 5). Como afirmei anteriormente, estas terras
não eram terras de ninguém, como podemos observar em outra passagem do
relatório:
[...] prosseguimos até o porto São Luiz onde, graças a Deus,
chegamos sem mais novidades às 22 horas. Fui recebido pelo
administrador do Snr. Zirbo Simões, com quem combinei
acomodação para o pessoal até o momento da entrada. [...]
São raros, na localidade, trabalhadores nacionais. Contratei duas
turmas de picadeiros paraguaios, e com o agregado Cachí Aveiro,
da mesma nacionalidade, acertei o serviço de penetração com
tropa de mulas e vaqueanos para a limpeza. (RELATÓRIO, 1957,
7).
Este relatório tinha a intenção de conhecer e demarcar as terras
devolutas que viriam a ser da empresa SOMECO S/A, que iria ser constituída
apenas em 25 de novembro de 1957, com a intenção inicial de colonizar os
chamados espaços vazios, os conhecidos sertões, “os oestes” do Brasil para citar
um termo utilizado por Ziliani.
Contudo, para melhor compreender este trabalho, e o que se
compreendia naquele momento, faz-se necessário conceituar os termos colonização
e sertão.
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Conforme Ziliani,
A primeira retrata, configura e expressa um tipo de atitude e de
ação de vários sujeitos históricos em determinado contexto
histórico, sempre a demandar uma população, recursos
econômicos além de normas e regras. A segunda, constituída de
espaços dinâmicos e radicalmente diversificados que, apesar de
uma “existência concreta”, quase sempre nas narrativas referentes
à noção de sertão, revelaram-se como lugares imaginados,
construídos e postos em articulação com o primeiro. (ZILIANI,
2010, 11).
Neste contexto de colonizar os oestes, “A ideia de sertão foi uma
construção simbólica para representar determinados espaços, em regra geral,
desconhecidos ou conhecidos precariamente pelos colonizadores europeus. [...]”
(Idem).
Mais especificamente sobre o antigo sul de Mato Grosso, atual Mato
Grosso do Sul, por ser o foco deste estudo, e por estar mais comumente dentro do
conceito que outras regiões do país tiveram sobre estes oestes, afirma Galetti,
Em fins da década de 1920, o Estado de Mato Grosso ainda era
tido, ou identificado, nos grandes centros do país, como “sertão”,
lugar isolado das grandes cidades e, consequentemente da
“civilização”. Representado como um local com vias de
comunicação e transporte precários, lenta dinâmica das atividades
produtivas, local de pessoas rudes, imensos espaços não
habitados pelo homem “civilizado” e sinais da presença de grupos
indígenas (GALETTI, 2000, 88).
Assim, o antigo sul de Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul, era visto
como uma região praticamente isolada, de difícil acesso e seus moradores como um
povo rude e sem cultura principalmente em relação ao sudeste brasileiro, este visto
como região desenvolvida e civilizada.
Apesar da “distância” dos grandes centros, o então sul de Mato Grosso,
assim como outras regiões do Brasil, sobretudo a partir de 1920, foi atingido
diretamente pelas frentes de expansão nacionais. Ou seja, “as regiões do país até
então „isoladas‟ começaram a sofrer um processo de articulação orgânica à vida
nacional, por meio da implantação de novos meios de transporte, comunicação e
fixação de novas populações” (RIBEIRO, 1993, 366). Assim como a CAND, a
colonização de Ivinhema foi realizada com a intenção de integrar a região do Vale do
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Ivinhema à economia Nacional, ou até mesmo, como afirmado anteriormente, para
atender a necessidade de se fazer assentamentos rurais, para talvez resolver os
problemas que a economia nacional vinha passando em relação às questões
agrárias.
De acordo com o Decreto Lei nº. 2009 de 9 de Fevereiro de 1940 no seu
artigo 2º “A formação de núcleos coloniais poderá ser promovida: a) pela União; b)
pelos Estados e Municípios; c) por empresas de viação férrea ou fluvial,
companhias, associações ou por particulares.”
No entanto, estas frentes de expansão nacional foram feitas geralmente
por empresas particulares ou associações. A colonização estatal não foi eficiente,
uma vez que as Colônias Agrícolas Nacionais não deram muito certo. Portanto fezse necessário a colonização por particulares, talvez, justificando assim, as
concessões de terras do governo.
Neste sentido afirma José de Melo e Silva,
Embora o nosso mau vezo de criticar, sem o necessário
conhecimento de causa, determinados departamentos da
administração pública, já nos foi dado compreender que o
Ministério da Agricultura está tolhido de muitas iniciativas, de vez
que é reconhecidamente ridícula a verba que lhe coube na
distribuição orçamentária.
Aconselhamos assim as iniciativas particulares, até que o poder
legislativo resolva suprir o Ministério da Agricultura com recursos
que sobram a outros departamentos da administração. (SILVA,
1947, 127 – 128).
Neste projeto de integrar (ou sanar os problemas agrários de outros
estados) estas “regiões isoladas”, surgiram empresas que conseguiram concessões
do governo federal, ou adquiriram terras por outros meios para realizarem tal projeto
colonizador. Dentre estas empresas, temos a SOMECO S/A.
Podemos afirmar que, o projeto de colonização da SOMECO S/A veio ao
encontro de tentar sanar os problemas agrários existentes em outros estados
brasileiros, - principalmente de São Paulo e região do Nordeste, uma vez que são
destas regiões as maiores levas de migrantes do Vale do Ivinhema – e
consequentemente de integrar esta região à economia nacional, incentivando o
cultivo de produtos destinados ao abastecimento do mercado interno brasileiro.
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Diante desta situação, conforme afirma em entrevista o senhor Augusto
Antonio, um dos pioneiros de Ivinhema, a proposta inicial da SOMECO era de que
os colonos se dedicassem ao cultivo de arroz, algodão, amendoim, feijão, mamona e
não a produção de café. Podemos concluir desta afirmação que o projeto inicial de
colonização visava ao abastecimento do mercado interno brasileiro e não de uma
produção voltada para a exportação.
Ainda dentro desta perspectiva do projeto de colonização, a SOMECO fez
a divisão das terras a serem colonizadas em glebas rurais perfazendo “uma área
total de 77.558,07 ha, num total de 3.031 lotes. A área média de cada lote foi de 15
ha, compreendidos em 11 glebas rurais.” (POLTRONIÉRI, 1992, 2). Isto esta de
acordo com o Decreto Lei nº. 2009 de 9 de Fevereiro de 1940 em seu artigo 14.
Art. 14. “Os Lotes, nos núcleos coloniais, serão classificados em:
a) rurais, destinados à lavoura e criação, cujo limite vaiará entre 10
e 50 hectares, salvo casos especiais, devidamente justificados e
submetidos à aprovação do Presidente da República.” (Decreto
Lei nº. 2009 de 9 de Fevereiro de 1940).
Até o momento podemos compreender que o projeto está de acordo com
os propósitos do governo federal em se fazer a reforma agrária. No entanto,
segundo uma análise da estrutura social e conjuntura do município de Ivinhema
realizada pela assistente social Sueli Garcia de Souza Poltroniéri em 1992, os
resultados desse processo de colonização, não surtiu totalmente os efeitos
esperados.
Segundo esta análise,
De um modo geral a área total do Município está dividida em
grandes proprietários (apenas 4), os quais, segundo informações
de um dos diretores da SOMECO S/A, detêm 35% da área, sendo
que o restante é dividido em médios e pequenos proprietários, o
que deixa claro que distribuição da renda é feita de maneira
desuniforme. (POLTONIÉRI, 1992, 5).
Portanto concluímos que o governo federal em suas medidas para a
realização de uma reforma agrária, na verdade foram mais paliativas do que de fato
eficazes. No entanto este é apenas um trabalho de mestrado que está no início de
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sua jornada. Cabe aqui aprofundar ainda mais sobre o tema em questão, e fica,
portanto o convite àqueles que se interessam pelo tema a buscar mais informações.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GALETTI, Lylia da Silva Guedes. Nos confins da civilização: sertão, fronteira e
identidade nas representações sobre Mato Grosso. 2000. 358 f. Tese (Doutorado em
História Social) – FFLCH/USP, São Paulo.
MELO E SILVA, José de. Canaã do Oeste: sul de Mato Grosso. Campo Grande:
Tribunal de Justiça, 1989.
POLTRONIÉRI, Sueli de Souza. Análise da estrutura social e conjuntura do
município de Ivinhema. 1992.
PRIORE, Mary Del; VENANCIO, Renato. Uma breve história do Brasil. São Paulo:
Ed. Planeta, 2010.
RIBEIRO, Darci. Os Índios e a Civilização: a integração das populações indígenas
no Brasil moderno. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1970.
RELATÓRIO, da empresa SOMECO S/A. 1956.
ZILIANI, José Carlos. Táticas e Estratégias da Companhia de Viação São Paulo
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http://www2.camara.gov.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-2009-9-fevereiro1940-411911-publicacaooriginal-1-pe.html Acesso em 11/01/2012.
Artigo recebido em 01/2013. Aprovado em 02/2013.
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