ESTUDO COMPARADO DOS PERIÓDICOS CERES E SEIVA, COMO FONTES DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA (UFV) Denilson Santos de Azevedo - Universidade Federal de Viçosa/ Universidade de São Paulo Esse trabalho objetiva realizar um estudo comparado sobre o ciclo de vida de duas revistas agrícolas que tiveram um papel relevante na sedimentação de uma tradição, até hoje mantida pela Universidade Federal de Viçosa1 (UFV) - MG, e que apresentam uma série de informações sobre a história educacional dessa importante instituição de ensino superior brasileira. Ambos os periódicos foram fundados na Escola Superior de Agricultura e Veterinária (ESAV) do Estado de Minas Gerais, que funcionou entre 1927 e 19492. A Ceres foi criada em julho de 1939 e mantida pelo “Clube Ceres” – associação científico-cultural constituída pelo corpo docente e doutorandos[sic] da ESAV- e vem sendo publicada até hoje. Já a Revista Seiva foi fundada em agosto de 1940 e mantida pelo Centro dos Estudantes. O último exemplar dessa revista foi publicado em 1990 – edição comemorativa dos 50 anos. O trabalho sobre essas duas publicações, será norteado por uma diretriz, que está pautada “pela investigação que visa estabelecer a história serial e repertórios analíticos destinados a informar sobre o conteúdo dos periódicos, classificando-os, registrando seu ciclo de vida, predominâncias ou recorrências temáticas e informações sobre produtores, colaboradores e leitores, entre outros dados.” (Catani e Souza, 1999, p. 11) Nesse sentido, pretendo fazer um levantamento sobre a história serial e sobre os produtores, colaboradores e leitores dos dois periódicos e identificar os repertórios analíticos das seções e dos artigos relacionados com a área da educação e humanidades dos primeiros 45 números da Revista Ceres (cerca de 16,9% do total de revistas) e dos 32 primeiros números da Revista Seiva (34% do total), com o intuito de detectar semelhanças e diferenças no ciclo de vida 1 A atual UFV originou-se da ESAV, que foi criada pelo Decreto 6.053, de 30 de março de 1922, pelo então Presidente do Estado de Minas Gerais, Sr. Arthur da Silva Bernardes e se concretizou em sua gestão na Presidência da República Federativa do Brasil (1922-1926). O início das atividades didáticas ocorreu em 1927. Pelo Decreto nº 3211, de 15 de novembro de 1949, a Universidade Rural do Estado de Minas Gerais (UREMG) foi oficialmente instalada em Viçosa, encerrando, conseqüentemente, a fase da Escola Superior isolada – (ESAV). A UREMG era composta pela Escola Superior de Agricultura, pela Escola Superior de Veterinária, pela Escola Superior de Ciências Domésticas, da Escola de Especialização (Pós-Graduação), do Serviço de Experimentação e Pesquisa e do Serviço de Extensão. Em 1969, a UREMG é federalizada, criando-se a UFV. 2 Esse período é denominado pelos servidores mais antigos como a “fase heróica” da UFV. Nessa época, era muito comum ocorrer, aos servidores da instituição, atrasos salariais de três, quatro meses. 1 desses periódicos e analisar o repertório veiculado pelas revistas durante a vigência da ESAV, ou seja, até o ano de 1949, em virtude do meu interesse em estudar a fase da escola superior isolada. Esse interesse também justifica o parâmetro de comparação que utilizo para analisar os periódicos editados. Embora essas revistas tenham por fim divulgar, difundir conhecimentos e informações agropecuárias, os fatos e eventos relacionados com a instituição ou com as entidades promotoras das respectivas revistas - Clube Ceres e Centro dos Estudantes - , o tratamento dado ao assunto, a representação dada a realidade é bastante distinta, o que, aparentemente, poderia comprometer a operação metodológica “de comparar o comparável”, já que à primeira vista, os produtores, colaboradores e leitores de cada impresso poderiam estar mais concentrados no segmento dominante de cada entidade, ou seja, nos professores e nos alunos. No entanto, o objetivo dessa comparação é procurar identificar a relação que se estabelece entre os representantes das entidades promotoras de cada publicação, haja vista o pequeno intervalo de tempo na criação dos dois periódicos (1 ano e 1 mês), e ao fato do Clube Ceres ser constituído pelo corpo docente e por alunos do último ano dos Cursos de Agronomia e Veterinária, o que levanta a hipótese de que os professores responsáveis pela Ceres tenham servido de fonte inspiradora e influenciado os estudantes a criarem sua própria revista. Segundo o professor Clibas Vieira (editor-chefe da Ceres desde 1972 e ex-diretor da Seiva), quando a Ceres foi idealizada, outros nomes foram também aventados para designá-la: "A ESAV", "Mensageiro Esaviano" e "Revista Esaviana". Contudo, saiu vitoriosa a alusão à deusa grega da agricultura. A partir de setembro/outubro de 1944, o periódico teve o nome ampliado para "Revista Ceres". A periodicidade dessa publicação é bimestral. “Inicialmente, a Revista Ceres publicava tanto artigos científicos originais como textos de divulgação técnica, pois para tal fora criada. Pouco a pouco, foi tornando-se cada vez mais científica e os últimos artigos de divulgação foram publicados em 1959”. (in Borges, 2000, p. 324) Seus mais de 60 anos de existência colocam-na entre as revistas agrícolas mais antigas do país. Atualmente, a revista tem uma tiragem de 1.100 exemplares distribuídos em 59 países, principalmente para permuta com periódicos similares. Essa publicação é editada em volumes anuais com seis números. Ao final de cada Volume, até o número VIII, constata-se a existência de um índice remissivo por assunto e por autor. Depois, há volumes que trazem esses índices e outros não. Quanto à circulação, não há nenhuma informação sobre a abrangência e a tiragem da Revista Ceres. Conforme depoimento dado pelo prof. Clibas, essa revista (assim como a Seiva) era impressa em Viçosa e a Escola custeava uma parcela das despesas, porque isso permitia a permuta com revistas agrícolas de outros Estados brasileiros e países. 2 Numa breve descrição sobre o formato da Revista Ceres, verifica-se que a capa dos primeiros exemplares do periódico apresenta os seguintes dados: nome da Revista, meses de circulação, ano, volume e número. Sua primeira página traz informações sucintas sobre a ESAV, 8 artigos do seu regimento. A segunda página é constituída pela seção Expediente, que traz informações sobre as assinaturas, as vendas, uma chamada para a publicação de anúncios e o endereço para o envio de correspondência dos leitores ou articulistas3. A terceira página traz mensagens aos assinantes e oferece os serviços da ESAV aos interessados. A quarta página apresenta além das informações existentes na capa, a relação nominal dos diretores da revista e o sumário, que apresenta o título dos ensaios publicados na edição e as duas seções fixas: a de Livros Novos – Revista das Revistas (que informa sobre o lançamento de livros, resenha e divulga referências bibliográficas sobre um determinado tema) e a de Notícias e Comentários, que traz informações, relatórios, dados estatísticos e notícias sociais, acadêmicas e administrativas, de interesse da comunidade esaviana. O números da Revista que iniciam um novo volume, quase sempre apresentam editoriais que trazem um registro discursivo, que pode ser compreendido como uma representação, como afirma Pierre Ognier, “dos métodos e concepções pedagógicas de uma época e da ideologia moral, política e social de um grupo profissional.” (Apud Catani e Bastos, 1997, p. 5) Tal assertiva pode ser verificada em alguns editoriais da revista (todos sem identificação da autoria), no qual se dá grande relevância à palavra impressa, como um meio para que a ESAV possa “multiplicar sua voz evangelizadora no meio rural e levar a todos os recantos da pátria brasileira, onde exista uma preocupação pelos problemas agropecuários. ”(...) (...) “Os princípios que norteiam a ação da Escola constituem o programa da Revista, que em suas páginas terão trabalhos científicos originais , abundante texto de divulgação enfeixando conhecimentos práticos, de aplicação imediata às necessidades da vida cotidiana do agricultor e de todos que estão em contato com o meio rural. Por ora, é esta organização a que mais se adapta ao meio agrícola mineiro.” (Revista Ceres, nº 1, pp 2-3) No primeiro aniversário da revista (nº 7, jul-ago-1940), o Editorial traz uma comemoração, apontando as dificuldades locais (edição feita no meio rural), nacionais (carestia) e internacionais (guerra), e o empenho interno da Instituição e da Diretoria para superar os obstáculos. Há ainda, um pedido de desculpas, pelo fato da revista desagradar alguns leitores, pelo seu caráter mixto, a um tempo científico e divulgador. 3 Ainda nessa seção, desde a primeira edição, a Diretoria da Revista informa que não se responsabiliza pelos conceitos emitidos pelos autores dos artigos assinados. Também pede aos leitores, a fineza de citar o nome da Revista e autor dos artigos originais, quando transcritos ou mencionados. 3 Já na revista nº 9 (nov-dez-1940), a seção Notícias e Comentários menciona que a ESAV contrata, “quase que anualmente, os alunos que mais se distinguem nos seus cursos, afim de fazer verdadeiros mestres, identificados com o programa da Escola e educados no regime de trabalho, de responsabilidade e ordem que são as características do nosso Estabelecimento.” (p. 259) O editorial da Revista nº 37 (jul-ago-1946) destaca a importância da socialização do conhecimento agropecuário para melhoria das condições de vida da população rural e aponta a irregularidade da revista, “em virtude da dificuldade de aquisição de material de impressão e de mão-de-obra, hoje tão comuns em todo país, têm determinado esses contratempos embora seja bastante farta a contribuição de nossos colaboradores.” (1-2) Sobre a Revista Seiva, não obtivemos maiores informações a respeito da sua origem. Em relação à natureza dos artigos, palestras e entrevistas publicadas na revista, a maioria é constituída de ensaios informativos, de divulgação, orientação e discussões práticas sobre conhecimentos produzidos, sobretudo, na área agronômica. A revista nº2 (out – nov 1940), informa que a Seiva é composta e impressa nas oficinas gráficas da Esav – Viçosa. Já a edição nº10 (out-nov 1942), acrescenta a essa informação, que a revista “está registrada no Departamento de Imprensa e Propaganda” do Estado Novo (p.12). A capa da Revista traz, na sua parte superior, o título Seiva, e a sua identificação como o “órgão oficial do Centro de Estudantes da ESAV”. Abaixo vem o nome do Diretor, do Redator Chefe e do Gerente. Em seguida, o número da Revista, local e data da publicação. Depois um editorial. Esse layout de capa será mantido até a edição de nº 37 (de março-abril de 1952). A periodicidade dessa publicação pode ser considerada trimestral, embora a seção Expediente, existente na segunda página da revista, informe que a Seiva é publicada “duas vezes no quadrimestre escolar.” Essa seção também informa o valor da assinatura anual - correspondente a 4 volumes – e do número avulso e o endereço de correspondência. A página 2 ainda traz o quadro diretivo do Centro de Estudantes da ESAV (Diretoria, Conselho Deliberativo, Redação da Revista, Departamentos Cultural, Social e Esportivo), e os redatores responsáveis pelas seções fixas (Estudos, Literatura, Esportes e Sociais) da revista. Da revista nº 14 (out-nov de 1943) à nº 22 (out-nov de 1945), traz reportagens com alguns ex-alunos, agora, correspondentes da revista em Belo Horizonte, Juiz de Fora, Rio de Janeiro e São Paulo. A terceira página apresenta a seção fixa de Estudos (onde encontra-se em média, 2 artigos publicados, por edição), seguida pelas outras seções fixas de Novidades (curiosidades, novidades científicas), de Literatura (poesias, prosas, crônicas, transcrição de trechos de livros de escritores conhecidos como Machado de Assis, Humberto de Campos, Menotti Del Picchia), Esportes (informes, comentários e agenda dos eventos esportivos em geral - principalmente os realizados 4 ou a serem realizados no Brasil, em Minas, na região próxima à Viçosa e na ESAV- e Sociais (efemérides nacionais, agenda dos eventos acadêmicos e sociais na ESAV, informes diversos – viagens de professores em estudo ou seu retorno, excursões, sobre o Centro de Estudantes, etc..). Quanto à circulação da Revista, não há nenhuma informação sobre sua abrangência até a edição de número 76 (jan-dez de 1972), que passa a informar que a Revista circula em todos os Estados brasileiros e em 48 países. A edição 81 (jan-mar de 1974) informa que a Revista circula em 55 países, enquanto a revista nº 98 (jan-dez de 1988), essa abrangência amplia-se para 64 países, além de continuar circulando por todos os Estados do Brasil. Em relação à tiragem de exemplares da Revista, essa informação só começa a ser fornecida na edição de número 58 (ago-set de 1964) que teve uma tiragem de 700 exemplares; as edições de nº 59 até a 62 (mai-jun de 1967), tiveram uma tiragem de 1000 exemplares. A partir da edição nº 67 (novembro de 1969) até a edição nº 84 (abr-jun de 1977) volta a constar a tiragem, que é de 4000 exemplares, excetuando-se uma edição especial de dezembro de 1970, que teve uma tiragem de 8000 exemplares. A partir da revista nº 85 (jan-mar de 1978) até o último nº encontrado, que é o 99 (outubro de 1990), não há nenhum registro sobre a tiragem do periódico. Em virtude da irregularidade da periodicidade de publicação dos números da Revista, que começa a partir de 1957 e se tornará uma característica do periódico até sua última edição, será destacado apenas as edições que trouxeram alguma mudança significativa ou inovação, como a revista de nº 63 (ago-set de 1967), que trouxe três novas seções: a de Atualidades (novidades mais importantes no campo da ciência e da técnica); Noticiário (últimos acontecimentos de interesse agronômico); e Miscelânias (curiosidades diversas). Contudo, essas seções não seguem um padrão. Elas ficam sujeitas aos critérios estabelecidos por cada equipe de redação. A revista de nº 64 (out-nov de 1967) passa a ter capa colorida e o seu conteúdo passa a ser impresso em papel acetinado. É também a partir dessa edição, que o periódico passa a contar com a página “O mundo das Ciências Domésticas”, cuja responsabilidade de redação fica a cargo das universitárias da Escola superior de Ciências Domésticas. A partir da revista número 70 (jul-set de 1970), a direção, em editorial, informa sobre as mudanças estabelecidas no periódico, como: a padronização da capa, para facilitar o reconhecimento imediato da Revista pelo leitor; a introdução do sistema de normas para a publicação dos trabalhos; a exigência de um resumo em inglês (abstract). Entre a revista nº 83 (jul-set de 1974) e a revista nº 84 (abr-jun de 1977), o periódico fica quase 3 anos sem circular. A partir do nº 84, a Revista passa a contar, até o último número publicado, com uma Comissão Editorial composta, em número variado e em diferentes momentos, por professores da UFV. 5 Quanto aos registros sobre o cotidiano da Instituição, veiculadas pela Revista Seiva, merecem destaque a edição nº 1 (ago-set, 1940: p.42) que informa sobre o funcionamento do Club Ceres: “Semanalmente, à noite se realiza uma sessão, constante de duas partes: Inicialmente um dos seus membros, previamente escolhido expõe um assunto original ou não. Em seguida, um noticiarista informa aos presentes sobre as últimas novidades ocorridas durante a semana, sob o ponto de vista cultural ou científico, como seja, a literatura sugerida, etc. No final da primeira parte, o conferencista fica à disposição dos presentes para responder ou esclarecer qualquer assunto atinente ao exposto.” Informa ainda que “o Club Ceres é dirigido por uma comissão mixta, de alunos e professores renovada anualmente”. A Revista nº3 (mar-abr, 1941 p.42), informa que, dos seis novos professores, cinco fizeram curso na ESAV, enquanto a capa da nº13 ( ago-set de 1943) destaca-se os seguintes dizeres: “Seiva bem sabe que há irmãs suas que andam com melhores roupagens, mas estas têm a proteção dos verbas oficiais e ela vem quase lutando sozinha”. Já o editorial “Um lustro” da edição de nº20 (mar-jun, 1945), faz um balanço sobre os cinco anos da revista, e agradece aqueles que a mantiveram (alunos, professores, leitores, tipógrafos) nos seus muitos momentos de crise econômica. Esse mesmo assunto volta no editorial da edição seguinte (ago-set, 1945), que trata das “luzes e sombras da revista.” No levantamento sobre o conteúdo veiculado pelas Revistas Ceres e Seiva, nos seus anos iniciais, e nos últimos anos de funcionamento da ESAV, conseguimos identificar 6 recorrências temáticas4, cujos assuntos estão relacionados às seguintes áreas: 1. Agricultura (produção vegetal): assuntos relacionados ao plantio das culturas, aos insetos, às pragas, aos solos, à ecologia, à irrigação e aos fenômenos climáticos. 2. Veterinária (produção animal): assuntos vinculados à genética, às patologias, à criação, alimentação e às cirurgias animais; 3. Engenharia Agrícola: instalação, construção e conservação de bens e/ou utensílios agrícolas; 4. Indústrias Rurais: orientação para fabricação de gêneros alimentícios, domésticos e de bebidas; 5. Ciências Exatas: Dados de estatística e de medições; 6. Ciências Humanas: estudos sobre a história, sociedade, economia, política, cultura, educação, administração e legislação no meio rural. Questões relacionadas à formação dos estudantes, como sobre a prática e a comunicação extensivas, a educação física e as novas áreas científicas. 4 O título de cada ensaio foi computado em apenas uma das áreas enumeradas acima, por mais que apresentasse uma perspectiva interdisciplinar, ou melhor, de interseção entre essas áreas. 6 Nesse universo, a Revista Ceres totaliza a publicação de 332 ensaios, dos quais 149 (44,9%) estão mais relacionados à área de produção vegetal (Agr.) , 107 (32,2%) à de produção animal (Vet.), 44 (13,3%) às Ciências Humanas, 20 (6,0%) ao setor da indústria rural, 10 (3%) à área de Engenharia Agrícola e apenas 2 (0,6%) vinculados mais diretamente às Ciências Exatas. Sobre a origem dos ensaios, constata-se, que a maioria é constituída por artigos escritos para divulgação (292), o que corresponde a 87,9% do total dos ensaios publicados, até o período examinado. Desses, 253 artigos - ou 86,7% do total – foram escritos por professores, exprofessores ou dirigentes de instituições de ensino brasileiras ou estrangeiras. Já os técnicos foram responsáveis pela publicação de 29 artigos (9,9%), seguidos pelos 10 artigos (3,4%) sem autoria identificada5. Quanto às palestras, transcritas nas revistas, encontramos um total de 40, o que corresponde a 12,1% dos ensaios publicados. Dessas, 32 palestras – ou 80% do total - foram proferidas por ex-professores, professores ou diretores das instituições de ensino. A maioria dessas preleções aconteceu na ESAV, sobretudo no Clube Ceres, nos Congressos da AEA (Associação de Ex-Alunos)6 ou na Semana do Fazendeiro7. Em relação à natureza dos artigos e palestras publicados na revista, a maioria é constituída de ensaios informativos, de divulgação, demonstração, orientação e discussões práticas sobre conhecimentos produzidos, sobretudo, na área agronômica e veterinária. Também identificamos ensaios que tratam do desenvolvimento de experiências, de observação e classificação de espécies da flora e fauna, de discussões científicas e debates acadêmicos. Conforme a ocupação dos autores, percebe-se que os principais colaboradores do periódico são os professores, que assinam 285 dos 332 ensaios publicados (85,8 % do total), seguido por aqueles que definimos como técnicos, com 34 ensaios publicados (10,2%), pelos 10 ensaios sem identificação de autor (3,01%) e 3 de outros (0,9%). Dentre os professores colaboradores da Revista Ceres, merecem destaque os docentes que trabalharam na ESA - sobretudo daqueles que, sucessivamente, contribuíram como diretores, gerentes, redatores ou membros do comitê de publicação da Revista -, uma vez que eles foram os autores de 239 artigos – ou 81,8% do total de artigos publicados – e de 28 palestras – ou 70% do total de palestras transcritas pelo periódico. Os maiores colaboradores, em termos de produção de 5 Também foram computados, nesses dados, as traduções ou as reprodução de artigos publicados em outras revistas de circulação nacional e/ou internacional. Esse mesmo critério será utilizado no estudo da Revista Seiva. 6 Associação criada, em 1935, pela primeira turma de engenheiros agrônomos formada pela instituição. A AEA permanece, até hoje, organizando os (re)encontros qüinqüenais dos ex-alunos dos diferentes cursos e diplomando as turmas que fazem “bodas de prata” (25 anos) e “bodas de ouro” (50 anos). 7 A “Semana do Fazendeiro” vem se realizando anualmente e sem interrupção, desde 1929. É uma das práticas extensionistas mais tradicionais, na área agropecuária, com o oferecimento de diversos cursos, difusão de 7 ensaios, foram: Octávio de Almeida Drummond (19), Arlindo P. Gonçalves (14), Edgar Vasconcelos (13), Aníbal Alves Torres (12), Joaquim Fernandes Braga (11). É importante salientar também que, dos 61 professores, ex-professores ou diretores da ESAV, que escreveram artigos para a Revista Ceres, 41 (67,2% do total) foram formados na própria instituição e serão os principais responsáveis pela permanência da Revista no seu primeiro decênio. Dos 34 artigos escritos por autores estrangeiros, 14 (41,1%), são escritos por norteamericanos, principalmente oriundos do Iowa State Agricultural College 8. Todos os artigos são publicados por homens. Dentre os artigos publicados pela revista, no período em estudo, destaco os seguintes na área de educação e humanidades: Da organização do ensino agrícola no Brasil, Aspectos da legislação do ensino agrícola brasileiro, A escola e a comunidade, Palestras Agrícolas I e II. Na Revista Seiva, as seis recorrências temáticas apresentadas, perfazem um total de 82 ensaios, dos quais 32 (39%) estão mais relacionados à Agricultura, 17 (20,7%) às Ciências Humanas, 15 (18,3%) à Veterinária , 9 (11%) ao setor da indústria rural, 5 (6,1%) à área de Engenharia Agrícola e apenas 4 (4,9%) vinculados mais diretamente às Ciências Exatas. A grande maioria dos ensaios publicados(69), é composta pelos artigos escritos para a Revista Seiva, que representam 84,1% do total de 82 ensaios. Quanto aos demais, encontramos um total de 10 palestras e 3 entrevistas transcritas em suas páginas, o que corresponde a 12,2% e 3,7%, respectivamente, dos ensaios publicados. Dos 82 ensaios publicados, 44 - ou 53,7% do total – foram escritos, apresentados ou entrevistas concedidas pelos professores, ex-professores ou dirigentes de instituições de ensino brasileiras ou estrangeiras. Já os estudantes foram autores de 27 artigos ( 33% do total). Os artigos, sem autoria identificada, foram 5 (6,1%), os técnicos e outros foram responsáveis, cada um, por somente 3 artigos, o que corresponde a cerca de 3,6% de participação de cada grupo no total de artigos publicados. Em relação à natureza dos artigos, palestras e entrevistas publicadas na revista, a maioria é constituída de ensaios informativos, de divulgação, orientação e discussões práticas sobre conhecimentos produzidos, sobretudo, na área agronômica. Em seguida, vêm os ensaios relacionados à área de Ciências Humanas, sobretudo os de caráter informativo e formativo Os conhecimento, tecnologia, etc. 8 É relevante informar que essa instituição norte-americana serviu de modelo para a criação da ESAV, visto que, um de seus alunos de bacharelado e do mestrado (P. H. Rolfs - Doctor of Science e Diretor do Florida Agricultural College), foi o responsável pelo planejamento, fundação e a direção da ESAV, de 1921 a 1929. Conforme depoimento gravado pelo ex-aluno, professor e reitor da UREMG, Edson Potsch.de Magalhães, até o mote da Escola é o mesmo : “ciência e prática”. 8 ensaios, de um modo geral, também têm uma preocupação muito mais didática, instrutiva, de divulgação de conhecimentos do que de artigos de natureza científica. Conforme a listagem dos autores, percebe-se que os principais colaboradores da Revista Seiva, até 1949, foram os professores da ESAV, responsáveis por 40 dos 82 ensaios publicados – incluindo artigos, palestras e entrevistas -, o que corresponde à 48,8 % do total, demonstrando, assim, a efetiva participação docente no periódico estudantil, principalmente daqueles que eram responsáveis pela publicação da Revista Ceres. Os professores que mais contribuíram com artigos, nesse período, foram: Antônio Rezende (4), Alberto Daker (3), Edgard Vasconcelos (3), J. M. Pompeu Memória (3). Todos os ensaios são assinados por homens. Quanto aos artigos publicados pela revista, nesse período, na área de educação e humanidades, destacamos os seguintes: Eugenia, O Ensino de Sociologia Rural na ESAV, Sugestões sobre a Reforma do Ensino Agronômico, A influência da educação Física na formação do homem moderno e A aversão pela Matemática. O Estudo do ciclo de vida da Revista Ceres , demonstra uma grande preocupação em articular o conhecimento com a prática e dar grande ênfase ao aprender fazendo, expressas pelo empenho na prestação de serviços, na difusão de métodos e técnicas de produção, baseadas em experimentos científicos, sistematizados e comprovados, que atende ao ideal presente desde os primórdios da Escola, de preparar homens para influir diretamente na reforma do trabalho agrícola e da vida de nossas populações rurais. Já no estudo da Revista Seiva, pude perceber que a ênfase do periódico não encontra-se na publicação de artigos (seção Estudos), mas nas seções de Literatura - com muitos versos, prosas e crônicas -, de Esportes e Sociais, o que lhe dá um caráter menos formal, mais informativo e com uma finalidade de maior integração social dos estudantes. Também pude detectar a trajetória irregular da Revista Seiva, em termos de periodicidade, de padronização do layout das páginas iniciais, o que reflete a grande rotatividade das sucessivas diretorias responsáveis por sua edição, característica própria da natureza passageira da maioria dos estudantes na Escola, o que a diferencia da Revista Ceres, onde os professores são mais permanentes, possuem maior constância à frente do periódico, fazendo com que as transições administrativas nos cargos de direção, sejam parciais, sem uma ruptura total, na maioria das vezes. Não se observa, em ambas revistas, nenhuma crítica ou comentário jocoso em relação à instituição, ou dos professores em relação aos alunos e vice-versa. Essa pilhéria é somente encontrada nas seções de Esportes e Sociais da Seiva, feita entre os estudantes, principalmente dos alunos veteranos sobre os calouros. Somando a isso, o fato de ambas terem sido custeadas parcialmente pela ESAV, reforça o papel desses periódicos como porta-vozes da instituição, o que 9 demonstra a eficácia da doutrina calcada no “espírito esaviano9” e a regulação institucional desses impressos. Assim, diante do exposto, creio que esses periódicos também desempenharam um papel relevante como meio de regulação coletiva desses valores, ao registrar no impresso, toda uma doutrina típica de uma instituição de ensino total – calcada no regime de internato e semi-internato – sediada num vale de uma cidade do interior do Estado de Minas Gerais. BIBLIOGRAFIA BORGES, José Marcondes et alii. A Universidade Federal de Viçosa no século XX. Viçosa - MG, UFV- Imprensa Universitária, 2000. CAPDEVILLE, Guy. O ensino superior agrícola no Brasil. Viçosa – MG, UFV - Imprensa Universitária, 1991. CATANI, Denice Bárbara e BASTOS, Maria Helena Câmara. A Educação em Revista – a imprensa periódica e a história da educação. SP, Escrituras Ed., 1997. CATANI, Denice Bárbara e SOUZA, Cynthia Pereira de Souza. Imprensa periódica educacional paulista (1890 – 1996): catálogo. SP, Ed. Plêiade, 1999. GOMIDE, Tarcísio. Universidade Federal de Viçosa - Esboço de uma síntese histórica. Viçosa MG, Imprensa Universitária - UFV,1996. NÓVOA, António. A imprensa de educação e ensino: concepção e organização do repertório português. IN: CATANI, Denice Bárbara e BASTOS, Maria Helena Câmara. A Educação em Revista – a imprensa periódica e a história da educação. SP, Escrituras Ed., 1997. RANGEL, Nello de Moura et alii. O Livro ESAV de 1939. S/d 9 Até hoje o “espírito esaviano” é apregoado como uma maneira de se valorizar o trabalho, a dedicação quase sacerdotal do indivíduo, ao progresso, ao engrandecimento da Instituição. Em depoimento gravado em 1990, o ex- aluno (1936-1940) e ex- prof. Otto Andersen, que lecionou na ESAV-UREMG-UFV, de 1946 até 1990, lembra que esse lema “vem desde o início, fazendo com que, qualquer novato, ao chegar aqui, pudesse absorver e desenvolver o ‘espírito esaviano’ de modo a se ter uma união boa que produzisse grandes resultados. Realmente, desde os operários, todos eles eram incutidos com o espírito esaviano a cooperar, porque a casa é nossa, e quanto mais engrandecer a casa, mais vantagem será para nós próprios. Vinculados à ESAV, nós estávamos realmente, nos fortalecendo para ter maior sucesso no futuro. O espírito mantém alto o entusiasmo por tudo que se diz a respeito da instituição, inclusive elevando o grau de motivação para as atividades e cria, incontestavelmente, um espírito de alta produtividade. Na determinação de criar tradição, é importante que se esteja pronto para defender e promover à velha Escola, evitando certas críticas destrutivas ou maldosas. Deve-se apelar para que o engrandecimento seja cada vez maior e assim se possa realçar, cada vez mais o valor dessa grande realização que é a Universidade. Desde a década de 30, quem aqui esteve para lecionar, em breve aderia ao espírito de trabalho com entusiasmo, convicto de que estava aprimorando cada vez mais, para cada vez melhor confirmar os seus desígnios”. 10