DOSSIER
TABAGISMO
Boas práticas em
prevenção do tabagismo
no meio escolar
JOSÉ PRECIOSO*
RESUMO
O maior risco que as crianças e os adolescentes correm quando começam a fumar é o de ficarem
dependentes do tabaco, muitas vezes para a vida inteira, e vir mais tarde a sofrer de inúmeras
patologias causadas pelo tabagismo (cancro de pulmão, D.P.O.C., enfartes, entre outras). Estudos
recentes mostram que as crianças tornam-se dependentes da nicotina mais facilmente do que os
adultos e com quantidades de tabaco tão baixas que nunca antes tinham sido estudadas (fumar
dois cigarros por dia durante quatro a seis semanas). Os investigadores constataram ainda que
as raparigas ficam mais facilmente viciadas em nicotina do que os rapazes.
Para além dos problemas de saúde associados, o consumo de tabaco na adolescência é um problema muito prevalente, em expansão, sobretudo no sexo feminino, mas vulnerável.
Para travar a progressão da epidemia tabágica é necessário conhecer a sua etiologia, ou seja, compreender quando, onde e porque é que as crianças e os adolescentes se tornam fumadores. Em face
das respostas a estas questões poderão desenhar-se intervenções mais racionais para resolver o
problema. A finalidade deste artigo é contribuir para clarificar a etiologia do consumo de tabaco e
analisar o contributo que a escola e os médicos de família podem dar para controlar a expansão do
tabagismo.
INTRODUÇÃO
ciência demonstrou de forma inequívoca que fumar
activa ou passivamente é
prejudicial à saúde em todas
as fases do ciclo de vida da pessoa. No
entanto o consumo de tabaco pelas
crianças e os adolescentes (ou a sua exposição à poluição resultante do fumo
do tabaco) é particularmente grave pelos seguintes motivos:
1. As crianças e os jovens que fumam,
activa ou passivamente, vêm aumentado o risco de padecer de amigdalite, de constipações, de bronquite, de
ataques de asma, assim como de outros problemas respiratórios1,2,3.
2. As crianças e os adolescentes, quando começam a fumar, correm um risco elevado de se tornarem dependentes do tabaco muitas vezes para a
vida inteira, podendo mais tarde vir
A
*Professor Auxiliar no Instituto
de Educação e Psicologia –
Universidade do Minho
a padecer das graves patologias associadas à aspiração do fumo do tabaco. Estima-se que entre 70 a 90%
das pessoas que consomem quatro
ou mais cigarros por dia durante algum tempo podem vir a tornar-se fumadores dependentes4,5,6. Estudos
mais recentes, efectuados por DiFranza et al7, mostram que as crianças tornam-se dependentes da nicotina mais facilmente do que os adultos e com quantidades de tabaco tão
baixas que nunca antes tinham sido
estudadas (fumar dois cigarros por
dia durante quatro a seis semanas).
Os investigadores constataram ainda que as raparigas ficavam mais facilmente viciadas em nicotina do que
os rapazes.
3. Entre os comportamentos aditivos, o
consumo de cigarros é um dos que
está mais estabelecido durante a
adolescência. Os dados sobre prevalência do consumo de tabaco em adolescentes permitem concluir que a
prevalência de alunos e alunas fumadoras é elevada, sobretudo no sexo
feminino (19% de fumadoras diárias
aos 15 anos); que contrariamente ao
que acontecia no passado, em que todas as taxas de fumadores eram das
menores da Europa, actualmente há
uma grande aproximação das prevalências registada em alunos portugueses e os seus congéneres europeus; e o pior de tudo é que a prevalência de alunas fumadoras tem aumentado de forma alarmante nos
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últimos anos8,9. Dado o aumento do
consumo na população feminina, e a
manterem-se estas tendências, os
problemas pré e pós-natais relacionados com o tabagismo feminino tenderão a agravar-se muito num futuro próximo.
4. A maioria dos actuais fumadores começa a fumar antes dos 18 anos, portanto na infância e na adolescência.
5. O consumo de tabaco está associado
com o consumo de álcool e de outras
drogas e é geralmente a primeira a ser
usada pelos jovens que entram numa
sequência de consumo de drogas que
incluem o tabaco, o álcool, a marijuana e outras drogas duras9,10.
Este conjunto de dados mostram que
em Portugal continua a ser muito importante fazer um esforço, sistemático
e organizado, na prevenção do consumo de tabaco pelo/as adolescentes e
jovens adulto/as na escola. É necessário que o Ministério da Educação comece a promover a saúde e a Educação
para a Saúde na escola de forma organizada e eficaz e não como até agora tem
acontecido, em que o padrão de intervenção tem carácter esporádico, pontual e restrito. Conforme já foi referido
o consumo de tabaco pelos jovens atenta directamente contra a sua saúde.
Para se prevenir este comportamento
temos que conhecer quando, onde e
porque começam a fumar. Com base
na resposta a estas questões tentaremos sugerir, com base na evidência científica, que papel pode a escola e o médico de família assumir na prevenção do
tabagismo.
ETIOLOGIA DO CONSUMO DE TABACO
Quando se começa a fumar?
Admite-se que nos países desenvolvidos
a maioria dos fumadores comece a fumar na adolescência, ou seja, antes dos
18 anos de idade, embora em Portugal
uma percentagem elevada de fumado202
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res, cerca de 30%, tenham começado a
fumar mais tarde12,14. Segundo Becoña
e Vázquez6, a probabilidade de vir a ser
fumador regular é tanto maior quanto
menor for a idade em que se começa a
fumar.
Vários estudos mostram que os jovens começam a fumar em idades cada
vez mais precoces13. Alguns começam
já aos 12 anos ou mais cedo.
A partir destes dados podemos inferir que a prevenção primária do consumo de tabaco deve começar antes dos
12 anos (provavelmente no 6o ou 7o ano
de escolaridade) mas deve continuar ao
longo do percurso escolar incluindo a
Universidade e o local de trabalho (pois
existe evidência epidemiológica que
mostra que em Portugal o começo é
mais tardio que noutros países mais
desenvolvidos).
O facto de a maioria das crianças não
começar a fumar antes desta idade (embora a tendência seja a diminuição da
idade de iniciação), associado ao facto
das crianças serem de uma forma geral hostis ao consumo de tabaco, permite-nos inferir que é desaconselhável
a abordagem deste tema no primeiro
ciclo do ensino básico. A sua abordagem
de forma incorrecta corre o risco de ser
contra-preventiva. Por outro lado os
alunos nesta idade têm outros problemas de saúde mais importantes (como
a higiene pessoal e oral, os acidentes domésticos, de lazer e rodoviários, etc.) e
que devem ser tratados. Sendo o tempo um recurso escasso, devemos atender aos problemas mais importantes
em cada faixa etária e claramente o consumo de tabaco não é (ainda) nesta faixa etária um problema prioritário.
Onde se começa a fumar?
A partir dos resultados de um estudo
efectuado por Precioso13 e de investigações realizados por outros investigadores, existe evidência científica segura
para poder afirmar que a escola é o local de iniciação do comportamento de
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TABAGISMO
fumar para a maioria (60%) dos alunos
portugueses (embora as raparigas tenham começado frequentemente noutros lugares) e que percentagens de alunos da amostra superiores a 50% receberam ofertas de cigarros na escola.
Uma vez que é no início da adolescência que muitos alunos já começam
e continuam a fumar, que o local de iniciação, na maioria dos casos é a escola, que todos passam pelo sistema de
ensino, a prevenção do consumo de tabaco deveria começar pelos 12-13 anos
e um local adequado para o fazer seria
a própria escola.
Porque se começa a fumar?
Após aturadas investigações, admite-se que não existe uma causa única que
explique esta conduta. Parece haver um
conjunto de factores complexos e interrelacionados que predispõem os mais
jovens a fumar15,16. Por outro lado sabe-se que os factores que podem levar as
pessoas a começar a fumar diferem de
indivíduo para indivíduo, o que torna os
esforços preventivos complexos pois
trata-se de agir sobre uma realidade heterogénea. Não obstante a complexidade desta conduta existem algumas teorias que pretendem explicar porque é
que os jovens começam a fumar e que
podem ter um valor importante na
orientação dos esforços preventivos.
Segundo Mendoza, Pérez e Foguet17,
os comportamentos de saúde, tal como
muitos outros, são determinados por
factores biológicos, psicológicos, microsociais (família, escola, amigos), macrosociais (em que os media têm um papel
preponderante), ambientais, culturais,
económicos, etc., representados no esquema da Figura 1.
Este esquema, para além de dar uma
ideia da complexidade da etiologia dos
comportamentos humanos, releva a necessidade de actuar globalmente, em
todas as esferas, sistemas e sub-sistemas da vida humana, para se obterem
mudanças de comportamento efectivas,
sustentáveis e duradoiras.
Da análise do esquema da Figura 1
pode dizer-se que a interacção das influências sociais e ambientais, com as
características individuais e a predisposição do indivíduo a ser susceptível a
tais influências, parecem ter um papel
importante no início da experimentação com cigarros. A seguir descrevem-se os principais factores pessoais,
sociais e ambientais, relacionados com
o consumo de tabaco e sugerem-se algumas actividades para os contrariar.
A)
FACTORES PESSOAIS
Os factores pessoais, que incluem o desconhecimento dos riscos do consumo
de tabaco; a necessidade de demonstrar
que atingiu a maioridade; o desejo de
ser e comportar-se como os adultos; a
curiosidade natural do jovem; algumas
crenças relacionadas com o fumo, tais
como, «o tabaco emagrece», «ajuda a
esquecer», a «resolver os problemas», a
«acalmar os nervos», «a lidar com o
stress»; a necessidade de chamar a atenção dos outros exibindo um comportamento desviante perante os pares ou os
pais, foram desde sempre apontados
como factores influentes na adopção do
AMBIENTE NATURAL
Produtividade solos, etc
Perigos naturais
AMBIENTE MACROSSOCIAL
Estruturas
Sistema social
Cultura
AMBIENTE
Amigos
Família
Indivíduo
Biopsicologia
Emprego
Grupos económicos
Escola
Instituições
Meios de comunicação
Capacidade turística
Recursos naturais
Figura 1. Determinantes dos estilos de vida (adaptado de
Mendoza, Pérez, e Foguet, 1994).
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hábito de fumar.
Muitos jovens começam a fumar
para parecerem mais adultos e mostrarem maior maturidade e autonomia. O
desejo de imitação dos mais velhos e sobretudo dos progenitores é muito habitual entre os jovens16. Geralmente fumar é associado com o ser adulto, esperto e os anúncios dos cigarros encorajam estas ideias15.
Há ainda um grupo de adolescentes
que começa a fumar só para contrariar
as restrições impostas pelos pais ou pelos irmãos mais velhos. Por vezes fumam só porque os pais ou os amigos lhe
disseram para não o fazer 15. Em determinadas crianças o consumo de cigarros é encarado como um símbolo de independência e de rebeldia contra as
normas impostas pela família e pela sociedade15.
Para outros jovens a adopção do hábito de fumar constitui mais um componente do ritual de passagem da infância para a adolescência e a idade
adulta.
Vários estudos mostraram também
que os jovens com piores resultados escolares13 e com menores ambições nos
seus estudos têm maiores probabilidades de se tornarem fumadores. Eliminar a imagem positiva do tabaco e ajudar os jovens a desenvolver confiança
em si próprios e a melhorar os seus desempenhos escolares e sociais contribuiria para reduzir a prevalência do tabagismo.
Outros estudos comprovaram que os
jovens fumadores têm menos conhecimentos sobre os riscos do tabagismo
para a saúde, não personalizam esses
riscos e acham que, a curto prazo, fumar oferece vantagens (auto-estima,
novas amizades) que compensam
quaisquer riscos. Os jovens que não fumam tendem a manter opiniões negativas a respeito do tabaco. Assim, é importante insistir nas consequências do
tabagismo a curto prazo (quer sobre a
saúde, quer na apresentação pessoal) e
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aproveitar as oportunidades para desmistificar as qualidades e valores atribuídos ao tabaco.
B)
FACTORES SOCIAIS
Os factores sociais incluem a atitude
positiva em relação a fumar dos amigos,
dos pais, dos irmãos e dos ídolos; o facto
dos pais, dos irmãos e dos ídolos fumarem; o facto de fumar ser um comportamento socialmente aceite.
A pressão social directa ou indirectamente exercida pelos amigos foi desde sempre considerada um dos mais
influentes factores relacionados com o
consumo de tabaco nos jovens. Vários
estudos referem que ter um «melhor
amigo» que fuma é um factor preditivo
muito importante para que os jovens venham a consumir tabaco no futuro. Os
jovens que começam a fumar costumam fazê-lo com os amigos e, para eles,
fumar constitui nitidamente uma actividade social. Por outro lado, quase todos os jovens não fumadores têm amigos que também não fumam. Muitos jovens experimentam o tabaco em grupo
e a aprovação dos companheiros é um
mecanismo importante para a manutenção do hábito. Segundo o Ulster Cancer Foundation15, os jovens podem começar a fumar para copiar os seus irmãos mais velhos ou os amigos. Na opinião de Pestana e Mendes16, a pressão
do grupo a que o jovem pertence e a tentativa de se identificar com ele levamno com frequência a iniciar o consumo
experimental e regular de tabaco. Muitas vezes começam a fumar pela dificuldade de resistir às pressões dos colegas
e amigos, realizadas geralmente pela
oferta de cigarros e o receio de cair no
ridículo ante a recusa ou não adopção
de um comportamento generalizado no
grupo13.
Por isso, ajudar os jovens a desenvolver a auto-confiança e a capacidade de
resistir às pressões sociais para fumarem contribuiria decisivamente para reduzir a prevalência do tabagismo.
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TABAGISMO
O tabagismo dos pais, bem como as
suas atitudes em relação ao tabaco, têm
sido associados de uma forma constante com o tabagismo dos jovens. As crianças criadas em ambientes familiares em
que os adultos não fumam e os pais desaprovam o consumo do tabaco têm
menos probabilidades de se tornar fumadores habituais. A influência dos
pais parece máxima na fase de transição do consumo «experimental» para o
consumo «regular». Se se conseguir influenciar o tabagismo dos pais e as suas
atitudes perante o tabaco, isso ajudará
a reduzir o tabagismo dos jovens.
Os dados do inquérito levantamento
Teenage Health and Lifestyles das
crianças das escolas secundárias (secondary school children) revelam que os
jovens têm mais possibilidade de vir a
ser fumadores se alguém em casa fumar; que os irmãos parecem ter mais
influência que os pais neste aspecto;
quando ambos os pais fumam, as crianças têm duas vezes mais probabilidade
de ser fumadores que se nenhum dos
pais fumasse.
Um estudo realizado por Precioso18
revela que o facto dos pais fumarem em
casa é um factor de risco adicional.
Constata-se que a percentagem de alunos fumadores é maior no grupo de alunos filhos de pais/mães que fumam em
casa que no grupo de alunos filhos de
pais fumadores que não fumam em
casa ou que não fumam.
C)
FACTORES AMBIENTAIS
A aceitabilidade social do consumo de
tabaco e o fácil acesso a estes produtos
(acessibilidade); a exposição e vulnerabilidade para o marketing e publicidade ao tabaco manifestadas pelos jovens;
o baixo preço do tabaco; a elevada
quantidade de dinheiro colocada à disposição dos jovens (nalguns casos); são
factores ambientais fortemente relacionados com o consumo de tabaco pelos
jovens16,17,18.
Cada vez mais abundam as evidên-
cias que relacionam a publicidade e a
promoção do tabaco (por meio do patrocínio de equipas desportivas, por exemplo) com a decisão de começar a fumar.
As campanhas publicitárias dirigidas a
promover o consumo de cigarros e as
estratégias de promoção associam o hábito de fumar com os divertimentos,
com o risco, com a maturidade, utilizando a Teoria do Reforço Social, para tentar convencer os jovens que se fumarem
obtêm as vantagens apresentadas na
publicidade. A publicidade dirigida directamente às mulheres jovens valoriza
a magreza, a elegância e provavelmente
apoia-se na Teoria da Aprendizagem
Social de Bandura, oferecendo imagens
de modelos muito atractivos para as
raparigas, fazendo com que estas
tentem copiá-los. Bandura também refere como elemento fundamental a
baixa auto-eficácia necessária para fumar, pois trata-se de um comportamento sem grandes barreiras económicas e
sociais.
Nos países em que se introduziram
amplas limitações à publicidade ao tabaco (Noruega, por exemplo), verificou-se uma redução imediata do tabagismo nos jovens.
A forma como o uso do tabaco é apresentado nos meios de comunicação, nomeadamente nos programas de televisão e no cinema, pode também pressionar directa ou indirectamente os jovens.
O uso do tabaco, apresentado sob um
aspecto favorável pelos «media», pode
reforçar os mitos sobre os efeitos benéficos do tabaco e encorajar as crianças
a fumar. Por esse motivo os produtores
de cinema e de televisão deviam estar
conscientes da sua influência, especialmente quando as personagens e/ou os
actores representam ídolos ou modelos
para os jovens.
Igualmente parcimoniosos no uso do
tabaco deveriam ser treinadores e dirigentes desportivos (particularmente de
futebol) e os realizadores das emissões
desses eventos, pois são frequentemenRev Port Clin Geral 2006;22:201-22
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te «apanhados» em flagrante pela câmaras de televisão a fumar e podem por
isso constituir um modelo negativo para
as crianças que em casa vêem o jogo
pela televisão.
Segundo Mendoza19, um dos factores
que mais fortemente explica o consumo
de tabaco pelos jovens é a facilidade que
estes têm em adquiri-lo, dada a alta
oferta deste produto e a facilidade na
sua compra. A venda de tabaco em máquinas automáticas, a dificuldade em
reconhecer a idade dos jovens e de fazer cumprir a lei que proíbe a venda a
menores, o facto do preço dos cigarros
ser acessível e os adolescentes possuírem bastante dinheiro disponível, faz
com que o acesso ao consumo de tabaco seja facilitado. Embora a venda de tabaco aos jovens seja proibida em muitos países, os cigarros estão perfeitamente ao alcance dos jovens de todas as idades e a preços que eles podem
pagar.
Torna-se necessário o alargamento e
a prática integral das limitações à venda do tabaco aos jovens. Uma política
de aumento de preços pode igualmente ter um importante efeito dissuasivo.
Estudos europeus provaram que os
preços elevados influenciam a prevalência do uso do tabaco tanto nos jovens
como nos adultos. Por outro lado, os
pais deveriam ter mais atenção ao dinheiro que fornecem aos filhos18. Uma
medida importante e já adoptada em alguns países é a verificação da idade do
jovem para não haver equívocos, pois é
reconhecida a dificuldade de actualmente avaliar a idade de um adolescente ou de um jovem adulto.
Outra medida importante para reduzir por um lado os riscos da exposição
ao fumo passivo e por outro lado reduzir o consumo é a criação de legislação
restritiva de fumar em lugares públicos.
Alguns países como os Estados Unidos,
o Canadá, a Irlanda, o Reino Unido, a
Espanha, já adoptaram legislação restritiva e aguarda-se os resultados do
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seu cumprimento e também da sua eficácia na cessação. Teoricamente o facto
de não fumar começar a ser a norma
social pode ter efeitos positivos na iniciação por parte dos adolescentes.
Deixam de ver o consumo de tabaco
como um comportamento normal dos
adultos.
O processo de aprendizagem de
fumar: A «carreira de fumador»
Embora o consumo de tabaco esteja
relacionado com os factores descritos
anteriormente, ninguém nasce fumador e ainda por cima «por geração espontânea». Aprende-se a fumar ao longo de uma série de passos que habitualmente são designados por carreira do
fumador.
A seguir descreve-se as fases do processo pelo qual o indivíduo pode começar a fumar e os factores psicológicos,
sociais e ambientais relacionados com
cada fase. Desta forma poderemos
orientar melhor os esforços preventivos.
Na opinião de vários especialistas20-23,
a aquisição de qualquer hábito, e fumar
é apenas um exemplo, não é uma simples resposta a um estímulo. É um processo que provavelmente se desenvolve
ao longo do tempo, segundo uma sequência ordenada de estágios. Na opinião de Nutbeam, Mendoza e Newman
(1988)21, o hábito de fumar desenvolve-se em quatro ou cinco etapas, até a
criança se tornar fumadora dependente: a preparação, a iniciação/experimentação, a habituação (consumo regular/instalação do hábito) e a manutenção/dependência (consumo dependente).
A fase de «Preparação» vai do nascimento ao início da adolescência. É caracterizada pelo facto de a criança ainda não ter fumado mas começar a criar
expectativas e a formar atitudes que a
poderão conduzir a experimentar o primeiro cigarro (iniciação). Na formação
de uma atitude positiva em relação a fumar são particularmente fortes o uso do
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tabaco pelos pais, a opinião dos pais e
os meios de comunicação social, em especial a televisão5,21. A atitude (positiva
ou negativa em relação ao tabaco) está
relacionada com o processo de socialização primária que ocorre no meio familiar, com o início do processo de socialização secundária, que ocorre na escola (com os amigos) e através dos «media»20,24. Conforme já foi dito, há mais
crianças fumadoras entre os grupo de
pais/mães que fumam em casa. Estes
progenitores têm provavelmente uma
atitude mais permissiva em relação ao
tabaco e, por isso, não tentam exercer
qualquer controlo do tabagismo nos filhos. É muito importante que os médicos recomendem aos pais que não fumem em casa.
A fase de «Iniciação» e «Experimentação» consiste na primeira prova do cigarro e está associada ao processo de
socialização secundária que decorre,
em particular, na escola com os amigos
mais próximos e também por intermédio dos «media». Ocorre dos sete aos 14
anos. Na experimentação do cigarro são
particularmente fortes as seguintes influências: a curiosidade natural de todas as crianças desta idade; o uso do
tabaco pelos amigos íntimos; uso do tabaco pelos pais; os «media», especialmente a televisão e as revistas; a facilidade de arranjar cigarros; o desejo de
aceitação social; a curiosidade relativamente aos hábitos dos adultos2,4,5.
Embora mais ou menos 90% da população tenha experimentado fumar e
muitos não tenham prosseguido, o risco de vir a fumar regularmente aumenta se a experimentação com o tabaco se
repetir mais de 4 a 5 vezes. Os estudos
sugerem que 70 ou 90% dos fumadores iniciais que fumam 4 a 5 vezes podem vir a fumar regularmente. Os estudos revelam igualmente que quanto
menor for o intervalo entre fumar o primeiro cigarro e os seguintes, maior será
a probabilidade de se estabelecer a dependência do tabaco5.
A fase de «Habituação» ocorre geralmente durante a adolescência e é caracterizada pelo facto do adolescente começar a fumar com alguma regularidade
(pelo menos um cigarro por semana).
Os principais factores psicossociais de
risco associados a este tipo de consumo
são: ter amigos fumadores, estar envolvido em situações sociais em que os
amigos apoiam o consumo, ter baixa
auto-eficácia e capacidade de recusa,
ter disponibilidade de cigarros, percepcionar que fumar é útil para a pessoa,
ter poucas restrições a fumar na escola
e na comunidade. A «Aquisição» do hábito está relacionada com o reforço do
hábito por experiências físicas, sociais
e psicológicas positivas relacionadas
com o uso do tabaco. São particularmente influentes na aquisição do hábito de fumar as convicções sobre os efeitos do tabaco (por exemplo: «acalma»,
«dá confiança», «controla o peso»); a aceitação ou subestima dos riscos para a
saúde; a conduta dos amigos relativamente ao tabaco (incluindo a dos irmãos); a imagem de si próprio; a acessibilidade e o preço dos cigarros.
A «Manutenção» do hábito e a dependência consiste no estabelecimento do
consumo diário de fumar e ocorre geralmente no fim da adolescência e início
da idade adulta. Na fase de «Manutenção/Dependência» o indivíduo continua
a fumar devido à dependência física da
nicotina e à dependência psicológica e
social2,4,5.
Para o estabelecimento da dependência contribuem os factores citados para
a fase precedente a que se associam a
dependência à nicotina e a dependência psicológica. No Quadro 1, apresentamos as diferentes etapas do desenvolvimento do hábito de fumar propostas
por Nutbeam, Mendoza e Newman21
e outros autores e descrevemos de forma resumida, as influências pessoais,
sociais e ambientais, associadas a cada
fase.
É importante salientar que o trajecRev Port Clin Geral 2006;22:201-22
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QUADRO I
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO MODELO EXPLICATIVO PARA A AQUISIÇÃO DO HÁBITO DE
FUMAR PROPOSTO POR NUTBEAM, MENDOZA E NEWMAN (1988)
Fase
PREPARAÇÃO
Idade
0-10
EXPERIMENTAÇÃO
7-14
HABITUAÇÃO
10-18
MANUTENÇÃO
13-18
PRINCIPAIS INFLUÊNCIAS
Sociais
Fumo dos pais
Atitude dos pais
Curiosidade natural
Fumo dos amigos
Fumo dos pais
Atitude dos pais
Pessoais
Crenças sobre o cigarro
Crenças na relevância
dos riscos para a saúde
Auto-imagem
Dependência física
e psicológica
to seguido por um fumador pode não
ser linear, ou seja, um adolescente que
experimente fumar poderá não vir a seguir os restantes passos da «carreira» e
geralmente o número de crianças que
passam de uma fase à seguinte vai diminuindo21. Em cada estágio existe a
opção de sair da «sequência». Durante
a juventude, regista-se uma oscilação
entre a experimentação, o consumo habitual e o abandono do tabaco, podendo o comportamento dos adolescentes
variar com a mudança de amigos, de escola e de estilo de vida. Muitas crianças
depois de terem experimentado fumar
decidem não repetir a experiência, enquanto outras continuam a fazê-lo,
muitas vezes, até se transformarem em
fumadores habituais21.
Nutbeam, Mendoza e Newman21 alertam para o facto de que ser fumador habitual durante a adolescência não significa necessariamente que se continue a
sê-lo na idade adulta, mas é geralmente preditivo da instalação da dependência do tabaco.
O perfil que descrevemos mostra os
momentos-chave para os quais as intervenções podem ser dirigidas. Acen208
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Fumo dos amigos
Fumo na família
Ambientais
Media
Televisão
Media (Televisão e
revistas).
Disponibilidade de cigarros.
Máquinas de venda automática
Disponibilidade
Custo dos cigarros
tua também a necessidade de intervenções diferenciadas em cada estádio.
É importante salientar que todos os
modelos cujas fases apresentamos no
Quadro 1 salientam o papel das influências sociais na aquisição do comportamento de fumar. Estas podem ser divididas em abertas (ou directas) tais como
persuasão, pressão e encorajamento,
ou influências encobertas (indirectas)
tais como a modelagem. Todos os modelos destacam também a importante
influência da pressão do grupo.
VIAS PARA A PREVENÇÃO DO CONSUMO
DE TABACO EM MEIO ESCOLAR
Já vimos que a adolescência é a fase do
ciclo de vida em que a maioria dos fumadores/as começam a fumar. O/a adolescente sofre durante este período um conjunto de influências micro e macro-sociais e ambientais, que o podem levar a
fumar. Podemos dizer que o adolescente vai aprendendo a fumar como aprende outros comportamentos. A aprendizagem começa na família e prossegue na
escola, com os amigos, com os adultos,
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com os media, no ambiente natural, etc.
Este processo de aprendizagem desenrola-se na aldeia cada vez mais global.
A prevenção do consumo de tabaco
deverá consistir em contrariar esse vasto conjunto de factores de risco e promover os factores protectores. A família e a escola, pelo impacto que têm no
processo de socialização, devem ser um
dos alvos das acções de prevenção.
Os estabelecimentos de ensino são
um dos locais e os alunos um dos alvos
privilegiados das acções de promoção de
saúde e de prevenção do tabagismo. É
na escola que os alunos passam uma
grande parte do seu tempo e aí adquirem valores e comportamentos salutogénios ou prejudiciais. Em todo o mundo, elas são o maior canal para colocar
informação à disposição de todos, visto que alcançam milhões de alunos e,
através deles, as suas famílias e comunidades. A intervenção deveria passar
pelo modelo das Escolas Promotoras de
Saúde, ou seja, ter uma dimensão curricular, uma dimensão psicossocial,
ambiental e comunitária.
Em seguida descreve-se o conjunto
de medidas a aplicar na escola para tornar a prevenção do consumo de tabaco eficaz. Convém referir que não é preconizada a aplicação de medidas isoladas. Uma vez que os comportamentos
são determinados por factores biológicos, psicológicos, sociais e ambientais,
para podermos modificar ou alterar
essa conduta teremos que actuar através de programas que pretendam agir
sobre esse conjunto de factores. Defende-se hoje que a prevenção do consumo de tabaco na escola (e não só) deve
ser feita de forma global e abrangente,
dirigida aos vários factores de risco associados ao consumo. Após uma vasta
revisão bibliográfica sobre políticas de
controlo do tabagismo e com base nas
publicações do Centers for Disease Control and Prevention (CDC), Guidelines for
School Health Programs to Preventing
Tobacco Use and Addiction25 e Best Prac-
tices for Comprehensive Tobacco Control
Programms26, na excelente apresentação de Cheryl L. Perry e Jean L. Forster
Youth Smoking: Can it Be Prevented or
Reduced?, utilizando como referência a
vasta documentação produzida pelo
professor Elisardo Becoña da Universidade de Santiago de Compostela sobre
este assunto27,28, baseados no programa Galego contra o tabagismo29, pensamos que as vias mais eficazes para
prevenir o consumo de tabaco pelos jovens incluem uma combinação das estratégias, representadas no esquema
da Figura 2.
As acções preventivas para contrariar
a procura de cigarros pelos jovens deverão ser implementadas em meio escolar
(dirigidas directa ou indirectamente aos
alunos) e também na comunidade.
Entre as iniciativas e actividades preventivas do consumo de tabaco implementadas em meio escolar dirigidas directamente aos alunos sugerem-se: a
aplicação generalizada de programas de
prevenção intensivos do tipo das influências psicossociais (em Portugal temos
o programa «Não fumar é o que está a
dar»30 e o Programa «Querer é Poder I e
II»)31,32,33 a promoção de estilos de vida
saudáveis, através do desenvolvimento
de um currículo transversal de Educação para a Saúde18;34.
Entre as iniciativas e actividades extra-curriculares que podem atingir indirectamente os alunos sugerem-se a
criação de um ambiente escolar (escola sem tabaco) que reforce as acções
educativas exercidas directamente sobre os alunos33, a criação de turmas
sem fumadores34,35,36 e a comemoração
de eventos relacionados (ex: Dia Nacional do Não fumador; Dia Mundial contra o Tabaco).
Entre as iniciativas e actividades preventivas implementadas na comunidade que podem atingir indirectamente os
alunos sugere-se: o envolvimento dos
pais dos alunos, as restrições à venda de
cigarros a menores (proibição da venda
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209
DOSSIER
TABAGISMO
Prevenção do consumo
de tabaco pelos jovens
Deve ser feita fundamentalmente em
Deve ser feita com o apoio da
Meio escolar
Comunidade
Agindo directamente sobre o
Agindo directamente sobre o
Indivíduo
Ambiente escolar
Através de
Através de
Acções curriculares
Acções curriculares
Programas de prevenção
intensivos (Área de
formação cívica)
Turmas sem fumadores
Continuidade da
intervenção anti-tabágica
ao longo do percurso
escolar
Currículo transversal de
Educação para a Saúde
Programas de desabituação
para jovens
Comemorações de
eventos relacionados
Organização/participação
em campanhas
Políticas de controlo
do tabagismo na
escola (escola livre
de tabaco)
Porta-moedas
electrónico
Envolvimento
dos pais
Campanhas nos media
(Jornal escolar)
Limitar o acesso à
compra de cigarros
Aumento dos preços
Figura 2.
em locais próximos das escolas, em vendas de máquinas automáticas, venda
avulso, etc.), a monitorização e o reforço
do investimento na prevenção primária.
As campanhas nos media poderão ter
também um impacto importante na prevenção do consumo, assim como a criação de espaços de lazer alternativos (espaços verdes e equipamentos que afastem os jovens de locais de maior risco de
virem a fumar como são os cafés, os bares, os salões de jogos, etc.).
A seguir será descrita de forma pormenorizada cada uma das medidas preconizadas anteriormente.
1) Actividades Curriculares
APLICAÇÃO DE PROGRAMAS ESPECÍFICOS DE
PREVENÇÃO DO CONSUMO DE TABACO NO 7O ANO
E SESSÕES DE REFORÇO NOS ANOS SEGUINTES
Está demonstrado que os programas
preventivos do tipo das influências psicossociais aplicados na escola aos alunos têm mostrado elevada eficácia preventiva e devem por isso fazer parte des210
Rev Port Clin Geral 2006;22:201-22
sa estratégia global de prevenção.
Através da concepção e aplicação de
programas do tipo das influências psicossociais tenta-se «imunizar» as crianças e os jovens contra o tabagismo. Tal
como o organismo desenvolve imunidade contra um agente infeccioso se a
ele for submetido em doses que o não
façam adoecer, também podemos desenvolver no aluno uma certa «imunidade» contra as influências psicossociais que o podem levar a fumar. Através de programas intensivos do tipo das
influências psicossociais inspirados nas
teorias descritas anteriormente podemos desenvolver no aluno resistências
psicológicas contra alguns factores psicossociais que conduzem ao consumo
de tabaco, designadamente, promover
o desenvolvimento de uma atitude negativa em relação ao fumar e aumentar
a sua auto-eficácia que é uma qualidade determinante para que ele resista às
pressões dos pares para que fume. É
importante fazer os alunos sentir que é
DOSSIER
TABAGISMO
possível e desejável resistir às pressões
directas ou indirectas para fumar (treino de assertividade) e que isso não é
muito difícil, basta utilizarem estratégias adequadas para o efeito (e que devem ser aprendidas e trabalhadas nas
aulas). Por outro lado é necessário ilegitimar as pressões efectuadas pelos
amigos. Dado que muitas crianças começam a fumar por volta dos 12-15
anos o processo de «vacinação» deve começar antes desta idade ou seja no 6º
ou 7o ano de escolaridade e continuar
com a aplicação de sessões de reforço
especialmente na transição de ciclo de
ensino (do básico para o secundário e
deste para a universidade). A seguir
será feita uma breve caracterização de
alguns programas do tipo das influências psicossociais.
O PROGRAMA «NÃO FUMAR É O QUE
ESTÁ A DAR»
O programa de prevenção do consumo
de tabaco «Não fumar é o que está a
dar»30 é um programa intensivo, específico e transversal, de prevenção do consumo de tabaco, do tipo das influências
psicossociais, constituído por um conjunto de 15 sessões semanais de uma
hora, dirigidas aos alunos do 7o ano de
escolaridade (que são os alunos em
maior risco de começar a fumar) e a ser
aplicadas nas disciplinas de Ciências
Naturais, Língua Portuguesa, Educação
Visual, Matemática e Educação Física.
As sessões do programa «Não fumar
é o que está a dar» estão agrupadas em
seis componentes básicos: Informações
sobre o fumo do tabaco; construir uma
atitude sobre fumar; tomar uma decisão sobre o futuro uso do tabaco; corrigir a percepção exagerada do número
de amigos fumadores; resistir às influências sociais para fumar.
Um componente corresponde a uma
sessão ou a um conjunto de sessões dirigidas a contrariar um determinado
factor de risco associado ao começo de
fumar pelos jovens30.
O programa que lhe serve de reforço
designado por «Aprende a cuidar de ti»,
destina-se a alunos do 8o ano e é para
ser aplicado no ano seguinte nas disciplinas de Ciências Naturais, Português
e Matemática37. Conforme já foi dito,
para além de constituir um reforço do
programa principal, pretende simultaneamente desenvolver no aluno a intenção de optar por um estilo de vida saudável.
O PROGRAMA «QUERER É PODER» I E II
O programa «Querer é Poder I», desenvolvido em Portugal no âmbito do European Smoking Prevention Framework
Approach31, é constituído por um conjunto de 6 sessões e destina-se a jovens
dos 12 aos 14 anos.
Tal como outros programas do tipo
psicossocial possui, entre outros, quatro componentes básicos: um componente informativo que proporciona aos
alunos a compreensão das consequências negativas de fumar para a saúde;
um componente que ajuda os alunos a
identificar a procedência das influências para fumar; um componente de
treino em habilidades sociais para resistir às pressões dos companheiros para fumar e um componente em que os
alunos se comprometam publicamente
a não fumar e exponham as razões que
os levam a tomar essa decisão.
O Programa «Querer é poder II» tem
um programa complementar de reforço para ser aplicado no 8o ano de escolaridade32. A função das sessões de recapitulação é manter o efeito do programa nos alunos a quem foi aplicado.
Estas sessões constituem fundamentalmente uma recapitulação das noções
fornecidas durante a implementação do
programa «Querer é poder I» (com as limitações impostas pelo tempo) e aborda a problemática do fumo passivo32.
Este programa pode ser adquirido
através de pedido ao Conselho de Prevenção do Tabagismo – Lisboa.
Um estudo quasi-experimental realiRev Port Clin Geral 2006;22:201-22
211
DOSSIER
TABAGISMO
zado entre 1997/200038 mostrou que o
programa «Não fumar é o que está a
dar» conseguiu alcançar resultados
francamente positivos (pelo menos a
curto prazo) no que respeita ao controlo de alguns factores de risco relacionados com o começo de fumar e à prevenção do consumo de tabaco. Constata-se que melhorou o nível de conhecimentos dos alunos; diminuiu a percepção por parte dos alunos de que os amigos gostariam que eles fumassem, provavelmente porque conseguiu persuadir os alunos a não pressionarem os
amigos a fumar; melhorou a sua capacidade para dizer não; fortaleceu o sentimento de vulnerabilidade dos alunos
e a sua preocupação com as consequências de fumar; incrementou uma atitude desfavorável relativamente ao consumo de tabaco e reduziu a percepção
exagerada da percentagem de colegas
(iguais) fumadores (sobrestima). O programa teve um efeito positivo em prevenir o consumo total de tabaco. Não
obstante, a nota mais saliente é o facto
do programa ter conseguido resultados
apreciáveis em prevenir o consumo diário de tabaco.
Relativamente ao consumo total de
tabaco a intervenção teve um efeito semelhante ao alcançado por outros programas designadamente pelo programa «Tabaco, Alcohol y Educacion: una
actuación preventiva»39;40.
No que se refere à prevenção do consumo diário de tabaco, obteve resultados a curto prazo muito próximos do
programa desenhado e implementado
pelo Norwegian Cancer Society e do Research Center for Health Promotion University of Bergen41.
Os trabalhos de revisão efectuados
por muitos autores41,42,43 mostram que
os programas mais eficazes na prevenção do abuso de substâncias implementados na escola são os que reforçam a
capacidade pessoal de resistir às pressões sociais. Diversos programas baseados neste modelo, com uma dura212
Rev Port Clin Geral 2006;22:201-22
ção que oscila entre oito e doze horas
num ano, aplicados entre o sexto e o oitavo ano, conseguiram reduções significativas no início do tabagismo. Outros
programas baseados no reforço da auto-estima ou de prevenção inespecífica
não mostraram resultados positivos
apreciáveis ao ser aplicados a estas idades e em alguns casos foram até contraproducentes43.
A revisão da eficácia de alguns programas mostrou que as intervenções
que apresentavam bons resultados incluíam os seguintes componentes: baseavam-se numa aprendizagem de tipo
socrática, bidireccional e interactiva (levavam o aluno a descobrir por meios
próprios); insistiam nas consequências
negativas de fumar já conhecidas pelos
alunos (sobretudo a curto prazo) em vez
de se centrar em aumentar conhecimentos sobre as mesmas (aprofundar
muito os conhecimentos sobre uma determinada desvantagem de fumar); desenvolviam habilidades para resistir às
pressões sociais; eliminavam a percepção errada de que o consumo é um comportamento normal de conduta social;
suscitavam declarações públicas de recusa de consumo por parte dos alunos.
Graças aos vários estudos experimentais e quasi-experimentais, efectuados por nós e por outros autores, e ainda com base na revisão de várias investigações realizadas, podemos afirmar
que as intervenções preventivas baseadas em modelos teóricos adequados,
bem planificadas e bem implementadas, podem reduzir a taxa de consumo
de tabaco (e outras drogas) e logicamente de problemas a ele associados. Não
aplicar programas preventivos eficazes,
que considerem os factores de risco e
de protecção do consumo, fará com que
o problema do consumo de drogas legais e ilegais diminua menos que o desejável, se mantenha ou até vá aumentando.
Face à demonstrada eficácia dos programas preventivos e o reduzido custo
DOSSIER
TABAGISMO
daquilo que poderíamos chamar de «primeira dose da vacina de prevenção contra o consumo de tabaco», pensamos
que a aplicação dos programas deve ser
generalizada a todas as escolas.
A sua difusão nas escolas poderá ser
feita de acordo com as quatro fases sugeridas por Becoña28 para a difusão de
programas de prevenção.
Na fase de disseminação, o programa
deverá ser divulgado e as escolas persuadidas a integrá-lo no seu projecto educativo, mais concretamente no seu plano de actividades. Na fase de adopção,
deverão ser tomadas iniciativas para que
as escolas se comprometam na implementação do programa. Na fase de implementação, deverá ser organizada a
formação para que os professores possam implementar o programa sem sobressaltos. Na fase de manutenção e
uma vez que o programa tenha sido
adoptado pelas escolas, deverão ser desenvolvidas as acções necessárias para
garantir que as escolas mantenham o
programa no seu plano de actividades.
A difusão destes programas necessita do apoio das Autoridades de Saúde
e de Educação do nosso país.
Continuidade das intervenções
ao longo do percurso escolar
Os resultados preventivos do consumo
de tabaco conseguidos com a implementação de programas intensivos e
multidisciplinares na idade de maior
risco (dos 11-12 anos e no 7o ano de escolaridade ou mesmo mais cedo) só podem ser mantidos ou mesmo reforçados
se houver continuidade ao longo de todo
o percurso escolar dos alunos26,27.
É importante que no ensino secundário os professores façam sessões de
reforço com os alunos que incluam as
seguintes estratégias:
1. Em trabalho de grupo, fazer uma lista de aspectos negativos e positivos
relacionados com o consumo de tabaco. Discutir se os aspectos positivos apontados pelos alunos o são
efectivamente (ex. controla o stress)
e se não podem ser atingidos por outras vias mais saudáveis (p. ex., praticar desporto...).
2. Listar os projectos de vida (p. ex: ter
filhos, praticar desporto, etc.) e ver de
que forma o tabaco pode interferir
na sua consecução.
3. Reanalisar as razões pelas quais se
fuma e discutir a validade desses motivos.
4. Discutir situações em que os alunos
foram confrontados com pressões
para fumar e apresentar testemunhos sobre a forma como se lidou
com a situação.
5. Envolver os alunos em campanhas
contra o tabaco e pela saúde.
Currículo de Educação para
a Saúde e de programas
transversais intensivos
Embora fumar seja um dos comportamentos mais prejudiciais à saúde, existem outros que rivalizam com este, tais
como: o consumo de drogas lícitas ou
ilícitas; o sedentarismo; a alimentação
desregrada; exposição a situações de
stress; promiscuidade sexual; violência;
condução perigosa e a má utilização dos
serviços de saúde44.
Promover a adopção de estilos de vida
saudáveis pode ser uma forma de dar
continuidade aos esforços de prevenção do consumo de tabaco, pois é uma
forma de levar os alunos a preocuparem-se mais com a sua saúde e com os
factores que a podem pôr em risco ou
que a podem promover.
Sabemos, no entanto, que os professores em geral só abordam o que estiver explícito no currículo da sua disciplina. Daí que o envolvimento dos docentes na promoção de estilos de vida
saudáveis passa pela criação de um
currículo transversal de Educação para
a Saúde. Sugere-se a implementação
de programas transversais intensivos
nos anos de maior risco e a devida continuidade nos anos seguintes. Os teRev Port Clin Geral 2006;22:201-22
213
DOSSIER
TABAGISMO
mas a abordar nesse currículo transversal de Educação para a Saúde poderiam
ser os que estão representados no Quadro 1, que são já adoptados em alguns
países designadamente Espanha e Inglaterra44,45 (Quadro II).
QUADRO II
TEMAS A ABORDAR NUM POSSÍVEL CURRÍCULO DE
EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE
Temas a abordar
Prevenção do consumo de
drogas (álcool, tabaco e outras)
Prevenção do cancro
Alimentação
Segurança (doméstica, de lazer,
rodoviária)
Prevenção das doenças infecciosas
Higiene
Educação sexual
Saúde e ambiente
Exercício físico e saúde
Saúde mental
Ano lectivo
6 e 7o ano
10o ano
8o ano
7o, 8o e 9o ano
9o ano
6 e 7o ano
9o ano
6 e 7o ano
6 e 7o ano
10o ano
2. Acções extracurriculares
«SMOKE-FREE CLASS» (TURMA SEM
FUMADORES)
Alguns países europeus, incluindo Portugal, estão a adoptar uma estratégia
extracurricular designada por «Smokefree Class» (Turma sem fumadores) que
consiste num concurso de âmbito
nacional e europeu, no qual o conjunto de alunos de uma turma se comprometem a não fumar durante um determinado período de tempo e a desenvolver um conjunto de actividades sobre o
consumo de tabaco (designadamente a
elaborar um slogan)35,36. Aqueles que se
mantiverem não-fumadores durante
esse período de tempo receberão um
prémio e poderão submeter-se a um
concurso de nível nacional e europeu,
habilitando-se a receber prémios com
valor significativo36. É uma estratégia
que utiliza incentivos (prémios) e que
orienta e manipula a pressão do grupo
214
Rev Port Clin Geral 2006;22:201-22
para a manutenção da abstenção de fumar. Nesta caso, a pressão do grupo é
dirigida a encorajar os alunos a não fumarem, contrariamente ao que é habitual que é para que estes experimentem
e continuem a fumar. Esta via é muito
importante, pois se é necessário desenvolver competências de recusa, é preciso ter consciência da dificuldade de «remar contra a maré», isto é, de o jovem
querer pertencer a um grupo sem fazer
o que o grupo pretende. Por isso, o melhor é mudar o «sentido da corrente»
agindo no sentido de fazer com que o
grupo, ou alguns dos seus elementos,
deixem de exercer pressão para que os
colegas fumem.
Outras iniciativas extra-curriculares
«mais convencionais», como as competições e eventos sem-tabaco ou sessões
de informação e formação para a comunidade escolar, devem ser mantidas e
melhoradas.
CLUBES «CAÇA CIGARROS» (SMOKEBUSTER)
Os programas dirigidos a jovens fora do
âmbito escolar, como os dos clubes de
«Caça cigarros» (Smokebuster), oriundos da Grã Bretanha e que actualmente se generalizaram por vários países incluindo Portugal, devem continuar a
sua acção. O seu interesse consiste em
reforçar a atitude dos alunos a manterem-se não fumadores e a intervirem no
seu ambiente familiar e comunitário,
criando condições mais favoráveis ao
controlo do tabaco34.
Programas de cessação para jovens
Diversos estudos mostram que uma
proporção muito elevada (70%) de jovens fumadores lamentam ter começado a fumar e que três em cada quatro
jovens tentam deixar de fumar em qualquer ocasião4.
Também no nosso estudo verificamos que a maioria dos alunos que fumam regularmente gostavam de experimentar deixar de fumar, uma percentagem apreciável de alunos estava he-
DOSSIER
TABAGISMO
sitante e outros já tinham tentado, embora sem sucesso.
Estes estudos confirmaram a necessidade de complementar as intervenções
de prevenção primária dirigidas aos alunos com programas de cessação dirigidas aos jovens que experimentaram ou
inclusive que estejam a fumar há algum
tempo mas que não tenham consolidado o seu hábito e a sua dependência26,34.
3. Acções a nível do ambiente escolar
CRIAR UM AMBIENTE ESCOLAR DE REFORÇO
ÀS ACÇÕES EDUCATIVAS EXERCIDAS SOBRE OS
ALUNOS
– ESCOLA SEM TABACO
A nível da escola deverão ser feitos esforços para promover um meio escolar
livre de tabaco e reforçar a norma de
«não fumar» na escola25. Isto pode conseguir-se através de medidas regulamentares tendentes à criação de uma
escola sem fumo33.
Uma escola sem tabaco é uma escola onde é possível circular sem ser incomodado pelo fumo do tabaco, ou seja,
é uma escola com uma política de prevenção tabágica clara conhecida e assumida pela comunidade escolar33.
A política de prevenção tabágica da
escola consiste basicamente na implementação da Lei de Prevenção do Tabagismo (Lei no 22/82, de 17 de Agosto).
Na alínea c) do artigo 3o esta Lei determina que, fora das áreas expressamente destinadas a fumadores, é proibido
o uso de tabaco nos estabelecimentos
de ensino.
Esta lei é regulamentada pelos Decretos-Lei 226/83, de 27 de Maio, e
393/88, de 8 de Novembro e, no que
respeita às escolas, pelo Despacho
8/ME/88, de 20 de Janeiro de 1989.
Em resumo, no quadro da lei, os
princípios para uma Escola sem Tabaco são os seguintes: os alunos não podem fumar na escola; os professores e
outros profissionais podem fumar apenas em áreas expressamente destinadas a fumadores, que devem estar identificadas com os respectivos dísticos.
As razões para criar uma escola sem
tabaco consistem basicamente no facto de estar cientificamente provado que
o fumo do tabaco, para além dos prejuízos que causa aos fumadores, prejudica seriamente a saúde das pessoas
que estão expostas à poluição do fumo
resultante da combustão do tabaco.
A par das razões relacionadas com a
saúde e a qualidade do ambiente, os
motivos para justificar uma Escola sem
Tabaco incluem o facto da proibição de
fumar na escola reduzir o número e o
tipo de modelos que podem influenciar
os jovens a fumar. Uma Escola sem Tabaco pode conseguir-se mediante a definição da respectiva política de escola,
o que obriga a uma negociação e clarificação de regras que devem ser aceites
e respeitadas por todos33.
4. Acções a nível da comunidade
ENVOLVER OS PAIS NAS ACÇÕES DE
PREVENÇÃO DO CONSUMO DE TABACO
Para além da intervenção a nível individual a prevenção do comportamento
de fumar pode conseguir-se de forma
mais eficaz através de acções desenvolvidas no meio social dos alunos e que
os atinjam directa ou indirectamente25.
O meio social dos adolescentes compreende os pais, os professores, o pessoal não docente, os líderes juvenis, o
grupo de pares e outros membros da comunidade.
O envolvimento dos pais nas acções
de prevenção primária é muito importante pelos seguintes motivos: para deixarem de constituir um mau exemplo
para os filhos; para terem maior autoridade para recomendar aos filhos a
adopção de comportamentos saudáveis, em geral, e de não fumar em particular; para se envolverem mais activamente na prevenção do consumo de
tabaco pelos filhos; para criarem um
ambiente de apoio, passivo e activo, ao
que é desenvolvido na escola.
O envolvimento dos pais na Promoção da Saúde e da Educação para a
Rev Port Clin Geral 2006;22:201-22
215
DOSSIER
TABAGISMO
Saúde poderá ser feito pelo director de
turma ou através da organização de
reuniões, colóquios ou outras actividades, na escola. No que diz respeito ao
hábito de fumar, deve explicar-se aos
pais os malefícios de fumar e encorajá-los a deixar de o fazer para não constituírem um mau exemplo, a terem uma
atitude positiva e não repressiva em relação ao consumo de tabaco pelos filhos, isto é, a apresentar aos seus educandos, os prejuízos do fumo e os benefícios de não fumar, a acompanhar os
filhos mais de perto e a controlar melhor o dinheiro que lhes disponibilizam13. Outra forma de atingir os pais
que por motivos vários não participam
nas acções promovidas pela escola é
através de correspondência.
Por estas vias, consegue-se a indispensável coerência entre o que é ensinado na aula e na família e garante-se
o indispensável contributo da educação familiar13.
Outra via de envolver os pais nos esforços de prevenção do consumo de tabaco é orientá-los no sentido de controlarem o dinheiro que proporcionam aos
filhos e aconselharem os seus educandos a gastar o dinheiro bem gasto. As
escolas podem facilitar esta tarefa se
adoptarem dispositivos de comércio
electrónico, os quais permitiriam aos
pais carregar um cartão do tipo porta-moedas multibanco com determinadas quantias, e dessa forma os filhos só
poderiam gastar o dinheiro em produtos vendidos na escola.
ENVOLVER A COMUNIDADE NAS ACÇÕES DE
PREVENÇÃO DO CONSUMO DE TABACO
Deverão ser realizadas a nível comunitário actividades para promover normas formais e informais de apoio e reforço ao comportamento de não fumar.
Por exemplo, implementação e divulgação de regras anti-tabágicas nos locais
frequentados pelos jovens, publicidade
na comunicação social regional, actividades comunitárias sem-tabaco, come216
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moração do Dia Mundial sem Tabaco e
do Dia do Não fumador.
Reforçar as medidas legislativas para desencorajar o consumo de tabaco e
para ampliar o número de instituições
e espaços públicos livres de fumo de tabaco e promover o seu pleno cumprimento incluindo a de proibir a venda de
tabaco a menores de 18 anos e a de regulamentar a venda de tabaco através
de máquinas automáticas47.
Fazer cumprir a legislação que proíbe a venda de cigarros a menores.
Proibir a venda de cigarros a menores
nos cafés e nas máquinas de venda automática em locais onde os menores tenham acesso (cafés, hipermercados,
parques de estacionamento).
5. Outras iniciativas
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Com o fim de levar a cabo a sua acção
anti-tabágica na escola, com eficácia, é
necessário que o professor se abstenha
de fumar pelo menos durante o horário
escolar, já que o seu exemplo é muito
benéfico para as crianças e os jovens (os
alunos muitas vezes imitam o seu professor) e que esteja devidamente capacitado para implementar a acção educativa44. É preciso que o professor conheça as mensagens e as técnicas de
educação sanitária antitabágica44.
Considera-se indispensável que os
professores possuam uma formação
adequada para executarem uma tarefa
de tão elevada importância e responsabilidade, como é a da Educação para a
Saúde dos alunos25.
Esta formação deve ser dada inicialmente nas universidades e ser continuamente reforçada, durante os programas de formação contínua de professores.
O comité de especialistas da OMS sobre as consequências do tabaco para a
saúde recomenda que as autoridades
sanitárias colaborem com as autoridades docentes na preparação dos planos
de estudos e do material didáctico que
DOSSIER
TABAGISMO
possa ser utilizado nos programas de
educação para a saúde organizados nas
escolas, nos centros de formação de
professores, nas Universidades e outras instituições4.
De opinião semelhante é o Centers for
Disease Control and Prevention (1994)
que, no seu livro Guidelines for School
Health Programs to Preventing Tobacco
Use and Addiction, recomenda a formação de professores como uma importante via para melhorar a implementação
dos programas de prevenção implementados na escola já existentes.
Produção de materiais pedagógicos
acessíveis e adequados
Muitos professores empenhados na
EPS reclamam que não lhes são facultados materiais adequados para a abordagem de determinados temas ou que
os que actualmente existem são muito
complexos e difíceis de implementar.
Para que a EPS possa ser feita de forma massiva na escola é preciso facultar materiais que os professores possam
utilizar de forma fácil (se não estes não
os usam)34. Podemos fazer programas
muito complexos para uma elite de professores mas os restantes não os implementam devido à sua complexidade e a
principal consequência disso é o facto
dos alunos não receberem a necessária
formação nesse tema. É, por isso, necessário que os Ministérios da Saúde e
da Educação produzam materiais educativos como guias didácticos, acetatos,
vídeos, etc. de fácil utilização, para que
os professores já assoberbados com
inúmeras tarefas didáctico/burocráticas se sintam motivados e capacitados
a implementá-los.
Monitorização
Para verificar se as medidas preventivas estão a ser bem sucedidas é necessário introduzir um sistema regular de
recolha de informação de saúde, designadamente a determinação do número
de fumadores por grupo etário e sexo.
O PAPEL DO MÉDICO DE FAMÍLIA NA
PREVENÇÃO DO CONSUMO DE TABACO
A adolescência é o período em que a
maioria dos fumadores começa a fumar
e a família e a escola constituem espaços privilegiados na aprendizagem desse comportamento. A adopção de muitos comportamentos salutogénios ou de
risco resulta de uma aprendizagem feita sobretudo com os pais e os amigos.
No caso do tabagismo, vários estudos
mostram a existência de uma relação
entre o consumo de tabaco dos pais/
/mães e o dos filhos18, sobretudo o consumo de tabaco no domicílio. Podemos
por isso inferir que, se pretendemos
evitar que as crianças sejam contagiadas pela influência daqueles que lhe estão mais próximos (pais, amigos e outros adultos de referência), a prevenção
deve começar no tratamento desses
grupos.
O facto dos médicos de família estarem frequentemente em contacto como
os pais dos alunos e com os próprios
alunos faz com que estes devam ser um
dos seus principais alvos. Os médicos
deverão aproveitar as consultas para
tratar os pais fumadores e para os envolver na prevenção do consumo de tabaco pelos filhos. A mensagem que o
médico deve transmitir aos pais/mães
é a de que não devem fumar; memo que
não consigam parar de momento, jamais o devem fazer em casa pelos prejuízos que causam aos conviventes e às
crianças em particular e que devem ter
uma atitude negativa em relação ao
possível consumo pelos filhos48. Os médicos devem esclarecer os pais do seu
papel de modelagem e para o facto de
fumar no domicílio ser prejudicial aos
conviventes.
É importante também que os acompanhem nas suas actividades e que
controlem o dinheiro que lhes dão.
O médico de família deve fazer esforços para evitar que a futura mãe fume,
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217
DOSSIER
TABAGISMO
com o objectivo de proteger o futuro feto
da agressão do fumo passivo e para não
constituir, após o nascimento, um mau
modelo para o filho. Deve promover o
tratamento da grávida pelas consequências que o fumo materno tem sobre o feto.
Sabemos também que o médico de
família está em contacto directo com os
adolescentes. Por isso mesmo, o Instituto Nacional do Cancro (Americano),
afirma que os médicos podem ter um
papel destacado na prevenção do consumo de tabaco entre os adolescentes.
Durante as consultas com o adolescente, devem questionar o/a jovem se fuma. Se o/a jovem não fumar, devem ter
uma atitude de prevenção primária, ou
seja, elogiar e reforçar a importância de
não virem um dia a ser fumadores. Segundo aquela instituição, o médico deve
aconselhar os adolescentes que não
consumam tabaco, a fim de os preparar para as pressões sociais que eles terão que enfrentar, procedentes dos amigos e outras fontes do ambiente48.
Os alunos consumidores de tabaco
devem ser aconselhados a abandonarem o hábito antes que se tornem dependentes. Este conselho deveria incluir uma discussão dos efeitos imediatos do tabaco, tais como o odor na roupa, o mau hálito, o amarelecimento das
unhas e dos dentes, e a redução da capacidade para o exercício físico48.
Pelo que foi dito podemos concluir
que, de certo modo, a melhor forma de
prevenir a iniciação do tabagismo pelos
jovens é promover o abandono por parte
dos adultos (em particular dos seus pais)
e dos amigos, que podem constituir modelos para os mais novos e reforçar a
ideia que fumar não é um comportamento normal e socialmente aceite49.
Programas de cessação na escola
para alunos, professores e
funcionários
O Centers for Disease Control and Prevention (1994) defende a existência de
218
Rev Port Clin Geral 2006;22:201-22
programas de cessação tabágica nas escolas, destinados ao pessoal docente,
não docente e discente, com vista a uma
efectiva redução da prevalência e, logicamente, a uma diminuição dos modelos para os alunos. Os Centros de Saúde deviam dar prioridade a estes profissionais nas suas consultas de cessação
tabágica.
Uma outra via para os profissionais
de saúde fazerem prevenção do tabagismo é através da sua intervenção em espaço escolar.
O modelo actualmente mais consensual para fazer a promoção e educação
para a saúde em geral e para prevenir
o tabagismo em particular é o das Escolas Promotoras de Saúde (EPS). As
EPS devem ter em conta não só a parte curricular, ou seja, o que é ensinado
nas aulas, mas também criar ambientes de apoio. É actualmente consensual
que as escolas, para seguirem a filosofia e a prática das EPS, devem promover
mudanças nas seguintes dimensões:
Curricular, Psicossocial, Ecológica, Comunitária e Organizacional.
A dimensão curricular refere-se essencialmente às aprendizagens formais, um dos aspectos fulcrais da actividade da Escola. A dimensão ambiental implica a criação e/ou manutenção
das condições de salubridade, segurança e conforto das instalações e na gestão das cantinas e bufetes escolares. A
dimensão comunitária tem em vista a
integração da Escola na Vida da Comunidade e o aproveitamento dos recursos
da comunidade para uma melhoria dos
resultados. Propõe intervenções em dois
sentidos: da Comunidade para Escola
e da Escola para a Comunidade.
A Escola não se deve desligar do meio
onde está inserida, devendo estabelecer
parcerias com as estruturas da Comunidade que possam intervir na promoção da saúde dentro da Escola e na própria Comunidade50,51.
As Escolas e os Centros de Saúde,
através da sua Equipa de Saúde Esco-
DOSSIER
TABAGISMO
lar devem estabelecer parcerias, no sentido de desenvolver um trabalho contínuo, ao longo do ano lectivo, de monitorização, de apoio técnico, de sensibilização e formação de toda a Comunidade Escolar sobre todos os temas
relacionados com a saúde50,51.
CONCLUSÃO
Pelo que foi dito anteriormente podemos
verificar que o tabagismo é um problema grave, em expansão, mas vulnerável. A difusão do tabagismo está relacionada com uma enorme multiplicidade de factores, entres os quais se encontram a demissão do sistema de
ensino e do sistema de saúde. As escolas podem e devem ter um papel importante no controlo da epidemia. Os médicos de família, pelo facto de estarem
em contacto com os membros de toda
a comunidade escolar, particularmente
os pais dos alunos e os próprios alunos,
devem aproveitar as consultas para fazerem prevenção primária e secundária.
Devem também, através das suas equipas de saúde escolar, estabelecer protocolos com as escolas, para promoverem a saúde e a educação para a saúde em geral50.
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José Alberto Gomes Precioso
Instituto de Educação e Psicologia
Universidade do Minho
4700-057 Braga
Tlm: 933 456 833
Telef: 253 604 241
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