1313 IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação PUCRS Diferenças cognitivas entre os gêneros na esquizofrenia através do Rorschach Doutoranda: Ana Cristina Resende Orientadora: Irani Iracema de Lima Argimon Programa de Pós-graduação, Faculdade de Psicologia, PUCRS Resumo Introdução Dados epidemiológicos apontam que a esquizofrenia é um problema mundial de saúde pública de primeira grandeza. Em média, esses pacientes ocupam 50% de todos os leitos dos hospitais psiquiátricos. Atinge aproximadamente 1% da população adulta, independentemente de sexo e condições socioculturais. O início é mais precoce nos homens, geralmente entre os 15 e 25 anos. Eles têm maior probabilidade de sofrer sintomas negativos, de ficarem solteiros, ter menor qualidade de vida, como também de ter maiores prejuízos no funcionamento social e de serem mais resistentes ao tratamento da doença. Diferentemente, nas mulheres o início da esquizofrenia é mais tardio, muitas vezes após os 25 anos de idade. Além disso, as mulheres em geral são casadas ou separadas e têm de cuidar dos filhos, tendem a revelar uma forma mais benigna da esquizofrenia com funcionamento social mais adequados e resultados mais favoráveis em seus tratamentos (APA, 2002; SADOCK E SADOCK, 2007). Vários estudos comprovam que as diferenças entre os sexos são um importante fator preditivo no curso e na evolução da esquizofrenia, como também podem contribuir para a elaboração de estratégias de tratamento e planejamentos de serviços de saúde mais IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009 1314 apropriados para esses pacientes (CHAVES, 2000; KELLY, 2006). Diante disso, o presente estudo teve o objetivo de investigar, por meio da técnica de Rorschach, as diferenças entre os gêneros no que tange aos aspectos cognitivos de pacientes que apresentam esse transtorno. Metodologia Participaram desse estudo 80 pacientes com o diagnóstico de esquizofrenia pela CID10 (OMS, 1993), 40 do sexo feminino e 40 do sexo masculino, com recidiva da doença, idades entre 20 e 55 anos, que encontravam-se internados em hospitais psiquiátricos de Goiânia e faziam uso de neurolépticos. Os instrumentos utilizados para coleta de dados foram: a entrevista psiquiátrica de acordo com os critérios das CID-10 para esquizofrenia, a Técnica de Rorschach (Sistema Klopfer) e os prontuários dos pacientes. Seguiram-se os seguintes procedimentos: após a autorização do diretor de cada hospital, fez-se a triagem dos participantes junto aos médicos psiquiatras; previamente à testagem, foi mantido um contato com cada paciente a fim de convidá-los e motivá-los a participar da pesquisa, como também para a obtenção do seu consentimento livre e esclarecido e de seu responsável; a administração do Rorschach foi realizada de forma padronizada seguindo as orientações de Vaz (1997); 25% dos protocolos (20 ao total), selecionados aleatoriamente, foram codificados por dois juízes para que o estudo de concordância, por meio do coeficiente Kappa, fosse realizado; os dados dos 80 protocolos foram lançados no programa SPSS 12.0; para verificar se existiam diferenças estatisticamente significativas entre os pacientes do sexo masculino e feminino, as diferenças entre as médias foram comparadas por meio da Prova t Student para os dados paramétricos, por meio da Prova de Mann Whitney para aqueles não paramétricos medidos pelo menos em uma escala ordinal e para aquelas variáveis não paramétricas medidas com uma escala nominal utilizou-se o Qui-quadrado com duas amostras independentes, sendo o nível de significância mínimo de 5% (p= 0,05). Resultados e Discussão IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009 1315 O coeficiente Kappa entre os dois avaliadores da técnica de Rorschach variou entre 0,86 e 0,94 (p< 0,001), indicando que houve uma concordância alta entre os juízes e que a correção da técnica de Rorschach para esse estudo é considerada confiável. Os dados indicam que tanto os pacientes do sexo masculino e feminino apresentavam atenção dispersa (Dd> 20%) e faziam generalizações inoportunas (G> 50% com predomínio da qualidade forma negativa), sendo esta a forma como pacientes com esquizofrenia, de uma forma geral, capta e processa as nformações. Todavia, foram os homens quem revelaram preocupação maior com aspectos mais insignificantes quando direcionavam sua atenção para o ambiente, bem como tinham menos capacidade de inibir estímulos distrativos, revelando-se mais incoerentes e inseguros do que as mulheres (Dd= 36%, p <0.05). Observou-se, também, nos homens uma tendência significativamente maior ao hipercontrole da razão, à simplificação excessiva da complexidade das situações, buscando soluções mais simples e superficiais para os seus problemas (F= 67%, p <0.05). Ao mesmo tempo, manifestaram com maior frequência o Tipo de vivência coartado, que é próprio de pessoas com pouca imaginação, poucas condições de se decidir ante a situação de tensão, e, portanto, revelaram menos capacidade de adaptação do que as mulheres. Além disso, a soma mais elevada de Fenômenos especiais críticos como Confabulação, Contaminação e Autorreferências (p <0.05) entre os homens aponta que eram eles quem possuíam os maiores prejuízos na capacidade de pensar de modo lógico e coerente, tendendo a raciocinar mais frequentemento de modo infundado e arbitrário. As pacientes do sexo feminino demonstravam maior capacidade de visão de conjunto, de pensar e elaborar mentalmente com mais flexibilidade, como também eram mais capazes de dar vazão às suas fantasias e desejos (G= 64% p <0.05, F= 58% p <0.05, M e Tipo de vivência introversivo levemente mais frequentes do que nos homens). Com isso, pode-se inferir que essas pacientes tinham mais acesso aos recursos psicológicos mais complexos, demonstrando níveis de desenvolvimento cognitivo maiores do que os homens. IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009 1316 Conclusão Esses resultados sustentam o que outros estudos sobre as diferenças entre os gêneros na esquizofrenia afirmam: que o distúrbio cognitivos nos homens tende a ser mais grave do que nas mulheres, o que repercutirá de forma desvantajosa no comportamento e no funcionamento social desses pacientes do sexo masculino. Em relação ao Rorschach, é importante considerar dois aspectos: que essas diferenças estatisticamente significativas entre gêneros não são encontradas nos dados normativos da população em geral, como também trata-se de uma técnica que demonstrou ser eficiente para revelar diferenças de gênero sutis no distúrbio cognitivo entre os pacientes desse estudo. Conclui-se, portanto, que as diferenças cognitivas entre gêneros devem ser consideradas como uma parte integrante do tratamento de pessoas acometidas por esquizofrenia. Referências APA – AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Porto Alegre: Editora Artemed. 2002. CHAVES, A. C. Diferenças entre os sexos na esquizofrenia. Revista Brasileira de Psiquiatria. Vol 22, N° 1(2000), pp. 21-21. KELLY, D. L. Treatment considerations in women with schizophrenia. Journal of Women Health. Vol 15, N° 10(2006), pp. 1132-1140. OMS - ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Classificação dos transtornos mentais e de comportamento – CID-10. Porto Alegre: Editora Artes Médicas. 1993. VAZ, C. E. O Rorschach: teoria e desempenho. Porto Alegre: Editora Manole. 1997. IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009