NOTA DE IMPRENSA Relatório SaeR de Junho Economia portuguesa pode melhorar mas persistem deficiências estruturais • A criação de valor empresarial em Portugal concentrou-se em actividades de tipo especulativo… • Tanto a baixa taxa de crescimento como o persistente défice da Balança Comercial não são mais do que o efeito presente dos condicionalismos do passado e não terá qualquer efeito útil estabelecer mecanismos de correcção na base de novos pressupostos que não se articulam com o que foi a evolução destes indicadores no passado; • Não é de afastar a hipótese da economia portuguesa vir a melhorar mas estes sinais animadores, não alteram as deficiências estruturais da economia portuguesa e estas perspectivas só são válidas enquanto perdurar o actual clima de euforia e confiança económica internacional e europeia; • A médio/longo prazo as perspectivas políticas, económicas e sociais portuguesas «poderão alterar-se drasticamente caso a prospecção de hidrocarbonetos na costa portuguesa venha a produzir resultados significativos… • As projecções da Primavera da Comissão Europeia poderão mesmo pecar por defeito, caso não sobrevenham grandes sobressaltos económico-financeiros ou geopolíticos; • De um modo que só na aparência é paradoxal, é no Oriente que hoje se encontra o Ocidente do passado; • Mau seria se a economia portuguesa pensasse que pode considerar-se alterada ao ponto de prescindir de sectores de produção e comercialização “tradicionais”; 1 Lisboa, Julho de 2007 – O Relatório SaeR respeitante a Junho deste ano salienta três temas que se articulam entre si na sua estrutura conceptual subjacente: o primeiro trata da turbulência geopolítica, das mudanças operadas no cenário político francês e da continuada estagnação portuguesa; o segundo, abarca a evolução recente das economias internacional e portuguesa; o último debruça-se sobre o caso exemplar do Grupo Tata, quer na perspectiva da economia indiana quer no contexto global. O primeiro tema é dissecado na habitual secção “O que Fica” sob o título “As tendências longas e a eficácia das decisões”. Depois de sublinhar que o cepticismo do economista John Maynard Keynes tinha razão de ser quanto à possibilidade de se estabelecer uma teoria previsional dos ciclos económicos, atendendo a que «os pontos de inflexão nas linhas de tendência das economias não derivam de, nem dependem de, varáveis estritamente económicas», refere que «os pontos de viragem da expansão para a recessão, ou dos estados de rendimentos crescentes para os estados de rendimentos decrescentes, são os resultados complexos das articulações da economia com a política e com a sociedade, com as dimensões adicionais do sistema cultural e do sistema das relações internacionais». Assim, como «cada conjuntura é apenas um estado temporário, uma ordem provisória, que se insere nas sequências longas que seguem a sequência de flutuação da expansão para a recessão (…) as acções de curto prazo serão eficazes e virtuosas ou inúteis e perversas conforme o modo como se articulam com o que é a evolução das tendências longas». Neste quadro de análise, o autor aborda a actual turbulência geopolítica aflorando a natureza da crise europeia, a posição norteamericana, a mudança francesa e, por último, a estagnação portuguesa. «O silêncio da Europa tem a sua origem num vazio da Europa» já que «o que apareceu como o seu sucesso na década de 1990 era, afinal, a abertura de uma crise mais complexa do que a das décadas de 1930 e 1940». «Para os Estados Unidos, a surpresa estratégica vem do facto de a Europa não contribuir em nada para os seus objectivos, deixando-os isolados no mundo». Se a vitória de Sarkozy encerra um ciclo na política francesa, «os ciclos que prosseguem nas outras dimensões, a económica e a social, não são favoráveis (como foram no pós-guerra) para que um novo ciclo político se possa consolidar sem dificuldades». Finalmente, o autor detém-se sobre as raízes da estagnação portuguesa, identificando dois momentos críticos na formação do padrão de modernização da sociedade portuguesa. O primeiro desses momentos críticos foi «a interrupção, na década de 1970, da estratégia do Atlântico, com os processos das descolonizações e das nacionalizações, que deixaram as empresas portuguesas sem 2 condições para estabelecerem especializações sectoriais e funcionais na articulação dos espaços económicos do Atlântico Sul com o espaço económico europeu». Esta linha foi substituída por uma estratégia política distributiva, de diferenciação interna (em função dos diferenciais de capacidade reivindicativa de cada grupo social) e sem conseguir promover comportamentos sociais competitivos…». O segundo momento crítico foi a integração europeia a partir de 1986, com acesso a importantes fundos comunitários, e complementado, a partir de 1989, com a estratégia de privatizações. Este segundo momento crítico, que deveria ter alterado o padrão de modernização e estabelecido uma nova estrutura empresarial com capacidade de inovação sectorial e estratégica, traduziu-se, afinal, num resultado final que «na perspectiva de 2007, não corresponde nem ao que era esperado, nem ao que seria necessário para consolidar a modernização da economia portuguesa». A verdade, segundo o autor, é que «a criação de valor empresarial se concentrou em actividades de tipo especulativo…». Assim, e em conclusão, «tanto a baixa taxa de crescimento como o persistente défice da Balança Comercial não são mais do que o efeito presente dos condicionalismos do passado e não terá qualquer efeito útil estabelecer mecanismos de correcção na base de novos pressupostos (como o crescimento da produtividade ou uma evolução demográfica favorável aos equilíbrios financeiros nas políticas sociais) que não se articulam com o que foi a evolução destes indicadores no passado». A estagnação em Portugal não é estruturalmente diferente da europeia, mas os constrangimentos do passado são mais fortes em Portugal, porque os dois momentos críticos da sua evolução tiveram resoluções inadequadas, sem que os discursos oficiais o reconheçam, mas também porque o menor grau de desenvolvimento da sua economia reduz a liberdade de decisão dos agentes económicos e políticos». Nas habituais secções “Conjuntura internacional” e “Conjuntura Portuguesa” o Vol. VII de Junho de 2007 do Relatório SaeR dirigido pelo Prof. Ernâni Lopes, destaca-se que os indicadores económicos evoluem em marcha favorável, superando mesmo as previsões, apresentando o ano de 2007 um ritmo de crescimento económico internacional na ordem dos 5%. Em particular no que se refere à Europa, as últimas projecções da Comissão (as da Primavera), reflectindo o clima de forte crescimento económico mundial e de elevada confiança, poderão mesmo pecar por defeito, «caso não sobrevenham grandes sobressaltos económico-financeiros ou geopolíticos. Haverá assim que atender, quando se perspectiva o rumo da economia internacional, à vulnerabilidade persistente a choques sistémicos e, mais em profundidade, assumir uma atitude de inevitável prudência face às questões geopolíticas e geoeconómicas. 3 Também a economia portuguesa «revela que está a sair do estado puramente anémico em que se encontrava e a ganhar algum dinamismo, reflectindo como que sem grande desfasamento temporal o comportamento da zona euro (…), assim como, em geral, o dinamismo das outras grandes áreas económicas internacionais», sendo «previsível que os sinais de reanimação se mantenham caso a zona euro tenha condições externas de prosseguir a evolução que vem revelando». No texto dedicado à “Conjuntura Portuguesa” refere-se que tudo aponta «para que a economia portuguesa esteja a ganhar algum dinamismo graças à procura externa», devendo a procura interna demorar algum tempo a ganhar esse dinamismo», devido, como é sabido, aos condicionalismos da consolidação orçamental, à subida tas taxas de juro na zona euro, ao elevado endividamento dos agentes e ao nível de desemprego significativo. Mas se tudo correr favoravelmente no domínio da conjuntura internacional «não é de afastar a hipótese da economia portuguesa vir a melhorar». Todavia, estes sinais animadores, não alteram as deficiências estruturais da economia portuguesa e estas perspectivas só são válidas enquanto perdurar o actual clima «de euforia e confiança económica internacional e europeia», pois, caso este seja «interrompido por um período sustentado, a economia portuguesa sofreria de imediato e naturalmente com tal interrupção». A médio/longo prazo as perspectivas políticas, económicas e sociais portuguesas «poderão alterar-se drasticamente caso a prospecção de hidrocarbonetos na costa portuguesa venha a produzir resultados significativos…» A secção “Estratégia de Empresa”, dedicado ao caso “Tata: um grupo económico da Índia», preenche o terceiro grande tema desta edição do Relatório SaeR. O grupo Tata, com origem numa estrutura familiar indiana, tem hoje 29 empresas cotadas em Bolsa e é comandado por uma holding com cerca de 30 pessoas, «o que só é possível porque cada segmento sectorial tem autonomia na gestão das suas actividades e das suas estratégias de internacionalização». O texto sublinha que o sucesso da economia indiana não é independente da dinâmica destes grupos empresariais» e que «este grupo económico, em especial, mostra como a articulação dos ciclos – económicos, políticos e sociais – tem um papel central na explicação dos resultados obtidos. Evidencia ainda como as multinacionais das economias emergentes entram em concorrência agressiva com as oriundas dos tradicionais pólos dominantes. De um modo que só na aparência é paradoxal, é no Oriente que hoje se encontra o Ocidente do passado». Na secção “Mercado Monetário e Financeiro” destaca-se que a aceleração da actividade económica em consequência das reformas operadas em vários países europeus, nomeadamente na Alemanha, a solidez das empresas, a reestruturação sectorial e a relação do 4 diferencial de taxas de juro, tanto de curto como de longo prazo, favorecem a apreciação do euro face ao dólar. Há a juntar a tudo isto um acentuado declínio da hegemonia do dólar enquanto moeda preferencial para aplicação de activos. Apesar da tendência favorável o euro, nos tempos mais próximos, poderá enfrentar dificuldades em ultrapassar os máximos históricos recentemente atingidos. A necessidade de se avançar no campo das energias renováveis – a UE é líder mundial da eólica – é uma das prioridades estabelecidas pela Presidência Portuguesa da UE, refere-se na secção “União Europeia”. Por esta razão são de acompanhar desenvolvimentos no modelo de incentivos e no enquadramento financeiro que, na prática, as novas QREN vão permitir em termos de elegibilidade de projectos, aponta-se no texto. O “Tema de Fundo” desta edição do Relatório incide sobre “O investimento estrangeiro em Portugal: a orgânica e execução”. Após considerar que «o IDE em Portugal reflecte uma redefinição do perfil de internacionalização económica e da própria potencialidade de desenvolvimento tecnológico», o autor do texto salienta que «mau seria se a economia portuguesa pensasse que pode considerar-se alterada ao ponto de prescindir de sectores de produção e comercialização “tradicionais”, usando o termo no limite da própria modernização tecnológica de cada um deles». O artigo enumera um conjunto de domínios com «potencial estratégico» para o desenvolvimento da economia (Turismo, Ambiente, Cidades e Desenvolvimento, Serviços de Valor Acrescentado e actividades ligadas ao hypercluster da Economia do Mar), detendo-se sobre as potencialidades da fileira florestal, da agro-indústria (especificamente os investimentos no Alentejo) e acentuando que Portugal tem «revelado vantagens acrescidas» no que refere ao sistema de meios e serviços de pagamentos. «Finalmente, refere o autor do texto, o Turismo é um caso paradigmático» adiantando que «num cruzamento do turismo enquanto tal e dos cuidados de saúde numa base de excelência, temos um mercado por desenvolver nas áreas de natureza, saúde e bem-estar». A África continua à margem dos grandes fluxos da economia internacional, reconhece-se no artigo da secção “Internacional” intitulado “O Investimento Estrangeiro e o Comércio Externo em África”. Apesar disso, no seu conjunto, o continente beneficiou de um aumento de IDE de 31 mil milhões de dólares em 2005 para 38 mil milhões em 2006, em consequência do aumento dos preços das matérias-primas e dos produtos-base 5 A secção dedicada a “Espanha” refere que a economia do país vizinho continua sólida e parece ajustar-se gradualmente ao endurecimento das condições monetárias: a despesa cresceu equilibradamente, verificou-se alguma desaceleração nos preços da habitação e na aceleração do investimento em bens de equipamento. O consumo manter-se-á apoiado no crescimento do emprego e dos salários, sendo a construção e os serviços os maiores geradores de emprego. Quanto ao Brasil, objecto de uma secção habitual no Relatório, por mais que subam as importações, o elevado crescimento do PIB face às demais economias permite saldos comerciais positivos. 6