Classificação de risco na emergência Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación CLASSIFICAÇÃO DE RISCO NA EMERGÊNCIA: AVALIAÇÃO DA EQUIPE DE ENFERMAGEM RISK RATING IN THE EMERGENCY DEPARTMENT: ASSESSMENT OF THE NURSING TEAM CLASIFICACIÓN DE RIESGO EN LA EMERGENCIA: EVALUACIÓN DEL EQUIPO DE ENFERMERÍA Eliane Regina Pereira do Nascimento1 Bárbara Rosso HilsendegerII Caroline NethIII Guilherme Mortari BelaverIV Kátia Cilene Godinho BertoncelloV RESUMO: Trata-se de um estudo descritivo com abordagem qualitativa cujo objetivo foi conhecer e analisar como os profissionais de enfermagem de um serviço de emergência hospitalar avaliaram o acolhimento com classificação de risco (ACR). A coleta de dados ocorreu em abril e maio de 2010, através de entrevista semiestruturada, com 13 profissionais de enfermagem (três enfermeiras e 10 técnicos em enfermagem), do serviço de emergência de um hospital público de Santa Catarina. Para o tratamento dos dados, adotou-se o discurso do sujeito coletivo. Dos relatos surgiram dois temas: mudanças no atendimento com a implantação do ACR e dificuldades para a sua realização. Para a análise dos discursos, utilizou-se o ACR, além das referências bibliográficas consultadas. O estudo evidenciou que houve melhora no atendimento, porém a falta de referência e contrarreferência dificulta a garantia de um atendimento de qualidade aos usuários e gera insatisfação dos profissionais de enfermagem. Palavras-chave: Emergências; acolhimento; classificação; enfermagem. ABSTRACT: This qualitative, descriptive study aimed to ascertain and examine how nursing personnel in a hospital emergency service evaluate reception with classification of ryisk (RCR). Data were collected in April and May 2010 by semi-structured interview of thirteen nursing personnel at a public hospital emergency service in Santa Catarina, and were treated by collective subject discourse analysis. Two themes emerged from the interviews: changes in care following introduction of RCR and difficulties in providing such care. Discourse analysis was conducted using RCR, in addition to the bibliographical references consulted. The study revealed that care had improved with RCR, but lack of referral and counter-referral made it difficult to ensure a quality service and generate dissatisfaction among nursing personnel. Keywords: Emergencies; user embracement; classification; nursing. RESUMEN: Se trata de un estudio descriptivo con enfoque cualitativo cuyo objetivo fue conocer y analizar como los profesionales de enfermería de un servicio de emergencia hospitalario evaluaron el acogimiento con clasificación de riesgo (ACR). La recolección de datos acaeció en abril y mayo de 2010, por medio de entrevista semiestructurada, con 13 profesionales de enfermería (tres enfermeros y 10 técnicos de enfermería), del servicio de emergencia de un hospital público de Santa Catarina-Brasil. Para el tratamiento de los datos, se adoptó el discurso del sujeto colectivo. De las declaraciones surgieron dos temas: cambios en el atendimiento con la implantación del ACR y dificultades para su realización. Para el análisis de los discursos, se uso el ACR, además de las referencias bibliográficas consultadas. El estudio evidenció que hubo mejora en el atendimiento, pero la falta de referencia y contrareferencia dificulta la garantía de un atendimiento de calidad a los usuarios y genera insatisfacción de los profesionales de enfermería. Palabras clave: Emergencias; acogimiento; clasificación; enfermería. INTRODUÇÃO As unidades de emergência são serviços geralmente existentes em hospitais de médio ou grande porte, nos quais são recebidos pacientes em situações de urgência e emergência, graves, potencialmente graves, que necessitam de recursos tecnológicos e humanos especializados e preparados para o seu atendimento e a sua recuperação1. I Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Adjunta IV do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Coordenadora do Grupo de Estudo no Cuidado de Pessoas nas Situações Agudas de Saúde. Florianópolis, Santa Catarin a, Brasil. E-mail: [email protected]. II Acadêmica da 8a Fase do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Membro do Grupo de Estudo no Cuidado de Pessoas nas Situações Agudas de Saúde. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mail: [email protected]. III Acadêmica da 8a Fase do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Membro do Grupo de Estudo no Cuidado de Pessoas nas Situações Agudas de Saúde. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mail: caroline@ho tmail.com. IV Acadêmico da 8a Fase do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Membro do Grupo de Estudo no Cuidado de Pessoas nas Situações Agudas de Saúde. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mail: [email protected]. V Enfermeira. Doutora em Enfermagem Fundamental pela Universidade de São Paulo. Professora Adjunta II do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina. Pesquisadora do Grupo de Estudo no Cuidado de Pessoas nas Situações Agudas de Saúde. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil. E-mail: [email protected]. p.84 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 jan/mar; 19(1):84-8. em: 29.10.2010 – Aprovado em:07.02.2011 10.01.2011 RecebidoRecebido em: 04.11.2011 – Aprovado em: Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación Esses serviços têm por característica uma alta rotatividade de pessoas, e foram criados para prestar atendimento imediato a pacientes com agravo à saúde, a fim de oferecer serviços de alta complexidade e diversidade para atender a essa demanda e garantir todas as manobras de sustentação à vida, com condições de dar continuidade à assistência no local ou em outro nível de atendimento referenciado1. Entretanto, grande parte da população não tem acesso regular a um serviço de saúde, contribuindo para condições inadequadas de vida e a utilização caótica dos serviços de emergência (SE), seja para atendimentos relacionados a doenças crônicas ou situações em que pouco se tem a fazer2. Ainda com relação a esse aspecto, a falta de leitos para internação na rede pública e o aumento da longevidade da população resultam na lotação dos SE e nas inúmeras dificuldades para o atendimento2. Nesse contexto, a enfermagem vem atuar na “indissociabilidade entre os modos de produzir saúde e os modos de gerir os processos de trabalho”3:4, fortalecendo a ideia de integralidade na assistência do indivíduo, tentando amenizar a dificuldade de acesso dos usuários e proporcionando uma boa recepção ao serviço de saúde4. Diante disso, a humanização em SE deve fazer parte de um grande processo dentro de uma instituição. É uma filosofia de trabalho que tem que estar alinhada com as crenças e com os valores do hospital, principalmente porque será o diferencial do atendimento4. Para organizar o atendimento nos SE e dar o destino correto aos usuários, além de atendê-los conforme os preceitos do Sistema Único de Saúde (SUS), foi criado o acolhimento com classificação de risco (ACR). Em 26 de janeiro de 2009, o hospital, cenário desta pesquisa, que atende em média 800 pacientes diariamente, implantou o ACR com recursos do Ministério da Saúde em parceria com a Secretaria de Estado da Saúde (SES) de Santa Catarina. O treinamento da equipe foi realizado em dezembro de 2008, executado pela SES com carga horária de 16 horas e mais um treinamento interno realizado pela comissão de educação do hospital e enfermeiros lotados na emergência com carga horária de 24 horas. Frente ao exposto e considerando que a avaliação de um serviço de atenção à saúde poderá subsidiar a melhoria da organização do trabalho e qualidade do atendimento, esta pesquisa teve como pergunta norteadora: Como os profissionais de enfermagem da emergência de um hospital da Rede Estadual de Saúde de Santa Catarina avaliam o serviço após a implantação do protocolo de acolhimento com classificação de risco no contexto da Política Nacional de Humanização (PNH) do Sistema Único de Saúde? Este estudo teve como objetivos conhecer e analisar como os profissionais de enfermagem de um serviço de emergência hospitalar avaliaram a implantação do ACR, no contexto da PNH do SUS. Recebido em: 04.11.2011 – Aprovado em: 07.02.2011 Nascimento ERP et al. REFERENCIAL TEÓRICO Para o embasamento teórico desta pesquisa, utilizou-se a PNH do SUS, mais especificamente o acolhimento com classificação de risco. A PNH é um conjunto de diretrizes e propostas no campo da humanização na atenção e na gestão da saúde que vislumbra a alteração dos modelos de atenção e de gestão das práticas de saúde, propondo uma nova relação entre usuários, suas redes sociais e os trabalhadores como também o estabelecimento de grupalidade e de vínculos solidários5. Nos SE, o ACR configura-se como uma das ações potencialmente decisivas na reorganização e implementação da promoção de saúde em rede. Engloba os seguintes aspectos: ampliar o acesso sem sobrecarregar a equipe e sem prejudicar a qualidade das ações; superar a prática tradicional, centrada na exclusividade da dimensão biológica interagindo profissionais de saúde e usuários; re-configurar o trabalho médico integrando-o no trabalho da equipe; transformar o processo de trabalho nos serviços de saúde, aumentando a capacidade dos trabalhadores em distinguir e identificar riscos e agravos, adequando à resposta satisfatória sem extrapolar as competências inerentes ao exercício profissional de sua categoria6. A classificação de risco é uma ferramenta que, além de organizar a fila de espera e propor outra ordem de atendimento que não a ordem de chegada, tem também outros objetivos importantes, como: garantir o atendimento imediato do usuário com grau de risco elevado; informar o paciente que não corre risco imediato, assim como a seus familiares, sobre o tempo provável de espera; promover o trabalho em equipe por meio da avaliação contínua do processo; dar melhores condições de trabalho para os profissionais pela discussão da ambiência e implantação do cuidado horizontalizado; aumentar a satisfação dos usuários e principalmente, possibilitar e instigar a pactuação e a construção de redes internas e externas de atendimento3. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa exploratória descritiva com abordagem qualitativa. A pesquisa exploratória objetiva dar uma explicação geral sobre determinado fato, e a pesquisa descritiva procura analisar em profundidade a realidade pesquisada7. Esta pesquisa ocorreu no serviço de emergência de um hospital público da rede estadual de saúde de Santa Catarina. Participaram 13 profissionais de enfermagem (três enfermeiras e 10 técnicos em enfermagem) atuantes nesse serviço desde o período anterior à implantação do acolhimento com classificação de risco. Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 jan/mar; 19(1):84-8. • p.85 Classificação de risco na emergência Para a coleta de dados, foi explicado aos participantes os objetivos da pesquisa e consultado o interesse em participar, obtendo assim a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A coleta ocorreu nos meses de abril e maio de 2010, através de entrevista semiestruturada. Foi questionado como os profissionais de enfermagem avaliam a implantação do protocolo de ACR da PNH do Ministério da Saúde. As entrevistas foram agendadas previamente e realizadas no local e no horário de trabalho, em ambiente privativo. Foram gravadas em formato MP3, tiveram a duração média de 30 minutos, tendo sido transcritas posteriormente. A pesquisa foi aprovada pela comissão de ética da instituição hospitalar (Protocolo no 018/09) seguindo as recomendações da Resolução no 196/96, do Conselho Nacional de Saúde. Para ordenação e organização dos dados, utilizou-se o processo metodológico do discurso do sujeito coletivo (DSC)8. Os procedimentos de construção do DSC obedeceram às seguintes etapas: leitura dos discursos individuais e extração de temas; agrupamento dos discursos individuais relacionados aos temas; extração das expressões chave (ECHs) dos discursos individuais; agrupamento das ECHs de mesmo sentido, de sentido equivalente, ou de sentido complementar; extração da idéia central (IC) de cada agrupamento de ECHs e por último a construção dos discursos coletivos constituídos por ECHs que têm a mesma IC relacionadas ao tema. O DSC é um discurso síntese, redigido na primeira pessoa do singular. Para esta apresentação optou-se por não mostrar os discursos individuais e as ECHs, e sim e os DSC que as contém, representados por DSC 1, DSC 2 e DSC 3 para diferenciá-los. RESULTADOS E DISCUSSÃO De acordo com os resultados encontrados, apresenta-se a seguir os temas e suas respectivas ideias centrais e os DSC, em seguida a análise dos mesmos. A análise teve como sustentação o referencial teórico e a literatura sobre os temas que emergiram dos dados. Tema 1: mudanças no SE com a implantação do ACR Ideia central: organização do trabalho A maneira como está organizado o trabalho com a implantação do ACR facilita o dia a dia na emergência. Por exemplo, os pacientes que são classificados como amarelos ficam todos juntos no local destinado a eles e então se sabe que ali estão os pacientes mais graves e isso facilita o cotidiano no serviço. As pessoas são atendidas na sala de triagem e de lá já saem informadas, não ficam perdidas, sem saber para onde ir. (DSC 1) p.86 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 jan/mar; 19(1):84-8. Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación Fica claro que, na visão dos profissionais, o ACR trouxe uma maior segurança para desenvolver suas atividades e, consequentemente, uma maior atenção ao paciente com risco iminente de morte. Observa-se pelo discurso que o atendimento do SE está em consonância com o que determina o Ministério da Saúde, ou seja, a área de emergência deve ser ponderada também por nível de complexidade, otimizando recursos tecnológicos e força de trabalho das equipes, acolhendo o usuário segundo sua necessidade específica3. Pela própria característica da unidade de emergência, que se relaciona com todos os outros setores do hospital, assim como com todos os multiprofissionais que nela atuam, é necessário fortalecer o trabalho na emergência com um modelo de gerenciamento que vise ao paciente como um todo, focado na continuidade do tratamento e do atendimento. O enfermeiro pode ser o profissional responsável e atuar como gerente de caso, para direcionar e integrar os pacientes, favorecendo seu vínculo com a equipe de saúde, inclusive um médico assistente, a rede básica de saúde e sua operadora de saúde9. Quando se consideram as etapas para implantação da organização do trabalho, pode-se dizer que a categoria de tomada de decisão clínica relaciona-se com a etapa de pontuação, que orienta os gerentes de caso a ver o paciente como um todo, avaliando suas reais necessidades de cuidado e após a definição da complexidade9. Trata-se de um ambiente de trabalho no qual o tempo é limitado, as atividades são inúmeras e a situação clinica dos usuários exige que o profissional faça tudo para afastá-lo de risco de morte iminente10. O trabalho em saúde é considerado essencial para a vida humana. Ao longo da historia da humanidade, tem assumido diversas formas, mas sempre considerado como uma atividade humana especial, cujo produto é indissociável do próprio processo de realização da atividade11. Assim, o ACR pode ser visto como uma estratégia que tem influência no processo de trabalho, que consiste em uma atitude de mudança no fazer em saúde, sugere ainda mistura de saberes, necessidades, possibilidades, angústias, que tornam o ambiente de trabalho mais acolhedor para os profissionais e, consequentemente, gera como produto final um bom atendimento em saúde. Tema 2: dificuldades para a realização do ACR Ideia central: a grande demanda A demanda de usuário é muito grande e isso faz com que haja acúmulo nos corredores e na recepção. Esse usuário, geralmente é o que deveria ser atendido na unidade básica de saúde e não é, porque alegam que não tem atendimento médico. Aqui, pela demanda, esse paciente que Recebido em: 04.11.2011 – Aprovado em: 07.02.2011 Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación não é de risco, espera, muitas vezes durante muito tempo para ser atendido, e a qualidade do atendimento prestado fica prejudicada. (DSC 2) Neste discurso está retratada a dificuldade que encontram os trabalhadores na implantação do ACR, com prejuízo na qualidade do atendimento, em consequência aos escassos recursos disponíveis na atenção básica. É comum no SE o grande fluxo de usuários à procura de atendimento. A implantação dos serviços de ACR deveria dar o destino correto a essa clientela, porém a população cada vez mais numerosa e com poucos recursos disponíveis na atenção básica acaba encontrando no SE o único lugar possível para atender as suas necessidades. A inadequada ou inexistente referência e contrarreferência, a falta de implementação da Política Nacional de Atenção às Urgências (PNAU) em todas as suas instâncias, o desconhecimento da população da oferta de serviços de saúde ou a utilização inadequada dos mesmos faz com que o ACR se torne ineficiente em alguns aspectos, já que o atendimento prestado aos usuários classificados como menos graves se torna superficial e inadequado. A carga de trabalho aumentada para os profissionais do SE, em decorrência do número elevado de usuários não urgentes, também contribui para a má qualidade do atendimento oferecido. Esforços para triar usuários com pequenos agravos podem consumir o mesmo tempo gasto no seu tratamento, como também ressalta-se que esta grande demanda na emergência pode expor a equipe a acidentes ocupacionais12. Frequentemente a consulta médica é uma duplicação da consulta na triagem. Referenciar o paciente de volta à sala de espera, após a triagem, aumenta a carga de trabalho da equipe, assim como quando o paciente precisa ser reorientado a voltar à área de consulta12. A grande quantidade de usuários nos SE ocorre nos setores públicos, em todos os países do mundo. No Brasil, os SE atuam acima de sua capacidade máxima, com poucos funcionários e sem treinamentos ou reciclagem para os mesmos. A demanda é inadequada, as verbas são insuficientes, o gerenciamento de recursos é precário e não há leitos de retaguarda13. A grande demanda prejudica o atendimento de casos graves e agudos, pois ocorre aumento no número de tarefas e custos de atendimento e gera sobrecarga para os profissionais14. A grande procura aos SE nos hospitais proporciona uma grande tensão por parte tanto de usuários, em cobrar atendimento digno, como de funcionários, ao tentar dar conta do número de atendimentos e problemas que parecem se multiplicar a cada minuto na unidade. Desse modo, a atenção fica debilitada e a qualidade do atendimento diminui, à medida que cresce a procura neste setor. Recebido em: 04.11.2011 – Aprovado em: 07.02.2011 Nascimento ERP et al. Ideia central: ausência de referência e contrarreferência Aqui não existe referência e contrarreferência. A referência que existe é da unidade de saúde para o SE, mas não do SE para eles. Infelizmente o usuário que passa pela classificação de risco e é classificado como azul não é referenciado para a unidade de saúde, pois não se tem um local para onde se possa encaminhá-lo para receber o devido atendimento. Os usuários são orientados a procurar sua unidade de saúde, mas poucos querem ir. Então, mesmo demorando, todos são atendidos na emergência. (DSC 3) Segundo os entrevistados, não existe um consenso entre o SE e outros serviços de atenção a urgências ou unidades básicas de saúde (USB), e os usuários que apresentam agravos menores acabam esperando atendimento no próprio SE, ocasionando a alta demanda. Normalmente os SE são caracterizados pela alta demanda de usuários que extrapola os recursos oferecidos, ocasionando as longas esperas por atendimento. Porém, essa procura comumente acontece por pessoas cujos problemas poderiam ter sido resolvidos em serviços de atenção ambulatorial, e cerca de 65% dos usuários se encaixam nessa situação15. O acesso aos serviços de saúde pelos usuários preferencialmente deve ocorrer a partir da atenção básica. De acordo com as necessidades apresentadas pelo usuário, deve ser feita referência para outros níveis13. Assim, o ACR não é apenas um serviço existente no SE, mas atua como um intermediador, unindo recursos internos, externos e multidisciplinares, comprometidos com as necessidades dos cidadãos14. Além disso, usuários que apresentam agravos de saúde e que procuram a UBS são orientados pela mesma a ir ao SE, porém sem contato prévio. Esses usuários acabam sendo atendidos no próprio SE, pois não há outro serviço de saúde para o qual possam ser encaminhados. A PNAU coloca as UBS, o Programa de Saúde da Família e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde como integrantes do sistema de urgência e emergência, caracterizando-os como serviços de atendimento pré-hospitalar fixo, devendo dar o primeiro atendimento para estabilizar o usuário e posterior encaminhamento a um serviço de maior complexidade, através da central de regulação15, caso seja necessário. Porém, essa orientação da PNAU não se dá na realidade onde este estudo foi realizado. Os diversos níveis de atenção à saúde devem formar uma rede de recursos, de modo que um complemente a ação de outro através de pactuações prévias. Entretanto, isso só acontecerá se cada um servir como integrante do sistema de atendimento às urgências, utilizando os recursos disponíveis no seu nível de atenção para atender o usuário no que seja necessário14. Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 jan/mar; 19(1):84-8. • p.87 Classificação de risco na emergência Assim, há uma descontinuidade no tratamento desse usuário, pois o mesmo procura o SE apenas para tratar o sintoma que o está incomodando, deixando de lado a causa do problema. Cerca de 65% dos pacientes que procuram o SE poderiam ter sido atendidos em ambulatórios. Desses, 36% não seguirão tratamento ambulatorial para acompanhar o agravo que motivou a procura ao SE13. Deve-se redirecionar os usuários para a atenção básica para que o devido tratamento e seguimento de sua situação de saúde sejam realizados, garantindo que não apenas os agravos sejam tratados, mas que todos os recursos de promoção da saúde e prevenção de doenças desse nível de atenção sejam oferecidos15. O ACR se mostra como uma ferramenta que visa diminuir as chances de insatisfação por parte de clientes e profissionais, pois agiliza o serviço prestado ao cliente, reconhece prioridades e proporciona os devidos encaminhamentos para a continuidade do tratamento do usuário. Porém ainda existem falhas que devem ser corrigidas, como pactuar entre hospitais e unidades não hospitalares de atenção às urgências a referência e contrarreferência, garantindo a continuidade no cuidado e o tratamento adequado a longo prazo. CONSIDERAÇÕES FINAIS A análise da visão dos profissionais de saúde relacionada ao ACR evidenciou dois temas: mudanças no atendimento com a implantação do ACR e dificuldades para a sua realização. Os participantes conhecem a finalidade do ACR e apontam como potencialidade o atendimento mais rápido aos usuários que estão com agravos agudos de saúde e que necessitam de intervenção médica e de enfermagem imediatas; a falta de espaço físico e materiais são algumas das fragilidades mencionadas; entre as dificuldades sinalizam a inexistência de referência e contrarreferência com consequente acúmulo de usuários no serviço, interferindo na qualidade do atendimento assim como na satisfação dos profissionais do SE. Seu uso deve ser difundido entre os SE hospitalares e não hospitalares para que a entrada do usuário no sistema aconteça corretamente e que seja encaminhado ao serviço adequado, com recursos necessários para sua assistência. Os profissionais destacaram que o ACR organizou e dinamizou o processo de trabalho, pois prioriza o atendimento a pacientes graves, conferindo-lhes maior segurança, estabilidade e controle da situação. p.88 • Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2011 jan/mar; 19(1):84-8. Artigo de Pesquisa Original Research Artículo de Investigación REFERÊNCIAS 1. Calil AM, Paranhos WY, organizadoras. O enfermeiro e as situações de emergência. São Paulo: Editora Atheneu; 2010. 2. Siqueira ILCP. Qualidade em serviços de emergência. In: Calil AM, Paranhos WY, organizadoras. O enfermeiro e as situações de emergência. São Paulo: Editora Atheneu; 2010. p.25-34. 3. Ministério da Saúde (Br). Secretaria de Atenção à Saúde. Acolhimento e classificação de risco nos serviços de urgência. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009. 4. Santos AE. Humanização em serviços de emergência. In: Calil AM, Paranhos WY, organizadoras. O enfermeiro e as situações de emergência. São Paulo: Editora Atheneu; 2010. p.139-48. 5. 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