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Confessionalidade
Evolução histórica do conceito de
confessionalidade no metodismo
brasileiro
Elias Boaventura
Doutor/UNICAMP
Professor do Pós-Graduação em
Educação da UNIMEP
R e s u m o
O presente artigo analisa a progressão das instituições metodistas de educação levando-se em consideração a presença
da confessionalidade nas escolas. Nesse sentido, a ação dos missionários e missionárias nas escolas sempre foi a de
respeito às outras religiões, ainda que tivessem a intenção de evangelizar e levar a todos a confissão religiosa.
Unitermos: moral; escolas; Bíblia; confissão; Granbery
Synopsis
This article analyses the progression in the Methodist Educational Institutions, considering the presence of confessionality
in schools. In that sense, the missionaries’ attitude in schools was always respectful of other religions, although it was
their intention to evangelize and bring the religious confession to all.
Terms: morals; schools; Bible; confession; Granbery
Resumen
El presente artículo analiza el progreso de las instituciones metodistas de enseñanza tomando en consideración la
presencia de la confesionalidad en las escuelas. En este sentido, la acción de los misioneros en las escuelas siempre fue
la de respeto a las otras religiones, aunque tengan la intención de evangelizar y llevar a todos a la confesión religiosa.
Términos: moral; escuelas; Biblia; confesión; Granbery
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“Posto que a religião seja livre, e não
nos esfo rçamos para que os alunos
façam parte de nossa Igreja, contudo
desejamos sinceramente que todos
conheçam o Evangelho e sigam a
Christo verdadeiramente.” Regulamento do Instituto Granbery (18971898 págs. 7 e 8)
Procuramos basear nossa busca
na primeira fase, que se estende até
a década de sessenta do século XX,
principalmente em fontes primárias como: Expositor Cristão — órgão
oficial da Igreja Metodista, e Estatutos do Instituto Granbery, sua
mais tradicional instituição de ensino, e no segundo momento, na
análise feita por diversos intelectuais metodistas através da Revista de
Educação do COGEIME e outras
obras ligadas ao tema.
“O Colégio era fundamentalmente
metodista. Jamais obrigava que
católicos ou judeus seguissem seus
preceitos teológicos, sob nenhuma
circunstância. De todas as maneiras,
os católicos teriam que comparecer à
sua igreja, da mesma forma que o
judeu à sua sinagoga.” Silva (1977 —
pág. 09)
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to constitui um esforço metodista
para tornar mais palatável sua mensagem, mas que o conteúdo permanece muito semelhante.
s instituições metodistas de
ensino no Brasil, criadas na
segunda metade do século XIX,
agendaram desde sua origem o tema
“prática educacional e confissão
religiosa”, a ser vivenciado nas
escolas sob orientação da Igreja
Metodista no País.
A questão “confissão religiosa
nas casas de ensino” parecia algo
tranqüilo para os missionários
que, entretanto, não a confundiam
com denominacionalismo e repudiavam encará-la como manifestação de sectarismo religioso, que
condenavam abertamente, como
observa Silva:
Neste trabalho, o que pretendemos é levantar o que os metodistas
tomaram por elementos essenciais
de confissão, que deveriam preservar
nas instituições educacionais, no Brasil, a evolução do conceito confissãoconfessionalismo até sua passagem
ao arranjo lingüístico que se convencionou chamar confessionalidade,
que passou a predominar até os dias
atuais no mundo educacional
metodista.
Trabalhamos com a hipótese de
que a preservação e divulgação da
confissão metodista, como um dos
objetivos das instituições educacionais foi sempre uma constante,
que a evolução histórica do concei-
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Fase inicial
O que confessavam enfaticamente os metodistas no fim do
século XIX e princípio do século XX,
que entendiam ser compromisso
que as instituições de ensino da
Igreja Metodista tinham a obrigação
de abraçar?
Na fase inicial, confissão estava
tomada no sentido de princípios
basilares sobre os quais deveriam se
sustentar a proposta educacional a
ser levada a efeito pelas instituições,
no período, bastante confundidas
com as própria paróquias onde
deveriam se desenvolver as atividades religiosas.
Confissão estava
tomada no sentido de
princípios basilares
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No regulamento do Colégio
Granbery, há uma clara confissão que
se procurou por longos anos
enfatizar:
“A base verdadeira d’essa moral
entendemos ser a Bíblia: portanto
todos os alunos têm de estudá-la.
Pensamos que os princípios d’ella
são os alicerces do progresso da civilização dos mais adiantados povos; e queremos que os alunos
edifiquem os seus caracteres sobre
esta pedra angular. Cumpre que a
escola seja um centro de luz, e uma
fonte de verdade: que a sua influência sobre os alunos e a sociedade seja benéfica e salutar. Faltando isso, já tem perdido a sua raison
d’être.” Regulamento do Instituto
Granbery (1897-1898)
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A ênfase em busca da verdade
encontra-se presente nos documentos oficiais e prospectos das
instituições de modo muito claro.
Deve-se, entretanto, levar em consideração que a única verdade existente é aquela revelada pela Bíblia.
“O collegio christão procura saber a
verdade, e é leal para com a verdade
em todos os logares e todos os
tempos.” Estatutos do Instituto
Granbery (1930)
“Qual é o fim destas escolas? Que atmosfera devem ter? A do livre pensamento da Universidade?[... ] Nossas
escolas, pois, não terão a atmosfera de
livre pensamento, essa pertence a outros estabelecimentos. Não andamos
perguntando: o que é a verdade. Julgamos saber a verdade, em parte ao
menos.” Livro de Atas Diretoria do
Instituto Granbery (1905)
Qual é o fim destas
escolas? Que
atmosfera devem ter?
A do livre
pensamento da
Universidade
Esta mesma ênfase no valor
universal e eterno da Bíblia era
sustentada nas assembléias, publicidades, conferências, grêmios e
todas as demais atividades intelectuais e dentro da visão literalista
e fundamentalista.
“Em relação à Bíblia, o fundamentalismo assume posições radicais:
inerrância absoluta quanto aos manuscritos originais, sendo somente
admissíveis pequenos erros na transmissão dos documentos. Como as palavras da Bíblia são as palavras de
Deus, a alta crítica é inteiramente inadmissível.” Mendonça e Velasques
(1990 pág. 140)
Em relação à Bíblia, o
fundamentalismo
assume posições
radicais
Devemos ressaltar ainda a grande
preocupação de se confessar sempre
o compromisso com a verdade, que
deveria permear a vida daqueles que
passassem pelas instituições.
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Este tipo de verdade é transcendental, definitiva, estática, revelada, só reconhece a verdade do
outro dentro dos arrais cristãos e o
máximo que se pode exigir do fiel é
que seja tolerante com o diferente,
respeite-o sem, entretanto, levar em
consideração sua possível contribuição, ou tentar efetivamente
entendê-lo em suas razões. Neste
sentido, as instituições preferencialmente deveriam trabalhar com
professores e administradores,
ligados ao metodismo, e quando
muito, à fé cristã evangélica.
“Queremos uma Universidade essencialmente cristã, com todos os professores e funcionários evangélicos,
que primem pelo seu viver, de modo
a serem exemplos vivos do poder do
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Para os missionários
educadores, o planeta
e todo universo é um
projeto de Deus
Cabia aos metodistas
contribuir para
resgatar o homem,
apontar-lhe os rumos
e tirá-lo deste estado
de ignorância
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“[... ] o movimento metodista, entre
os absolutos de eternidade (céu e
inferno), mostrava o universo efêmero
das ações humanas como o palco da
luta histórica entre duas entidades
metafísicas, o Bem e o Mal (na
linguagem da fé, Deus e o Diabo). Os
homens tinham de tomar consciência
dessa luta e eram desafiados a se
alistarem ao lado do bem para serem
felizes nesta vida e garantirem a
eternidade no céu.” (Mendonça 1997
pág. 135)
Cabia aos metodistas contribuir
para resgatar o homem, apontar-lhe
os rumos e tirá-lo deste estado de
ignorância tanto pela evangelização
como pela educação formal, como já
o havia feito nos Estados Unidos.
As próprias autoridades religiosas brasileiras se consideram perdidas, como disse a Kidder um clero
da época.
“Explicou-nos que era nulo o
espírito de religião, tanto no clero
como no povo. [... ] Perguntamoslhe que notícia daríamos ao mundo
religioso com respeito ao Brasil. —
Diga que estamos em trevas,
atrasados, quase abandonados.”
Leonard (1981 pág. 32)
“Será felicidade coletiva, toga
honrada pela Fé Cristã; a espada
erguida pela justiça sob os impulsos
do Cristianismo para afastar o mal; a
Ciência iluminada e amparada pela
humildade do Evangelho. O que
importa é haver cristãos, de fato, no
ambiente social.” Expositor Cristão
(8/11/1945).
Para este Brasil em trevas, a Igreja Metodista confessa que tem a resposta, que sua experiência na Inglaterra e nos Estados Unidos lhe
confere esta credencial. Para isso,
adota claramente o método norteamericano no ensino e considera que
Para este Brasil em
trevas, a Igreja
Metodista confessa
que tem a resposta
Estes mesmos missionários —
educadores confessam sua fé em um
planeta criado e governado por Deus,
sistêmico, com destinação certa,
morada provisória do homem e ame-
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açado pelo pecado da espécie humana, por natureza pecadora, e desviada da vontade do Criador, como considera Mendonça:
Evangelho, e mais pelo exemplo que
por qualquer motivo deixem sulcos
indeléveis nas personalidades dos futuros guias dos destinos de nossa Pátria.” Expositor Cristão (18/10/1945)
Possuidores da verdade e amantes da liberdade dentro dos limites
do cristianismo, os missionários
metodistas trabalhavam com a convicção de que eram participantes do
“destino manifesto” (MESQUIDA 1994)
que lhes conferia a condição especial de membro do Novo Israel de Deus,
portador de uma definitiva visão do
mundo.
Para os missionários educadores,
o planeta e todo universo é um projeto de Deus, tudo funciona sistematicamente dentro de uma ordem emanada do Criador, que deve ser
acatada por todos. A esta ordem encontram-se presas as ciências, cujo
fim é contribuir para a preservação
universal dentro da lógica advogada.
A escola deve também se submeter a esta lógica e funcionar como
braço estendido da Igreja no cumprimento de sua missão sob pena de
perder sua razão de ser.
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a educação pode funcionar como
meio auxiliar e confessa:
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“precisamos de uma Universidade
profundamente religiosa, primordialmente aos filhos dos crentes, e não
para os filhos dos graúdos. A Igreja
precisa dar amparo aos filhos da
Igreja.” Expositor Cristão (1945)
“Mesmo quando as velhas formulações, por causa dos novos conhecimentos, se achem inadequadas, continuaremos cientificamente a ‘lançar
emphafese sobre as relações humanas’, guiados pelo ensinamento de
Jesus, segundo o qual cada pessoa tem
um valor infinito, perante um Deus
eterno, justo e misericordioso.” Estatuto do Instituto Granbery (1930)
Dando continuidade à exposição de
motivos, os metodistas esclarecem:
“a verdadeira missão de uma instituição de ensino superior é preparar
personalidades, com elevado propósito moral, com intelectos inspirados
a perceber os grandes valores religiosos : indivíduos que se consagrem a
tornar melhor o mundo, e que seu
objetivo, além disso, é preparar cidadãos que serão competentes na realização do melhor sentimento público,
e que serão sábios na liderança moral e social, e cuja serenidade mental
e espiritual será suficiente para quaisquer emergências.” Expositor Cristão
(1945)
“O metodismo norte-americano que
chegava ao Brasil trazia uma ideologia capaz de mostrar aos brasileiros
que ele desejava partilhar os benefícios da civilização protestante americana com os menos ‘afortunados’.”
Mesquida (1994 pág. 125)
As duas grandes guerras mundiais provocaram deslocamentos e
arranjos econômicos significativos, que por sua vez colocaram em
estado de prontidão a visão estática de mundo até então aceita. A revolução de 1917 na Rússia, no Brasil o crescimento do modernismo
na década de 20, o otimismo pedagógico, o acirrado debate entre católicos liberais, o início da desruralização brasileira na década de
30 e o fim do Estado Novo, na década de 40, são fenômenos reveladores da inquietação que perpassava o País.
Os metodistas, agora portadores
de uma autonomia educativa
consentida, participaram desta inquietação e passaram com mais contundência a defender a idéia de universidade como meio de se
protegerem dos efeitos da onda materialista reinante.
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Turner, dotado de grande realismo quanto ao papel de uma universidade, esclarece que o currículo de
nossa universidade não pode ser diferente, mas a confissão poderia ser
proporcionada através de outros expedientes.
Os metodistas, agora
portadores de uma
autonomia educativa
consentida,
participaram desta
inquietação
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“A premissa básica nesse proceder
era claramente que o fim primordial da atividade a que chamamos
educação é o homem equipado moralmente para enfrentar e interpretar a vida e os seus problemas do
ponto de vista Evangélico. Em outras
palavras, uma universidade não
poderá possuir e, portanto, não poderá transmitir aos alunos, o ideal
do caráter cristão, e a atitude cristã
para com a vida e com os seus se-
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Confessavam os
intelectuais
metodistas que a
educação formal era
extremamente
importante
“Confessar” passou a
ter novo sentido que
o termo “confissão”
Segunda fase
Esta certeza quanto à obrigação
de uma escola ligada à Igreja ser
confessional nos termos em que
vinha sendo posta começou a ser
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questionada, em função de uma
onda de acontecimentos que
atingiu muitas partes do mundo.
Entre estes acontecimentos,
mencionamos a Guerra do Vietnã,
a questão estudantil financeira que
abalou Paris em 1968, o avanço da
Teologia da Libertação, toda uma
condição de Pós-Modernidade que
colocava em questão valores até
então tomados por definitivos.
A América Latina assiste ao avanço de governos militares autoritários, em alguns casos sanguinários, o que levou Mortiner Arias a
afirmar que a América Latina sorriu
na década de 1950 e chorou na década de 1960.
No Brasil, este avanço da brutalidade contaminou as escolas através
de perseguições a professores e alunos, de imposição de posturas
tecnicistas e de adesão aos Estados
Unidos através do acordo MECUSAID.
O metodismo brasileiro também
colocado no “olho do furacão” foi
fortemente impactado, pela postura de sua juventude, sensibilizada
com as mensagens de Richard
Shaull e D. Hélder Câmara, o que
acabou por resultar no fechamento
da Faculdade de Teologia em Rudge
Ramos e na debandada de grande
número de jovens.
A partir daí “confessar” passou
a ter novo sentido que o termo
“confissão” era pesado demais
comportar, razão por que os pensadores metodistas optaram pelo
conceito de confessionalidade bem
mais flexível e mais amplo, capaz
de comportar o novo quadro social. A Igreja Metodista nas décadas
seguintes fez sua autocrítica e declarou enfaticamente:
melhantes, — no sentido evangélico da palavra “cristão”, — a não ser
que a orientação da universidade
seja evangélica e o corpo docente
seja também evangélico.” Expositor
Cristão (1946 — setembro)
O autor, no mesmo artigo, denuncia o humanismo materialista das
universidades estatais, chama a atenção para os efeitos catastróficos e
sentencia “queremos uma universidade rigorosamente cristã.”
Em síntese, confessavam os intelectuais metodistas que a educação formal era extremamente importante, que a igreja metodista
precisava de uma universidade
cristã-evangélica compromissada
com a fé cristã e que levasse claramente a todos os seus alunos esta
confissão religiosa.
Este modelo de Universidade chegou a ser vivenciado no Granbery até
o princípio do século XX, mas não
vingou por questões internas, por
pressão da Junta de Missões dos Estados Unidos e por tantos outros
motivos como já mencionamos em
outro trabalho nosso Boaventura ,
(1995).
Na década de 1930 fechou no
Granbery a última faculdade deste
período, mas não desfaleceu, como
já tivemos a oportunidade de ver, e a
busca de uma universidade confesadamente cristã-metodista, continuou pelo menos até o fim da década de 1950.
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riência em instituições metodistas de
ensino no Cone Sul e confessadamente socialista, entende que a
confissão essencial é a mesma de
Pedro: Você é o Cristo — e declara:
“No caso específico das nossas escolas, à medida que a sociedade
brasileira foi se desenvolvendo,
elas perderam suas características
inovadoras e passaram a ser
reprodutoras da educação oficial.
Esvaziaram- se perdendo sua percepção de que o Evangelho tem
também dimensões políticas e sociais, esquecendo, assim, sua herança metodista. Em razão, suas limitações históricas e culturais à ação
educativa metodista tornou-se prejudicada em dois pontos importantes: primeiro, porque não se identificou plenamente com a cultura brasileira; segundo, por ter apresentado pouca preocupação em descobrir
soluções em profundidade para os
problemas dos pobres e desvalidos,
que são a maioria do nosso povo.”
Vida e Missão
(pág. 35 — 1982)
“Eu acho que essa é a nossa confissão fundamental: se posicionar como instituição no meio de qualquer
sociedade, como instituição cristã,
é lembrar uma confissão apostólica que nós sentimos ainda como
nossa.”
Disse mais:
“Na busca de vivenciar esta confissão
o metodismo brasileiro adotou o
‘American way of life’ como sinal de
uma cultura superior e melhor do que
aquelas existentes no Brasil onde se
apresentou como cristianismo flexível
e aberto.”
Não há nenhuma negação da fé
metodista, mas não se trata mais de
se enfatizar princípios, e sim de se
buscar uma identidade dentro deste
mergulho mais tenso na realidade
social. Trata-se de um olhar para fora,
de onde virá a inspiração para a prática educativa e o acerto de novos
conceitos capazes de tornar mais
palatável a missão da Igreja.
Passemos agora às principais
contribuições dadas pelas autoridades e intelectuais metodistas ao
tema, através de exaustiva revisão
bibliográfica dentro dos limites
propostos.
Júlio de Santa Ana (1992), teólogo metodista, membro do Conselho
Mundial de Igrejas à época, professor
do IMS (Instituto Metodista de Ensino
Superior São Bernardo do Campo)
em Rudge Ramos, com larga expe-
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Santa Ana se nega a ver as instituições de ensino como agências
de evangelização e considera as
pastorais universitárias simples
“decoração piedosa” e que apesar
de ter que responder às exigências do mercado, o projeto de educação metodista em qualquer nível
busca ser convergente, de inclusão, e essencialmente tem como
“ objetivo final a produção de sentido para a vida”.
Santa Ana entende que esta leitura interessa a qualquer tipo de
educação libertadora por significar
uma experiência de amor com raiz
na ternura da graça, elementos essenciais no desenvolvimento da capacidade de sonhar para além do
mercado, e termina afirmando: “Nós
temos que colocar sementes da graça
neste mundo desgraçado”.
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Em seu entender, esta confessionalidade exige “educação de qualidade”, entendida exatamente como
aquela que contribui para a semeadura de sinais da graça neste mundo
desgraçado.
Segundo ele, todos podem adotar estes valores, e lutar institucionalmente a favor deles. Isto não implica a negação do atendimento às
exigências do mercado, muito menos a negligência em relação aos
avanços científicos e tecnológicos,
mas na capacidade de dar sentido
mais amplo a eles.
Bispo Paulo Ayres (1992), metodista, compromissado com as questões sociais e zeloso das doutrinas
da Igreja Metodista, se caracteriza
pelo seu estilo contundente e por
suas afirmações definitivas, aliás,
características do episcopado. Em
seu trabalho faz uma leve retomada
histórica em que procura deixar clara a seu leitor a tentativa permanente da Igreja, esta entendida apenas
como uma instituição do cristianismo, reformado ou não, de controle
da escola, particularmente da universidade. São suas palavras textuais (p.
50-51) :
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Após este rápido intróito, o autor
passa a tecer considerações sobre a
relação Igreja Metodista e escolas no
século XIX, mais especificamente no
Brasil com um tipo de metodismo
que aqui se ministrava. Era um projeto modernizador, que via na educação formal o instrumento apropriado para se alcançar o objetivo
desejado. (p. 52)
Os missionários entendiam a educação como um instrumento tão válido e eficiente como a pregação religiosa para a salvação do povo
brasileiro das trevas da ignorância e
superstição. Sua intenção era “através da educação modernizar a sociedade brasileira”.
Os missionários
entendiam a
educação como um
instrumento tão
válido e eficiente
como a pregação
religiosa
“Hoje percebemos que tal projeto
eivado de bons propósitos cristãos era
reacionário e arrogante, pois não
partia dos interesses de um projeto
enraizado e proposto para responder
às necessidades da realidade do povo
brasileiro”
Em seguida, Paulo Ayres passa a
tecer críticas ao relacionamento Igreja Metodista-Escola no Brasil e deixa
claros alguns pontos importantes:
- a Igreja não conhece o mundo
da escola e o desrespeita;
- não reconhece que a escola é um
bem da sociedade civil e deseja
convertê-la em simples instrumento
de sua ação;
- tem tido um comportamento
autoritário nas tentativas de solução
das crises e por isto perdeu o
respeito das escolas;
- as Igrejas tendem a reduzir a liberdade de produção e reprodução
de conhecimentos.
Ora o autor se refere exclusivamente à Igreja Metodista no Bra-
“quem mantinha o controle da escola
eram os próprios religiosos, pois
basicamente se destinava à reprodução do próprio clero, responsável
pela formulação intelectual do conhecimento religioso”
“os sucessores dos grandes reformadores vão inclusive tentar restabelecer o controle eclesiástico rigoA Igreja não conhece
roso na criação das escolas e das
o mundo da escola e o
universidades nos principados onde
desrespeita
prevalecia o protestantismo”
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“Digo que a expressão escola
confessional é uma contradição de
termos exatamente porque a Escola
como parte importante da sociedade
civil tem fundamentos próprios, que
não se confundem com os da Igreja”
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“A maioria das escolas metodistas
não pode ser para a classe pobre, tem
que ser para a classe média, ou classe
média alta. Se quiser ficar pensando
que vai fazer escola para pobre, para
quem está em situação difícil, nós não
vamos conseguir oferecer uma boa
educação .” (p. 62)
A maioria das escolas
metodistas não pode
ser para a classe
pobre,
Após esta tomada de posição,
vem a crítica às escolas confessionais: “podemos, infelizmente,
constatar que um número grande das
escolas confessionais oferece uma
educação muito desqualificada
aliada aos interesses ecumênicos
retrógrados e autoritários” (p. 65)
Prossegue o autor seu raciocínio
na seguinte direção:
- as escolas confessionais têm
sido meras reprodutoras do sistema;
- a Igreja Metodista reconhece que
a universidade tem fundamento
próprio;
- as escolas confessionais metodistas necessariamente têm que
oferecer superávit;
- elas não devem se alinhar ao
lado das escolas privadas e nem das
estatais “Não devemos, por outro lado,
de forma alguma, nos aliar ao lado das
escolas particulares: por favor, não
entrem nesse trem das escolas privadas; nós não podemos entrar; as escolas privadas no Brasil em sua grande
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maioria são um crime contra a nação
brasileira, contra a sociedade brasileira, contra o povo brasileiro, e nós temos de ter a coragem de denunciar o
escândalo da escola privada no Brasil” (p. 61).
Ao encerrar sua exposição, Paulo Ayres conclui melancolicamente e com grande realismo, que
escandalizou e escandaliza aqueles
que acreditam na possibilidade de
uma ação transformadora e reparadora das instituições de ensino
metodistas na direção de um mundo melhor.
sil, já no século XX, ora generaliza
suas afirmações para todas as Igrejas relacionadas com problema da
educação formal. É no contexto destas críticas que o autor coloca a questão da confessionalidade de modo
bastante enfático
“Uma contradição de termos numa
ótica democrática, pois se é escola
não é confessional, e se é confessional
não é escola”
○
Que conclusões, a título de síntese, se pode tirar deste pronunciamento? Historicamente, o relacionamento Igreja/Escola manteve-se
tenso em função da permanente intenção de controle e instrumentação
das instituições por parte da Igreja.
No caso dos metodistas, eles entendiam a educação formal como instrumento útil à Igreja; não souberam
respeitar a escola em sua vida própria e a trataram de modo autoritário nas diversas crises.
No que se refere à confessionalidade da escola, pareceu-me
taxativo: “Se é escola não é confessional
e se é confessional não é escola”.
Reafirma sua oposição tanto à
escola estatal como à privada e reivindica a necessidade da e scola pública, único caminho, segundo ele,
As escolas
confessionais têm
sido meras
reprodutoras do
sistema
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para a garantia de qualidade, que
no caso metodista só se alcança
enquanto escolas exclusivamente
voltadas aos ricos.
Paulo Lockman: (1992), bispo
metodista no Rio de Janeiro, em
sua contribuição ao tema não
acrescenta muito, uma vez que tentou trabalhar com a situação localizada do Instituto Bennet e a partir de experiências pouco refletidas
e de significação limitada. Sua fala
tem, todavia, o mérito de trabalhar
fatos concretos bem ilustrativos de
uma condição pouco confortável
da Igreja Metodista, para ele responsável em última instância pela
fragilidade dos poucos sinais de
confessionalidade.
De sua fala podem ser extraídas
as seguintes observações: toma a
confessionalidade como “a identidade
do metodismo na ação educacional
dentro das nossas instituições de
ensino”. (pág. 64) Esta confessionalidade deveria ser vista nos diversos
níveis da administração, onde encontra vários obstáculos:
1.Conselhos
Diretores
sem
condições técnicas
2. Direções gerais conflitantes, sem
a visão de um ministério educacional
3. Desencontro com as pastorais
4. Fraco desempenho de funcionários metodistas
5. Ausência de controle no uso do
espaço físico
Sua contribuição atribui à Igreja de
modo geral, o fracasso por não se obter
uma real confessionalidade e conclui:
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porque nós mesmos não respeitamos os
princípios que estabelecemos.” (p. 76)
Rui JOSGRILBERG (1992), reitor
da Faculdade de Teologia da Igreja
Metodista (na época), doutor em
Filosofia, caracteriza-se pelo rigor
conceitual com que elabora o texto
e pela profundidade teórica com
que discute a questão. Deixa o leitor bem informado sobre a natureza da fé, segundo sua percepção, do
que entende por Teologia e Filosofia Cristã e do papel que tem a razão em relação à fé e conclui sua
introdução com Wesley: “Wesley
não dissolve a liberdade e a razão
na fé, mas vê a razão e a liberdade
como necessárias à fé, ainda que a
iniciativa e a primazia pertençam à
fé e a palavra de Deus em seus conteúdos próprios.” (p. 82)
Ao entrar na questão da
confessionalidade nas escolas
metodistas oferece algumas pistas
interessantes:
- “A confessionalidade não se
sobrepõe ao saber em suas respectivas áreas que tem seus métodos
e conteúdos de ciências específicas”
(p. 83)
- A escola não pode ser tratada
como uma Igreja local
- É estreita a senda da vivência da
confessionalidade “ entre o desrespeito à pessoa e ao processo educativo
de um lado e o perigo de não assumir
a confessionalidade de outro”
A confessionalidade
não se sobrepõe ao
saber em suas
respectivas áreas que
tem seus métodos e
conteúdos de ciências
específicas
Ely Éser B. CÉSAR, teólogo
metodista, ex-professor da Faculdade
de Teologia, Vice-Reitor Acadêmico da
Universidade Metodista de Piracicaba
— UNIMEP, é portador de larga experiência acadêmica em instituições
metodistas. Sua fala vem sempre
“Temos que ser os primeiros a garantir
a respeitabilidade desses órgãos, desses
funcionamentos, porque, do contrário, a
nossa própria autoridade é questionada;
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acompanhada de muito respeito e
credibilidade.
Ao colocar a questão da confessionalidade faz sínteses realmente
provocativas. Reconhece como princípio fundamental que a escola é uma
instituição civil e secular. Rechaça
qualquer possibilidade de “censura
religiosa na produção do saber na
Universidade”.
A docência nas instituições
“não pode ser prerrogativa dos
metodistas” e o compromisso da
docência requer liberdade que ultrapassa os limites das prerrogativas confessionais. Nas escolas
metodistas há que se preservar “a
liberdade para a produção do saber”. O papel da escola é dado pela
própria sociedade e a Igreja precisa estar atenta a esta realidade. Insistente na visão de que não se garante a confessionalidade só com
metodistas, afirma categoricamente: “não é necessário que nossos docentes sejam metodistas. É necessário, sim, que tenhamos radical
compromisso com a vida concreta
do povo brasileiro”. É nestes limites que admite a possibilidade da
confessionalidade, através de orientações e de se caminhar para a
construção da cidadania.
Em outro trabalho (1997), intitulado Educação e Confessionalidade,
Barreto César oferece rica contribuição a quem desejar examinar o tema
confessionalidade nas instituições
metodistas de ensino. Afirma que se
a escola não existe para promover a
evangelização, ela deve contribuir
para o Reino de Deus, concluindo que
a confissão nas instituições metodistas é a confissão nas possibilidades do reino de Deus. Para ele, a instituição confessional necessita
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A docência nas
instituições “não
pode ser prerrogativa
dos metodistas”
A missão da escola
confessional não
coincide com a
missão da
congregação que se
funda na fé
A instituição
confessional necessita
cultivar a reflexão e a
elaboração teológica
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cultivar a reflexão e a elaboração teológica e relembra que a crise da
docência, que se vive hoje nas instituições, está relacionada à ausência
de uma articulação de uma Teologia
Fundamental de natureza wesleyana.
Relembra, entretanto, que o projeto
educacional é secular, escapa à visão
teológica, deve ser amplamente
participativo, e sem manipulações e
sintetiza:
“A própria natureza desta escola
confessional exige processo que
garanta a mais ampla participação de
seus agentes conforme os diferentes
níveis de sua responsabilidade no
interior do projeto.”
O articulista volta ao tema no encontro da Associação Latino-america de Instituições Metodistas de
Ensino — ALAIME (1999) com o tema
“Projeto educacional percebido por
uma perspectiva crítico profética”.
Afirma que “a missão da escola
confessional não coincide com a missão da congregação que se funda na
fé”, porque, segundo ele “a escola
mesmo confessional, está vinculada
ao sistema produtivo e de mercado
e, conseqüentemente, aos interesses
das elites.” A educação parece perder a função de busca de sentido da
vida para atender ao mercado
globalizado.
A escola confessional metodista,
desafiada a incorporar-se ao projeto
missionário da Igreja, mas pela sua
própria natureza de escola, não pode
escapar às demandas complexas do
projeto educacional da sociedade,
porque seus “cânones” são os da legislação pública e não os da Igreja. A
escola se sentirá órfã se a Igreja não
respeitar sua especificidade. Há que
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se reconhecer sua contribuição de
instituição secular a serviço de uma
dada sociedade, o que pode facilmente levá-la à dependência de grupos que funcionam com objetivos
puramente mercadológicos. A natureza confessional da escola obriga,
por outro lado, a superar administrativamente condutas opressivas lesivas ao corpo de servidores.
Corre-se o perigo de se desenvolver uma teologia missionária cínica, se não produzir atos concretos
para a superação da pobreza resultante do processo histórico. É neste
engajamento que se pode aferir a fidelidade do processo em defesa da
causa do pobre:
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“Que nós, nessa busca da nossa
confessionalidade, da caracterização
da nossa confessionalidade, saibamos
ser equilibrados e que Deus nos faça
compreender a nossa responsabilidade, como metodistas em
relação às nossas crenças.”
“A escola metodista latino-americana
não merecerá sobreviver enquanto
instituição Wesleyana se não for
capaz de estruturar espaços pedagógicos para o exercício humano da
solidariedade radical para com o
poder concreto e na direção da massa
de excluídos.”
Elza Maria Rolim Zenker (1996),
pastora metodista no sul do Brasil, então coordenadora da Pastoral Instituto Porto Alegre / Instituto Metodista de Educação e
Cultura — IPA/IMEC, reivindica que
a educação confessional tem que
estar engajada na construção do
conhecimento, “considerar a vida
como bem maior”. Reconhece que
hoje se vive uma situação iníqua
em termos de justiça social e qualidade de vida, mas a prática educacional, ao contrário, reforça a situação de injustiça vigente no país
e conclui categoricamente: “Se a
escola não for agência de cooperação, de mudança, inócua se torna a
sua tarefa” .
Outras contribuições, menos
elaboradas, aprecem ainda e merecem menção, embora os autores
tivessem como objetivo fundamental
categorias diferentes.
É o caso de Jorge Mesquita (1992),
que relembra:
Revista de Educação do Cogeime
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Ulisses Panisset (1992), leigo
metodista notável, diretor de escolas metodista por longos anos,
relembra que o Aurélio não registra o termo “confessionalidade” e
enfatiza que a confessionalidade,
como presente na tradição e documentos metodistas, consiste em um
olhar sempre voltado para o outro,
compromisso com o bem-estar social, adoção do sacerdócio universal dos crentes e exorta:
Corre-se o perigo de
se desenvolver uma
teologia missionária
cínica
“os missionários deixaram como
marcas da confessionalidade: riqueza de currículos com disciplinas
complementares, assembléias religiosas, estímulo à presença dos alunos em escolas dominicais, diretores missionários, respeito ao calendário e lideranças metodistas do
passado.”
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Se a escola não for
agência de
cooperação, de
mudança, inócua se
torna a sua tarefa
Jorge Hamilton (1996), pastor
metodista, coordenador, à época, da
Pastoral Universitária da UNIMEP,
relaciona confessionalidade, direito à
cidadania e classe média. Ressalta a
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influência do mercado e o fato de que
o conceito de cidadania, da classe
média, está relacionada ao consumo
e sintetiza:
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meio usado pela igreja cristã para
transmitir seus princípios e admite
que a universidade geralmente serve à manutenção do sistema dominante, mas pode também servir à
transformação social.
Em seu esforço na busca de um
conceito de confessionalidade, afirma
que ela é inerente ao cristianismo:
“A maioria que freqüenta nossas escolas é da classe média, nas instituições se valoriza a diferença entre escola e igreja, a prática educacional
confessional metodista exige a defesa da cidadania e uma sensibilidade
para lutar pelo direito de todos.”
“não se atemoriza diante da ciência e da tecnologia; respeita o campo próprio de cada ciência expressa-se com firmeza, transparência e
tolerância. Parte essencial do cristão, seu propósito é a construção do
reino de Deus, cujas marcas são:
amor, justiça, liberdade, serviço e
paz [...] não é proselitista nem sectária. Ecumênica, aceita o
pluralismo das idéias.”
Peri Mesquida (1996), estudioso
da educação metodista no Brasil, se
preocupa com a etimologia das palavras educação, cidadania e confessionalidade. Esta, ele relaciona com o
ato de declarar e sustentar alguma
coisa com fervor. E conclui: “Na medida em que a religião é um fenômeno
social, um grupo confessional é aquele
grupo que possui fé e práticas comuns
que refletem e projetam uma unidade.”
Mesquida faz questionamentos
intrigantes, colocando em dúvida
se os metodistas no Brasil possuem hoje uma unidade, se são um
sujeito coletivo ou mesmo uma
confissão.
Queremos relembrar ainda contribuições de metodistas leigos fora
do âmbito do COGEIME e a visão de
confessionalidade de intelectuais não
ligados a fé metodista. No âmbito do
laicato metodista merece menção
Gustavo ALVIM (1993) em sua didática obra Autonomia Universitária e
Confessionalidade . Alvim, militante
metodista há longos anos, vice-reitor
administrativo da UNIMEP, enfoca a
confessionalidade metodista dentro
dos seguintes aspectos:
A Igreja Católica vê na universidade “um centro elaborador de cultura automaticamente humana” , um
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Considerações provisórias
A Igreja Católica vê na
universidade “um
centro elaborador de
cultura
automaticamente
humana
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Propusemo-nos examinar o pensamento metodista sobre a questão
da confessionalidade nas instituições de ensino da Igreja exclusivamente no Brasil. Não foi nossa intenção desprezar as contribuições
anteriores, como seria as dos missionários no fim do século XIX e nas
primeiras décadas do século XX.
Nem desconhecemos o valor das
contribuições ao tema, dados por
instituições metodistas da América
Latina e de outros continentes,
igualmente enriquecedoras.
Reconhecemos ainda representar grande lacuna a ausência da visão de outras Igrejas, tanto evangélicas como a Igreja Católica,
envolvidas com o problema da
educação e às voltas com a questão da confessionalidade , embora
de modo diferente daquele que
vivenciamos.
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Nosso propósito foi tentar dar
conta daquilo que pensam os metodistas de nossos dias, clérigos e leigos,
ligados à educação formal e militantes
na esfera do COGEIME, quer como
militantes nas instituições de ensino,
quer como participantes do poder da
Igreja Metodista ou simplesmente
conferencistas ou articulistas da
“Revista de Educação do COGEIME”.
Para obter nosso objetivo, esforçamo-nos em respeitar a voz dos
sujeitos envolvidos, ouvi-los desde o
lugar de onde falaram, razão da revisão bibliográfica, trabalhada de
modo a oferecer ao leitor um quadro
fiel de tudo o que, nos limites propostos, se disse sobre o tema. Com base
no que foi escrito, usamos uma síntese, que considera o pensamento
aproximado do metodismo brasileiro, uma vez que os articulistas, pela
prática e até pelo esforço teórico, legitimam-se como autênticos interpretes da voz metodista do País.
Que conclusões podemos extrair
de tudo o que disseram os intelectuais
metodistas?
Em primeiro lugar, que a
confessionalidade nas instituições
metodistas de ensino é hoje uma questão posta para a Igreja Metodista, que
a incomoda, a problematiza e a desafia em larga escala, afetando de modo
muito amplo seu cotidiano missionário. A maioria dos articulistas afirma:
as instituições metodistas de ensino
têm que estar compromissada com a
confessionalidade.
Pode-se concluir também da
fala dos expositores que a dificuldade para o exercício de uma
confessionalidade nas instituições
é mais obstaculizada pelo inadequado modo como a encara a Igreja do que pela resistência real por
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Que conclusões
podemos extrair de
tudo o que disseram
os intelectuais
metodistas?
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parte das instituições. A confessionalidade metodista se encontra
teorizada, fortemente desejada,
mas em função das contribuições,
das ambigüidades existentes na
prática, postas pelo próprio mercado, o esforço teórico, nas palavras de Barreto César, soa como
uma “ teoria teológica cínica”. Em
resumo, o problema da confessionalidade nas instituições de ensino encontra mais obstáculos na
própria ação da Igreja do que nas
instituições de ensino.
A maioria dos articulistas possui
em comum vários pontos dados por
aceitos e imprescindíveis à confessionalidade metodista:
- educação deve ser de qualidade,
aqui entendida como capacidade de
dar sentido à vida;
- esta busca de sentido não desobriga as instituições de responderem
às exigências do mercado;
- a escola deve ser respeitada
como uma agência prestadora de
serviços da sociedade onde se
encontra inserida;
- escola não é paróquia nem
agência de evangelização: busca seu
sentido na própria sociedade;
- no interior de uma escola metodista, confessionalidade não se sobrepõe ao saber: a ciência deve ser
livre e não pode haver obstáculo a
ela, independente de seus fins e posturas que representa.
Não obstante freqüentada pela elite, a escola metodista não pode negligenciar seu compromisso em defesa do
pobre e sua oposição às injustiças do
sistema. Para todos os expositores, a
confissão “Tu és o Cristo” e a construção do Reino de Deus representam a
essência da confessionalidade. A
docência deve ser respeitada e exercida
Educação deve ser de
qualidade, aqui
entendida como
capacidade de dar
sentido à vida
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sem constrangimento e a falta de um
projeto teológico por parte da Igreja é a
maior ameaça que pesa no problema
confessionalidade e docência.
Por longos anos, trabalhando
com o conceito de confissão e
confessionalismo como sinônimo
de confessionalidade, temos sustentado a impossibilidade de uma
universidade ser confessional e autônoma.
Que compromissos seriam propostos a uma universidade confessional e
autônoma?
- O reconhecimento de seu
compromisso com a sociedade da
qual é aparelho;
- respeito com a pluralidade de
pensamento, e com a autonomia da
ciência;
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- dever de atender às necessidades impostas pelo mercado e pelo
sistema através de sua clientela;
- ação em busca do sentido da
vida e do direito do pobre a uma vida
digna, à paz e à justiça
- direito de confessar seu compromisso com a construção do Reino de
Deus, caracterizado pela vivência de
justiça e de paz para todos.
Nesta segunda fase, não se negou o
compromisso com a confessionalidade
nas instituições metodistas de ensino,
mas quebrou seu caráter absoluto e se
procurou deixar claro que o principal
compromisso de uma escola é com o
saber, tarefa que ela deve cumprir com
autonomia, dentro das exigências que
a sociedade lhe fizer, sem qualquer outro tipo de constrangimento.
Nesta segunda fase,
não se negou o
compromisso com a
confessionalidade
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