METODOLOGIA DE AVALIAÇÃO DO PROBLEMA DE SUPRIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA EM COMUNIDADES NÃO ATENDIDAS: O CASO DA COMUNIDADE DE MARUJÁ Wilson Negrão Macedo (Msc.) *, Luís Guilherme Monteiro Oliveira (Grad.) *, Alaan Ubaiara Brito (Msc.) *, Roberto Zilles (Dr.) * e João Tavares Pinho (Dr.-Ing.) **. * Programa Interunidades de Pós-Graduação em Energia da Universidade de São Paulo Instituto de Eletrotécnica e Energia, Av. prof. Luciano Gualberto 1289, 05508 – 900 SP ** Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energéticas, DEEC/CT/UFPA Caixa postal 8605 – Ag. Núcleo Universitário, CEP 66.075 – 900, Belém, PA E-MAIL: [email protected] FAX.: 5511816287, FONE: (0XX-11)(3091-2657) RESUMO Neste trabalho, apresenta-se uma metodologia de avaliação do problema de suprimento de energia elétrica em comunidades não atendidas, tomando como base a comunidade de Marujá, localizada no município de Cananéia, estado de São Paulo. Essa avaliação se deu através do levantamento da carga instalada na comunidade, onde foram entrevistadas, através de formulários, 37 famílias tradicionais, que correspondem a 90 % do total da comunidade. Desses formulários, várias informações foram extraídas tais como: número de habitantes residentes, edificações, famílias tradicionais, e turistas acolhidos em alta temporada. Além disso, outras informações de suma importância para a estimação da carga da comunidade também foram levantadas, a saber: uso de energia elétrica, equipamentos instalados, uso de outros energéticos e a demanda reprimida. Com base nessas informações, vários cenários energéticos foram criados, com o objetivo de estimar as possíveis curvas de carga para a comunidade de Maruja, as quais são de fundamental importância para qualquer tomada de decisão relacionada à solução do suprimento de energia elétrica, permitindo uma melhor visualização e compreensão do problema de suprimento de energia elétrica em comunidades não atendidas. 1. INTRODUÇÃO A eletrificação em comunidades não atendidas é uma questão essencialmente social, e levar a energia a essas áreas “surge como um desafio, uma conquista de cidadania, dentro de uma sociedade com desigualdades sociais e econômicas” (Serpa, 2000). No entanto, a maioria das tentativas de se alcançar esse desafio tem fracassado pela falta de uma avaliação detalhada do problema existente em cada comunidade em particular. A necessidade de energia elétrica em áreas não atendidas depende fundamentalmente das características do contexto em que ela está inserida tais como: suas atividades econômicas e sócio-culturais, recursos energéticos disponíveis no local, padrões de demanda, tamanho da carga, grau de dispersão da comunidade e condições ambientais. Na atualidade, os programas de eletrificação dessas localidades têm empregado os sistemas conversores das energias renováveis, por serem considerados como uma alternativa tecnicamente viável para a geração elétrica em comunidades não atendidas. Porém, a escolha desses esquemas depende dos fatores mencionados anteriormente, os quais só podem ser identificados por meio de um processo metodológico que envolve pesquisas de campo em cada localidade em particular, tal como está sendo apresentado neste trabalho. Com esse propósito, utilizou-se como base a comunidade de Marujá, a qual utiliza atualmente como alternativas para suprir suas necessidades energéticas basicamente duas fontes de energia: fóssil (diesel, gasolina e gás natural) e solar fotovoltaica. Na presente pesquisa foram consideradas as cargas atendidas por cada um desses sistemas bem como a potência instalada dos grupos geradores e painéis fotovoltaicos. 2. CARACTERÍSTICAS DA COMUNIDADE DE MARUJÁ A comunidade de Marujá é uma vila turística localizada dentro do Parque Estadual da Ilha do Cardoso (PEIC), que pertence ao município de Cananéia. Atualmente, conta com 41 famílias, que têm como principais atividades a pesca e o ecoturismo. De acordo com informações levantadas em campo, vivem na vila aproximadamente 113 moradores tradicionais. Além disso, constatou-se dentro da área abrangida pela pesquisa, que a comunidade de Marujá possui 73 edificações, sendo 45 de moradores tradicionais e 16 pertencentes a veranistas, além de escola, igreja, centro comunitário, centro de visitantes e oito diversos (depósitos, restaurantes, etc.). No que se refere ao abastecimento de água, este é feito por meio de uma represa existente na montanha e uma rede de distribuição que atente praticamente a todos os domicílios. A pressão da rede de distribuição é mantida pela altura manométrica entre a represa e a vila. Esse aspecto se torna bastante favorável, evitando o uso de energia elétrica para esse uso final. 2.1. Atividade sócio-econômica mais importante e aspectos sazonais Os moradores dessa comunidade, que antigamente era conhecida como Praia do Meio, desenvolvem suas atividades relacionadas com a exploração do turismo; muitos deles oferecem alojamento e serviços aos turistas, que aparecem principalmente nos finais de semana, feriados prolongados e nas férias de verão. Paralelamente, realizam também atividades pesqueiras de subsistência. A característica da comunidade, de dispor tanto de praias de mar aberto como de lagunas de água salobra e manguezais onde a pesca é abundante, além das ótimas condições para o turismo ecológico, fez com que os moradores tradicionais da vila tenham assimilado de maneira positiva as influências desse turismo. A comunidade possui um total de 180 quartos, sendo 82 para uso próprio dos moradores e 98 destinados para pousadas. Vale ressaltar que, em média, cada quarto para pousada hospeda quatro pessoas na alta temporada. No que se refere à área de “camping” oferecida, constatou-se um total de 226 vagas para barracas, sendo que cada barraca hospeda em média duas pessoas. De acordo com as informações anteriores, pode se estimar um total de 844 turistas na alta temporada1 se todas as vagas forem preenchidas. 3. LEVANTAMENTO DA CARGA ELÉTRICA O levantamento da carga foi subdividido em duas partes: carga atendida pelo sistema diesel e carga atendida pelo sistema fotovoltaico. Isso foi feito com o intuito de identificar o número de sistemas fotovoltaicos instalados na comunidade e qual a relevância das cargas atendidas por esses sistemas em relação ao grupo gerador. 3.1. Carga atendida por sistemas solares fotovoltaicos A caracterização deste item pode ser visualizada através da tabela 1, onde constam informações relacionadas à origem da instalação (ECOWATT2 ou próprio), número de sistemas, potência instalada, capacidade em baterias utilizadas por esses sistemas, além da carga instalada atendida e o consumo médio. Tabela 1 – Resumo sobre os sistemas fotovoltaicos instalados em Marujá3. Tipo Nº Próprio Ecowatt Total 8 23 31 USO DE ENERGIA ELÉTRICA Solar fotovoltaica Pot. Instalada (Wp) Bateria (Ah) Carga Instalada (W) 2.965 3.220 6.185 3.490 3.595 7.085 1.613 2.041 3.654 Consumo Médio (kWh/mês)4 155,16 170,28 325,44 Os sistemas ECOWATT são todos de 140 Wp5. No que se refere aos sistemas ditos “próprios”, esses correspondem a sistemas que variam de 45 Wp a 900 Wp, sendo os sistemas instalados no posto de saúde, centro comunitário e centro de visitantes os que possuem maior potência instalada (420 Wp, 800 Wp e 900 Wp, respectivamente). A utilização desses sistemas restringe-se aos horários em que os grupos geradores não estão em funcionamento, para aquelas edificações que são atendidas por estes, ou aos horários 1 Veraneio, dezembro, janeiro e fevereiro, e datas particulares, como feriados. Programa comercial iniciado pela antiga Companhia de Energia Elétrica do Estado de São Paulo (CESP) 3 Ressalta-se que a maioria desses sistemas encontra-se instalada inadequadamente e um sistema de 280 Wp próprio se encontra abandonado. 4 Correspondente ao consumo médio da comunidade. 2 noturnos, para aquelas que não são atendidas por grupo gerador, implicando assim, em um número médio de utilização de 3 horas em baixa temporada e 4 horas em alta temporada6. Segundo as informações resumidas na tabela 1, pode-se perceber a subutilização desses sistemas quando se confronta a capacidade instalada em painéis fotovoltaicos e baterias com o consumo médio mensal da comunidade. Isso se deve a uma serie de fatores que vão desde a má instalação dos equipamentos até poucas horas de utilização, devido à presença dos grupos geradores. 3.2. Carga atendida por grupos geradores A tabela 2 (ANEXO) mostra de maneira detalhada, a utilização de grupos geradores na comunidade de Marujá, onde se identificou um total de 15 grupos geradores, sendo esses em quase sua totalidade alimentados por diesel. Estima-se que esses sistemas são responsáveis pelo suprimento de mais de 70% da carga elétrica existente na comunidade. Os valores de consumo médio mensal foram obtidos através do produto entre a potência de cada equipamento pelo número de horas de sua utilização, informadas pelos próprios moradores. Nota-se da tabela 2 (ANEXO), que dos 15 grupos geradores identificados, apenas dois deixam de funcionar no período de baixa temporada. Por outro lado, percebe-se o aumento significativo do consumo de eletricidade (e conseqüentemente de combustível) no período de alta temporada, chegando a ser aproximadamente 63% superior ao período de baixa temporada. É possível calcular, a partir das informações da tabela 2 (ANEXO), um custo médio de aproximadamente R$ 0,857 por kWh gerado por esses sistemas dispersos na comunidade. Porém, ressalta-se que esse valor não considera outros aspectos importantes, tais como 5 6 Watt-pico (Wp) Segundo informações dos moradores. reposição de peças e troca de óleo, o que elevaria ainda mais esse valor. Dentre outros aspectos, o custo da energia elétrica paga atualmente pelos moradores de Marujá, torna-se um atrativo muito importante à aplicação de alternativas que utilizem os recursos locais, tais como o solar e o eólico. As figuras (1a) e (1b) foram obtidas dos levantamentos de cargas das tabelas 1 e 2 e com o auxílio das características de consumo descritas pelos moradores entrevistados, onde se pode perceber uma predominância significativa da utilização dos grupos geradores em relação aos sistemas fotovoltaicos. As curvas dão uma boa idéia de como se encontram as curvas de carga da comunidade hoje, referente às duas fontes (solar e diesel). Diesel Fotovoltaico Carga (kW) Carga (kW) Curva de carga média em baixa temporada 24 22 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 24 22 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 Curva de carga média em alta temporada Diesel Fotovoltaico 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 Horas Horas (a) (b) Figura 1 – Curvas de carga representativas da comunidade de Marujá: (a) período de baixa temporada e (b) período de alta temporada. Constata-se através da observação da tabela 2 (ANEXO) a coerência no perfil do consumo retratado nas figuras (1a) e (1b), no que se refere aos grupos geradores, uma vez que as potências desses grupos são bem maiores que a potência instalada alimentada por eles, o que implica em uma operação ainda mais ineficiente caso parte da carga instalada alimentada por esses sistemas for desconectada. Por essa razão, os moradores não têm a preocupação de desligar as cargas de suas residências, pois o consumo final de combustível permanecerá praticamente o mesmo. Nota-se também que a utilização dos sistemas fotovoltaicos restringese basicamente às horas em que os grupos geradores não estão em funcionamento. 7 Valor obtido com base no preço do combustível pago pelos moradores em junho de 2003. 4. OUTROS ENERGÉTICOS Além do consumo de eletricidade e, conseqüentemente, de combustível (basicamente diesel), outros energéticos, tais como, pilhas secas ou primárias, baterias recarregáveis8, velas e gás liquefeito de petróleo (GLP) também foram levantados. No entanto, somente o último energético possui uma relevância importante em termos de quantidade e custos, uma vez que poucas famílias utilizam pilhas primárias e velas. Em relação às baterias recarregáveis, estas, em quase sua totalidade, estão associadas aos sistemas fotovoltaicos mencionados anteriormente. Por essa razão, este tópico se restringe ao levantamento do consumo e custos referentes apenas do GLP. 4.1. Consumo de GLP - quantificação e custos Observou-se, um consumo significativo desse energético, destinado basicamente à cocção e banho quente. Estima-se também um aumento de quase 60 % desse consumo em épocas de alta temporada, o que não acontece com o consumo referente ao uso de geladeiras, para o qual se estimou em torno de 30 botijões por mês, tanto em baixa quanto em alta temporada. Dessa forma, pode-se dizer que este último uso final (refrigeração), seria de suma importância no projeto de um sistema alternativo para o fornecimento de energia elétrica utilizando os recursos locais. Isso se deve ao fato de que haverá uma substituição de geladeiras a gás por geladeiras elétricas, tal como mostra o item que trata das aspirações futuras da comunidade. Estima-se que essa substituição acarretaria para a comunidade uma redução de custo de aproximadamente 50 % no que se refere a esse uso final (refrigeração), ou seja, em torno de R$ 405 a R$ 5258 mensais. Uma alternativa para reduzir o consumo desse energético seria através de um projeto conjunto utilizando coletores solares planos com 8 Segundo Dell e Rand (2001) as baterias podem ser classificadas como baterias secundárias (carga/descarga) ou acumuladores; este termo está fora de uso na língua inglesa de acordo com os autores, e é mais comum e aceitável referenciar a mesma como baterias recarregáveis. complementação elétrica, uma vez que a utilização de chuveiros elétricos para aquecimento de água para banho poderia tornar o suprimento de energia elétrica por meio de fontes não convencionais inviável, devido ao grande aumento da potência instalada necessária. 5. DEMANDA REPRIMIDA Com o intuito de se estimar a curva de carga da comunidade de Marujá, para uma possível disponibilidade de energia elétrica, levantou-se dentre as famílias entrevistadas quais as suas principais aspirações de consumo. Essas aspirações estão resumidas na tabela 3, onde se nota uma quantidade significativa de utilização de chuveiros elétricos. Entretanto, as aspirações referentes à utilização de chuveiros elétricos não foram consideradas nos cenários a seguir pelos motivos mencionados no item anterior. Tabela 3 – Equipamentos almejados pela comunidade, caso tenham disponibilidade de energia elétrica. ASPIRAÇÕES FUTURAS Equipamento Ventilador Freezer Geladeira Televisores (TV) DVD Ferro Passar Liquidificador SOM Maq. Lavar Computador Chuveiro Microondas Estufa Batedeira Iluminação Pública Nº Famílias 15 5 33 11 1 3 3 4 1 2 12 2 1 1 Nº de pontos de luz 40 Total Potência por equipamento (W) 100 200 200 60 20 1000 300 80 500 180 3500 1200 200 120 Potência por equipamento (W) 40 Potência total por equipamento(kW) 1,5 1 6,6 0,66 0,02 3 0,9 0,32 0,5 0,36 42 2,4 0,2 0,12 Potência total por equipamento(kW) 1,6 61,18 Observa-se da tabela 3 que as aspirações mais significativas no que refere ao consumo de energia elétrica, seja pela quantidade de famílias que as almejam ou pela própria 8 Valores obtidos com base nos preços do gás pago pelos moradores em junho de 2003. necessidade e característica de utilização desses equipamentos, correspondem aos quatro primeiros itens da tabela (Ventiladores, “freezers”, refrigeradores e televisores). Com base principalmente nesses quatro equipamentos e também na carga já existente, alguns cenários para obtenção da curva de carga foram criados e são apresentados a seguir. Para criação dos cenários, foi considerado também um sistema de iluminação pública constituído de 40 pontos de luz, sendo que cada um deles possuí uma potência de 40 Watts, como consta na tabela 3. 6. CURVA DE CARGA O objetivo deste tópico é identificar o comportamento do consumo de energia elétrica através da análise da curva de carga da comunidade de Marujá, estimada com base no levantamento de dados obtidos na pesquisa de campo. Neste tópico são criados dois cenários com base nas informações abordadas anteriormente, com o intuito de se fazer uma previsão da demanda futura da comunidade de Marujá, no que diz respeito ao uso de energia elétrica. CENÁRIO 1 Este cenário foi elaborado com base nas seguintes premissas: 1. A carga instalada é considerada a soma das cargas alimentadas pelos grupos geradores e sistemas fotovoltaicos, além de um quilowatt (kW), a mais, de demanda reprimida e as cargas mencionadas no item anterior; 2. A carga já instalada (carga alimentada pelos grupos geradores + carga alimentada pelos sistemas fotovoltaicos) continuará sendo utilizada, tal como os perfis das figuras 1(a) e 1(b) (no que se refere somente às horas de funcionamento dos grupos geradores), ou seja, no período noturno de 4 a 6 horas por dia, de acordo com a temporada; 3. O consumo diário se deve basicamente à refrigeração, TV, ventiladores e rádios, sendo que os ventiladores são utilizados durante o pico de calor (15:00 às 18:00) e também à noite, em alta temporada; 4. O consumo durante a madrugada corresponde à refrigeração, iluminação pública e 5% da carga instalada da premissa um, correspondente à iluminação residencial residual. CENÁRIO 2 Com relação ao segundo cenário, este foi obtido com base nas considerações do cenário anterior acrescido do item cinco descrito a seguir: 5. O fator de utilização (FU) é de 50 % (baixa temporada) e 70 % (alta temporada) da carga referente à premissa dois. Esses valores foram assumidos com base na educação do uso racional da energia (uso de interruptores, equipamentos mais eficientes, etc.), o que não acontece no momento, na comunidade; As curvas de carga obtidas segundo os dois cenários descritos acima representam o 35 33 31 29 27 25 23 21 19 17 15 13 11 9 7 5 3 1 Curva de carga da Comunidade do Marujá - Obtida segundo o Cenário 1 Baixa temporada Alta temporada Média BT Média AT Potência (kW) Potência (kW) consumo em quilowatt a cada hora e estão ilustradas nas figuras (2a) e (2b)9. 26 24 22 20 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0 Curva de carga da Comunidade do Marujá - Obtida segundo o Cenário 2 Baixa Temporada (FU=0,5) Alta Temporada (FU=0,7) Média BT Média AT 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 Horas Horas (a) (b) Figuras 2 – Curvas de cargas representativas da comunidade de Maruja, obtidas para os períodos de baixa e alta temporada, segundo dois cenários: (a) Cenário 1 e (b) Cenário 2. A partir dos resultados, é possível identificar os horários de maior consumo, tanto durante o dia quanto durante a noite. Esta análise permite estimar o comportamento do 9 Média BT – Demanda média em baixa temporada Média AT – Demanda média em alta temporada consumo, bem como estudar as características do sistema de geração de eletricidade necessário para o atendimento mais adequado da demanda da comunidade de Marujá. Um outro aspecto muito importante associado à demanda estimada para a comunidade em questão, está relacionado ao fator de carga, que é definido como a relação entre a demanda média verificada em um dado intervalo de tempo e a máxima demanda registrada nesse mesmo intervalo. Quanto maior o fator de carga, melhor caracteriza-se a utilização de energia elétrica em um sistema (ver gráfico representativo na figura 3). Figura 3 - Comportamento da demanda diária de uma comunidade hipotética. Neste exemplo, apresenta-se o comportamento da demanda diária de uma comunidade hipotética. A demanda máxima é bem superior à média, resultando em um fator de carga baixo. No caso de uma comunidade isolada, não existe uma demanda a ser contratada; porém, se um sistema alternativo que utilize os recursos locais for projetado para suprir energia elétrica, terá que atender determinado valor de demanda limite, que deve ser, neste caso, próximo de 85. Entretanto, a instalação só fornece essa potência em um pequeno período do dia, o que implicaria no aumento significativo do custo do sistema alternativo a ser implantado. Assim, administrar o fator de carga, ou seja, gerenciar o uso dos equipamentos de forma que a curva de carga torne-se mais plana, permite que o custo de uma solução alternativa seja menor. Para que esta gestão seja possível, a administração dos equipamentos deve ser feita pelos próprios moradores da comunidade que, depois de serem submetidos a um trabalho de conscientização do uso racional da energia elétrica disponível, determinam os equipamentos que podem ser desligados e administrados, assumindo o controle e garantindo uma curva de carga mais plana. Isso se faz necessário quando comparam-se os fatores de carga associados às curvas de carga estimadas segundo os dois cenários aqui propostos. Nota-se que a parte crítica das curvas de carga estimadas, tanto para o Cenário 1 quanto para o Cenário 2, refere-se ao período de pico com uma potência de aproximadamente três vezes maior que a potência média. Logo, isso se torna um aspecto extremamente importante a ser considerado. 8. CONCLUSÕES A metodologia apresentada neste trabalho, destinada à avaliação do problema de suprimento de energia elétrica em comunidades não atendidas, revela-se como uma ferramenta de grande utilidade no processo de planificação de alternativas de atendimento nos programas de universalização. Nota-se a partir das informações obtidas pela metodologia, que há uma série de justificativas para uma solução alternativa utilizando os recursos locais, no que diz respeito ao consumo de eletricidade, tais como: muitos geradores a diesel, alto custo do kWh gerado por esses, possibilidade de gestão na própria comunidade, etc. Com base no perfil das curvas de carga obtidas com a metodologia proposta e nas características locais da comunidade de Marujá, constatou-se que uma possível solução para o problema de suprimento de energia elétrica dessa comunidade seria por meio da implantação de um sistema híbrido solar-eólico-diesel. Contudo, há também a necessidade de se verificar os potenciais energéticos solar e eólico existentes na localidade. Para isso, é necessária a implantação de sistemas que permitam obter essas informações e trabalhá-las de modo a se constatar a viabilidade ou não dessas alternativas, que por sua vez só devem ser implementadas com a plena aceitação dos moradores locais. Com esse propósito, o Laboratório de Sistemas Fotovoltaicos do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (LSF/IEE/USP) em parceria com o Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energéticas da Universidade Federal do Pará (GEDAE/UFPA), vem realizando o levantamento dos potenciais solar e eólico na localidade em questão. 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DELL, R. e RAND, D. Understanding Batteries. CSIRO Energy Technology: Ed. RS.C. Victoria, Austrália. 2001. Cap. 1: Energy Store in Batteries. ISBN 08-5404-605-4. SERPA, P. Eletrificação Fotovoltaica em Comunidades Caiçaras e seus Impactos Socioculturais. São Paulo: Programa Interunidades de Pós-graduação em Energia da Universidade de São Paulo, 2001. 291 p. Tese de Doutorado. ANEXO Tabela 2 – Grupo geradores instalados em Marujá, levantamento de carga e consumos10. USO DE ENERGIA ELÉTRICA Grupo gerador Nº da Motor Gerador Combustível Carga Tempo de Tempo de edificação (HP) (kVA) Utilizado11 Instalada Uso do Uso do (kW) Gerador em Gerador em Baixa Alta Temporada Temporada (h/dia) (h/dia) 1 4 5 8 12 14 15 16 19 21 22 33 38 41 41a12 Soma Média 10 9 13 7,5 18 7,5 7,5 7,5 7,5 12 12 10 9 11 9 10 150,5 10,0 7 10 3,5 5 3,5 4 3 4 7,5 7,5 6 5 6 3 5 80 5,3 D D D D G D D D D D D D D D G 1,062 1,84 1,62 1,125 1,41 0,74 0,5 0,89 1,44 1,48 3,11 3,17 1,9 1,6 0,81 22,70 1,5 5 0 0 2 5 3 6 6 4 3 4 5 3 4 4 54 3,6 7 5 7 6 5 5 6 7 6 6 5 5 7 5 4 86 5,7 Consumo Médio em Baixa Temporada (kWh/mês) 91,8 0,0 0,0 67,5 211,5 66,6 82,8 160,0 173,0 133,2 373,0 475,0 186,0 162,0 97,2 2.279,6 152,0 Consumo Qtd. Total de Qtd. Total de Gasto Gasto Médio em Combustível Combustível Médio Médio Alta em Baixa em Alta Mensal Mensal Temporada Temporada Temporada em Baixa em Alta (kWh/mês) (l/mês) (l/mês) (R$) (R$) 126,0 276,0 340,0 202,5 211,5 111,0 82,8 187,0 260,0 266,4 466,5 475,0 354,0 240,0 97,2 3.695,9 246,4 100 0 0 50 100 65 100 100 120 100 150 120 120 100 40 1.265 84,3 150 225 100 150 100 105 100 100 180 200 200 120 150 150 40 2.070 138,0 150,0 0,0 0,0 75,0 150 97,5 150,0 150,0 180,0 150,0 225,0 180,0 180,0 150,0 60,0 1.897,5 126,5 225,0 337,5 150,0 225,0 150,0 157,5 150,0 150,0 270,0 300,0 300,0 180,0 225,0 225,0 60,0 3.105,00 207,0 A tabela 2 foi obtida com base nas informações que foram fornecidas por cada proprietário do grupo gerador a diesel. Vale ressaltar que nem sempre a carga instalada está sendo utilizada quando o grupo gerador está em funcionamento e o gasto médio mensal refere-se somente ao gasto com combustível. 11 Diesel (D) e gasolina (G). 12 Edificação encontrada próximo à casa 41.