OS VALORES MORAIS NA ESCOLA: CARTOGRAFANDO A COMPREENSÃO DOS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO INFANTIL TOIGO, Letycia Cristina Toigo – UNOESC [email protected] TREVISOL, Maria Teresa Ceron – UNOESC [email protected] Eixo Temático: Educação infantil Agência Financiadora: Não contou com financiamento Resumo De que um indivíduo necessita saber para poder viver em uma sociedade concreta? O que é preciso transmitir-lhe, e como, para que alcance essa condição? Nesse sentido, a escola, enquanto instituição parceira na construção desses indivíduos deve intervir na formação dos valores sociais e morais em seus alunos? Este artigo objetiva cartografar os sentidos atribuídos por professores que atuam na educação infantil, em municípios localizados na região oeste catarinense, sobre a construção dos valores morais de seus alunos; como esses professores apreenderam os valores e como os ensinam. Os professores participantes desse estudo reconhecem a importância das relações, das interações na formação da criança na construção dos valores sociais e morais. Apesar de apontarem a família, como a base na construção da moral, indicaram a escola e a sociedade como espaços complementares. No que se refere a como esses profissionais aprenderam e ensinam os valores morais, identificamos a ênfase atribuída ao papel de suas famílias. Quando questionados sobre suas atitudes e a relação destas com “modelos” de professor que tiveram durante sua vida escolar a maior parte descreveu terem tido, ao menos, um professor como modelo, que mereceu destaque por representar figura de afeto, atenção, compreensão e respeito; essenciais para favorecer o trato pedagógico. Palavras-chave: Formação de valores sociais e morais. Escola. Professores da educação infantil. Introdução No Brasil da última década, a exemplo de alguns outros países, uma vigorosa preocupação com uma educação em valores (às vezes sob a denominação de "educação para a cidadania", outras vezes sob o de "educação moral") tem despontado como fonte de 5350 inspiração para uma vasta gama de iniciativas, seja na esfera da produção acadêmica, seja no âmbito das práticas pedagógicas, ou ainda no terreno das políticas públicas (AQUINO; ARAÚJO, 2001). De um modo ou de outro, o que parece chamar atenção tanto dos teóricos quanto dos protagonistas escolares é a dimensão propriamente atitudinal do trabalho educativo junto às novas gerações - o que, de certo modo, continua sendo uma incumbência escolar cujos limites e possibilidades permanecem em aberto. Espera-se da escola e dos profissionais que lá atuam responsabilidade e compromisso com relação à dimensão do aprendizado da moral e dos valores dos alunos. Entendemos que a escola, consciente de seu papel formativo e instrutivo, não pode trabalhar com qualquer valor. Se almejar a educação para a cidadania, sua responsabilidade encontra-se em propiciar a oportunidade para que seus alunos e alunas interajam reflexivamente e na prática sobre valores e virtudes vinculados à justiça, ao altruísmo, à cidadania e à busca virtuosa da felicidade. Essa interação, no entanto, deve ser prazerosa, para que seja alvo das projeções afetivas dos sujeitos. Caso contrário, o valor trabalhado poderá não se constituir como valor para eles. O que queremos dizer é que trabalhar valores de forma tradicional, não permitirá sua construção. Inspirando-nos nas idéias de Piaget (1954), definimos os valores como trocas afetivas que o sujeito realiza com o exterior. Surgem da projeção dos sentimentos sobre objetos, pessoas e/ou relações. Desde o momento em que nascemos, por meio da realização de trocas interpessoais, da intelectualização dos sentimentos, e dos julgamentos de valor que vamos realizando, os valores vão sendo cognitivamente organizados. Dessa maneira, cada um de nós constrói seu próprio sistema de valores, que se integra à nossa identidade. Nesse sistema que cada um constrói, alguns valores posicionam-se, em relação à identidade, como mais centrais ou mais periféricos. Nesse sentido, buscamos com este artigo analisar os sentidos atribuídos por profissionais que atuam na educação infantil, atuantes em municípios do oeste catarinense, sobre a construção de valores sociais e morais de seus alunos; como esses professores apreenderam os valores e como os ensinam. A base empírica deste artigo foi constituída a partir de dados de pesquisa, que contou com uma amostra composta por quinze professores que atuam nesse nível de ensino. Como procedimento de coleta de dados foi utilizado uma entrevista com um roteiro semi-estruturado, e como procedimento de análise a técnica de análise de conteúdo. 5351 A opção por profissionais desse nível de ensino se deve, principalmente, por acreditarmos que estes profissionais assumem, nos anos iniciais de vida das crianças/alunos, papel importante na construção da dimensão da moral e dos valores. Além de se constituírem figuras de autoridade, referência na aplicação dessa dimensão. Valores morais na escola Tendo em vista as novas demandas e exigências que emergem na sociedade atual torna-se indispensável trabalhar e valorizar uma educação voltada para a ética, uma educação moral que priorize realmente o desenvolvimento integral das crianças. Porém, ainda é possível observar diversas instituições de ensino que buscam e repassam exaustivamente conteúdos curriculares. Nesse sentido nos afirma Puig (1998a, p. 16) que para se ter uma educação integral precisamos cuidar de todas as capacidades humanas dando mais atenção à educação moral que não se restrinja apenas as aquisições intelectuais. Segundo Cória-Sabini (2005, p.08) existe uma grande preocupação com o tema dos valores morais, pois o que se percebe é que grande parte dos valores perderam o sentido e por isso ocupam muitas das discussões dos pais, professores e dos demais adultos engajados principalmente no processo de ensino. Tanto os jovens quanto os adultos estão incertos e inseguros quanto às normas que devem seguir, sustentar e considerar tendo em vista que a escola é um importante espaço de formação. “[...] enfatizamos a moral e suas manifestações na prática docente como uma possibilidade de transformação dessa situação caótica. Acreditamos, também, que não existe educação sem os valores inerentes ao desenvolvimento moral” (CÓRIA-SABINI, 2005, p. 09). Tendo conhecimento de que a educação moral se constrói nas vivências, nas relações entre as pessoas, torna-se imprescindível que isto seja assunto para debate dentro da escola. A ética e os valores devem ser continuamente trabalhados e reforçados dentro do contexto educacional para que realmente se priorize o desenvolvimento integral dos alunos e formemse também cidadãos conhecedores de seus direitos e deveres. Afinal de contas, a educação moral auxilia as pessoas a terem um melhor relacionamento interpessoal tornando-nos também pessoas mais autônomas. Sendo assim, “as atividades de educação moral deviam ser sistemáticas. Nem as metodologias específicas, nem seu estabelecimento transversal podem recair em atividades 5352 ocasionais e talvez desordenadas, mas sim devem estar regulados e orientados por uma proposta curricular específica” (PUIG, 1998a, p. 30). Voltamos aqui a afirmar que a proposta de uma educação voltada para a ética e para os valores deve estar presente durante o decorrer do ano letivo dentro das salas de aulas. Os trabalhos e atividades desenvolvidos mesmo que de maneira transversal devem conter posturas, comportamentos e atitudes que incentivem o desenvolvimento de tais aspectos. Além disso, conforme nos afirma Puig (1998a, p. 33) deve-se ter uma especial atenção quanto aos recursos metodológicos, pois estes devem estar baseados em finalidades educativas, aos conteúdos curriculares que irão ser trabalhados e aos princípios que orientam sua prática para que desta forma realmente se chegue aos objetivos traçados. Em escolas em que predomina o ensino verbal e a autoridade do professor é bastante acentuada, o desenvolvimento da autonomia será mais lento e difícil. O aluno somente alcançará algum êxito em atividades não relacionadas às tarefas escolares, tais como esportes, administração de material e atividades extracurriculares. Por sua vez, os métodos que se baseiam em pesquisas, atividades espontâneas e diálogos entre professor e aluno favorecem a autonomia intelectual que leva ao desenvolvimento da autonomia moral. (CÓRIA-SABINI, 2005, p. 33) Segundo Puig (1998a, p. 117-118) “o melhor modo de desenvolver simultaneamente a sensibilidade, o juízo e a conduta moral é aproximando-se pessoalmente das situações reais nas quais se vivencia uma problemática moralmente relevante. Ver a realidade de perto é o melhor modo de entendê-la e de sentir-se tocado por ela.” Assim, reafirmamos que a conduta do professor deve estar baseada em comportamentos morais direcionados pela ética. Afinal de contas, sua finalidade é possibilitar a reflexão e a discussão sobre valores humanos para conduzir a um maior carinho e respeito por si mesmo, pelo outro e pelo que o rodeia (CÓRIASABINI, 2005, p. 57). Conduta dos professores Dentro desta perspectiva queremos detalhar algumas atitudes e valores profissionais que Puig (1998a, p. 199) cita em seu livro, e as quais acreditamos serem coerentes com os objetivos de uma educação voltada para a moral. Não queremos esboçar aqui um modelo perfeito e acabado de educador, apenas mostrar um leque de comportamentos que podem proporcionar melhores resultados diante da formação integral dos alunos. Afinal de contas 5353 A autonomia e a liberdade deveriam ser os objetivos da prática educativa. Se a aula fosse transformada em palco de discursos e práticas direcionadas para esse fim, onde as inteligências fossem somadas, onde cada professor aprendesse a ter amor por aquilo que realiza e estimulasse as capacidades e as inteligências dos alunos, haveria a transformação tão sonhada por todos. (CÓRIA-SABINI, 2005, p. 54) Segundo La Taille (2006, p. 107) nós devemos privilegiar no querer fazer moral a progressiva construção do auto-respeito. Sendo assim faz-se necessário a presença de alguns sentimentos na relação professor-aluno que “correspondem, portanto, ao “cimento” afetivo que une a criança às pessoas de seu entorno social, cimento sem o qual ficaria difícil conceber o despertar do senso moral” (LA TAILLE, 2006, p. 108). Uma atitude que acreditamos ser coerente expor diz respeito à compreensão empática e o respeito positivo incondicional os quais proporcionam uma “relação respeitosa e compreensiva, já que é esta relação a que permite aos alunos manifestar-se com espontaneidade e naturalidade, sem necessidade de manipular a própria identidade para ‘ganhar’ a aceitação e o apreço do professor” (PUIG, 1998a, p. 195). Tal conduta ajudará os alunos a manifestarem-se além de compreender e valorizar a opinião de seus colegas. Pois o que se vê hoje é que “presta-se muito mais atenção às diferenças do que à pessoa do outro” (CORTELLA; LA TAILLE, 2006, p. 27). Desta forma é preciso buscar o “equilíbrio entre a autoridade do mestre e a liberdade dos alunos. Qualquer que seja a combinação, o fator principal é o respeito ao aluno (CÓRIA-SABINI, 2005, p. 33). Dentro desta perspectiva Cortella e La Taille (2006, p. 31) enfatizam o quanto é importante “olhar o outro como outro e não como estranho” isto é, precisamos acolher o outro na condição de alguém como eu, sendo necessário trabalhar nessa perspectiva visando formarmos uma comunidade onde existam objetivos comuns e mecanismos de proteção mútua. Outro aspecto que se torna necessário mencionar é a autenticidade do educador, pois o aluno percebe quando o professor está agindo ‘como se’, portanto deve-se haver “coerência entre o que sente e o que expressa, entre o que pensa e o que comunica” (PUIG, 1998a, p. 196). Nesse mesmo sentido, “o heterônomo [os alunos de educação infantil] precisa incessantemente de provas de que a moral é, de fato, respeitada por outrem, para que ele mesmo possa dobrar-se à suas exigências” (LA TAILLE, 2006, p. 112). Além disso, se deve ter uma concepção positiva da pessoa e das relações humanas. Sendo assim, o professor não deve decidir pelo aluno muito menos determinar aquilo que ele considera certo ou errado, 5354 mas conforme exposto por Puig (1998a, p. 198) “a ajuda do professor irá centrar-se, pois, em favorecer ou criar as condições adequadas para que o educando possa restabelecer suas próprias potencialidades”. Ainda é importante destacar a maturidade emocional que o professor deve ter. Segundo Puig (1998, p. 198-199) é comum tentar “transmitir para o outro aqueles modelos, métodos, valores e maneira de pensar que a ajudaram em sua vida”, porém “omite a diversidade e a pluralidade de pontos de vista, sentimentos e experiência, tendendo a apresentar o mundo a partir de um ponto de vista muito pessoal”. Desta forma “o professor, em seu papel de educador, deve estar preparado para manter-se sereno e ponderado diante dessas oscilações inevitáveis nas atitudes de seus alunos.” Desta forma, conforme o que nos aponta Cória-Sabini (2005, p. 45-46) “afetividade, compreensão e confiança são palavras-chave para a conquista do saber”, ou seja, é preciso que o professor articule a emoção com o conhecimento para que haja um aprendizado significativo, afinal de contas “um pequeno auxílio dado no momento exato poderá fazer com que a criança possa recuperar-se.” Conforme o exposto por La Taille (2006, p. 109-113) a criança esta atenta para a integridade das figuras de autoridade percebendo se as regras impostas não são seguidas pelos adultos, se sentido enganada e injustiçada caso obriguem-na a segui-la. Afinal de contas, a criança desenvolveu respeito pelas figuras que lhe apresentam tais regras porque elas lhe inspiram amor e medo na medida em que sente admiração e apego por eles e teme perder a proteção que lhes oferecem, além de sentir-se fraca e ter experimentado punições desagradáveis. É preciso que mais professores se proponham a adotar uma atitude de Educação em Valores nas suas práticas, de forma sistemática e principalmente amorosa, pois a prática docente impregnada de afetividade pode ser um elemento de transformação do caos que se tornou o cotidiano da humanidade (CÓRIA-SABINI, 2005, p. 94). Os valores sociais e morais a partir da ótica de professores que atuam na educação infantil 5355 As respostas coletadas com os professores pesquisados foram organizadas em três blocos, a saber: a) Compreensão do professor da educação infantil sobre a dimensão dos valores morais; b) Como se ensina os conteúdos morais na escola; c) Como você aprendeu os valores morais. Passaremos, a seguir, a analisar o conteúdo abstraído destas respostas. Compreensão do professor da educação infantil sobre a dimensão dos valores morais. Neste primeiro bloco procuramos compreender como os professores de educação infantil acreditam que são formados os valores morais, se estes são inatos ou construídos, neste caso relatando como isso ocorre. Buscamos também identificar se os docentes acreditam ser importante uma educação voltada para valores morais dentro da escola e quais os motivos que os levam a acreditar nisso. Desta forma, observou-se que treze professores acreditam que os valores são construídos a partir das relações com os outros e com o meio em que vivem e nas interações que fazemos cotidianamente. Importante frisarmos aqui o destaque dado por parte dos docentes ao papel da família nessa construção seguida pela escola e pela comunidade em geral que segundo eles devem contribuir, pois também tem esse compromisso. Conforme nos afirma La Taille (2005, p. 06) a criança possui valores desde que nasce, pois, uma vez no mundo, inevitavelmente investe sua afetividade nos objetos que pode conceber, embora não tenha, no período designado por Piaget como sensório-motor, compreendido entre 0 a 2 anos, consciência desse fato. Além disso, houve dois professores que afirmaram que nascemos com valores, porém pontuaram também, que ao longo de nossas vidas esses valores inerentes ao indivíduo são modificados pelo meio em que vivem. Estes também enfatizaram a importância da família, da escola e da sociedade na construção dos valores morais. Na segunda questão realizada em nossa entrevista observou-se que 100% dos professores afirmaram que a construção dos valores morais ocorre dentro da instituição familiar. Os valores são aos poucos e desde cedo repassados à criança pelos familiares e pessoas mais próximas da família. Identificou-se ainda que 80% dos docentes acreditam ser a sociedade, as relações entre as pessoas, amigos, no convívio e nas trocas realizadas no decorrer da vida, co-responsáveis por essa construção. Observou-se ainda que onze professores, ou seja, 73,3% indicaram que essa construção também ocorre dentro do âmbito escolar, afirmando que o trabalho deve visar à 5356 complementação dos valores aprendidos na família, ou seja, o trabalho da escola é uma continuidade. Como nos afirma Delval (1998, p. 21) a construção dos valores morais é ampla envolvendo todos os contextos com os quais temos contato, ou seja, na família, na escola, no contato com amigos, adultos, através dos meios de comunicação e na observação diária da vida dentro da sociedade onde vivemos. Assim, percebendo ou não a influência que exercemos na construção de valores morais, devemos sempre estar atentos a conduta que adotamos, pois estes certamente estarão sendo repassados. Quando questionados sobre qual a importância de realizar um trabalho voltado para os valores morais dentro da escola os profissionais enfatizaram que este é um conteúdo que os alunos irão utilizar durante toda sua vida em qualquer âmbito ao qual estiverem. Ressaltaram que se trata de aprendizagens necessárias para viver em sociedade, as quais devem iniciar o trabalho de construção e desenvolvimento no âmbito escolar partindo da educação infantil. Afinal de contas, como nos pontua Cória-Sabini (2005, p. 56) a aprendizagem de valores morais possibilita uma nova percepção da realidade sendo trabalhado desde a educação infantil e leva a uma formação e crescimento harmônico. Sendo assim, percebemos o quanto é importante repassar valores morais aos alunos, buscando transformá-los em pessoas mais autônomas, que percebam mais criticamente a sociedade e assumam o compromisso e a responsabilidade como cidadãos. Como se ensina os conteúdos morais na escola Dentro deste bloco buscaremos sistematizar quais valores morais os professores consideram essenciais na educação das crianças da educação infantil, os métodos e recursos utilizados para esse fim. Além de identificar se os professores consideram ser realmente compromisso da escola educar na dimensão da moral, inclusive se o projeto político pedagógico da escola onde atua prevê a atuação nesse âmbito. Partindo da análise realizada das respostas dos professores, percebemos que treze deles, isto é, 86,6% acreditam ser da escola o compromisso de educar na dimensão moral e dos valores frisando o importante papel que tem na formação integral das crianças, indicando ainda que esta não deva fugir de seu papel. Dentre os entrevistados um dos professores identificou não ser o ensinamento de valores morais compromisso da escola, porém enfatizou que esta pode atuar em conjunto com 5357 a família. Além disso, um dos professores enfatizou que depende do planejamento realizado tanto pelo professor quanto pela escola devendo estes se propor desenvolver com as crianças. A educação moral deve ajudar a analisar criticamente a realidade cotidiana e as normas sociomorais vigentes, de modo que contribua para idealizar formas mais justas e adequadas de convivência. Também pretende aproximar os educandos de condutas e hábitos mais coerentes com os princípios e normas que vão construindo. E, finalmente, a educação moral quer formar hábitos de convivência que reforcem valores como à justiça, a solidariedade, a cooperação ou o cuidado com os demais (PUIG, 1998, p. 15). Tendo em vista que a maior parte dos professores reconhece o ensinamento de valores morais como um compromisso da escola buscamos cartografar quais valores eles consideram essenciais na educação das crianças que freqüentam a educação infantil. Dos valores mais citados identificamos o respeito com maior freqüência, citado por doze dos quinze entrevistados. Mencionado por cinco professores está à solidariedade, na qual os professores enfatizaram a importância do saber dividir dentro e fora da escola. Em seguida, a cooperação, a honestidade e os limites, os quais três professores destacaram como essenciais na educação dos alunos de educação infantil. Citado por dois professores valores como a responsabilidade, integridade, autonomia, amizade, amor, educação e boas maneiras. Já os valores de participação, organização, auto-estima, fraternidade e religiosidade foram citados por um professor, mas nem por isso deixam de ser menos importantes. Em seguida, os professores foram questionados sobre quais os recursos utilizados para ensinar valores morais a seus alunos. Frisaram a importância da realização de uma autoavaliação constante e indicaram que com diferentes métodos conseguem atingir os objetivos que desejam. Todos os professores indicaram aproveitar as situações diárias para trabalhar os valores morais. Nesse sentido, como nos afirma Araújo e Puig (2007, p. 53) “mais importante é não ensinar estes conteúdos de forma teórica, mas na prática, a partir da análise e discussão dos conflitos diários”. Afinal de contas conforme pontua Delval (1998, p. 22) A moral não é um conjunto de conhecimentos teóricos, e sim algo que determina a nossa maneira de agir e mostra quais são as condutas valiosas. Trata-se de uma disciplina eminentemente prática – livros e palestras são de pouca utilidade. A moral 5358 é adquirida na prática, analisando-se as situações e decidindo-se o que é preciso fazer mediante o raciocínio. Dentre os professores participantes 60% deles indicaram utilizar as histórias infantis, a literatura para ampará-los no dia-a-dia. Verificamos também que 40% dos professores fazem uso de brincadeiras, do lúdico, jogos, trabalhos e atividades práticas desenvolvidas diariamente para ensinar valores. Observamos que igualmente citado por quatro professores, ou seja, 26,6% indicam fazer uso de filmes ou com projetos pré-estabelecidos no início do ano os quais direcionam as atividades. Conforme nos pontua Puig (1998, p. 33 e 34) diante da gama de objetivos que podem ser alcançados com uma educação voltada para o desenvolvimento moral das crianças, tornase difícil buscá-los com um único tipo de atividades ou com programas de propostas uniformes tendo em vista ainda, que há a possibilidade de trabalhar mais de um objetivo quando se tem também variadas atividades planejadas. Sendo assim observamos o quanto é necessário resgatar valores, preocupar-se mais com a formação não só intelectual das crianças, mas integral envolvendo especialmente o desenvolvimento psíquico e social. Tudo isso se faz necessário tendo em vista que “os valores humanos são essenciais para a formação do educando, pois é por meio deles que se formam cidadãos cientes de que o respeito mútuo e a solidariedade, bem como as leis que regem a organização das relações de grupos, são os pilares de uma sociedade democrática” (CÓRIASABINI, 2005, p. 47). Para finalizar esse bloco, os professores foram questionados se o projeto político pedagógico de suas escolas prevê a educação na dimensão dos valores morais. Desta forma, todos responderam de maneira afirmativa. Deste modo em concordância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional capítulo II, seção II (1996; p. 18): “a educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.” Como você aprendeu os valores morais 5359 Neste tópico analisaremos como os professores de educação infantil aprenderam os valores morais bem como, identificar se há algum professor que os tivesse marcado pelo ensinamento nessa dimensão, como era o encaminhamento dado, a postura assumida por ele e se concordava ou não com determinadas formas de conduzir situações que envolviam essa questão. O que se percebeu com a pesquisa foi a importância dada à família no ensinamento dos valores morais; 100% dos professores entrevistados afirmaram terem aprendido os mesmos dentro do núcleo familiar. Enfatizaram ainda o quanto era rígida a educação e como eram cobrados pelos pais que exigiam obediência dos filhos. Observou-se também que dos quinze professores oito, o que corresponde a 53,3% incluíram o papel da escola como complemento do que era ensinado na família. Já o papel da comunidade foi indicado por 26,6% dos professores e a religião também foi citada por 26,6% dos professores. O sujeito adquire a moral em todos os contextos nos quais se encontra e nos quais realiza sua atividade. Portanto, aprende a comportar-se moralmente da forma que se considera correta no seio da família, na escola, no contato com os adultos e com os colegas, através dos meios de comunicação e, geralmente, por meio da sua atividade e observação da vida cotidiana dentro da sociedade onde vive (DELVAL, 1998, p. 21). Em seguida, solicitamos aos docentes sobre algum professor que serviu de modelo ou professor marcante para a postura adotada por eles quando neste papel. Assim, percebemos que um dos professores entrevistados indicou que todos os seus professores, de uma forma ou de outra, lhe repassaram valores. Outro enfatizou que os professores de séries iniciais tiveram uma maior contribuição nessa construção, e doze dos entrevistados recordaram de um professor, ao menos, que os marcou por ensinar os alunos nessa dimensão. Ao descreverem as ações, atitudes, características ou fatos que ocorreram e os fizeram lembrar determinados professores identificou-se que a maioria ressaltou a importância da aproximação, do contato, do afeto e respeito que partia desses profissionais. Além disso, dois destes professores citaram que as matérias específicas como educação moral e cívica, religião e filosofia eram mais propícias para o trabalho de valores. Houve ainda dois professores que recordaram também de situações desagradáveis que lhes serve de parâmetro para atitudes que devem ser evitadas. Evidenciamos ainda um professor que relatou não ter aprendido valores morais com seus professores, pois faltava o 5360 contato, o carinho, a confiança, o afeto, a aproximação com seus professores afirmando ainda que se sentiam muito inseguros com os mesmos. Sendo assim, conforme nos afirma Puig (1998a, p. 196) percebemos o quanto é necessário o sentimento de acolhida e de valorização do aluno para que este se manifeste com transparência. Assim, é necessário estabelecer um elo de confiança para que de fato haja um trabalho diferenciado. Considerações finais Com este trabalho de pesquisa buscou-se identificar a compreensão dos professores referente à formação moral dos alunos além de identificar se tal tarefa é entendida pelos mesmos como um compromisso da escola. Assim, tomando como base as respostas obtidas a partir das entrevistas realizadas observou-se que os professores reconhecem que a escola e conseqüentemente eles, os professores, desempenham um papel importante na construção dos valores morais dos alunos. Apesar disso os docentes enfatizaram que este trabalho deve iniciar-se na família, pois é com esta que ocorre a socialização da criança, o elo de ligação desta com o mundo. E, posteriormente surgem então a escola e a sociedade que nas interações vão lapidando, favorecendo a construção dos valores da criança. Sendo assim, mesmo que alguns dos professores frisaram não ser um compromisso da escola, ou só da escola, a formação de valores, todos eles afirmaram que é fundamental a participação ativa da escola nessa construção, afinal de contas conforme contido na LDB é dever da escola a formação integral de seus alunos e essa construção deve iniciar na educação infantil. Identificamos nas entrevistas com os decentes que todos reconhecem a importância das relações, das interações na formação da criança e, principalmente, na construção dos valores. E apesar de apontarem a família como a base para a formação moral, também indicaram a escola e a sociedade como espaços complementares para reafirmar e repassar tais valores universalmente desejáveis. Afinal de contas, como exposto por diversos autores, mesmo sem perceber a escola está repassando valores e deve ter consciência disso para que possa planejar e controlar as conseqüências que determinadas atitudes adotadas pelos profissionais envolvidos no processo de educação podem acarretar. Além destes elementos procuramos delinear como os professores aprenderam os valores morais. Verificamos a ênfase no papel da família na construção de seus valores morais frisando como receberam e foram cobrados de maneira rígida por seus pais para o 5361 cumprimento dos mesmos. Quando questionados se lembravam e pautavam suas atitudes em um modelo de professor que tiveram durante sua vida escolar, a maior parte dos professores descreveu ter tido um professor como modelo, do qual destacaram como tais professores eram afetuosos, atenciosos, compreensivos e mantinham essa relação de respeito com seus alunos. Assim, faz-se necessário que o professor adote posturas pautadas no respeito devendo ainda ser compreensivo, autêntico e maduro para aceitar as escolhas realizadas pela criança. Os professores descreveram que ensinam valores morais a seus alunos aproveitando principalmente as oportunidades que surgem no cotidiano afinal de contas, os valores morais devem ser repassados como um conteúdo transversal, pois está presente em todas as atitudes do professor e dos colegas, em todas as atividades as quais a criança vai estar envolvida. Também deram destaque a diversos recursos que utilizam como, por exemplo, as histórias infantis, projetos específicos, filmes e as brincadeiras realizadas na escola que auxiliam e facilitam que o professor trabalhe tais conteúdos. Contudo, gostaríamos de enfatizar que o conteúdo dos valores morais deve ser trabalhado de maneira contínua e no cotidiano da escola, pois todas as atitudes adotadas pelo professor estarão sendo observadas e avaliadas pelas crianças que por estarem na fase denominada por Piaget de heteronomia, vão conceber tais atitudes como verdades absolutas, como um modelo que sem questionar deve ser seguido. É importante que os profissionais que constituem o cotidiano escolar compreendam, conforme De Vries; Zan (1998, p. 35) que a escola influencia o desenvolvimento social e moral quer pretenda fazer isso ou não. Os professores comunicam continuamente mensagens sociais e morais enquanto dissertam para as crianças sobre regras e comportamentos e enquanto administram sanções para o comportamento das crianças. Portanto, a escola ou a creche não são e não podem ser livres de valores ou neutros quanto a esses. Por bem ou por mal, os professores estão engajados na educação social e moral. Desta forma, devemos ter consciência de que “é a escola que ocupa um lugar central, apesar de que, infelizmente, ela tem se colocado hoje como uma instituição a reboque da sociedade. [...] Não se pode supor que só se vai ensinar uma parte dos conhecimentos, deixando de lado o civismo, a moral e a ética. [...] Não é tarefa só da escola, mas é uma tarefa prioritária da escola” (CORTELLA; TAILLE, 2006, p. 109). Assim, um posicionamento torna-se necessário a fim de que se eduque as crianças de forma integral, desempenhando seu 5362 papel como instituição de ensino e buscando que as demais instituições auxiliem nessa construção dos valores humanos fundamentais para viver em sociedade. No que se refere ao contexto da educação infantil, encontramos em Jares (2005, p. 14) a posição de que a educação infantil é uma etapa do sistema educativo crucial para a aprendizagem de valores, incluindo os valores coerentes com uma cultura da paz, como o respeito, a cooperação, a resolução de conflitos, a igualdade, a não-discriminação, o compartilhar, a ternura, a autonomia, a justiça, etc. REFERÊNCIAS ARAÚJO, U. F. & AQUINO, J. G. Os direitos humanos na sala de aula: a ética como tema transversal. São Paulo: Moderna, 2001. ARAÚJO, Ulisses F.; PUIG, Josep Maria. Educação e valores. São Paulo: Summus, 2007. 164 p. CORIA-SABINI, Maria Aparecida; OLIVEIRA, Valdir Kessamiguiemon de. Construindo valores humanos na escola. 2. ed. São Paulo: Papirus, 2005. 96 p. CORTELLA, Mario Sergio; TAILLE, Yves de La. Nos Labirintos da Moral. 3. ed. São Paulo: Papirus, 2006. 112 p. DELVAL, Juan. Alguns comentários sobre a educação moral. Pátio: Revista Pedagógica – Educação Infantil. São Paulo: ano II, nº 5, Artmend, p. 18 – 22, maio/ julho 1998. DE VRIES, DE Rheta; ZAN, Betty. A ética na educação infantil: o ambiente sócio-moral na escola. Porto Alegre: Artmed, 1998. JARES, X. R. A Cidadania no Currículo. Revista Pátio. Porto Alegre, ano IX, n.36, nov. 2005/jan.2006. LA TAILLE, Yves. O despertar do senso moral. Pátio: Educação Infantil – Educação em valores na primeira infância. São Paulo: ano III, nº 7, Artmend, p. 06 – 09, março/ junho 2005. LA TAILLE, Yves de. Dimensões Intelectuais e Afetivas. Porto Alegre: Artmed, 2006. 189 p. MARTIN, M. Del Mar Badia. Educação, infância e valores. Pátio: Educação Infantil – Educação em valores na primeira infância. 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