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Maio · 2015
C Á E N TRE N ÓS
A dicotomia canavieira
Nos canaviais
brasileiros ainda
há práticas do
Brasil-Colônia
D
icotomia é a divisão de um elemento em duas partes, em geral
contrárias, como a noite e o dia, o
bem e o mal, o preto e o branco, o céu e
o inferno...
Seguindo esta linha, podemos dizer
que a dicotomia canavieira está entre o
conservadorismo e o vanguardismo.
Conservadorismo porque demora
para aderir a novas práticas, postergou a
mecanização dos canaviais, reluta a adotar
novas variedades de cana e há 500 anos
realiza o plantio por meio do esparrame
de cana-tolete.
Vanguardismo porque é pioneiro
ao criar o maior programa de combustível renovável do mundo, o ProÁlcool; no
desenvolvimento de tecnologias verdes;
pioneiro ao transformar e comercializar
biomassa em energia.
Qual caminho o setor irá seguir daqui para frente?
O vanguardismo do setor aconteceu
em épocas de crise. Para muitos, são essas
fases de extra dificuldade o melhor combustível para fervilhar a criatividade. Se as-
sim for, inovação não vai faltar e o setor
estará aberto para adotá-las. Que venha o
novo!
O setor também é pioneiro
Luciana Paiva
[email protected]
Clivonei Roberto
[email protected]
3
ÍN D I C E
Capa
Vai mudar!
Holofote
Tendências
-O risco de florescimento
dos canaviais no Centro-Sul
e a aplicação de maturadores
-Mapeamento e controle
de processos: uma
necessidade das usinas
Herbishow
Insectshow
-Canavial com e sem palha.
O que muda na flora daninha?
-Expertise em pragas de solo
Mecanização
Tecnologia
Industrial
-Agrishow encolheu,
mas não em
lançamentos
-A indústria verde
da cana luta para
sair do vermelho
Economia
-Com crise financeira,
empresas investem em
turnaround dos negócios
Pesquisa & Desenvolvimento
-A cana e a química verde
Gestão de Pessoas
-Mantendo a
chama acesa
Editores:
Luciana Paiva
[email protected]
Clivonei Roberto
[email protected]
Redação:
Adair Sobczack
Jornalista
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Leonardo Ruiz
Jornalista
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Marketing
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Comercial
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Editor gráfico
Thiago Gallo
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Florescimento causa
perda de 35% a 40%
U
vereiro. Uma aplicação do inibidor de florescimento não é suficiente para segurar
m dos pontos que ajuda a migrar a
produtividade e o ATR ao longo da
a inibição. Tem que fazer duas aplicações.
Rogério Augusto Soares, gerente de
Planejamento Agrícola da Bunge
safra é a isoporização no florescimento.
Trabalhei por 17 anos em Goiás. Nesse período, percebi que se havia um ano que
era muito seco, a safra seguinte começava com ATR 10 kg, 15 kg abaixo do normal. Também percebemos isso nas uni-
Atenção ao manejo
E
stamos bastante atentos ao florescimento para tentar manejar de acordo
com aparecimento da indução de flor. So-
dades da Bunge. Em região que chove
bre maturador, raramente aplicamos, mas
menos, o ATR começa baixo na safra se-
neste ano usamos um pouco para tentar
guinte. Na Bunge, nos preparamos para o
segurar em algumas condições específicas
florescimento em 2015. Em algumas áre-
canaviais que tinham um pouco mais de
as não teve jeito de aplicar inibidor nes-
tonelagem. O objetivo é melhorar o ma-
te ano porque a cana estava muito baixa
nejo, visando talvez uma resposta melhor
no período indutivo. É inclusive impor-
do canavial.
tante ficarmos alertas para o planejamento com estas áreas que vierem florescer. E
é impressionante o efeito do florescimento, principalmente em regiões mais secas.
Chega-se a uma perda de 35% a 40% da
produtividade agrícola, o
que depende da variedade e da intensidade de seca que houver.
Paulo Rodrigues, produtor
de cana em Guariba, SP
Como curiosidade, em
Tocantins, onde a empresa tem unidade,
o período de
indução floral
começa
em
dezembro e
vai até fe-
Corte de custos
obriga assumir risco
U
ma prioridade nossa tem sido redução de custos. O financeiro sempre
7
H O LOFOTE
nos diz que não podemos passar de tal
nocana, a intenção era aplicar em mil hec-
patamar com investimento. Mas onde po-
tares, mas aplicamos em 377 hectares. No
demos cortar? Cortamos naquilo que se
segundo planejamento, vamos voar mais
acha que pode não acontecer. A nossa re-
400 hectares.
Paulo Roberto Artioli, diretor da
Tecnocana, em Lençóis Paulista, SP
gião, pelas condições de clima, nos facultou em não focarmos em nenhuma aplicação para florescimento. No ano passado
focamos no chochamento, especialmente
da 7515. Mas neste ano não. É fato que estamos correndo este risco para, pelo menos, reduzir um pouco nossos custos. Mas
tem questões que se está divulgando mui-
Planejamento varietal é
a principal prevenção
O
período indutivo da região de Ribeirão Preto, de acordo com a latitude,
to em cima da hora, o que é um problema
dura mais ou menos 20, 25 dias. É nessa
no caso de se querer tomar medidas con-
hora que temos de aplicar o regulador de
tra o florescimento. Se não fizer a aplica-
florescimento para impedir que a gema
ção na hora certa e pontual, não adianta
apical se diferencie e altere a fisiologia da
fazer mais. Agora estamos na torcida, tor-
planta no período indutivo. Por isso, agir
cendo para que o florescimento não acon-
no momento certo é maneira que temos
teça. Seria mais um fator para prejudicar a
de impedir que tenha seu pendão floral.
produção. Quanto ao uso de maturador,
Só vamos saber que existe probabilida-
tivemos dificuldade tremenda neste ano
de maior de florescer após o período in-
para usá-lo. Primei-
dutivo. Após esse período não adianta
ro porque a legis-
mais aplicar o regulador de florescimen-
lação está pegan-
to. Mas isso depende muito do ano. Nes-
do muito no pé.
te ano especificamente o período indutivo
No planejamen-
nosso começou em 20 de fevereiro e foi
to da Tec-
até cerca de 25 de março. Em 20 de fevereiro nosso canavial estava muito pequeno relativamente. E sabemos que o regulador de florescimento dá uma interrompida
no crescimento, pelo menos por um período. Essa briga fisiológica entre crescimento, florescimento e amadurecimento é
natural. Não tem como fugir dela. A grande prevenção, o grande remédio com re-
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lação ao florescimento e ao chochamento nasce lá no planejamento de plantio.
É quando podemos ganhar dinheiro sem
gastar. O controle varietal é a base para
perder menos. Neste ano fizemos uma
parte de regulador de crescimento, numa
época correta. Deve ter bom efeito e agora estamos num esforço grande no planejamento de safra para colher antecipadamente as variedades que certamente vão
florescer. Com estas ações, o florescimento não deve ter impacto forte na safra da
São Martinho. Temos variedades floríferas
que normalmente são colhidas até o iní-
lítica da empresa, o que favoreceu come-
cio de julho.”
çarmos um pouco mais tarde as unidades.
Tivemos um período maior de crescimento. No ano passado começamos mais cedo.
Quanto a inibidor, também temos essa política de aplicação, mas somente fazemos
nas áreas que colhemos no meio da safra.
Mas neste ano não estamos achando que
vai ser ano com potencial de florescimento. Esta é a posição da Guarani.
Jaime Stupiello, diretor
agrícola da Açúcar Guarani
Mario Gandini, o Marinho, diretor
agroindustrial da Usina São Martinho
Ano sem potencial
de florescimento
C
De acordo com
a probabilidade
N
a Raízen trabalhamos com a pro-
babilidade de florescimento. Nas variedades
floríferas, que maneja-
om relação a maturador, fizemos a
mos no meio e no
aplicação normalmente, como é a po-
final de safra,
9
H O LOFOTE
fazemos a aplicação, mas dentro da pro-
cana crua, o que vai impactar diretamente
babilidade. Se tem probabilidade alta faze-
na qualidade.
Edson Girondi, gerente de operações
agrícolas da Usina Alto Alegre
mos sim a aplicação porque faz diferença.
Fernando Lima, diretor de
produção agrícola da Raízen
Alta incidência
Floresce pouco
no Paraná
S
N
a região em que estamos inseridos a
incidência de florescimento é muito
alta. E observamos que quando não floresce,
e em São Paulo a probabilidade de flo-
com a seca prolongada tem efeito de cho-
rescimento é de 70%, 80%, no Paraná é
chamento forte. Sobre variedades floríferas,
de 20%, 30%. Ou seja, dificilmente floresce
temos muito a RB867515, com a qual conse-
no estado. Mas é planejado o uso do ini-
guimos observar resposta boa ao inibidor de
bidor de florescimento. No passado, usou-
florescimento. É prática regular, temos por
se muito inibidor quando era plantada a
hábito pegar tudo que vai ser colhido de 15
variedade SP701143, que também flores-
de julho para frente e trabalhar forte com ini-
cia muito. Mas, de maneira geral, as usinas
bidor de florescimento, uma vez que temos
deixaram de plantá-la. Mas em contrapar-
essa regularidade alta. Sobre maturador, te-
tida chove-se no estado o ano todo. Matu-
mos uma questão fisiológica: a cana fisio-
radores aplicamos sim, quando iniciamos
logicamente tem pureza muito baixa, refle-
a safra. É imprescindível. Sem ele, nossa
xo do estresse do ano anterior. Temos uma
qualidade vai pra baixo. Quanto à previsão
demora para subir a curva de maturação e
de perda de qualidade da cana no Paraná
o maturador nos ajuda a fazer esse traba-
em 2015, é que até no ano passado po-
lho. Protelamos um pouco o início da aplica-
dia-se queimar até 100% do canavial nas
ção, fazemos a primeira quinzena maturada,
usinas que preferiam colher dessa manei-
e depois vai até o final de julho com prati-
ra. Exceto nas áreas circunvizinhas às ci-
camente 80%, 90% da cana com matura-
dades. Já neste ano, 20% das áreas de co-
dor. Temos essa política apesar de estarmos
lheita do Paraná terão de ser colhidas com
numa região seca aparentemente. Nosso início de safra realmente tem essa característica
de começar normalmente com 100, 105 kg.
Fica num patamar abaixo da nossa expectativa caso não se use maturador.”
Agnaldo Rigolin, gerente de
desenvolvimento agrícola
da BP Biocombustíveis
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Maio · 2015
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DIVULGAÇÃO DATAGRO
H E R B I SHOW
Presença da palha impactou flora daninha dos
canaviais, aumentando a importância das folhas
largas e diminuindo as infestações das folhas estreitas
Canavial com e sem palha.
O que muda na flora daninha?
MECANIZAÇÃO DA COLHEITA IMPLICOU EM MUDANÇAS NAS
ESPÉCIES DE PLANTAS DANINHAS ENCONTRADAS NOS CANAVIAIS.
COMO SERÁ ESSA MUDANÇA QUANDO O RECOLHIMENTO
PARCIAL DA PALHA FOR INTENSIFICADO NAS USINAS?
Leonardo Ruiz
A
rias,
té o início dos anos 1990, a flo-
sas espécies se beneficiavam das carac-
ra daninha dos canaviais era com-
terísticas encontradas no solo daquele
posta, basicamente, por Brachiá-
tempo, época em que a palha da cana-de
Capim-Colchão,
Capim-Colonião,
-açúcar era queimada.
Pé-de-Galinha, Tiririca, Grama-Seda, Ca-
Com a mudança do sistema de co-
pim-Carrapicho, Picão-Preto e Caruru. Es-
lheita para máquinas e cana crua, é corre-
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Maio · 2015
to afirmar que o ambiente dos canaviais
quais são as plantas daninhas que vão es-
foi modificado. Agora, um colchão de pa-
tar presentes ou não nesse canavial”.
lha permanece sobre o solo (variando de
alterando o microclima da área, o que re-
Cenário mecanizado
com palha
sulta em mudanças de umidade, tempera-
Azania afirma que qualquer altera-
5 a 15 ton/ha, dependendo da variedade),
tura e amplitude térmica.
ção a essas características beneficiam algumas espécies e prejudicam outras. “A
mico de Campinas (IAC), Carlos Alberto
presença da palha ocasionou uma dimiARQUIVO CANAONLINE
O pesquisador do Instituto Agronô-
Capim-Carrapicho era um
problema até o início da
mecanização da colheita
Mathias Azania, explica que qualquer mu-
nuição da variação da temperatura do solo
dança na forma de manejo, seja de colhei-
durante as 12 horas do dia. Além disso, a
ta, espaçamento ou densidade, implica,
quantidade de água disponível e a absor-
posteriormente, na alteração da flora da-
ção de luz aumentaram significativamen-
ninha. “Isso ocorre porque, quando se tem
te. Isso fez com que tivéssemos um predo-
uma cultura instalada sobre um solo, se
mínio de espécies que nem imaginávamos
tem algumas condições específicas de luz,
que um dia teríamos que lidar, como as
umidade e temperatura, sendo que são es-
Cordas-de-Viola”.
ses fatores que, em conjunto, determinam
O pesquisador do IAC conta que,
13
CORTESIA UNICA/NIELS ANDREAS
H E R B I SHOW
Com a colheita mecanizada, um colchão de palha permanece sobre o solo
ditava-se que teríamos muita incidência
canização da colheita da cana, surgiram
de plantas arbóreas. Porém, destas, ape-
muitas dúvidas em relação ao impac-
nas a Mamona é encontrada nos canaviais
to que isso teria na flora daninha. “Acre-
até hoje, em função das sementes serem
DIVULGAÇÃO USINAS ITAMARATI
quando começou a ser discutida a me-
Carlos Azania: “a mudança de manejo fez com que houvesse predomínio de
espécies que ninguém imaginaria um dia enfrentar, como as Cordas-de-Viola”
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Maio · 2015
MICROCLIMA DOS CANAVIAIS
Fonte: Divulgação IAC/Carlos Alberto Mathias Azania
maiores. Era comum, também, afirmar que
jo tenha interferido e reduzido fortemen-
apenas a presença da palha seria suficien-
te a germinação e a infestação de plan-
te para inibir as ervas daninhas, o que não
tas daninhas com sementes pequenas
ocorreu”.
com baixa reserva nutricional, as chama-
Além das Cordas-de-Violas e Mamo-
das gramíneas ou folhas estreitas, ainda é
nas, outras espécies passaram a dominar
possível encontrar algumas dessas espé-
nos canaviais com a chegada das máqui-
cies no campo devido à degradação e dis-
nas, principalmente as folhas largas, como
tribuição irregular da palhada na lavoura.
as Merremias, Mucunas, Buvas, Buchas e
É o caso do Capim-Brachiária, Capim-Col-
Melões-de-São-Caetano.
chão, Capim-Colonião, Capim-Camalote,
Capim-de-Rodes e o Sorgo.
Presença da palha impulsionou
algumas espécies de
folhas largas, como as
Merremias, Mamonas,
Mucunas, Buvas, Buchas e
Melões-de-São-Caetano
15
SAULO HARUO OHARA
Ainda que essa mudança de mane-
H E R B I SHOW
DIVULGAÇÃO USINAS ITAMARATI
Rafael Charlier:
“Com a colheita de
cana crua, houve
uma diminuição
da importância de
Capim-Colchão, Péde-Galinha e Caruru
nos canaviais da
Usinas Itamarati”
Mudança da comunidade
de plantas daninhas
possuem baixo teor de reserva nutricional
Antes da chegada das colhedoras
buíram para a mudança da comunidade
de cana aos canaviais da Usinas Itamara-
de plantas daninhas dos nossos canaviais”.
ti, com sede em Nova Olímpia, sudoeste
E a mudança foi grande. Com a co-
do Mato Grosso, os principais problemas
lheita de cana crua, houve uma diminui-
eram as altas infestações de Capim-Co-
ção da importância de Capim-Colchão,
lonião, Capim-Brachiária, Capim-Colchão,
Capim-Colonião, Capim-Marmelada, Ca-
Capim-Carrapicho, Trapoeraba e Caruru.
pim-Carrapicho, Pé-de-Galinha e Caruru,
Agora, com a intensificação da mecaniza-
e um aumento da preocupação com infes-
ção, os obstáculos são outros.
tações de Leiteiro, Cordas-de-Viola, Mer-
Desde a safra 2011/12, a Usinas Itamarati colhe 100% de sua cana de for-
nas sementes. “Todos esses fatores contri-
remias, Capim-Branco, Capim-Camalote e,
mais recentemente, Mucuna e Bucha.
ma mecanizada. O engenheiro agrônomo
Com essa variação, algumas estra-
e analista de processos agrícolas da em-
tégias tiveram que ser adotadas. O enge-
presa, Rafael Charlier, conta que essa mu-
nheiro conta que foram empregadas téc-
dança de manejo promoveu uma altera-
nicas de aplicação sequencial, visando
ção no microclima do solo, resultando em
estender o período de controle em áreas
uma diminuição na variação de tempera-
com altas infestações de Bucha e Mucuna,
tura da superfície do mesmo, na manuten-
e de PPI (Pré-Plantio Incorporado), para
ção da umidade e na alteração na quanti-
manejo e redução do banco de sementes.
dade de luz que chega à sua superfície. Ele
como uma barreira física para a emergên-
Cenário:
mecanizado sem palha
cia das plantas daninhas, causando pro-
Numa colheita mecanizada, os col-
blemas, principalmente, para espécies que
mos (caule) é que são processados para
afirma que a camada de palha funciona
16
Maio · 2015
produção de açúcar e etanol, sendo que
de energia elétrica ou como matéria-pri-
suas sobras viram o bagaço. Já as folhas
ma para a produção do etanol de segun-
(verdes ou secas) e o “ponteiro” (ponta
da geração.
da cana), que formam a palha, permane-
Porém, ao retirar essa parcela de pa-
cem no campo. Estima-se que a cana-de
lha, o produtor está criando um terceiro
-açúcar produza, em média, 140 kg de pa-
cenário no canavial: colheita mecanizada,
lha em base seca para cada tonelada de
mas sem a presença total da palha. O am-
cana. Esta biomassa, quando enfardada,
biente, portanto, é afetado e passa a pos-
tem umidade de 15% e um poder calorífi-
suir condições de luz, umidade e tempera-
co 70% superior ao do bagaço.
tura intermediárias em relação aos outros
Com tantos benefícios, é cada vez
DIVULGAÇÃO CTC
mais comum encontrar fornecedores e
dois sistemas (queima e colheita mecanizada com a presença total da palha).
usinas recolhendo parcialmente essa pa-
Para o pesquisador do IAC, Carlos
lha, com intuito de trazer receita adicional
Azania, esse novo cenário irá afetar a flo-
para a empresa, seja por meio da geração
ra daninha, porém, não tanto como o vis-
Ao retirar uma parcela de palha
do canavial, o produtor acaba
criando um terceiro cenário no
campo: colheita mecanizada, mas
sem a presença total da palha
17
H E R B I SHOW
to quando as máquinas chegaram aos ca-
sempre priorizou o sistema de aplicação
naviais. “Dificilmente teremos uma espécie
de pré-emergência, já que, em virtude da
que vai dominar as áreas de cana-de-açú-
queima ou do aleiramento em áreas de
car, como aconteceu com as Cordas-de-
muda, a brotação ocorria com mais faci-
Viola. O que vai mudar é a predominância
lidade. Era comum, ainda, o uso de pin-
das espécies já existentes. Eu acredito que
gentes em aplicações de pós-emergência.
teremos um retorno e equilíbrio maior en-
Com a mecanização da colheita, o contro-
tre folhas estreitas e folhas largas, especial-
le em si não sofreu alterações, o que mu-
mente falando das folhas largas de hábito
dou foram as moléculas utilizadas, uma
trepador. As plantas que hoje são suprimi-
vez que a camada de palha interfere na di-
das retornarão aos poucos com estágios de
nâmica dos herbicidas.
igualdade para com as Cordas-de-Viola”.
Para o especialista em tecnologia de
aplicação e diretor da GMC Alvo Consultoria, Glauberto Moderno Costa, a pre-
Até o início dos processos meca-
sença de palha não impacta na eficiên-
nizáveis, o controle de plantas daninhas
cia do produto, mas desde que a seleção
ARQUIVO CANAONLINE
Controlando
Mucuna é uma das plantas daninhas que foram impulsionadas pela presença da palha
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Maio · 2015
DIVULGAÇÃO USINAS ITAMARATI
A presença de palha não impacta na eficiência do herbicida, mas desde
que a seleção das moléculas seja apta para esta modalidade de aplicação
das moléculas seja apta para esta moda-
ponsável pelo transporte do herbicida até
lidade de aplicação. “Em alguns casos, é
o solo. “O produtor deve estar orientado
necessário o aleiramento da palha, visan-
para saber quais as moléculas existentes
do a aceleração da brotação (regiões mais
no mercado brasileiro que atenderão sua
frias), e isto permite a opção de seleção
lavoura, levando sempre em conta o perí-
de moléculas que não são recomendadas
odo de aplicação (chuvoso, seco ou semi-
sobre a palha.”
seco)”, afirma Moderno.
Ele lembra, ainda, que a eficiência do
Agora, quando o produtor decidir
transporte de herbicidas da palha para o
iniciar o recolhimento parcial da palha, é
solo depende de vários fatores, como as
importante que a aplicação seja feita, no
características físico-químicas inerentes a
máximo, de 10 a 15 dias após o corte da
cada produto, a capacidade da palha de
soqueira. “Nesse cenário, as mesmas mo-
cobrir o solo e de reter o ingrediente ativo
léculas utilizadas sobre a palha também
e o período em que a área permanece sem
servirão em áreas com pouca ou nenhuma
chuva após a aplicação, já que ela será res-
cobertura”, finaliza o especialista.
19
TE N D ÊN CIAS
Mapeamento e controle de processos:
uma necessidade das usinas
José Rezende1 e Luiz Barbosa2
A
complexidade de uma usina de
principalmente, riscos operacionais, finan-
cana pode ser medida pelo nú-
ceiros, ambientais e de imagem. Esses ele-
mero de processos e riscos para
mentos podem gerar desde ineficiência e
sua operação. Em média, as usinas pos-
retrabalho até fraudes com impacto finan-
suem 16 macroprocessos, os quais es-
ceiro e exposição indevida do nome da
tão permeados por diversos riscos, sendo,
usina na mídia.
RISCOS IDENTIFICADOS POR TIPO DE PROCESSOS DAS USINAS
Fonte: PwC Brasil
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Segundo o levantamento realizado
O controle e o mapeamento de cada
pela PwC Brasil, existem cerca de 840 ris-
processo são essenciais para uma boa ges-
cos relacionados a esses processos que
tão, evitam falhas e ineficiências e permi-
vão desde o plantio da cana até a comer-
tem uma melhor administração dos custos
cialização dos produtos finais, passando
de produção. No entanto, o levantamen-
por todos os seus processos principais e
to da PwC mostrou que cerca de 72% dos
também de apoio administrativo. O pro-
processos das usinas apresentam alguma
cesso Agrícola é o que possui o maior nú-
ineficiência.
mero de riscos identificados (213). Em se-
Os processos da área agrícola, res-
guida, vem o processo de Suprimentos,
ponsável por cerca de 70% dos custos de
com 123 riscos e, em terceiro lugar, o pro-
produção de açúcar e etanol, são os prin-
cesso de Recursos Humanos, com quase
cipais pontos que requerem melhoria e
70 riscos mapeados. Juntas, essas três áre-
estão relacionados com o registro das
as respondem por quase a metade de to-
operações e manejo da cultura. No caso
dos os riscos mapeados em uma usina.
do registro, também chamado de aponta-
21
TE N D ÊN CIAS
CONTROLES AGRÍCOLAS E AGRICULTURA DE PRECISÃO
mento, é muito comum o uso de contro-
saltar, porém, a importância das fases que
les manuais, apontamentos duplicados de
antecedem a adoção da tecnologia, como
operações, ausência de registro de servi-
o devido mapeamento e a gestão dos di-
ços terceirizados, falta de rastreabilidade
versos processos e controles pertinentes a
dos insumos e serviços, possibilidade de
cada área.
desvio de insumos, registros de colheitas
Enfim, o mercado vem passando
em áreas não colhidas, dentre outros. Já
por diversas mudanças, em um ambiente
no que se refere ao manejo da cultura, a
competitivo crescente a cada ano. A exis-
eficiência e redução de custos estão atre-
tência de processos bem definidos, nor-
ladas ao uso correto dos insumos, desde
mas, procedimentos e controles docu-
a escolha dos produtos a serem utilizados
mentados e regularmente testados, pode
até a forma de aplicação.
aumentar a confiança das informações,
Um instrumento que pode propiciar
tornar a tomada de decisão mais preci-
melhor controle no manejo e contribuir
sa e ágil e oferecer maior confiança aos
para os ganhos de eficiência agrícola é a
acionistas e ao mercado. Conhecer e pro-
Agricultura de Precisão (AP). Essa tecno-
mover melhorias no nível de eficiência de
logia possibilita a identificação das condi-
seus processos é vital para que uma em-
ções gerais das áreas produtivas e permi-
presa possa buscar crescimento estrutu-
te administrar o uso de insumos por meio
rado e de longo prazo.
de dosagens específicas de acordo com
as necessidades de cada área. Na prática,
isso se traduz no uso de tecnologia para
gerar informações confiáveis para a tomada de decisão no campo, aumentando a
precisão.
A Agricultura de Precisão é, portanto, uma excelente ferramenta para suportar a melhoria dos controles adotados em
uma usina ou em qualquer outra agroindústria com produção agrícola. Vale res-
22
José Rezende,
Sócio da
PwC Brasil
1
Luiz Barbosa,
Gerente da PwC
Brasil e especialista
em Agribusiness
2
Maio · 2015
IN S E C TSHOW
Expertise em
pragas de solo
O CONTROLE DE INSETOS SUBTERRÂNEOS REALIZADO PELA
USINA SANTA TEREZINHA, DETENTORA DE 10 UNIDADES
PRODUTIVAS NO PARANÁ E UMA NO MATO GROSSO DO SUL
A
o longo dos últimos anos, alguns
insetos de hábito subterrâneo
atingiram status de pragas nos
canaviais brasileiros. Isso se deve às mudanças no sistema de produção e da expansão da cultura para novas áreas. Esse
DIVULGAÇÃO USINA SANTA TEREZINHA
Leonardo Ruiz
grupo pode ser caracterizado como insetos que atacam o sistema radicular ou outras partes das plantas, mas que apresentam todo o ciclo, ou pelo menos uma das
fases dele, no solo.
Os estudos sobre as “pragas de solo”
são poucos, em decorrência das dificuldades de coleta de dados e do longo ciclo
de vida dos insetos. Na cultura da canade-açúcar, vários insetos estão associados
ao sistema radicular, toletes e internódios
basais. Contudo, nem todas as espécies
causam danos e, por isso, não são consi-
Estima-se que os prejuízos econômicos
causados pelo Migdolus sejam na
ordem de 30 t/corte/ano, além da
redução da longevidade dos canaviais
23
DIVULGAÇÃO USINA SANTA TEREZINHA
IN S E C TSHOW
Sintomas de ataque de larvas de Migdolus ao internódio basal da cultura da cana-de-açúcar
deradas pragas. Diante disso, o monitora-
que a mesma proporciona, estão o Telchin
mento e a identificação das espécies e seu
licus, Sphenophorus levis, Hyponeuma tal-
prejuízo são de suma importância para a
tula, Elasmopalpus lignoselus e Mahanar-
tomada de decisão acerca do controle.
va fimbriolata.
Segundo o diretor da Global Cana So-
“O último Grupo pode ser reservado
luções Entomológicas, José Francisco Gar-
para as pragas tipicamente da parte aérea,
cia, entre as pragas subterrâneas ou aque-
como a Diatraea saccharalis, Diatraea fla-
las estritamente associadas ao solo e de
vipennella, Mahanarva posticata, Metama-
ciclo longo, podem ser destacados o Mig-
sius hemipterus e os complexos de des-
dolus fryanus, complexo de cupins (Hete-
folhadoras (Spodoptera frugiperda, Mocis
rotermes tenuis, Procornitermes triacifer,
latipes) e de saúvas do gênero Atta”, afir-
Neocapritermes opacus, Neocapritermes
ma Garcia.
parvus), complexo de corós (Diloboderus
coris castanea). Já entre aquelas que utili-
Combate às pragas
na Santa Terezinha
zam a touceira como abrigo e/ou que são
A partir de 2013, com o intuito de ra-
beneficiadas pela condição microclimática
cionalizar os inseticidas utilizados no mo-
abderus) e percevejos-castanhos (Scapto-
24
Maio · 2015
mento do plantio, as unidades do Grupo
cisco Dourado, explicam que os danos à
Santa Terezinha iniciaram o monitoramen-
cana-de-açúcar são causados pelas lar-
to de pragas de solo. Dentre os principais
vas de Migdolus, que se alimentam do sis-
insetos observados nesses levantamentos,
tema radicular e dos internódios basais,
destaca-se o Migdolus spp. Originária do
destruindo-os totalmente. “Em função da
Brasil, essa praga está associada a várias
diminuição das raízes, há a redução da ab-
culturas além da cana-de-açúcar. Por isso,
sorção de água e nutrientes. Em períodos
é importante a realização de levantamen-
de estresse hídrico, facilmente é possível
tos das fases biológicas do Migdolus em
observar reboleiras de plantas amarela-
áreas de expansão da cultura canavieira.
das, secas e também mortas, o que acaba
indicando a maneira de distribuição dessa
César Pattaro, e os assistentes de desen-
praga”. Estima-se que os prejuízos econô-
volvimento agrícola da Usina Santa Tere-
micos causados pelo Migdolus sejam na
zinha, Flávio Rubialies e Leonídio Fran-
ordem de 30 t/corte/ano, além da redu-
DIVULGAÇÃO USINA SANTA TEREZINHA
O assessor agronômico, Fernando
Fases biológicas
(larva, pupa
e adulto) do
Pão-de-galinha
25
IN S E C TSHOW
ção da longevidade dos canaviais.
ção das larvas. “Como o Migdolus se distribui por reboleiras, os levantamentos têm
vantamento de Migdolus segue a seguinte
sido realizados por curvas de nível. Des-
regra: abrem-se duas trincheiras/ha, com
sa forma, quando constatada a presença
as dimensões de 0,50 x 0,50 x 0,30 m, logo
da praga ou de danos, o controle é reali-
após o último corte do canavial e antes do
zado por reboleira ou curva. É uma manei-
DIVULGAÇÃO USINA SANTA TEREZINHA
Na Santa Terezinha, o método de le-
Capacitação de colaboradores na Usina Santa Terezinha para o trabalho
de monitoramento de pragas de solo em áreas de reforma e expansão
preparo para posterior reforma. Se os le-
ra de racionalizar a utilização dos insetici-
vantamentos forem efetuados no período
das”, afirmam.
do inverno, é possível quantificar as larvas
O monitoramento para o controle
nas trincheiras, bem como os danos cau-
do Migdolus ocorre entre os meses de se-
sados aos internódios basais das soquei-
tembro a abril, época em que se observa
ras. Já em outros períodos, observam-se
a presença de adultos. “O principal méto-
apenas os danos causados pela alimenta26
Maio · 2015
DIVULGAÇÃO USINA SANTA TEREZINHA
Isca de papelão corrugado na Usina Santa Terezinha para
monitoramento de espécies de cupim em áreas de expansão
do de controle ainda é o químico, seja no
e atacam as gemas de toletes e brotações.
momento da cobrição das mudas ou como
“Até o momento, não foram quanti-
barreira química, no momento do preparo”.
ficados os danos causados por esses insetos. Alguns relatos sugerem que a popula-
Pragas secundárias
ção de 40 larvas/trincheira de 0,50 x 0,50 x
Além do Migdolus, a Usina Santa Te-
0,30 m pode estar acima do nível de dano
rezinha também enfrenta uma série de
econômico, por apresentar plantas debili-
“pragas de solo secundárias”, observadas
tadas e secas devido à redução do siste-
nos levantamentos de trincheiras. Algu-
ma radicular. Entretanto, nas unidades da
mas dessas espécies são o Pão-de-Gali-
Usina Santa Terezinha, utiliza-se o nível de
nha, Diloboderus abderus, Dyscinetus sp.,
controle de 10 larvas/trincheira.”
Cyclocephala sp., Euetheola humilis, Li-
Nos canaviais da Usina, também é
gyrus gyas, Stenocrates laborator e Ste-
comum encontrar larvas de Naupactus,
nocrates minutus. De acordo com a equi-
bem como ninfas e adultos de percevejo
pe de desenvolvimento agrícola da Usina,
castanho Scaptocoris spp., principalmente
as larvas desses insetos podem se alimen-
em áreas de expansão, anteriormente ocu-
tar de toletes, raízes e internódios basais, e
padas por pastagens. O assessor agronô-
somente as fêmeas adultas se alimentam
mico e os assistentes de desenvolvimento
27
DIVULGAÇÃO USINA SANTA TEREZINHA
IN S E C TSHOW
Iscas para monitoramento de Sphenophorus levis em áreas de
viveiros de mudas de cana-de-açúcar na Usina Santa Terezinha
agrícola da Santa Terezinha afirmam que a
amplo trabalho de prevenção. Atualmen-
distribuição da Scaptocoris spp. se dá em
te, toda muda introduzida nas unidades
reboleira e, em decorrência de seu ata-
do Grupo, bem como a troca de mudas en-
que, as plantas ficam murchas e amarela-
tre elas, são vistoriadas quanto a essa pra-
das. “Não há controle específico para es-
ga. “Além disso, realizamos um monitora-
sas pragas, pois, normalmente, estas são
mento especial voltado o SL, por meio de
controladas juntamente com as pragas
‘iscas’ confeccionadas com a própria cana,
primárias”.
com adição de melaço (1 litro de melaço
Eles contam, também, que até o momento não estão sendo encontradas es-
para 1 litro de água), distribuídas em áreas de viveiros”.
pécies de cupins, muito provavelmente
pela utilização de inseticidas de alto po-
Broca peluda
der residual utilizados no passado.
A Iponeuma, também conhecida
O Sphenophorus levis também não
como broca peluda, tem sido encontra-
foi avistado. Porém, a Usina realiza um
da com frequência nos levantamentos de
28
Maio · 2015
abertura de trincheiras na Santa Terezinha.
onde a cana-de-açúcar foi queimada”.
A equipe de desenvolvimento agrícola da
O levantamento populacional é rea-
Usina conta que, embora frequente, pou-
lizado por meio da abertura de duas trin-
co se sabe sobre esse inseto associado à
cheiras/ha, observando-se o número de
cultura da cana-de-açúcar. “Na década de
“tocos” totais e o número de tocos ataca-
1990, houve relatos sobre danos causados
dos da touceira. Com a divisão do núme-
por essa praga no município paulista de
ro de tocos atacados pelo número de to-
Jaú e nos mato-grossenses de Maracajú e
cos totais, multiplicado por 100, tem-se a
Rio Brilhante, com redução da produtivi-
porcentagem de infestação da praga. “Mui-
dade e morte de plantas”, afirmam.
to embora não haja trabalhos de pesqui-
Segundo eles, as fêmeas adultas co-
sa que determinem o nível de controle
locam seus ovos na base dos colmos e,
para essa praga, utiliza-se, empiricamente,
após a eclosão, as lagartas penetram em
a porcentagem de 40% de infestação para
direção à base, fazendo galerias nos inter-
o controle”, relatam Fernando César Pat-
nódios basais. “Possivelmente, existe a re-
taro, Flávio Rubialies e Leonídio Francisco
lação de maior infestação da Iponeuma
Dourado.
29
ME C A NIZ AÇÃO
Colhedora de cana
Valtra BE1035
lançada na Agrishow
Agrishow encolheu,
mas não em lançamentos
A MAIOR FEIRA DE TECNOLOGIA AGRÍCOLA DA AMÉRICA DO SUL REFLETE
A CRISE DO BRASIL, REDUZ VOLUME DE VENDAS, MAS CAPRICHA
NOS LANÇAMENTOS, INCLUSIVE PARA O SETOR CANAVIEIRO
Luciana Paiva, Clivonei Roberto e Leonardo Ruiz
P
ela primeira vez em 22 edições, a
no volume de negócios. O valor apresen-
Agrishow, maior feira do agronegó-
tado pelos organizadores foi de R$ 1,9 bi-
cio da América Latina, anuncia queda
lhão, em 2014 o faturamento foi de R$ 2,7
30
Maio · 2015
bilhões. De acordo com as entidades realizadoras (Abag, Abimaq, Anda, Faesp e SRB),
a alta dos juros e a incerteza político-econômica foram as principais responsáveis
pela grande queda na realização de negócios. “O Brasil vive hoje uma crise de con-
Confira no vídeo
a manifestação
dos produtores
rurais na
abertura da
Agrishow
fiança generalizada e sentida também pelo
produtor rural”, explicaram os realizadores.
Mas quem foi à feira, realizada de 27
de abril a 1 de maio em Ribeirão Preto, SP,
talvez tenha a impressão de que a queda
seja ainda maior.
No terceiro dia melhorou um pouquinho, mas nada parecido com as edi-
Nos dois primeiros dias, o silêncio
ções anteriores, e já havia a sensação de
era tão grande que parecia que não havia
que a Agrishow 2015 seria pior do que se
começado. Não se ouvia conversa anima-
esperava. O som mais alto que houve na
da entre vendedores e compradores, sinos
feira foi da manifestação dos produtores
tocando anunciando vendas, exclamações
rurais na abertura. As autoridades presen-
de visitantes empolgados com as novida-
tes preferiram se retirar e também, pela
des, a rádio Agrishow estava muda e os
primeira vez na história da feira, a cerimô-
helicópteros não cruzavam o céu.
nia não chegou ao fim.
Lançamentos superam a crise
BE1035, A COLHEDORA DE CANA DA VALTRA
E
ssa redução da Agrishow é alarmante e reflete o cenário atual do país.
Mesmo assim, os fabricantes de má-
quinas e implementos continuam acreditando no agronegócio e levaram uma
série de lançamentos para a feira. Até o
segmento canavieiro, que atravessa a pior
e mais longa crise entre as culturas agrícoColhedora Valtra chama
atenção na Agrishow
31
ME C A NIZ AÇÃO
Interior da BE1035E
las, foi altamente brindado.
da Santal foram fundamentais.
A BE1035, a primeira colhedora
“Por ser uma marca que atua há mui-
de cana com a marca Valtra, foi um dos
tos anos no setor sucroalcooleiro, a Val-
destaques. No ano em que Valtra com-
tra conhece todas as particularidades do
pleta 50 anos no Brasil, a empresa trou-
segmento, e agora passa a oferecer em
xe grande linha de equipamentos para a
seu portfólio uma máquina perfeita para
Agrishow 2015. Segundo Paulo Beraldi, di-
colher em canaviais de alta produtivida-
retor comercial da companhia, a presen-
de. E o melhor: a colhedora de cana é de
ça forte está em sintonia com a aposta da
alta performance, mas é econômica, pois
empresa no setor agrícola, embora ele re-
foi desenvolvida com um motor ajustado
conheça queda das vendas companhia na
para ter baixo consumo de combustível,
Agrishow deste ano e também nos núme-
baixa emissão de poluentes e maior vida
ros finais de 2015.
útil. Além de um pacote de soluções que
Paulo Beraldi explica que a colhedo-
combina uma cabine confortável, pensa-
ra de cana que a AGCO apresenta ao mer-
da de forma ergonômica para o operador
cado ganhou a bandeira da Valtra, e não
e com um sistema eletrônico desenvolvi-
Massey Ferguson, pela longa história que
do realmente para facilitar o trabalho no
a empresa tem junto ao setor canavieiro.
campo”, destaca Marco Antônio Gobesso,
“A cana está no DNA da Valtra.” O executi-
gerente de marketing de equipamentos
vo lembrou que para a concepção do pro-
de cana-de-açúcar AGCO.
jeto, o know-how e a expertise advindos
32
Gobesso salienta que a AGCO desen-
Maio · 2015
33
A colhedora
de cana Valtra
responde ao
toque do dedo
volveu para esta colhedora um novo siste-
figuração poderá fazê-lo. Ou seja, quem
ma de telemetria que até o momento não
regula a máquina que pode ser o líder ou
havia sido aplicado no segmento agríco-
coordenador de colheita, vai programar o
la. A novidade, implementada pela primei-
equipamento e deixá-lo pronto para uso.
ra vez em um equipamento do grupo, vai
Assim o operador não precisa se preocu-
permitir o monitoramento da máquina em
par com a programação da máquina”, es-
tempo real, quer seja da fábrica, da conces-
clarece Gobesso.
sionária Valtra ou até mesmo do cliente.
Outra inovação da colhedora da Valtra é a chave: pode parecer algo simples,
mas não é. Isto porque essa chave-cartão
da BE1035 pode ser codificada para dife-
Veja vídeo com
mais detalhes
da BE1035
rentes níveis de acesso. O que quer dizer
que a colhedora, quando acionada com
uma chave-cartão (similar a um cartão de
crédito), vai trabalhar de acordo com o
que foi configurada. E essa programação
Se a colhedora Valtra vai fazer frente
pode variar segundo o nível de especiali-
aos maiores players desse mercado de co-
dade do profissional.
lhedora de cana no Brasil, Beraldi diz que
“A ideia é tirar do operador a respon-
apenas o tempo dirá, mas ressaltou: “Não
sabilidade de regulagem do equipamen-
viemos para brincar.” Em relação ao merca-
to, e assim garantir que a colhedora opere
do sucroenergético, Beraldi observou que
sempre nas melhores condições. Diversas
ainda haverá dificuldades, mas começam
pessoas podem operar o equipamento,
a ser detectados sinais de melhoria do ce-
mas como o cartão é personalizado, ape-
nário. “Já começamos a sentir um aumen-
nas quem é autorizado para alterar a con-
to das cotações na fábrica, por exemplo.”
34
Maio · 2015
Nova família de colhedoras
de cana da John Deere
N
a Agrishow 2015, a John Deere,
zendo melhores produtos ao mercado.
atual líder no mercado de colhe-
Ao todo, a JD trouxe onze novos mo-
doras de cana, lançou sua Nova
delos de equipamentos para a Agrishow
Família de Colhedoras de Cana CH 570 e
deste ano.
CH 680. Segundo Paulo Herman, presidente da John Deere Brasil e Vice-presidente de marketing e vendas da John Deere para América Latina, a empresa acredita
na agricultura brasileira e por isso está
sempre disposta a oferecer novos produ-
Veja vídeo
sobre as novas
colhedoras de
Cana JD
tos ao mercado. Para ele, o momento pode
ser difícil, mas isso é cíclico. Por essa certeza, a John Deere continua investindo e tra-
DMB destaca na Agrishow
Plantadora Automatizada PCP 6000
S
egundo Auro Pardinho, gerente comercial da DMB Máquinas e Implementos Agrícola, de Sertãozinho, SP,
a grande vedete da empresa na Agrishow
2015 foi a plantadora de cana PCP 6000
Automatizada. Por ser equipamento inovador no setor, atrai o interesse dos profissionais sucroenergéticos onde quer
que esteja exposta. Não seria diferente na
Agrishow.
Entre os visitantes da DMB esta-
Cestari e a Plantadora Automatizada PCP 6000
va Carlos Alberto Cestari, grande produ-
35
ME C A NIZ AÇÃO
tor de cana no interior paulista, nas regi-
cou na Agrishow tecnologias que aten-
ões de Jaboticabal e Palestina. “Na hora
dam essa necessidade do produtor, como
do plantio mecanizado, chega de jogar
a plantadora de cana PCP 6000 Automati-
açúcar no sulco”, ressalta Cestari, que bus-
zada DMB.
Itaiquara migra para o plantio mecanizado
Roberto Satti, coordenador de manutenção,
Ricieri Zerbetto, gerente agrícola e Felipe Lorenzato, estagiário
O
s profissionais da Usina Itaiquara
canização do plantio de cana. Ricieri sabe
não perdem a Agrishow. A em-
que se trata de uma das etapas mais delica-
presa conta com duas unidades,
das do processo, que mais encarece o cus-
uma em Itapiratiba, SP, voltada exclusiva-
to devido à quantidade de cana tombada
mente para a produção de fermento. Nes-
nas linhas de plantio e também exige qua-
ta safra, a expectativa, segundo Ricieri Zer-
lidade na operação, para não deixar falhas.
betto, gerente agrícola, é de moer 600 mil
Por isso, os profissionais da Itaiqua-
toneladas de cana, destinadas à produção
ra, durante a Agrishow, visitaram o estan-
de fermento. A outra unidade, em Passos,
de da DMB em busca de informações e
MG, deve moer 1,8 milhão de toneladas de
tecnologia apropriada para suas necessi-
cana nesta safra para a produção de eta-
dades. Pretendem iniciar com a distribui-
nol, fermento e açúcar.
dora de mudas de cana, depois partirão
A Itaiquara está migrando para a me-
36
para a plantadora automatizada.
Maio · 2015
DMB lançou Adubador de Discos - 2300 A
Pardinho: “cana-de-açúcar necessita incorporação profunda de adubação”
P
ardinho também destacou o lança-
cadores compostos por 1 disco de corte
mento DMB na Agrishow 2015, o
de palha de 26 polegadas, 2 discos desen-
Adubador de Discos - 2300 A, diri-
contrados de 18 polegadas com dispositi-
gido para a cultura canavieira em espaços
vo aplicador do adubo em profundidade
combinados de 3 linhas. O implemento
e 2 rodas de borracha que fazem o fecha-
oferece alto rendimento e aplica o adubo
mento do corte na palha e solo, evitando
em profundidade ao lado da linha de cana.
perdas de nutrientes por volatilização.
De acordo com o Gerente de Marke-
O depósito de adubo tem capacida-
ting da DMB, estudo feito pela Unesp de
de para 2.300 litros e faz a distribuição por
Jaboticabal para a cultura canavieira indi-
meio de esteiras em 3 linhas de cana si-
ca que é essencial dar preferência para a
multaneamente. Permite a deposição do
incorporação profunda da adubação, pois
adubo nos dois lados da linha da cana
garante maior produtividade agrícola ao
numa profundidade de 8 a 12 cm, onde
canavial, possibilitando o máximo apro-
se concentra a maior porcentagem de re-
fundamento do sistema radicular.
novação do sistema radicular da cultura.
O implemento é destinado a rea-
Como fica protegido, podem ser utilizadas
lizar a adubação das soqueiras da cana-
formulações com qualquer fonte nitroge-
de-açúcar, principalmente colhida crua
nada, o que permite a opção pela de me-
mecanicamente. Possui 6 conjuntos apli-
nor custo, no momento da aplicação.
37
ME C A NIZ AÇÃO
AgMusa atrai a atenção dos visitantes
se organizando para adotar a tecnologia
no futuro. “Temos que melhorar a produtividade do nosso canavial, por isso
precisamos utilizar de tecnologias como
esta.”
Confira vídeos de visitantes
Produtores de Orindiuva, SP, visitam
o estande da BASF na Agishow
U
Profissionais da
Usinas Itamarati
visitam estande
da BASF
ma das atrações do estande da
BASF, localizado no pavilhão Shopping Rural da Coopercitrus, foi a
tecnologia de mudas pré-brotadas AgMusa. Era difícil quem não parasse para observar as bandejas com as mudas.
Durante toda a feira, os profissionais
da Basf foram requisitados para passar informações ao público sobre a tecnologia
Produtor de
Jaú quer mais
informações
sobre AgMusa
de mudas sadias da companhia. Entre os
visitantes estava um grupo de produtores
de cana de Orindiúva, SP, que fornece cana
para a Unidade Bunge – Moema. Para Luiz
Ribeiro, Grisolino Borges, Guido Lucianelli
e Guido A. Ferreira Lucianelli, esta tecnologia é muito bem-vinda ao setor sucroenergético, por possibilitar a formação de
viveiros sadios e produção de mudas com
Profissionais da
Usina Meridiano
querem saber
mais sobre
AgMusa
máxima qualidade.
Guido Ferreira disse que ainda não
fazem plantio com AGMUSA, mas estão
38
Maio · 2015
TMA lançou Plantadora Ptx 7010 Automatizada
Além dos mecanismos atuais de
agricultura de precisão, rastreamento
por câmeras e monitores, a nova plantadorada TMA dispõe de células de
Gilmar e a Plantadora
Ptx 7010 Automatizada
S
controles individuais
de taxa variável que
egundo Gilmar Pereira, gerente de
controlam a vazão dos produtos automa-
negócios, os destaques da planta-
ticamente de forma a compensar as varia-
dora ficam por conta da diminuição
ções de velocidade de deslocamento da
do número de mudas por hectare planta-
máquina, mantendo constante a taxa de
do, de 18 para 12 ton/ha, e a redução da
aplicação e dosagem de toletes, fertilizan-
possibilidade de erro por fator humano.
tes e defensivos.
Senai/Sp e Valtra Lançam Maior Carreta
de Escola Móvel da América Latina
M
as como não adianta ter má-
cânico de máquinas agrícolas) e especiali-
quina sem profissionais treina-
zação profissional (eletrohidráulica de má-
dos para dominar a tecnologia,
quinas agrícolas).
durante a Agrishow a Valtra, em parceria
com o Senai/SP, lançou a maior Escola Móvel da América Latina, adaptada em uma
carreta de 156 metros, voltada para qualificação de mão de obra de manutenção
Conheça o
interior da
Escola Móvel
de colhedoras de cana. A carreta oferece
os seguintes cursos: auxiliar profissional
(auxiliar de climatização de automóveis),
qualificação profissional (eletricista e me-
39
C A PA
40
Maio · 2015
Vai mudar!
O SECULAR MÉTODO DE PLANTIO DE CANA-TOLETE
ESTÁ COM OS ANOS CONTADOS. HOJE, JÁ SE PLANTA
A MUDA DA CANA E NO FUTURO SERÁ A SEMENTE
41
C A PA
Luciana Paiva e Clivonei Roberto
D
emorou quase 500 anos, mas com
primento, por um microtolete de 5 cm que
o lançamento do sistema de mu-
era depositado na linha de cana um a um,
das pré-brotadas (MPB), pelo Ins-
como uma semente. A plantadora, muito
tituto Agronômico (IAC) em 2013, o méto-
mais leve que as convencionais, utilizava
do de plantio por meio de esparrame de
em torno de 1,5 a 2 toneladas de cana por
cana-tolete pode estar com o tempo con-
hectare, contra a média de 20 toneladas
tado. “Na verdade, foi o Plene, pela Syn-
utilizadas no plantio mecânico.
genta, apresentado em 2008, que apre-
“O que a Syngenta fez em 2008 foi um
sentou o microtolete e a possibilidade de
convite ao setor de desenvolvimento con-
plantar cana de um outro jeito”, lembra o
junto da tecnologia. Procuramos as prin-
produtor Paulo Rodrigues, diretor da fa-
cipais unidades sucroenergéticas e monta-
zenda Santa Izabel, de Guariba, e um dos
mos áreas demonstrativas comerciais. Em
pioneiros na produção e plantio do MPB.
2010, começamos a comercialização e as-
A tecnologia de mudas Plene troca-
sinamos 350 milhões de dólares de contra-
va o tradicional tolete de 40 cm de com-
to para os cinco anos seguintes. Quando
Tamanho do tolete
normal e o Plene:
não vingou, mas
gerou filhotes
42
Maio · 2015
Pesquisador Mauro
Xavier, do IAC,
apresenta durante
a Agrishow 2013 a
muda pré-brotada
na-de-açúcar. Amaral,
salienta que muitas
empresas passam por
isso, e que faz parcomeçamos a entregar o produto, vimos
te do processo de inovação, principalmen-
que não tínhamos escala comercial, além
te quando se traz algo que provocará uma
disso, o desempenho no campo era mui-
mudança de patamar de tecnologia.
to variável, tinha hora que funcionava, hora
não. Decidimos retornar à fase de pesqui-
IAC lança o sistema MPB
sa e aumentamos os investimentos”, conta
O Plene se recolheu, mas já havia li-
Leandro Amaral, diretor de Marketing Ca-
berado a centelha da mudança. Entre os
O método agradou e o IAC passou a realizar muitos cursos para explicar o sistema MPB
43
C A PA
Paulo Rodrigues e muda produzida em sua fazenda
primeiros a captar está oportunidade es-
provenientes daqueles minirrebolos, ele
tavam os pesquisadores do IAC (Institu-
pensou que talvez pudesse produzir mu-
to Agronômico), quem fornecia o material
das de cana, utilizando a estrutura do vi-
varietal para a produção do Plene. Os pes-
veiro de mudas nativas de sua proprieda-
quisadores Marcos Landell e Mauro Xavier
de, onde já produzia substrato. Com essas
olharam para o microtolete e viram a pos-
mudas iria cobrir as falhas da socaria. O
sibilidade de transformá-lo em uma muda
produtor não só pensou como colocou
pré-brotada cheia de sanidade. E passa-
em prática o projeto.
ram a pesquisar e aprimorar a ideia. Isso
foi em 2009.
Em abril de 2013, na Agrishow, maior
feira de tecnologia agrícola da América
Como o setor sucroenergético é
Latina, realizada em Ribeirão Preto, o IAC
uma rede de informação, o produtor Pau-
apresentou oficialmente um método iné-
lo Rodrigues, parceiro do IAC, em uma
dito de plantio de cana-de-açúcar: o siste-
de suas visitas ao Centro de Cana do Ins-
ma de mudas pré-brotadas (MPB) de cana.
tituto, ficou a par do experimento. Paulo
Na época, o pesquisador Mauro Alexandre
conta que a seca de 2010 provocou mui-
Xavier explicou o processo: no lugar dos
tas falhas de rebrota na socaria da safra
colmos como sementes, entram as mudas
2010/11. Olhando para aquelas mudinhas
pré-brotadas que são produzidas a par-
44
Maio · 2015
tir de cortes de canas, chamados minirre-
um hectare de cana, o consumo de mudas
bolos – onde estão as gemas. Depois pas-
cai de 18 a 20 toneladas, no plantio con-
sam por uma seleção visual e são tratados
vencional, para 2 toneladas no MPB.
com fungicida. São colocados em caixas
de brotação com temperatura e umidade
Método revolucionário
controlada, e ao final colocadas em tube-
Enquanto o sistema MPB era lança-
tes que passam por duas fases de aclima-
do na Agrishow, não muitos quilômetros
tação. O ciclo completo leva 60 dias.
de distância, na fazenda Santa Izabel, em
De acordo com o pesquisador, o MPB
Guariba, Paulo Rodrigues já colhia os fru-
era a oportunidade de restaurar os bene-
tos de seu projeto de produção de mudas
fícios da formação de mudas em vivei-
para cobrir falhas. “Foi um sucesso”, afir-
ros, procedimento que fora praticamente
ma. Doze meses após cobrirem as falhas
esquecido com o boom do setor. O MPB
no canavial, as mudas se transformaram
contribui para reduzir as ocorrências de
em cana com 30% mais de massa. Para
pragas e doenças na implantação do ca-
o produtor, o método revoluciona o con-
navial por usar mudas sadias. “É uma tec-
ceito de plantio de cana praticado desde
nologia de multiplicação que poderá con-
sempre no Brasil. Resgata também a ca-
tribuir para a produção rápida de mudas,
racterística da cana ser uma soqueira, e
associando elevado padrão de fitossani-
que o fato de esparramar os toletes na li-
dade, vigor e uniformidade de plantio”,
nha provoca uma competição por espaço,
salientou. Outro grande benefício, disse
Xavier, está na redução da quantidade de
mudas que vai a campo. Para o plantio de
Viveiro na Santa Izabel: produção
de 200 mil mudas pré-brotadas
45
C A PA
Área de AgMusa no sistema Meiosi
com amendoim na fazenda de
Ismael Perina, em Jaboticabal, SP
luz e nutrientes, além da falta de uniformi-
AgMusa e a biofábrica móvel
dade. “Mais sanidade, mais perfilhos, mais
E em julho do 2013, a multinacional
colmos, mais uniformidade, levam a mais
Basf entrou no jogo, apresentando cartas
tonelada e a mais açúcar por hectare. Este
pesadas: lançou o sistema AgMusa com
é o sistema MPB”, sintetiza Paulo.
mudas sadias, com qualidade superior e
O viveiro de produção de MPB da
difusão de técnicas para a implantação
Santa Izabel tem capacidade de produção
de viveiros com alto potencial produtivo.
anual de 200 mil mudas, mas o objetivo
O AgMusa não é simplesmente a muda,
do produtor é chegar a produzir 5 milhões
mas um sistema, um pacote tecnológico.
por ano para cobrir as falhas de toda sua
A Basf orienta no preparo do solo e no
área de plantio. A renovação nos canaviais
manejo, fornece a muda, realiza o plantio
da Santa Izabel é da ordem de 10%/ano. O
e assistência técnica.
plantio das mudas é manual, para cana de
Alicerçado com práticas como a
18 meses (com plantio só de verão) e sem
Meiosi com o amendoim, já é possível di-
irrigação.
zer que o sistema AgMusa “pegou”, pois
46
Maio · 2015
em 2015 já ocupa mais de três mil hecta-
negócio com AgMusa em um ano, cons-
res de cana.
truiu seu viveiro primário dentro dos pa-
“O método Meiosi com AgMusa su-
râmetros de sanidade do sistema, e ago-
pera as expectativas”, diz Ismael Peri-
ra quer multiplicar esse varietal. Ao invés
na, produtor rural em Jaboticabal, SP, um
da cana ser colhida e levada para a biofá-
dos pioneiros a tombar a cana-muda ad-
brica da Basf, no município de Santo An-
vinda da AgMusa em áreas cultivadas por
tonio de Posse, SP, para a industrialização
amendoim. “Essa cana, com apenas oito
das gemas, a biofábrica móvel vai até o
meses, ofereceu muito mais material que
canavial do cliente. A cana cortada pas-
a cana convencional de 14 meses. Forma-
sa pela biofábrica, onde é realizada a ex-
ção de viveiro primário é base para o nos-
tração das gemas, o que equivale de 2%
so setor. O plantio de muda de cana no
a 3% da cana. O restante da matéria-pri-
sistema AgMusa em Meiosi - com amen-
ma vai para a usina a fim de ser transfor-
doim ou soja - garantiu uma excelente
mado em açúcar, etanol, energia, geran-
qualidade da muda para o plantio comer-
do receita para o cliente. A gema segue
cial. Adotar esse sistema não pesa no bol-
para a biofábrica fixa da Basf, para a in-
so. Ao contrário, traz retorno. Trata-se de
dustrialização e produção da muda, que
um sistema simples e que, diferente do
retorna ao campo dois meses depois.
que alguns dizem, sai barato. A partir de
uma taxa de multiplicação de um por sete
se tem o equilíbrio de custo na produção
desta muda”, explica. O melhor é que a
taxa de multiplicação chega a ser de um
por 15.
Uma das ferramentas para maior
Cássio:
a biofábrica
AgMusa
gera renda
ao cliente
adesão à tecnologia foi o lançamento, em
2014, da biofábrica móvel AgMusa de extração de gemas de cana. Cássio Teixeira, gerente de Marketing para a América
Latina de Especialidades da Basf, explica que a biofábrica móvel é um equipamento patenteado pela empresa e que
tem o objetivo de fazer a extração de gemas próxima ao talhão, onde a cana será
plantada. Funciona assim: a usina fechou
47
C A PA
A popularização do MPB
Não é exagero dizer que o sistema
de MPB já está correndo o mundo. No Brasil é difícil a unidade que não tenha pelo
menos um cantinho com mudas pré-brotadas. A tecnologia se mostra acessível até
Veja vídeo com
explicação do
pesquisador Mauro
Xavier sobre a
produção de
mudas pré-brotadas
mesmo para pequenos produtores. O IAC,
a Coplana (Cooperativa Agroindustrial) e
a Socicana (Associação dos Fornecedores
de Cana de Guariba) criaram o Projeto de
Validação do Kit de Pré-Brotação do MPB.
O maior plantio de MPB
O Projeto tem dois propósitos diretos: ofe-
Área com 5 ou 10 hectares com MPB
recer condições para que o fornecedor de
é a realidade da maioria do setor, mas não
cana retome a gestão do seu negócio e re-
na Usina Alta Mogiana, em São Joaquim
duzir o tempo de adoção das novas varie-
da Barra, SP, que já conta com 1.800 hec-
dades desenvolvidas pela pesquisa. Com a
tares plantados com a tecnologia. “É uma
transferência de informações e de pacote
das soluções que temos disponíveis hoje
tecnológico pretende-se contribuir para a
para melhorar a produtividade. E o produ-
independência do canavicultor em relação
tor, o empresário tem que estar atento a
à produção de mudas.
todas”, diz o diretor-comercial Luiz Gusta-
A Biofábrica AgMusa
vai até o canavial
48
Maio · 2015
“MPB é uma das soluções
que temos disponíveis
hoje para melhorar a
produtividade”, diz Luiz
Gustavo Figueiredo
vo Junqueira Figueiredo.
Mas Luiz Gustavo
lembra que esta é uma
tecnologia nova. “Está
no nascedouro e tem seus desafios. Não
missora. Atualmente, a usina já faz o plan-
adianta acreditar que esta tecnologia, so-
tio comercial das mudas pré-brotadas.
zinha, é a ‘salvação da lavoura’. Afinal, exi-
“Neste ano, 20% do nosso plantio foi fei-
ge uma série de cuidados, inclusive com
to com MPB. É um índice alto, pois plan-
relação à umidade do solo no plantio e no
tamos 9 mil hectares, o que correspon-
pós-plantio. “Se não ficar atento a isso, o
de a 1.800 hectares plantados com MPB,
produtor acaba tendo resultado até pior
que vão virar cana e depois matéria-prima
do que com a cana convencional.”
para a indústria”, informa.
De qualquer forma, Luiz Gustavo
Para o diretor da usina, ainda falta
acredita que o MPB é uma tecnologia pro-
um pouco de amadurecimento completo
A Alta Mogiana já plantou 1.800 hectares com MPB
49
C A PA
A Alta Mogiana utiliza MPB de vários fornecedores
do ciclo da cana para chegar a uma con-
As mudas de MPB foram plantadas
clusão final sobre o sistema. “Entre plantar,
em áreas de pousio, reforma e rotação
colher, multiplicar, gostaria de ter pouco
de culturas, porém não foi feita em Meio-
mais de resultados para ter uma avaliação
si. Foram plantadas algumas propriedades
precisa. Até agora, diria que a expectativa
no modelo de cantose (talhão “num can-
é boa. Mas ainda queremos olhar os resul-
to” da propriedade que servirá de muda
tados de campo para comprovar que é vi-
para o plantio mecanizado após alguns
ável apostar nessa opção.”
meses do plantio efetivo da MPB).
Até agora, a Alta Mogiana plantou
Nos canaviais da Alta Mogiana en-
mudas de vários fornecedores: Basf (Ag-
contram-se quatro unidades da biofábri-
Musa), Syngenta (Plene Evolve e Plene PB),
ca móvel AgMusa da Basf. A Usina traba-
CTC, IAC e SBW, mas pretendem plantar
lha com a Basf em duas linhas de negócios
de outros parceiros também. Os profissio-
com relação à MPB: a linha Premium, em
nais da Usina alertam que para o bom de-
que compra a muda, e a linha comparti-
sempenho das mudas é preciso cuidados
lhada, em que extrai gemas de materiais
com o preparo do solo, o plantio propria-
oriundos de meristemas da própria usina
mente dito e com irrigação de salvamento
com extratoras da Basf. O ganho para am-
(quando necessária).
bos é na redução de custos.
50
Maio · 2015
A equipe da Alta Mogiana considera que a utilização do sistema evoluiu ra-
pensa em plantar o máximo possível em
escala comercial.
pidamente e só não é mais utilizado pela
atual situação do setor sucroenergético,
MPB caseiro no Grupo Aralco
que não comporta custos e investimen-
Algumas unidades estão investindo na
tos mais elevados. “Na parte da capacida-
produção das próprias mudas ao invés de
de de produção, acreditamos que já existe
adquirirem de empresas, mas a equipe da
ambiente para o serviço Disk Muda avan-
Alta Mogiana diz que no momento não há a
çar rapidamente, se houver demanda.” O
pretensão de produzir as mudas. “Compra-
próximo passo da Alta Mogiana quanto
mos mudas e temos alguns modelos/eta-
ao plantio de MPB é evoluir no conceito
pas compartilhados (em que fazemos parte
de irrigação para possibilitar a ampliação
do processo e o parceiro faz outras).”
Já o Grupo Aralco, com quatro uni-
vidos no sistema como um todo permiti-
dades no Oeste Paulista, aposta na produ-
rem um ganho de escala maior, a empresa
ção caseira do MPB. Tiago Rodrigo Dossi,
COMUNICAÇÃO ARALCO
da janela de plantio. E se os valores envol-
Brotação de mudas em viveiro da Aralco
51
C A PA
COMUNICAÇÃO ARALCO
“Queremos
uma muda
com um valor
final abaixo
do mercado”,
diz Tiago
assistente de Formação e Colheita, diz que
mos as camas de germinação. Aproveita-
a ideia inicial é produzir a muda para plan-
mos palanques de madeira que tínhamos
tio comercial, e alavancar o crescimento
para montar a estrutura da estufa, fizemos
de algumas variedades, que não têm ou
e faremos de tudo para minimizar os gas-
que acham necessário expandir. “O MPB é
tos e baratearmos essas mudas para que
uma forma de multiplicarmos essas varie-
ela seja viável para a empresa. Só adquiri-
dades que nos faltam, com uma garantia
mos a bandeja, arame e algumas lascas de
genética e de sanidade, que são as duas
madeira de eucalipto tratado.”
principais garantias que buscamos. E em
A produção iniciou no ano passa-
uma próxima etapa, incluir essa produção
do em fase de experimento, em um vivei-
em falhas de plantio.”
ro de árvores nativas, que se localizava em
Essa produção doméstica, segun-
General Salgado. “Ainda na fase de expe-
do Tiago, visa um melhor custo-benefício. “Queremos uma muda com um valor
final abaixo do mercado (hoje está em torno de R$1). Para isso, adquirimos poucos
recursos materiais, pois utilizamos os materiais que a empresa oferece. O substrato fazemos com a torta que temos aqui;
nossas camas de germinação foram feitas com barracão que tinha aqui na usina.
Desmontamos e aproveitamos para fazer-
Montando a estrutura
para a produção de
mudas na Aralco
52
Maio · 2015
COMUNICAÇÃO ARALCO
MPB produzida pela Aralco
rimentos, começamos a colher dados de
qualificar a distribuição para as outras uni-
germinação, temperatura, umidade, qual
dades. Temos hoje 5 hectares plantados
a variedade que iriámos produzir. Com
manualmente. Agora com o término da
isso, neste ano, transferimos o viveiro para
instalação, a intenção de produção desse
o alojamento – ATA – em Santo Antônio
viveiro é que passe a ser de 1 hectare por
do Aracanguá, para centralizar as ações e
dia”, observa Tiago.
COMUNICAÇÃO ARALCO
Inicialmente, as mudas são para formação de viveiros primários. A multiplicação se dá a partir deles. Tiago explica que
foram selecionadas 12 variedades mais
adequadas à região onde se encontram as
unidades do Grupo. E como é a sanidade
do MPB da Aralco? “Temos áreas no Grupo que plantamos e manejamos como viveiros primários e secundários, hoje nosso MPB está tendo origem dessas áreas.
Na hora em que vai ser feito o processo
de extração da gema, tratamos com fungicida, inseticida e enraizador. Pretendemos
também adquirir algumas mudas de MPB
53
C A PA
Frente de plantio de cana-tolete exige grande estrutura
oriundas de instituições de pesquisas.
ções. Quando obtivermos os dados neces-
Montaremos um viveiro na Aralco com es-
sários e a partir do momento que estiver
sas mudas e o nosso MPB sairá também
produzindo um hectare por dia, passará a
produzido por meio dessas. Então tere-
ser comercial para nós”, diz Tiago. Sobre o
mos uma garantia de sanidade, porque a
custo de produção o MBP da Aralco, infor-
origem dela já é sadia.”
ma que ainda não é possível fazerm o cál-
O plantio foi manual e no verão.
culo final dessa muda, mas trabalham para
Mesmo assim utilizaram irrigação, feita
ter uma muda de MPB abaixo do valor de
com caminhão pipa. Tiago salienta que o
mercado.
objetivo é liberar muda o ano inteiro. As-
Um ponto chave da produção de
sim, o plantio será no verão e no inver-
MPB é a economia de muda. Hoje, para
no, havendo o uso de irrigação no perío-
plantar um hectare de cana mecanizado,
do mais seco.
usa-se aproximadamente 18 toneladas de
A Aralco já pensa no plantio comer-
cana por hectare. “Já no plantio da MPB
cial do MPB. “Ainda não está comercial em
a gente necessita de aproximadamente
larga escala, porque estamos em fase de
duas toneladas de cana por hectare. Então
pesquisas, em busca de números, informa-
há uma economia aproximada de 16 tone-
54
Maio · 2015
55
C A PA
ladas. É um desafio, e que estamos todos
Acho que tudo isso favorece para um cres-
buscando.”
cimento notável da cultura de MPB.”
O plantio de mudas é uma alterna-
Paulo Roberto Artioli, diretor da Tec-
tiva ao plantio de cana-tolete? Para Tia-
nocana, de Marituba, SP, desenvolve um
go, sim. “É uma tecnologia que está aí, e
projeto-piloto com plantio de vários ti-
cada vez mais aumenta a quantidade de
pos de MPB em uma área irrigada com
usinas e produtores que a adotam, pen-
pivô. Ele queria saber mais sobre o poten-
sando em economia de muda, na sanida-
cial dessa tecnologia. E disse estar satisfei-
“Lógico que a mudança não será de uma hora para outra, mas podemos dizer
que a cana-tolete está com os anos contados”, afirma Paulo Roberto Artioli
de e qualidade da muda, em diminuição
to com os primeiros resultados. Conta que
de mão de obra, de máquinas. Hoje, um
as canas colhidas com 12 meses renderam
plantio mecanizado de MPB necessita ba-
110 toneladas, as que foram colhidas com
sicamente de um trator, um caminhão ¾
14 meses, chegam a 130 toneladas e taxa
e três a quatro pessoas. Já o plantio me-
de multiplicação foi de um por oito.
canizado requer mais investimentos, mais
O produtor ressalta que o plantio de
mão de obra, a muda sofre mais, e sem
cana-tolete não faz mais parte do canavial
contar a garantia de sanidade dessa muda.
do futuro. “Lógico que a mudança não será
56
Maio · 2015
de uma hora para outra, mas podemos di-
de plantio”, salienta Beto Artioli.
zer que a cana-tolete está com os anos
Luis Augusto Contin Silva, gerente
contados. O sistema MPB vai promover
do Processo Desenvolvimento Agrícola da
várias alterações, começando pelo mane-
Alta Mogiana, acredita que para a adoção
jo. A evolução da mecanização no canavial
em larga escala do plantio com MPB faltam
começou pelo fim, pela colheita, esquece-
reduzir custo das mudas e automatizar o
mos do plantio. E agora precisamos correr
sistema de plantio. “Os equipamentos dis-
atrás. Continuar jogando essa quantidade
poníveis para o plantio (transplantado-
absurda de cana nas linhas (média de 20
ras), apesar de algumas melhorias recen-
toneladas), manter essa estrutura enorme
tes, têm muito a avançar, principalmente
e custo altíssimo para a renovação do ca-
na questão da automação.”
navial não é viável economicamente. Mas
Cássio Teixeira, da Basf, conta que
para a expansão do plantio com mudas é
muitos clientes já sinalizam realizar o plan-
preciso que haja evolução nas máquinas
tio de canavial por meio do AgMusa, pois
Protótipo da plantadora
de MPB AgMusa da BASF
que está na fase de testes
57
C A PA
o custo já está ficando viável. “Muitos di-
res, vai precisar de outra plantadora, que
zem: ‘Meu primeiro ano será de viveiro, o
ofereça assistência mais rápida e mais fá-
segundo de canavial’. Começa a ser uma
cil, maior facilidade de regulagem para
tendência”, diz Cássio. Mas ele concorda
diferentes tipos de solo, com mais auto-
que, quando se pensa em larga escala, é
mação, que atenda todas as normas de re-
preciso melhorar o desempenho das plan-
gulação de trabalho. Esta plantadora está
tadoras. Por isso, a Basf está desenvolven-
em fase final de testes”, informa Cássio.
do uma plantadora que oferece maior es-
produzida pela DMB Máquinas e Imple-
Syngenta não acredita
que o MPB irá substituir
o cana-tolete, mas sim
o plantio da semente
mentos. Cássio explica que essa máquina
Leandro Amaral conta que, quando
realiza um excelente trabalho para quem
a Syngenta recolheu o Plene para a fase
quer plantar uma área introdutória de Ag-
de pesquisa, criou a plataforma de plantio
Musa. “Tecnicamente planta muito bem
Plene. “Entre 2011/12 criamos dois produ-
uma área de 10 hectares com AgMusa.
tos, um deles é uma muda de meristema
Mas se o produtor já dominou, quer am-
chamada Plene Evolve para plantio de vi-
pliar rapidamente para 50, 100, 200 hecta-
veiro pré-primário para introdução de no-
cala de plantio com redução de custo.
Hoje, o plantio da AgMusa é realizado pela plantadora licenciada pela Basf e
Leandro com o Plene
Evolve e o Plene PB
58
Maio · 2015
59
C A PA
vas variedades com alta sanidade genética.
genta, o futuro é o plantio da semente da
E na sequência, criamos a muda pré-bro-
cana”, salienta Leandro. Trata-se de uma
tada, o Plene PB. “Mas não acreditamos
tecnologia apresentada pela empresa em
em plantio comercial com MPB. Acho que
2014, o Plene Emerald (esmeralda).
ao médio prazo vão surgir máquinas se-
“É hora de mudarmos a forma como
miautomatizadas com um operador para
pensamos cana-de-açúcar”, ressalta Da-
alimentar três linhas, com um nível de efi-
niel Bachner, diretor global de cana-de
ciência maior, mas que ainda não terão ní-
-açúcar da Syngenta. Um dos grandes
vel de exigência compatível para plantio
passos dados pela Syngenta com esta so-
normal”, diz Leandro.
lução é o fato de unir na mesma tecno-
Então quer dizer que o plantio de
logia duas aspirações antigas do setor: o
cana-tolete continuará presente no futu-
plantio de cana por “semente” e a cana
ro do setor? “De jeito algum, o plantio de
transgênica. Na produção desta semente,
cana-tolete precisa acabar e logo, pois é
a Syngenta incorpora um material geneti-
caro e ruim. Hoje custa R$ 7 mil por hec-
camente modificado que apresenta resis-
tare, demanda muita muda, muita mão de
tência a herbicidas e pragas, como a bro-
obra e o resultado não é bom. Para a Syn-
ca. “Toda tecnologia aplicada na semente
de soja e de milho a companhia introduziu
na semente de cana”, relata Bachner.
Daniel Bachner
e o novo Plene
Leandro salienta que o grande diferencial com o primeiro Plene é que aquele
tinha uma vida útil de quatro dias para ser
plantado. O novo Plene tem prazo de seis
meses com armazenamento a 12 graus e
quando coloca no campo tem alto vigor
de germinação. Pesa de 5 a 10 gramas e
serão utilizados de 150 a 200 quilos por
hectare. “Será possível plantar tranquilamente 60 hectares por dia, podendo otimizar o plantio na época ideal. Com cana
de 18 meses que tem melhor rendimento
e ter as melhores produtividades. A tecnologia vai reduzir entre 10 a 15% o custo da
tonelada de cana produzida.”
Para não ter nenhum gargalo logís-
60
Maio · 2015
A expectativa é que a semente de cana chegue ao mercado em 2017
tico no sistema de produção da semente,
ra até o final do ano, está na fase da pro-
hoje a empresa estuda a ideia de implan-
dução da semente e testes de campo den-
tar de quatro a cinco fábricas em diferentes
tro das áreas da Syngenta. Paralelamente,
pontos do país. De acordo com Bachner, o
está sendo desenvolvida uma máquina es-
melhor é que tais operações não vão pre-
pecífica para o plantio mecanizado da se-
cisar da implantação de viveiros de cana. O
mente de cana. “Hoje para o plantio de
material é produzido no laboratório. “O ob-
MPB, as máquinas plantam de 2 a 3 hecta-
jetivo é que se produza a semente duran-
re/dia, com a evolução irão plantar de 4 a
te o ano todo, de acordo com a demanda.”
5. A máquina do novo Plene plantará en-
Inicialmente, as sementes serão fei-
tre 40 a 90 hectares/dia”, informa Leandro.
tas das cinco variedades de cana mais
Mas esse futuro esmeralda do setor já tem
plantadas. Na segunda fase, as semen-
data para começar? “Sim, 2017.” É a previ-
tes serão também de novas variedades de
são de lançamento da semente de cana da
alta produtividade. O novo Plene, de ago-
Syngenta.
61
E CON OMIA
Com crise financeira, empresas
investem em turnaround dos negócios
Andréia Moreno, da MBF Agribusiness
U
ma expressão muito utilizada no
sustentável, surge a partir de uma série de
mundo corporativo é o turnarou-
medidas realizadas na estrutura operacio-
nd, que significa mudar substan-
nal das empresas, que possibilitem maior
cialmente o desempenho de uma empre-
margem em seus produtos, inclusive a re-
sa, ao retirá-la de uma rota de declínio
adequação da relação Capital Próprio X
para colocá-la, novamente, em crescimen-
Capital de Terceiros. Para Marcos Françóia,
to. Mas o redirecionamento para a obten-
diretor da MBF Agribusiness, as empresas
ção de resultados positivos, de maneira
precisam controlar esse indicador de capi-
62
Maio · 2015
tal de terceiros e saber como está oneran-
separando a emoção da razão e trazendo
do o resultado econômico. “Para muitas
ferramentas e relacionamentos diferencia-
empresas o custo financeiro já virou par-
dos com o mercado. “Isso tudo pode mu-
te do custo do produto final e não é mais
dar a visão sobre a qualidade da gestão e
conhecido, pois o risco de mercado ele-
dos gestores, trazendo maior credibilida-
va o valor dos serviços e da matéria-prima
de para as empresas e, com isso, ter aces-
na aquisição dos mesmos e muitos ges-
so mais fácil e mais barato ao mercado de
tores ou áreas de suprimentos não estão
capitais, inclusive na renegociação do en-
preparados para tratar adequadamente
dividamento atual, que tem sufocado mui-
esse assunto. Mas isso só não resolve a si-
tas empresas”.
tuação econômica das empresas. É preci-
Através de um plano de gestão pré-
so rever o processo produtivo, verificar a
definido e aprovado pelos acionistas ou
possibilidade de redução de custos, tratar
pelo Conselho de Administração, a MBF
da renegociação das dívidas, reorganizar
Agribusiness promove o turnaround em
os controles internos e readequar o papel
empresas de qualquer segmento do mer-
da contabilidade dentro da gestão (mui-
cado, visando reverter seus resultados
tos escritórios ainda são meramente emis-
econômicos-financeiros, garante Françóia.
sores de guias de impostos)”, diz.
“Esse plano provavelmente irá conter re-
Separar emoção da razão – De acor-
negociações com credores, realinhamento
do com ele, muitas vezes essa mudan-
dos custos de produção e despesas, revi-
ça necessita de um olhar crítico externo,
são dos processos e procedimentos em todas as áreas da empresa, inclusive preparando os profissionais para analisarem os
números e tomarem decisões mais acertadas. Pode ser um plano global de remodelagem, como um plano de alongamento do passivo financeiro”, revela.
Para fundos de investimentos e instituições financeiras, a vantagem em ter
na empresa especialistas na remodelagem
do sistema de gestão permite maior credibilidade, possibilitando que a instituição
avalie uma flexibilização nos prazos e até
Françóia: turnaround em
empresas visando reverter seus
resultados econômico-financeiros
mesmo nas taxas praticadas nos empréstimos, completa o executivo.
63
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
A indústria verde da cana
luta para sair do vermelho
SEM SAÚDE FINANCEIRA, A INDÚSTRIA BRASILEIRA PIONEIRA
NA TRANSFORMAÇÃO DA CANA EM ENERGIAS RENOVÁVEIS
PERDE TALENTOS, REDUZ PESQUISA E ENCOLHE
Luciana Paiva
A
cidade de Sertãozinho, no inte-
março sobre o mês anterior, encerrando o
rior paulista, é cercada por lavou-
primeiro trimestre com queda acumulada
ras de cana-de-açúcar, mas seu
no ano de 5,9%. Foi o pior resultado no
coração é industrial. Pulsam mais de 600
empresas distribuídas em quatro distritos
industriais.
mês de março desde 2006.
Mas em Sertãozinho, o quadro industrial é mais crítico. Muitas de suas in-
No geral, a situação da indústria bra-
dústrias estão na UTI, outras já fecharam
sileira é grave. Segundo relatório do Ins-
as portas. Isso ocorre porque cerca de 85%
tituto Brasileiro de Geografia e Estatística
das empresas atendem exclusivamente ao
(IBGE), divulgado em 6 de maio, a produ-
setor sucroenergético que vive uma cri-
ção da indústria nacional recuou 0,8% em
se que já dura quase oito anos e que já
fechou quase 80 usinas e colocou 67 em
Sertãozinho é a casa da Fenasucro, a maior
feira de tecnologia sucroenergética do mundo
recuperação judicial, segundo a Unica
(União da Indústria de Cana-de-Açúcar).
Luciana Paiva
64
Maio · 2015
O Centro Nacional das Indústrias do
Setor Sucroenergético e Biocombustíveis
(Ceise Br) considera ser um cenário sem
precedentes. Segundo a entidade, a crise é oriunda da combinação de alguns fenômenos, como o reajustamento do setor
com a entrada de grandes grupos multinacionais na produção de açúcar, álcool e
energia; fatores climáticos adversos; o setor público ter deixado de enxergar o etanol como prioritário com o advento do
Pré-Sal; a não priorização da produção de
“Não há contratação,
apenas demissão, diz Liboni
energia de biomassa; e preços insuficientes para remuneração do investimento na
queda do império canavieiro. Quando a
ponta da cadeia produtiva do setor, pro-
cana vai bem, seus indicadores econômi-
vocando um efeito em cascata.
cos batem recordes positivos, como aconteceu em 2006: a cidade liderou a geração
Confira vídeo
da passeata pela
retomada do setor
sucroenergético
realizada em Sertãozinho em 27
de janeiro de 2015 e que reuniu
quase 20 mil pessoas
de empregos no setor industrial paulista,
de acordo com dados do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp).
Somente no primeiro semestre daquele
ano, a variação positiva foi de 20,4%, com
a contratação de 6.300 trabalhadores. Era
o ápice da expansão canavieira embalada
pela expectativa da abertura do mercado
mundial ao etanol.
Mas quando a cana está em baixa, o
Sertãozinho:
economia movida à cana
doce azeda. “Neste mês de março, o índice
A crise atinge o setor sucroenergé-
no estado de São Paulo, foi de 0,6%, mas
tico nos quatro cantos do Brasil, mas Ser-
Sertãozinho registrou - 6,5%. Está nega-
tãozinho é emblemático, uma vez que se
tivo, ou seja, não há contratação, apenas
trata do maior polo de tecnologia sucro-
demissão. E a expectativa é que o mês de
energética do mundo. O município sen-
abril feche com - 7%”, salienta Carlos Ro-
te na pele os efeitos de cada ascensão e
berto Liboni, secretário de Indústria, Co-
de empregabilidade no Brasil foi de 0,12%,
65
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
mércio, Abastecimento, Agricultura e Re-
Proálcool: 40 anos
lações do Trabalho de Sertãozinho.
Sertãozinho foi quem mais abra-
Liboni conta que o menor índice de
çou o chamado governamental, na déca-
empregabilidade já registrado em Sertão-
da de 1970, para a produção de combus-
zinho, foi em 2008, com - 11%. Foi a época
tível verde. Criado durante a primeira crise
do anúncio da crise financeira global, que
mundial do petróleo, em 1975, o ProÁlco-
deflagrou no mundo canavieiro um tsuna-
ol (Programa Nacional do Álcool), além de
mi que passou a moer usinas, empresas,
reduzir a dependência do Brasil em relação
empregos, investimentos, produtividade e
à gasolina, trazia um novo horizonte para
colocando em risco a tecnologia verde de-
a matriz energética brasileira. Em sua pri-
senvolvida pela indústria brasileira.
meira fase, o objetivo foi utilizar o álcool
“É lamentável a situação do setor su-
anidro como aditivo à gasolina na propor-
croenergético”, diz Plínio Nastari, presi-
ção de 13%, em substituição ao chumbo
dente da Datagro Consultoria. Para Nasta-
tetraetila, que era importado e altamen-
ri, a crise no setor sucroenergético é mais
te poluente.
complexa do que em outras culturas agrícolas, pois além de afetar o campo, nocauteia a indústria, não só a sucroenergética
– a que transforma a cana em açúcar, etanol, energia e outros produtos – mas as
empresas que produzem equipamentos e
serviços para as usinas e também as suas
fornecedoras de matéria-prima. É uma cadeia, que compreende, segundo dados da
Unica, mais de 1.000 indústrias.
Shigeaki Ueki, ministro de Minas e
Energia na época do Proálcool, abastece
o primeiro carro 100% movido a álcool
66
Maio · 2015
pamentos Pesados SA, fabricante de equipamentos industriais, que entrou de cor-
Veja Vídeo de
Propaganda do
Proálcool na
Década de 1970
po e alma para desenvolver tecnologias e
ajudar a plantar destilarias pelo Brasil afora. Nas décadas de 1970 e 80, a Zanini se
transformou na mais importante empresa brasileira fornecedora de equipamentos pesados e detentora de tecnologia de
ponta para o setor canavieiro. Chegou a
ter 7 mil funcionários e a produção gira-
No final da década, em setembro de
va 24 horas.
1979, com a segunda crise do petróleo, o
Mas além de produzir tecnologia, a
governo federal e a Associação Nacional
empresa formou profissionais. Um de seus
dos Fabricantes de Veículos Automotores
maiores produtos foi a Escolinha da Zani-
(Anfavea) assinaram um protocolo pelo
ni, onde centenas de jovens aprenderam
qual os fabricantes deveriam desenvolver
a arte de moldar os metais, transforman-
novas tecnologias para a produção em sé-
do-os em equipamentos para montagem
rie de veículos movido a álcool. No mes-
de usinas e também de destilarias que se
mo ano, foi lançado o primeiro carro mo-
uniram às fábricas de açúcar nas usinas já
vido 100% com combustível verde feito
existentes ou foram implantadas indepen-
de cana-de-açúcar, o Fiat 147. O Proálco-
dentes, denominadas destilarias autôno-
ol ganhava raízes mais sólidas e se tornou
mas. A primeira delas foi a Destilaria Al-
o maior programa de combustível renová-
cídia, localizada em Teodoro Sampaio, SP,
vel do mundo.
longe dos tradicionais polos canavieiros,
Pesquisa realizada pela Datagro
pois uma das funções do ProÁlcool era
Consultoria aponta que a produção anu-
levar desenvolvimento para o interior do
al de cana no Brasil, que até 1969 era de
país. A construção da Destilaria Alcídia ini-
57 milhões de toneladas, com o Proálco-
ciou-se no ano de 1976. A primeira safra
ol, na década de 1970, alcançou a casa das
foi colhida em 1978.
300 milhões de toneladas. Mas só ter cana
A atual produção brasileira de etanol
não adiantava, era preciso tecnologia para
ilustra bem o sucesso do Proálcool: cresceu
transformar essa matéria-prima em álco-
de 555 milhões de litros em 1975/76 para
ol combustível. É aí que Sertãozinho gru-
28,6 bilhões de litros na safra 2014/2015,
da seu nome à cana-de-açúcar.
segundo projeção da Conab (Companhia
A cidade contava com a Zanini-Equi-
Nacional de Abastecimento).
67
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
Sertãozinho, com seus 110 mil habitantes, vive sob os humores da cana
Maior polo de tecnologia
sucroenergética do mundo
nasceu de uma crise
agroindústria canavieira demorou para as-
No dia 8 de maio de 1990, o então
principalmente destilarias autônomas, não
presidente Fernando Collor de Mello, por
sobreviveram à transição. A aquisição de
intermédio do Decreto 99.240, extinguiu o
equipamentos foi cortada no osso e a Za-
Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA). Cria-
nini, que já vivia uma crise de gestão, su-
do em 1933 dentro da política intervencio-
cumbiu. Em 1992 se fundiu à Dedini, outra
nista do presidente Getúlio Vargas, o Ins-
gigante em tecnologia sucroenergética,
tituto era uma autarquia de administração
com sede em Piracicaba, SP.
similar o golpe, até aprender a caminhar
com as próprias pernas. Muitas usinas,
federal que atuava como um agente re-
Na grande metalúrgica, que come-
gulador e planejador do setor sucroener-
çou como oficina Zanini em 1950, a mar-
gético nacional, definindo e monitorando
ca Zanini foi substituída por Dedini, segui-
quotas de produção de açúcar e álcool por
da por demissão em massa. A cidade de
usina, além de preços e mix de produto.
Sertãozinho estava ferida, mas longe de
Com o fim da regulamentação do setor, foi
estar morta. E a solução foi um espanto:
extinguido o Proálcool.
morreu a mãe Zanini, mas seus filhotes, os
Órfão de uma hora para outra, a
68
alunos de sua escolinha, aprenderam tão
Maio · 2015
bem o oficio que tiveram confiança para
tecnologia diferenciada, podemos chamá
abrir suas próprias empresas. A sementei-
-la de tecnologia verde, pois destina-se à
ra de talentos fez brotar no solo sertane-
produção de energias renováveis. Ajuda-
zino centenas de indústrias, o que levou à
mos a colocar o Brasil na vanguarda mun-
criação do maior polo de tecnologia su-
dial no que diz respeito a alternativas vi-
croenergética do mundo.
áveis ao uso dos combustíveis fósseis”,
salienta.
Tecnologia verde
Plínio Nastari concorda com Liboni e
ressalta que o etanol passou a ser impor-
meninos da Escolinha da Zanini, salien-
tante componente da matriz energética
ta que 100% da tecnologia sucroenergé-
brasileira e alçou o país a um dos grandes
tica é desenvolvida e produzida no Brasil,
consumidores de energia limpa e renová-
a maior parte em Sertãozinho. “E é uma
vel do mundo. Em quase 35 anos de uti-
FORÇA SINDICAL
O Secretário Liboni, que foi um dos
Neste mês de maio, funcionários da unidade da Dedini, em Sertãozinho,
entraram em greve por causa de atraso nos salários
69
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
90% dos carros
produzidos no
Brasil são flex
lização como combustível puro, o etanol
tem uma trajetória de altos e baixos. Passou a ser utilizado diretamente no tanque
dos veículos em 1979 e bastaram apenas
4 anos para igualar a gasolina na preferência dos veículos novos. Em 1985, o etanol
atingiu seu pico, com cerca de 90% dos
carros novos sendo movidos pelo combustível renovável.
Porém, no fim da década, o preço do
ma no motor do etanol produz em média
petróleo diminuiu, e a gasolina ultrapas-
25% menos monóxido de carbono e 35%
sou o álcool em 1990. Entre 1996 e 2002,
menos óxido de nitrogênio do que a quei-
foi praticamente zero a quantidade de ve-
ma da gasolina. Em 2014, a Unica desta-
ículos novos movidos a etanol. O combus-
cou que, desde 2003, quando foi introdu-
tível só ressurgiu em 2003, com a chegada
zido o motor flex no Brasil, o uso do etanol
dos motores flexíveis, que permitem que
já evitou a emissão de 240 milhões de to-
o motorista abasteça o tanque do veícu-
neladas de carbono, volume que corres-
lo com gasolina ou com etanol, de acordo
ponde a três anos de emissões de um país
com a escolha, e na proporção que prefe-
como o Chile.
rir. Foi nessa época que o combustível mu-
A pegada verde do etanol brasilei-
dou a denominação de álcool para etanol.
ro foi reconhecida pela Agência de Pro-
Desde 2005, a venda de automóveis total
teção Ambiental dos Estados Unidos (En-
flex predomina: 90% dos carros produzi-
vironmental Protection Agency, EPA) que
dos no Brasil são flex.
confirmou que o etanol de cana-de-açúcar é um biocombustível renovável de bai-
Combustível avançado
xo carbono, capaz de reduzir as emissões
Antonio de Padua Rodrigues, dire-
de gases do efeito estufa em pelo menos
tor-técnico da Unica, salienta que a quei-
50% comparado com a gasolina. Evidên-
70
Maio · 2015
ge uma redução de 73% a 82% nas emissões de gases de efeito estufa comparado à gasolina. O etanol de cana ganhou
da EPA o status de combustível avançado.
A indústria verde
alimenta a lavoura
Mas a tecnologia verde sucroenergética não se resume à produção de etanol:
Jaime Finguerut, assessor técnico da presidência do CTC (Centro de Tecnologia Canavieira), observa que, com o ProÁlcool,
surgiram outros resíduos como a vinhaça
e torta de filtro. A vinhaça é um resíduo do
processo de destilação, fonte rica em potássio e que também tem cálcio, magnécias científicas apresentadas à EPA pela
sio, enxofre e micronutrientes. Cada litro
Unica mostram que mesmo incluindo-se
de álcool fabricado gera outros 13 litros
emissões indiretas, o etanol de cana atin-
de vinhaça. Já a torta de filtro é mistura
O etanol da cana é capaz de reduzir as emissões de gases do
efeito estufa em pelo menos 50% comparado com a gasolina
71
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
de bagaço moído e lodo da decantação,
ram muito valor nas usinas, pois se torna-
resultando em material rico em fósforo,
ram fonte de receita e, de resíduos passa-
além de ser fonte de cálcio, magnésio, en-
ram para a categoria de subprodutos. As
xofre e micronutrientes.
unidades passaram a racionalizar o uso e
Há várias opções de uso para a vinha-
melhorar o aproveitamento para reduzir a
ça como: produção de gás metano; ração
utilização de adubos químicos da lavoura.
animal; utilização como adubo na lavoura
“O setor se tornou um exemplo de reutili-
ou queima para a produção de fertilizante;
zação racional no próprio sistema produti-
e a utilização agrícola do resíduo in natu-
vo. O Brasil é o país mais desenvolvido na
ra, em substituição total ou parcial às adu-
utilização dos subprodutos da cana na la-
bações minerais.
voura”, afirma Finguerut. Além da vinhaça,
A vinhaça e a torta de filtro ganha-
a cana fornece um composto de nutrien-
A vinhaça sai da indústria e alimenta a lavoura
72
Maio · 2015
73
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
tes formado pela torta de filtro, bagacilho,
cinzas e fuligem, que substituem a adubação química em até 60%.
A Luz que Vem da Cana
Da cana se tira não apenas o açúcar,
etanol e energia, ressalta Finguerut. Muitas
empresas do setor sucroenergético obtêm
renda ao explorar outros produtos possíveis a partir do processamento da cana,
como óleo fúsel, levedura, RNA (Sal Sódico do Ácido Ribonucléico), este último utilizado na indústria farmacêutica e alimentícia como matéria-prima e também como
realçador de sabor.
Mas é a energia elétrica que tem o
maior potencial de se transformar no primeiro produto do setor, atualmente, apesar de ser o mais remunerador, ocupa a
terceira posição, atrás do açúcar e etanol.
A maior caldeira de leito fluidizado borbulhante
do Brasil foi produzida em Sertãozinho
A comercialização do excedente de
energia vinda da cana começou em 1987,
uma fonte 100% renovável. Era o pontapé
quando a pequena cidade de Barrinha, no
inicial para a comercialização da bioeletri-
interior paulista, passou a ser iluminada
cidade proveniente da biomassa da cana.
pela energia elétrica gerada por meio do
O grande impulso à energia da bio-
bagaço de cana. Diferentemente da ener-
massa veio com a crise energética vivida
gia proveniente das hidroelétricas, a ener-
entre julho de 2001 a fevereiro de 2002,
gia da biomassa da cana não percorria
chamada de “crise do apagão”, que le-
centenas de quilômetros até chegar em
vou o governo Fernando Henrique a lan-
Barrinha. Era produzida ali no quintal da
çar planos de incentivo às energias alter-
cidade, na Usina São Francisco, do Grupo
nativas, entre as quais, a mais viável, é a
Balbo, instalada na vizinha Sertãozinho.
bioeletricidade, uma energia limpa e reno-
A São Francisco entrava para a his-
vável, feita a partir da biomassa: resíduos
tória: era a primeira unidade sucroenergé-
da cana-de-açúcar (bagaço e palha), res-
tica a exportar energia elétrica obtida de
tos de madeira, carvão vegetal, casca de
74
Maio · 2015
75
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
arroz, capim-elefante e outras.
No Brasil, 80% da bioeletricidade
vem dos resíduos da cana-de-açúcar. Cada
cesso, suas indústrias desenvolveram a
tecnologia que possibilitou às usinas alcançar este novo patamar.
tonelada de cana moída na fabricação de
bagaço e 200kg de palha e pontas. Mas
O Brasil exporta
tecnologia verde
para ampliar o poder de geração de ener-
Desenvolver tecnologias para outros
gia dessa fonte, era preciso tecnologias
segmentos além do canavieiro foi um dos
mais modernas, por exemplo, o parque in-
caminhos seguidos pelas indústrias ver-
dustrial sucroenergético precisava aban-
des, o outro foi buscar mercado fora do
donar as caldeiras de 21 quilos por caldei-
Brasil. Muitos daqueles negócios embrio-
ras de alta pressão, era preciso reduzir o
nários nascidos com o fim da Zanini trans-
consumo de vapor e utilizar equipamen-
formaram-se em empresas exportadoras
tos mais seguros.
de alta tecnologia. Uma dessas empresas
açúcar e etanol gera, em média, 250kg de
Mais uma vez, a indústria verde da
é a TGM, com clientes em 40 países nos
cana entrou em ação e desenvolveu tec-
cinco continentes. A exportação responde
nologia de ponta para a produção de bio-
por mais de 60% da produção da empresa.
eletricidade. E Sertãozinho liderou o pro-
“Desenvolver soluções que possibili-
Cada tonelada de cana moída na fabricação de açúcar e etanol gera, em média, 250kg de bagaço
76
Maio · 2015
A TGM gera quase
1 mil empregos
tam gerar energias renováveis é pensar na
segurança das plantas, dos equipamentos, é vender o excedente de energia para
geração de caixa, é trazer competitividade no preço e no produto, é reduzir custo
operacional, é gerar emprego na cidade e
em toda região onde a planta está instalada, ou seja, é um conjunto de ações que
resultam em pontos positivos e benéficos
para toda a cadeia produtiva”, diz Adalberto Marchiori, coordenador de Marketing da TGM.
Adalberto salienta que a TGM vai
muito além do setor sucroenergético. Ela
pesquisa, desenvolve e aplica soluções integradas com fornecimento de turbinas
Em 2014, a TGM forneceu os dois
a vapor, redutores de velocidade e servi-
maiores redutores planetários do mundo
ços especializados em diversos segmen-
para acionamento de moendas e difuso-
tos. Em março de 2014, foi inaugurada a
res. Um entregue à Sermasa para instala-
primeira planta de cogeração de energia
ção na BP Tropical (Unidade Edéia, GO) e
a vapor a partir da queima de biomassa
o outro para a Usina Tanabi (Guarani SA).
de eucalipto, no Complexo Industrial de
A maior turbina a vapor desenvolvi-
Aratu, em Candeias, BA. O projeto, pio-
da e fabricada pela TGM, para geração de
neiro no setor petroquímico e o primei-
energia elétrica, não está no Brasil, mas na
ro da ERB em parceria com a TGM a en-
Guatemala, em plena operação na Com-
trar em funcionamento no Brasil, abastece
panhia Guatemalteca de Níquel (Guate-
a maior unidade da Dow, com energia lim-
malteco Nickel Company SA - CGN. A TGM
pa. O equipamento fornecido é uma Tur-
tem 15 unidades operando na Europa com
bina TGM de reação de 17 MW de potên-
turbinas instaladas em planta de gera-
cia. Com este projeto, a Dow substitui 150
ção de energia elétrica a partir da queima
mil metros cúbicos diários de gás natural.
do lixo. Ao invés do resíduo sólido urba-
77
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
no (lixo) segue para os aterros, segue para
O plano era previsto para durar três
as térmicas resultando uma ação mais efi-
meses, mas mesmo com o início da sa-
ciente e, ambientalmente correta.
fra, foi renovado, pois a situação continua
crítica. Mas na opinião de Antonio Eduar-
Pacto social
do Tonielo Filho, presidente do Ceise-Br, o
Em novembro de 2014, a Prefeitu-
cenário atual, apesar de ainda ser preocu-
ra de Sertãozinho e mais 17 entidades de
pante, é melhor que o ano passado, pois
classe sertanezinas, colocaram em práti-
algumas das reinvindicações da cadeia
ca um plano emergencial para amenizar
produtiva do setor – que dependem de
o agravamento da crise econômica com a
políticas públicas –, foram atendidas, tais
chegada da entressafra canavieira. O pla-
como: a volta parcial da CIDE (Contribui-
no foi um pacto social, tendo a tolerância
ções de Intervenção no Domínio Econô-
como base. “Sabemos que haverá atrasos
mico) na gasolina; o aumento de 25% para
de pagamento e aumento de inadimplên-
27% de anidro na gasolina; a liberação de
cia, então, pediremos aos credores, prin-
crédito para warrantagem; e realização de
cipalmente bancos, paciência para passar-
leilões de energia específicos para a bio-
mos os meses de novembro e dezembro”,
massa. “Além dessas iniciativas do gover-
salientou Liboni na época.
no federal, temos a redução do ICMS para
A TGM exporta tecnologia verde para 40 países
78
Maio · 2015
Tonielo Filho:
“Retrofit, o caminho
mais curto para a
retomada do setor”
positivo no setor seria o governo federal atender ao pleito
do Ceise Br e outras
o etanol em Minas Gerais, que provocou
entidades do setor, para a implantação de
um impacto imediato no consumo de eta-
um programa de ‘retrofit’ em unidades
nol. Há também a desoneração de algu-
produtoras, possibilitando a cogeração de
mas matérias-primas por iniciativa do go-
pequenas e médias unidades.
verno do Estado de São Paulo”, diz Tonielo
Filho.
É a mesma opinião de Liboni, “para
produzir mais energia é preciso renovar o
No entendimento da entidade, a
parque industrial das usinas. Os pedidos
combinação dessas medidas, desde que
de novos equipamentos farão com que a
mantidas e combinadas com a renegocia-
roda volte a girar, as indústrias fornecedo-
ção de dívidas e crédito para investimen-
ras de produtos e serviços parem de demi-
tos, devem provocar no médio e longo
tir, podendo até recontratar e a economia
prazo a volta da confiança de investido-
do município voltará a aquecer. O Brasil
res, possibilitando um círculo virtuoso de
precisa de energia, e a bioeletricidade é a
crescimento. Mas, o Presidente do Ceise
energia mais barata e pode ser obtida em
Br, diz só ter certeza que isso só ocorre-
curto espaço de tempo. Mas as usinas pre-
rá se a produção de etanol e de energia se
cisam de dinheiro para investir. ”
tronar prioritária para o governo, optan-
Conseguir condições para retrofitar
do por uma energia renovável, sustentável
as usinas e assim tirar o setor da crise tem
ambientalmente e que melhora os resulta-
sido uma das missões de Antonio Galla-
dos de nossa balança comercial.
ti, diretor da TGM e um dos fundadores
da empresa. Ex-aluno da Escolinha da Za-
Retrofit: caminho para
a retomada do setor
nini, Gallati é apaixonado por tecnologia,
Na visão de Tonielo Filho, no curtís-
quando soluções viáveis, como a energia
simo prazo, o que poderia provocar efeito
pelo setor e pelo país, e fica inconformado
da biomassa, não são adotadas.
79
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
Gallati: “O retrofit vai
reaquecer a cadeia
sucroenergética”
Estudo realizado pela TGM
apontou que no Brasil, 230 usinas moem na faixa de 1,5 milhão
a 2 milhões de toneladas de cana.
E dessas 230, 190 estão sucateadas. Com o sucateamento e a falta de ma-
pode mudar esse cenário.
nutenção as paradas durante a safra são
Por isso, Gallati munido por um ela-
mais frequentes, aumentam as perdas no
borado projeto de retrofit desenvolvido
processo e o custo de produção. Indo jus-
pela TGM, iniciou uma maratona para ten-
tamente ao contrário do que a empresa
tar viabilizá-lo. Suas visitas são constantes
precisa para se manter viva: aumentar a
aos ministérios, como o de Minas e Ener-
produtividade e reduzir custos. E o retrofit
gias, ao BNDES (Bando Nacional de De-
A crise reduziu até mesmo a manutenção das usinas; o parque industrial está sucateado
80
Maio · 2015
senvolvimento Social), e a Secretaria de
que a usina não tenha de fazer a linha de
Energia do Estado de São Paulo. O relató-
transmissão e conexão de energia.
rio apresenta todos os pontos essenciais
Cada uma dessas usinas que moem
para a viabilidade do retrofit, inclusive le-
entre 1,5 milhão e 2 milhões de toneladas,
vantou 30 usinas no interior paulista que
apurou a TGM, se forem retrofitadas terá
estão mais próximas das linhas de trans-
10 MW/h de sobra de energia, que pode-
missão de energia, e, por isso, demandará
rá ser comercializada, representando au-
A luz produzida nas usinas de cana já ilumina 5 milhões de residências no Estado de São Paulo
menos recursos, reduzindo o valor do in-
mento de caixa de R$ 11 milhões no ano.
vestimento no projeto de retrofit.
Também ganharão com a redução no cus-
O investimento para retrofitar uma
dessas unidades será de R$ 50 milhões.
to de produção de etanol e energia, resultado de maior eficiência da indústria.
Na comercialização de energia nessas em-
A aprovação do retrofit irá aquecer a
presas retrofitadas, Gallati observa que R$
cadeia sucroenergética, pois muitas plan-
250,00 cobre o valor do megawatt, desde
tas terão de ser renovadas quase que inte-
81
TE C NOLOGIA IN D U STRIAL
O uso da palha reforça a produção de energia elétrica proveniente da cana
gralmente, Gallati calcula que em um perí-
equivalente a quase 30% de todo o consu-
odo de 10 anos é possível retrofitar umas
mo residencial do Estado de São Paulo. Do
20 usinas. O BNDES acenou financiar pro-
equivalente a 54 mil habitantes, abasteci-
jetos de retrofit, mas não cobre os inves-
dos pela bioeletricidade em 1987, o setor
timentos em linhas de transmissão. En-
passou na última safra para mais de 5 mi-
tão, Gallati tem buscado a cooperação do
lhões de residências, ou 21 milhões de pes-
governo paulista para assumir essa parte.
soas, utilizando energia da cana-de-açúcar
“Precisamos pressionar para ver se sai pe-
durante o ano inteiro.
los menos uns dois projetos este ano, o
que já seria um alento para o setor”, diz.
Considerando dados de 2013 e 2014,
Zilmar de Souza, gerente de bioeletricida-
Atualmente, 127 unidades sucroener-
de da Unica, destaca que a biomassa é
géticas exportam bioeletricidade no Brasil,
responsável atualmente por aproximada-
segundo pesquisa da consultoria Datagro.
mente 4,5% do consumo de energia elétri-
A energia do bagaço vendida para a rede é
ca do Brasil, sendo que o bagaço e a palha
82
Maio · 2015
da cana-de-açúcar correspondem a mais
de 80% de todas as fontes de biomassa
utilizadas no país.
go e renda no país”, diz Tonielo Filho.
O Ceise Br vai aproveitar esta data,
para, mais uma vez, refletir sobre as difi-
Em 2014 o setor sucroenergético ge-
culdades e apontar soluções para a reto-
rou quase 21 mil GW/h para a rede, diz Zil-
mada do desenvolvimento e crescimento
mar, (a hidrelétrica de Belo Monte irá gerar
desta indústria, com a realização de uma
11 GW/h a partir de 2019, quando estiver
palestra do Prof. Dr. Rudinei Toneto Junior,
em funcionamento pleno). “Se todo o ba-
com o tema “Conjuntura e Benefícios da
gaço e palha fossem aproveitados pelas
Efetivação de um Arranjo Produtivo Local”.
usinas seria possível gerar seis vezes mais
O Secretário Liboni diz que a data
energia do que este patamar de 21 GW/h.
não pode passar em branco. “Não pode-
É impossível concretizá-lo da noite para o
mos esquecer dessa tecnologia fantásti-
dia. Mas é possível afirmar que é rápida
ca que desenvolvemos. A tecnologia ver-
a resposta do setor aos estímulos. Um in-
de que o mundo procura, nós já temos.
dicador deste potencial foi registrado em
Vamos aproveitar o Dia da Indústria para
2010. Com política favorável e alguma an-
mais uma vez reivindicar ações para tirar
tecedência, chegamos a acrescentar num
nossas indústrias do vermelho.”
único ano 1,8 GW/h”, salienta o gerente de
energia da Unica.
Há o que comemorar
no Dia da Indústria?
Há três anos, a diretoria do Ceise Br
resolveu comemorar o Dia da Indústria, 25
de maio, de uma forma diferente. Trocou a
festa por seminários para refletir sobre os
riscos, oportunidades e desafios do setor.
“Logicamente, num primeiro momento,
podemos chegar à conclusão de que o cenário atual não é de comemoração, pois a
indústria de base do setor sucroenergético
atravessa uma crise sem precedentes. Mas
vejo que temos que comemorar a história
deste empresariado que acredita e acreditou no setor, gerando tecnologia, empre-
Zilmar: “se todo o bagaço e palha fosse
aproveitado pelas usinas, seria possível
gerar seis vezes mais energia do que
o patamar atual de 21 GW/h”
83
P E SQU ISA & D E SE N VOLV I MENTO
Ao invés de fazer
alguns solventes
do petróleo, é
possível fazer do
bagaço de cana
A cana e a química verde
A QUÍMICA VERDE TEM A SUSTENTABILIDADE COMO PONTO DE
PARTIDA. REFERE-SE A PRODUTOS E PROCESSOS DIRETAMENTE
RELACIONADOS AO USO DE TECNOLOGIAS LIMPAS
Clivonei Roberto
U
m dos campos mais avançados
químicos que possam minimizar ou elimi-
dentro da cadeia de valor da ca-
nar substâncias prejudiciais tanto à saúde
na-de-açúcar e que liga o setor
como ao meio ambiente.
com o futuro é a Química Verde, que abre
A Química Verde tem a sustentabi-
um vasto espectro de possibilidades de
lidade como ponto de partida. Refere-se
produtos de alta qualidade e menor im-
a produtos e processos diretamente re-
pacto ambiental.
lacionados ao uso de tecnologias limpas,
Segundo a pesquisadora Maria Tere-
em que há controle mais rigoroso quan-
sa Borges Pimenta Barbosa, do CTBE (La-
to à menor emissão de poluentes, menor
boratório Nacional de Ciência e Tecnologia
produção de resíduos e efluentes, uso de
do Bioetanol), Química Verde é o desen-
menos energia, mínima aplicação de pro-
volvimento de tecnologias para a obten-
dutos tóxicos, redução de impactos am-
ção tanto de processos como de produtos
bientais. E diferentes alternativas podem
84
Maio · 2015
ser consideradas, como os processos em
nhar viabilidade econômica. A área de
que se substitui o petróleo e seus deriva-
cana-de-açúcar para etanol no país re-
dos por biocombustíveis para a obtenção
presenta em torno de 1,2% das áreas
do mesmo produto.
agricultáveis, o que é menos de 25% da
O avanço da Química Verde é uma
área ocupada para a produção de milho e
tendência crescente, segundo a pesquisa-
12,5% da área ocupada com a soja. Con-
dora. “No momento, buscamos chegar a
siderando, por exemplo, a quantidade de
produtos de química verde cujos proces-
etanol necessária para produzir 200 mil to-
sos sejam viáveis. Com muitos deles ain-
neladas de eteno verde (a matéria-prima
da estamos em fase de desenvolvimento
para o polietileno), seria necessário em ca-
e estes processos também vão sofrer as
naviais o correspondente a apenas 0,02%
mesmas dificuldades para depois se es-
das áreas agricultáveis brasileiras.
tabelecerem. A tecnologia ainda está em
amadurecimento”, explica.
A aposta do CTBE nesta área de pesquisa é grande. “Pesquisamos blocos químicos de fontes renováveis (produtos de-
A viabilidade da cana
para a química verde
rivados da biomassa), o que inclui na lista
No Brasil, o investimento neste tipo
produtos derivados de alcoóis, falamos de
de tecnologia é promissor, mas requer a
continuidade dos investimentos para ga-
os alcoóis. Neste caso, quando visamos
alcoolquímica.”
O desenvolvimento de cada produto
“No mundo, há
uma tendência de
mercado crescente
para a bioenergia
e a química verde”,
diz a pesquisadora
85
P E S Q U ISA & D E SE N VOLV IMENTO
ou via tecnológica não é simples e tem um
cos que hoje são produzidos pela rota pe-
tempo específico de maturação. Dentre os
troquímica e podem ser produzidos pela
produtos da química verde, Maria Tereza
biomassa (alcoolquímica).”
destaca os polímeros, que vêm da rota do
“No mundo, há uma tendência de
etanol de primeira geração (um combustí-
mercado crescente para a bioenergia e a
vel renovável e limpo) para a produção do
química verde”. E a torcida é para que, no
polietileno verde, que já é uma realidade
futuro, os produtos feitos a partir de maté-
do mercado.
rias-primas renováveis e limpas sejam di-
Maria Teresa afirma ainda que exis-
ferenciados no mercado (etiqueta verde) e
tem diversos outros blocos químicos que
sejam remunerados por essa característica.
podem ser produzidos a partir da cana-de
O desafio é conferir à Química Verde
-açúcar, além do biocombustível. “Ao invés
a valorização que merece. Afinal, corres-
de fazer alguns solventes do petróleo, é
ponde a tecnologias que têm a sustenta-
possível fazer do bagaço.” Ela cita ainda al-
bilidade no DNA. É resultado de uma atu-
guns blocos químicos: biobutanol; o pró-
ação responsável e proativa na gestão dos
prio etanol de segunda geração; ácidos
impactos ambientais, sociais e econômi-
orgânicos, como o ácido acético; fenóis;
cos gerados pelas atividades da empresa,
hidroximetilfurfural etc. “São muitos blo-
envolvendo toda cadeia produtiva.
Existem diversos
outros blocos
químicos que podem
ser produzidos a
partir da cana-deaçúcar, além do
biocombustível
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Maio · 2015
GE S TÃ O D E P E SSOAS
Mantendo a chama acesa
NESSE MOMENTO DE CRISE, É VITAL MANTER O FUNCIONÁRIO BEM
INFORMADO, APOIADO E ENVOLVIDO NO PROCESSO DE BUSCA DE SOLUÇÕES
Manifestação em Sertãozinho, em janeiro de 2015, reivindicando a retomada do setor. Algumas
medidas vieram como aumento da adição de etanol na gasolina, mas pouco efeito causaram
Leonardo Ruiz
O
setor sucroenergético vem pas-
sões. Somente a cidade paulista de Ser-
sando por uma intensa crise nos
tãozinho, mais importante polo sucroe-
últimos anos. Desde 2008, 80 usi-
nergético do Brasil, onde mais de 70% do
nas foram fechadas no país e outras 67 es-
Produto Interno Bruto (PIB) está ligado à
tão em processo de recuperação judicial. E
cadeia produtiva de açúcar e etanol, per-
essa quebra das usinas afetou, ainda, a in-
deu, segundo dados do Cadastro Geral de
dústria de base. Juntas, essas empresas fe-
Empregados e Desempregados (CAGED),
charam 2014 com uma dívida acumulada
mais de 2.200 postos de trabalho na in-
de mais de R$ 60 bilhões de reais.
dústria no último ano. Antes da crise, o
Tudo isso tem gerado muitas demis-
número de funcionários ligados ao setor
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FORÇA SINDICAL
GE S TÃ O D E P E SSOAS
Paralisação dos funcionários da Dedini em Sertãozinho: salário atrasado
canavieiro na cidade era de 15 mil. Hoje,
Diálogo
esse número não passa de nove mil.
Para a consultora, palestrante e con-
Mesmo os que ainda estão empre-
selheira de carreiras, Beatriz Rossi Resende
gados não podem respirar aliviados, pois
de Oliveira, esse tipo de situação deve ser
a crise não acabou. Muitas empresas, em
tratado com muito respeito, transparência
profundas dívidas, estão atrasando o pa-
e apoio mútuo. “Nesse cenário, é impor-
gamento dos salários e benefícios, afe-
tante que haja um entendimento, envolvi-
tando a vida dos trabalhadores que ficam
mento, compreensão e apoio mais efetivo
sem saber informações sobre o futuro das
dos colaboradores, não para entender so-
companhias e dos próprios empregos.
bre os salários atrasados, mas para ajudar
Por conta dos salários atrasados, inclusive, os funcionários da metalúrgica De-
a empresa a passar pela crise da melhor
forma possível, ou com menos traumas”.
dini S/A entraram em greve no início de
Mas não são apenas os funcionários
maio, em Piracicaba, SP. Segundo o Sindica-
que devem alterar suas atitudes. As em-
to dos Metalúrgicos do município, a empre-
presas também precisam ser melhores nos
sa pagou apenas R$ 1 mil para cada um dos
posicionamentos e posturas que adotam
funcionários porque o restante do dinheiro
nesse momento. Beatriz afirma que os di-
foi bloqueado na Justiça para quitar dívidas.
rigentes, gestores, líderes, áreas de Re-
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Maio · 2015
cursos Humanos (RH) e demais represen-
ser tratadas com respeito, amadurecimen-
tantes da empresa dentro da organização
to e honestidade”.
têm que trabalhar a comunicação de uma
A consultora ressalta que falar em
forma estruturada, transparente e hones-
motivação em um momento de crise é
ta, garantindo uma disseminação dela de
muito difícil, pois, geralmente, quem te-
maneira uniforme e assertiva. “Não é hora
ria que passar a mensagem de motivação
de se esconder ou fingir que nada está
também está desmotivado. “E ainda tem o
acontecendo. Temos que ser competen-
fato de que motivação não vem de fora, e
tes e responsáveis em todos os momen-
sim de dentro das pessoas”.
tos. Assim como é difícil no papel geren-
Para Beatriz, em vez de falar em man-
cial dar feedbacks e fazer desligamentos
ter o colaborador motivado, o ideal seria
de pessoas, também em momentos como
falar em manter o funcionário bem infor-
este precisamos tratar tudo com muita
mado, apoiado e envolvido no processo
elegância, por mais difícil que seja. É ne-
de busca de soluções por parte da empre-
cessário e nos fortalece. As pessoas que
sa e de suas equipes no tratamento e con-
nos apoiam, e que fazem parte de um time
dução dessa fase.
que nós elegemos, têm que, no mínimo,
Segundo ela, é importante que as
empresas proporcionem aos colaboradores, ou estimulem neles, pensamentos positivos e visões menos pessimistas, mesmo dentro de um cenário delicado. “Claro
que isso não é fácil, mas pode ser possí-
“Não é hora de
se esconder ou
fingir que nada
está acontecendo”,
diz Beatriz
vel, sendo que, se conseguirmos atingir alguns, isso já pode ser considerado como
um ganho no processo.”
Beatriz indica uma prática que pode
ser realizada visando essa meta: mapear
pessoas na organização que estejam dispostas a serem multiplicadoras de pensamentos menos catastróficos. “Em cenários
de insegurança, medo, ansiedade e dúvidas, o que menos precisamos é de pessoas, líderes e áreas de RH, contaminados e
sendo agentes de contaminação de pessimismo e negativismo crônicos”.
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GE S TÃ O D E P E SSOAS
Papel do RH
triz Rossi Resende de Oliveira.
Obviamente que, durante uma cri-
Ela explica que, antes da crise, a área
se como essa, as áreas de RH das empre-
de RH vinha conseguindo maiores espa-
sas procurem enxugar projetos, progra-
ços para uma atuação mais ampliada e es-
mas e ações mais estratégicas de gestão
tratégica nas empresas, onde se via orga-
de pessoas. Porém, esse seria o momento
nizações do segmento encorpando suas
em que elas mais precisariam da atuação
áreas de RH dentro de modelos contem-
estratégica de RH, planejando e promo-
porâneos com atuação focada em con-
vendo ações e intervenções que visem a
sultoria interna, amplitude corporativa e
manutenção do clima, dos ânimos, do de-
projetos e ações voltadas ao desenvolvi-
sempenho e da sinergia.
mento de pessoas. “Esse cenário conquis-
“Isso é extremamente necessário e
tado me deixa muito feliz e realizada. Eu
não é enxugando as áreas de RH e voltan-
acredito que, em breve, estaremos escre-
do para o básico que vamos obter esses
vendo e discutindo a importância da ges-
resultados. Remodelar, inovar, trazer no-
tão de pessoas para o sucesso do negócio.
vos desafios às equipes dessa área, isto
Além disso, posso afirmar que estaremos
sim. Pois, para se ter força, credibilida-
todos, daqui a um tempo, colhendo a par-
de e dar a cota necessária de contribui-
te boa do que as crises e mudanças nos
ção numa crise como essa, temos que ser
impõem, mesmo que a caminhada, nesse
muito bons. Não dá para sermos simples-
momento, esteja sendo dura e desgastan-
mente básicos”, afirma a consultora Bea-
te”, completa.
Fuzi-Tec, em Sertãozinho, dispensou 150 funcionários em 2014
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