LÉSBICAS, COMUNICAÇÃO E SAÚDE PRISCILA DO ESPÍRITO SANTO LIMA Rio de Janeiro, abril de 2011 FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ INSTITUTO DE COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLOGICA EM SAÚDE CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM COMUNICAÇÃO E SAÚDE LÉSBICAS, COMUNICAÇÃO E SAÚDE por PRISCILA DO ESPÍRITO SANTO LIMA Projetode Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado como requisito básico para a obtenção do título de Especialista em Comunicação e Saúde. Orientadora: ProfªMs Janine Miranda Cardoso Rio de Janeiro Abril de 2011 RESUMO A pesquisa Lésbicas, Comunicação e Saúde teve como objetivo mapear os principais interesses em saúde e os espaços de comunicação utilizados por jovens mulheres, com idade entre 18 e 25 anos, e que se identificassem como lésbicas. O trabalho, após ser aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, foi desenvolvido na cidade de Salvador, no ano de 2011. Através do método de pesquisa qualitativa foram realizadas entrevistas semi estruturadas, que apontaram a internet como canal preferencial de comunicação para esta população. Os blogs, sites e redes de relacionamento foram citados como espaço de busca de informação, mas não necessariamente como espaço de diálogo, para isto preferem os amigos e as namoradas. O maior interesse relatado foi com a saúde sexual, o medo de contrair alguma DST e os métodos preventivos. Entretanto a análise do conteúdo mostrou que o medo da violência é o principal problema de saúde enfrentado por esta população. LISTA DE SIGLAS GGB - GRUPO GAY DA BAHIA LGBT – LÉSBICAS, GAYS, BISSEXUAIS E TRANSGÊNEROS. SUS – SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE SUMÁRIO 1. Introdução 06 2. A identidade homossexual 10 3. Juventude e homossexualidade 16 4. Políticas de saúde para as lésbicas 20 5. O papel da comunicação e saúde 25 6. Metodologia 28 7. Os encontros 34 8. As conversas 36 8. Conclusão 47 9. Referências 50 10. Anexos 52 1Introdução A homossexualidade é um dado cultural importante, que condiciona o posicionamento, e, por vezes o acesso do cidadão às políticas, bens e serviços em áreas como educação, trabalho e saúde. Para os sujeitos desta pesquisa, mulheres que mantêm, exclusivamente, relacionamento afetivo e sexual com outras mulheres, a homofobia e a misoginia são dois agravos importantes. A sociedade, patriarcal e heteronormativa1, torna esse grupo duplamente invisível, não reconhecendo suas práticas e desejos. A homossexualidade ainda é estigmatizada negativamente. Dentro da sociedade ocidental contemporânea as pessoas que possuem esta orientação sexual são categorizadas comoos/asdiferentes. A orientação sexual deixa de se relacionar apenas às relações afetivas e sexuais e se imprime como uma“marca” no indivíduo, afetando o seu modo de estar no mundo, podendo assim ser considerada como um determinante cultural. É evidente que o dado sexual pode ter maior ou menor relevância, dependendo do contexto social, de como este sujeito se constitui, da época, do grau de aceitação ou marginalização de suas características –estatisticamente entre os homossexuais os travestis são as maiores vítimas de agressões físicas 2–classe, gênero, raça e uma infinidade de outras variáveis,que juntamente com o componente sexual distinguem 1 Segundo a teórica queer Judith Butler, a matriz heterossexual que predomina na sociedade faz que a dimensão do desejo sexual seja sempre pensado como uma relação entre homem e mulher. O binarismo masculino /feminino, sendo concebidos como ‘opostos que se completam’ é segundo a autora a causa da homofobia. 2 A coleta de dados sobre a violência homofóbica no Brasil é feito desde a década de 80 pelo Grupo Gay da Bahia. No ano de 2009, ultimo relatório divulgado, foram assassinadas 198 pessoas motivadas por crimes de ódio sexual. Os crimes quase nunca passam por uma investigação mais rigorosa, não há testemunhas ou família para reclamar os corpos que muitas vezes são encontrados esquartejados, sem mãos, cabeça e pênis. O padrão de assassinato e distinto para cada grupo, enquanto os homens homossexuais geralmente são vitimados por golpes de faca em casa ou em locais fechados como motéis, as travestis geralmente são mortas na rua, por arma de fogo. 6 sujeitos dentro do “grupo” homossexual, que não será aqui tratado de forma homogênea. Na atualidade, observam-se mudanças sociais e culturais que parecem favorecer a reversão dessa situação de marginalidade. Ainda assim, deve-se considerar que mesmo movimentos como o de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros – LGBT, que desde a epidemia de HIV/AIDS passou a incluir fortemente o debate sobre saúde no seu discurso, têm grande parte da sua comunicação e de sua luta pautada no homem homossexual. O Ministério da Saúde, somente no ano de 2006, lançou uma cartilha de saúde voltada para as lésbicas. Até então esse segmento não era considerado preferencial, entre outras razões, porque suas práticas sexuais não representavam nenhum “risco” à saúde. Além disso, outros fatos e processos são obstáculos para mudanças mais significativas: as famílias dificilmente aceitam a homossexualidade da filha, irmã ou neta amigavelmente; há as religiões que condenam as práticas sexuais entre pessoas do mesmo sexo; os serviços de saúde que não reconhecem as singularidades desta população e os meios de comunicação que, em pleno século XXI, ainda mantêm o discurso de que a sociedade não está preparada para a homossexualidade, o que contribui para o tratamento superficial da questão. Em 2010 o Governo Federal lançou a Política Nacional de Saúde LGBT, buscando atender aos princípios básicos do SUS: universalidade, equidade e integralidade. A inclusão dessa população é fundamental para garantir a saúde como direito de cidadania, garantindo universalidade do acesso a serviços e ações de saúde. A integralidade remete à articulação entre políticas econômicas e sociais a fim de que estas garantam esse acesso, valorizando não somente a prevenção, mas também a promoção à saúde. Outro aspecto da integralidade diz respeito à necessidade de 7 reconhecer os sujeitos em sua totalidade, superando seu recorte em múltiplas especialidades médicas. Já o princípio da equidade reconhece a necessidade de tratar de forma diferente os desiguais, prevendo uma ação afirmativa, que proteja os desfavorecidos e aponte para diminuição das iniqüidades sociais. O cumprimento destes princípios, presentes na Constituição de 1988, é buscado pelo movimento LGBT desde os primórdios do SUS, na década de 90. A Política Nacional foi uma grande conquista, pois além de enfrentar o problema no âmbito institucional, contou com a participação popular, tendo sido posta em consulta pública antes de ser aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde. Entretanto, sua implantação ainda não foi consolidada, devido à grandiosidade e complexidade do sistema e da existência de práticas excludentes como, por exemplo, o questionário do protocolo ginecológico, que presume a heterossexualidade da paciente. A homofobia quando não se institucionaliza pela presença, se caracteriza pela ausência. Ser lésbica parece ser uma opção tão remota e improvável que nem é cogitada dentro das práticas habituais. Nesse universo de silêncios que apenas começam a ser rompidos, esta pesquisa pretende contribuir minimamente para os estudos sobre homocultura. A proposta é de mapear os canais de interlocução entre as mulheres homossexuais e a área da saúde, saber quem fala para esse público, o que se fala e sobre o que elas buscam dialogar. Em outras palavras, quais atores sociais têm mais legitimidade e alcance em relação a esse grupo de jovens mulheres homossexuais e quais as formas e modelos preferenciais de comunicação. Nossa expectativa é que os resultados desta iniciativa possam fornecer subsídios para movimentos e instituições interessados em construir ações de comunicação e saúde mais dialógicas e plurais, diminuindo agravos que afetam esta 8 população. Segundo Facchini e Barbosa (2004), a um enorme contingente de lésbicas está sendo negado o seu direito à saúde, pois não são alcançadas pelas políticas públicas. As autoras atribuem este fato à incipiente produção científica sobre o tema saúde e homossexualidade feminina. Este projeto foi elaborado nesta perspectiva, contribuir para os avanços nesta área e colaborar com outras iniciativas. A pesquisa intitulada Lésbicas, Comunicação e Saúde se propõe a mapear e analisar os espaços de comunicação, veículos, canais e fontes de informação mobilizados por jovens lésbicas na construção dos seus conhecimentos sobre saúde. Através das entrevistas semi estruturadas, com mulheres de 18 a 25 anos, buscou-se identificar quais temas lhe despertam maior interesse, e quais assuntos estão mais presentes em seus diálogos sobre saúde. A opção de privilegiar esta faixa etária se deu por considerar que nesta fase do desenvolvimento humano a identidade sexual tem uma grande importância. Se em outros momentos da vida a profissão, a classe ou a família podem se constituir como dado mais importante na construção de identidades e das relações pessoais, na juventude a sexualidade tem uma importância vital nessas aproximações, afastamentos e na própria construção do sujeito. 9 2 A identidade homossexual Segundo a teoria psicanalista a busca pela identidade surge do sentimento de falta, inerente à condição humana e que afeta a todos os indivíduos. Ele é gerado pela ruptura entre a criança a mãe na chamada fase do espelho. Para a teoria lacaniana é a partir deste momento, em que a criança se reconhece como um corpo separado da mãe, que se inicia a busca, que durará a vida inteira, pela identidade. Esta seria entendida como algo exterior, que recria a unidade perdida do sujeito. A vontade de voltar a ser completo é que impele o processo de construção das identidades. Alguns autores dos estudos culturais se apropriam do conceito de identidade na psicanálise para entender qual o papel desta na formação do sujeito pós moderno. A corrente explica o porquê de ter identidades, dita no plural, pois a teoria pós estruturalista rompe com o conceito da identidade única, que se manteria inalterada durante a toda a vida, e defende que há múltiplas identidades em um mesmo sujeito. As identidades como as de raça, gênero, sexualidade dentre outras são exaltadas dependendo do cenário do debate, assim algumas marcas se tornam mais relevantes que outras no processo de identificação do sujeito com as representações do mundo. Segundo Kathryn Woodward (2009) a identidade é relacional, se distingue por aquilo que ela não é. Só faz sentido dizer que sou alguma coisa se há outras coisas para ser, o ser baiano, por exemplo, só existe porque há o ser paulista, carioca, pernambucano etc. Ser homossexual é, portanto, não ser heterossexual, e esta não é apenas uma alteração da ordem dos termos. A construção da identidade inclui em si um processo de marcação de diferenças atuando pela exclusão. Excluir pressupõe escolher entre o melhor e o pior, por isto o processo de diferenciação não apenas classifica as diferenças, mas a hierarquiza os elementos postos 10 em contraste. É através das relações de poder entre as partes que a hegemonia se institui, criando o normal e o outro. Ao normal são atribuídas as características positivas, como o próprio nome diz, ele é a norma, o padrão e em relação a ele o diferente vira a exceção, o outro. Para Tomaz Tadeu da Silva (2009) “a força da identidade normal e tal que ela nem sequer é vista como uma identidade, mas simplesmente como a identidade”. Por isto ninguém a questiona. Não é necessário assumir para os pais, a família e os amigos que se é heterossexual, por ter se instituído como a norma a heterossexualidade se tornou compulsória, presumida como afirma Judith Butler (2003). O processo de “sair do armário” tão penoso para uma grande parte de jovens e adultos só é necessário por que o que se espera em relação à sexualidade é que ela obedeça sempre ao padrão. O é menino ou é menina proclamado na hora do parto diz muito mais do que se a criança nasceu com pênis ou vagina, determina uma série de expectativas sobre aquele corpo que acaba ser apresentado à sociedade. As identidades não nascem com os sujeitos, e nem estão na natureza, são construídas dentro dos discursos. Segundo Michel Foucault (2007), ainda no século XVII é que foi implantado o discurso sobre a sexualidade, transportando os atos corporais para a linguagem. Instituída a conexão entre palavra e ação, os atos, transformados em discurso poderiam ser censurados com mais profundidade. A Igreja Católica foi o grande fomentador deste projeto de transformação do sexo em discurso, através do que Foucault caracterizou historicamente como a Pastoral do século XVII. Assim os cristãos eram induzidos a confessar minuciosamente seus atos sexuais e seus desejos mais secretos, incluindo os sonhos. Entretanto esta prática não ficou restrita à religião, posteriormente com o avanço do das cidades, do capitalismo e a 11 necessidade de mão - de - obra produtiva, o discurso sobre o sexo foi sendo disseminado pela burguesia européia, era de interesse político e econômico controlar o sexo, agora não somente através de um apelo da moral, mas pela racionalidade. O sexo descontrolado constituía uma epidemia quando levados em consideração as questões de demografia, saúde pública e habitação. O sexo deixaria assim de ser algo particular, passando a ser de interesse público, já que suas possíveis conseqüências, doenças e filhos, afetariam toda a sociedade. Por isso sua administração foi feita através de três eixos principais: pedagogia, medicina e a demografia. Para controlar a sexualidade se fez necessária a criação de regras e normas, que eram introduzidas através não mais de um mecanismo que colocasse a sexualidade no campo do permitido/proibido, e sim por discursos hegemônicos, reiterados por diversas áreas do conhecimento. Assim surge a medicalização do sexo, a psiquiatrização das formas sexuais não genitais e o combate ao incesto. A partir da fundamentação científica, criou-se a hereditariedade da sexualidade: conservar-se sem vícios era uma obrigação consigo e com os futuros descendentes, uma vida pecaminosa poderia transmitir doenças físicas e mentais às próximas gerações. A homossexualidade, e as práticas sexuais que não fossem entre homens e mulheres adultos e sem grau de parentesco, como o incesto, a pederastia e a masturbação, passariam a ser combatidas. Instituiu-se a norma do que era não apenas moralmente, mas biologicamente correto. É neste contexto que, a partir do século XIX, a homossexualidade passou a ser reconhecida como uma prática anormal e perigosa, um vício, doença, que deveria ser combatido pelas famílias, pela Igreja e pela escola. Para Foucault a rejeição à homossexualidade tem como uma de suas causas a transição entre as duas formas de 12 controle social, pela qual ainda estaríamos passando, ele as denominou de dispositivo de aliança e dispositivo de sexualidade. O dispositivo de aliança seria a forma primeira através da qual a sexualidade do indivíduo foi controlada na sociedade. Através do casamento era criado um vínculo entre os parceiros, mantendo assim a riqueza e o poder entre as duas famílias que ali se uniam. O sexo só deveria ocorrer dentro desta relação, pois com a procriação haveria a manutenção da riqueza dentro do mesmo núcleo. Já o dispositivo de sexualidade, que viria a substituir este, funciona através de regras móveis, que seguem as estruturas conjunturais do poder. Para este dispositivo, o que contaria não é somente a relação entre os indivíduos, mas o prazer, as sensações do corpo, controlando além das práticas sexuais, o desejo e as fantasias. Por isto Foucault afirma que através do dispositivo da sexualidade o prazer penetra no corpo, pois o controle não é somente das ações, mas se expande até os pensamentos. Através da educação, da psicologia e da psiquiatria concluiu-se que alguns comportamentos são normais, outros doentios. Entretanto continuamos presos à estrutura familiar heterossexual porque o dispositivo de sexualidade foi construído em torno do dispositivo de aliança, assim os eixos principais deste, marido-mulher e paisfilhos são também os principais eixos do outro. Enquanto no dispositivo de aliança o controle estava em torno do relacionamento, no dispositivo da sexualidade está em torno do desejo e do prazer. A conexão entre estes dois dispositivos fez surgir uma série de desajustes, o prazer sexual que se encontrasse fora da estrutura familiar heterossexual era considerado pervertido, doente. O sujeito homossexual surge como um ser que desvia da estrutura imposta, um sujeito anormal. 13 Mas o que define a anormalidade? Como são construções culturais, influenciadas pelo contexto histórico, o limite entre o normal e o outro passam por ajustes constantes. As fronteiras entre as identidades opostas são reconfiguradas o tempo todo, o que era caracterizado como atitude masculina na idade média é diferente do que é hoje, a vaidade e preocupação com a beleza dos chamados metrossexuais não seriam aceitas como atitudes masculinas há algumas décadas, isso mostra como as identidades estão em transito, se reinventando sempre. É precisamente porque as identidades são construídas dentro e não fora dos discursos que nós precisamos compreendê-las como produzidos em locais históricos e institucionais específicos, no interior de formações e práticas discursivas específicas, por estratégias e iniciativas específicas. (Hall, 2000, p10) Segundo Butler essa reinvenção só é possível porque a identidade é performática, ou seja, sem uma essência, e é criada através do processo de repetição de um ato de linguagem. Ao dizer “ela é sapatão” isto não é apenas a descrição de que aquela mulher se relaciona amorosamente com outra, é a inserção deste corpo num contexto lingüístico que reforça a negatividade – pois é o outro - do ser homossexual. Assim todas as mulheres que se relacionam com outras serão chamadas de “sapatão”, pois é através da repetição que este ato lingüístico constitui as identidades. Os sistemas de representação como a televisão, por exemplo, têm o poder de definir e determinar as identidades, pois tem maior fôlego de repetição. Adotamos uma identidade pondo em relação a subjetividade e as possibilidades criadas pelos sistemas de representação. A forma como vivemos nossas identidades sexuais é mediada pelos significados culturais sobre a sexualidade, que são produzidos por meio de sistemas dominantes de representação(Woodward, 2000, p32) 14 A experiência de viver uma identidade sexual marginalizada pode ser determinante para a construção da personalidade, a discriminação pode além de causar dor e sofrimento, afastá-lo da escola, da família e do trabalho. Será que todo travesti tem vocação para a prostituição mesmo ou são as condições sociais que os impele a isto? Não há determinações baseadas na orientação sexual, o que ocorre é que o preconceito social pode comprometer o desenvolvimento das outras áreas da vida, limitando o acesso à educação, dificultando a ascensão social dos que nasceram em camadas menos favorecidas, contribuindo para a perpetuação da pobreza e da marginalidade. 15 3. Juventude e homossexualidade Juventude é um conceito mutável, diferentes sociedades constroem, cada uma a sua própria definição e representação para esta fase da vida, que nem mesmo cronologicamente apresenta limites definidos. Como faixa etária, relação mais direta e indissociável, seus limites atuais são tão amplos que podem se estender entre o início da puberdade até a chegada à maturidade. Como estado de espírito pode se prolongar por toda a vida, pois os ideais de liberdade, padrões estéticos e comportamentais que se referem à juventude como o padrão de beleza e vitalidade, fazem com que todos queiram ser e parecer jovens por muito tempo. A juventude como um conceito positivo é demasiadamente explorado, se tornando, portanto um ícone cultural. Ou seja, os valores associados aos estilos de vida jovem – catapultados na modernidade do século XIX como espírito de tempo – passam a ser consumidos como meta e desejo por diversos atores sociais, para quem o discurso midiático tende a incentivar e a cobrar a eterna juventude. (ENNE,2010, p 27) Aqui, para este trabalho, utilizaremos o conceito de juventude delimitado pela faixa etária que vai dos treze até por volta dos vinte e cinco anos, antes do ingresso na fase adulta, sendo aqui compreendida como o momento a partir do qual o sujeito adentra a vida social, passando a ser responsável pela sua própria subsistência no mundo, saindo de casa, terminando os estudos e iniciando seu próprio núcleo familiar. Reforçando que este padrão sociológico clássico não deve ser encarado como universal ou normativo, há pessoas que com quarenta anos dependem financeiramente dos pais, e outras com dezoito que já cuidam sozinhos de suas vidas. 16 Entendemos também que esta fase não se dá do mesmo modo para todas as pessoas, não sendo nem mesmo vivido por todos. Há pessoas que não passam por esta suposta etapa do desenvolvimento do modo como esperado, ou mais comumente identificado: rebeldias, perda de limites e crises existenciais. A construção social da juventude, muitas vezes baseadas em padrões de outras culturas, como a norte americana, pode engessar as possibilidades de compreensão da realidade juvenil. Quando se trata de sexualidade entre os jovens, o comportamento esperado se divide entre masculinos e femininos. Enquanto a eles é permitido olhar e comparar os órgãos sexuais e até se masturbarem juntos, sem que isso denote sinais de homossexualidade, entre as meninas essa conduta é rechaçada. Para elas andar de mãos dadas, dormir juntas e declarações de amor são permitidas, e vistas como normais, coisa que para eles seria impensável. O problema é quando os meninos se apaixonam por outros meninos e as meninas querem fazer sexo com outras meninas, aí família, escola, igreja e outras instituições sociais ligam seus sinais de alerta e passam a controlar, direcionar o jovem para o que seria o “caminho certo”: a heterossexualidade. A convivência na escola pode, muitas vezes, ser sacrificante, pois em defesa de uma suposta masculinidade, ou feminilidade, a discriminação e a homofobia passam a ser praticadas rotineiramente ao jovem que frustra as expectativas da heterossexualidade. As piadas, expressões e xingamentos são propagados, e até incitadas desde a infância por alguns pais que transferem para os filhos a homofobia, como se esta fosse uma herança genética. Essas agressões são banalizadas e deixam de ser tratadas como o que são: atos de violência. Segundo os teóricos queer que atuam na pedagogia, como Louro(2008) esta ojeriza do adolescente aos seus pares homossexuais 17 tem como uma de suas causas o temor que o jovem heterossexual tem de ser confundido com o outro, sendo então uma afirmação da sua própria sexualidade. O termo inglês bullyng, é utilizado para denominar as agressões, verbais e/ou físicas, sofridas sem motivo e repetitivamente, praticada por um, ou um grupo de colegas. Este novo conceito de violência já entrou na pauta das escolas de ensino fundamental e médio, tornando pedagogicamente incorreto permitir que os alunos se chamem por apelidos como gorducho, quatro olhos, magricela etc. Mas expressões como viado, bicha e sapatão permanecem culturalmente dentro do grupo das palavras aceitas, sejam ditas em brincadeiras ou não. Visando educar para uma pedagogia mais inclusiva nas escolas brasileiras o Ministério da Educação elaborou o kit antihomofobia, o material, que foi rechaçado pela bancada evangélica do Congresso Nacional e acabou sendo vetado pela Presidenta Dilma Roussef, abordava a homossexualidade no ambiente escolar, trazendo uma reflexão sobre o tema em uma linguagem própria para crianças e adolescentes. No momento ainda está em discussão um novo modelo pedagógico para o kit. A pesquisa da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) intitulada “Violência, AIDS e drogas nas escolas”, realizada em catorze capitais durante o ano de 2001, revela que 25% dos alunos brasileiros não gostariam de ter homossexuais como colegas de escola, em Salvador 39,7% dos pais não gostariam que seus filhos tivessem colegas homossexuais. Se a educação doméstica ainda precisa romper as barreiras do preconceito e encarar a diversidade como algo positivo, a educação escolar precisa se orientar de acordo com as novas resoluções e se aliar à ciência para poder oferecer uma educação de qualidade, pois a mesma pesquisa revela que 14,5% das professoras ainda julgam que a homossexualidade é uma doença. 18 São estas as profissionais responsáveis pelas aulas de biologia, religião, educação física e outras onde o tema da sexualidade é discutido, ou omitido. A pesquisa de Meyer e Borges (2008), feita com professores, revelou que eles têm medo de que, ao abordar o tema diversidade sexual estejam contribuindo para estimular as práticas homoeróticas entre os alunos. É como se ao não discutir o assunto ele fosse deixar de existir, e, sendo isto o vivido na escola, como pode este cidadão ser realmente preparado para estar em uma sociedade plural? A pedagogia tem que incluir, que fazer pensar e questionar os padrões, não é simplesmente conceber que o outro é diferente, mas perceber que todos são diferentes e valorizar isto, esta possibilidade de ser uma infinidade de coisas, problematizando a relação binária que constrói a divisão entre a norma e a exceção. 19 4 Políticas de saúde para lésbicas Considerando o determinante cultural da homossexualidade como fator importante para a criação das demandas em saúde, incluindo as práticas sexuais distintas, as necessidades das mulheres lésbicas têm uma configuração específica, requerendo assim ações específicas também. Cientificamente ainda não há pesquisas comprobatórias de que mulheres homossexuais estariam mais sujeitas a desenvolver determinadas patologias do que as heterossexuais, o que se proclama é que a associação de vários comportamentos de risco como o não uso (pela inexistência) de preservativos, o baixo índice de procura a serviços de saúde (pelo despreparo das equipes em acolher o tema), a não realização de exames básicos como o papa Nicolau (pela falta de informação) e a exposição à situações de violência(misoginia e homofobia) fazem com que esta população tenha singularidades. Por isto as políticas públicas vêm se empenhando em atendê-las. Esta atenção só é possível porque o direito à saúde entrou na pauta das reivindicações dos movimentos sociais, e o sistema de saúde foi concebido para atender às necessidades do cidadão. O acesso da população brasileira à saúde nem sempre existiu da forma que as gerações atuais o vivem. Atualmente é impensável cogitar a possibilidade de não se poder ir à um hospital público em caso de emergência, ou que este acesso só seja permitido para trabalhadores com carteira assinada, entretanto, pouco mais de duas décadas atrás não era assim. O Sistema Único de Saúde brasileiro (SUS) é decorrente de um processo histórico de lutas que, na década de 80, uniu pesquisadores, profissionais de saúde e movimentos sociais. Era um momento da construção de um país, que pela grandeza do território e processos separatistas ainda precisava se firmar como nação na busca da 20 soberania econômica, social e cultural. Diversos setores organizaram-se a fim de construir um projeto de reestruturação da saúde, uma área de grande importância para a cidadania de um povo que vinha sendo massacrado pela ditadura militar, com grande privação de direitos, inclusive os sociais. Nestas reuniões, dentre as quais se destaca como uma das mais importantes a 8ª Conferencia Nacional de Saúde, surgiram demandas que, no processo da Assembléia Constituinte de 87/88 entraram na pauta de discussão e, posteriormente integraram o texto da Carta Magna brasileira. Entretanto esse processo não se deu de uma só vez, o diálogo foi sendo construído desde o final da década de 70, com o movimento sanitarista, e mesmo posteriormente à aprovação do texto foram feitos emendas e decretos de lei, com o objetivo de melhorar o projeto, corrigindo as deficiências e o adequando às novas realidades e demandas que surgem com o tempo.(Noronha et al, 2008) Por ser pautado pela missão de atender aos princípios democráticos da nação é que o SUS tem como princípios a universalidade, a equidade e a integralidade (Araújo;Cardoso, 2007). A universalidade diz que a saúde é um direito de todos, sem exclusão de raça, credo, identidade sexual ou de gênero. A integralidade se refere tanto às ações de prevenção e promoção a saúde quanto à concepção da saúde do individuo como a relação entre diversos componentes que inclui o bem estar físico e psicológico, as condições de moradia, alimentação, emprego, sociabilidade etc. Já a equidade garante que necessidades diferenciadas sejam tratadas com distinção, a fim de proporcionar o melhor atendimento de acordo com as características especiais de cada grupo. No caso da saúde da mulher homossexual este aspecto é o mais latente, pois, em teoria, as demandas das lésbicas já estariam contempladas nas ações de saúde da mulher. 21 Entretanto, considerando as especificidades desta população, se fez necessária a criação de uma política específica. Na busca por cumprir a estes princípios no atendimento da população LGBT vêm sendo tomadas uma série de iniciativas pelo poder público, contando com o apoio da sociedade civil organizada. A articulação entre grupos de mulheres lésbicas e o SUS teve inicio no ano de 1996 com a realização do primeiro Seminário nacional de Lésbicas, o SENALE. Desde então foram criados grupos de trabalho, levantando as demandas com a própria população. Em 2004 a Secretaria Especial dos Direitos Humanos lançou o programa “Brasil sem Homofobia”, uma série de ações, propostas e projetos para eliminar a homofobia institucional e social no Brasil. Dez anos depois do primeiro SENALE, e dois anos depois do “Brasil sem Homofobia” o Ministério da Saúde lançou a cartilha “Chegou a hora de cuidar da Saúde” voltada para mulheres lésbicas e bissexuais. O material informativo foi produzido pela Área Técnica da Saúde da Mulher (ATSM) do Ministério da Saúde e foi o resultado do grupo de trabalho da ATSM sobre a saúde da mulher lésbica composto por diversas militantes dos movimentos sociais, assim como do grupo de trabalho criado pelo Programa Nacional de DST/AIDS para combate de DST’s entre lésbicas e bissexuais. No material, único até o presente momento, são abordados temas como diminuição de riscos no uso de drogas, sexo seguro e violência. São informações necessárias, que visam melhorar a qualidade de vida desta população negligenciada durante muito tempo. Pelas dificuldades de implantação de um projeto que dialogue com este público de maneira eficaz é que o resultado de pesquisas sobre cuidados com a saúde ainda se mostram longe do esperado. Algumas pesquisas realizadas no Brasil avançam nesta área, tais como (Pinto, 2004) que em estudo realizado na cidade de São Paulo145(cento e quarenta e cinco) 22 MSM - terminologia utilizada para designar mulheres que fazem sexo com mulheres, independente de sua identidade sexual - a cerca de seus cuidados com a saúde sexual. Os dados revelaram que 42,2% das mulheres não vêem necessidade de uso de preservativo nas suas relações sexuais, um dado alarmante, pois apesar do baixo índice comprovado de transmissão de HIV entre esta população, há as hepatites virais e as vaginoses causadas por fungos e bactérias, que podem acometer qualquer vagina. Entretanto, se analisados os possíveis métodos de prevenção – o Ministério da Saúde recomenda a utilização de barreiras como camisinha ou luva de látex para a penetração com as mãos,e filme plástico (aquele de embalar alimentos) para o sexo oral – será claramente identificado o porquê da baixa adesão. Enquanto não forem criados instrumentos específicos, pensados para uso na relação entre mulheres, dificilmente haverá o uso de proteção no sexo entre lésbicas. A pesquisa ainda aponta outros comportamentos perigosos, 44,1% das MSM costuma fazer sexo oral/ penetração durante o período menstrual, prática arriscada, pois o sangue pode ser fonte de contaminação. Além disto, 45,5% das mulheres que usam acessórios sexuais durante a penetração não costumam trocar a camisinha para uso na parceira, o que facilita a contaminação pela troca de fluidos. Os serviços de saúde como os Postos de Saúde da Família (PSF), e as consultas médicas seriam o espaço ideal de conversa, mas uma grande parcela das lésbicas não se sente à vontade para revelar sua orientação sexual, isso quando vão ao médico. Algumas especialidades como o ginecologista são mais facilmente buscados por mulheres que já tiveram ou mantêm relações com homens, entre as com prática exclusivamente homossexual há a concepção de que ir ao ginecologista é desnecessário ou doloroso. Facchini e Barbosa (2004, pág. 27) apontam que há “maior dificuldade em acessar 23 cuidados ginecológicos entre mulheres que nunca tiveram sexo com homens, que possuem uma gramática corporal masculinizada ou que pertencem a segmentos sócio econômicos mais baixos.” Se as pacientes são inibidas, a iniciativa também não surge das equipes de saúde. A pesquisa intitulada “As faces da homofobia no SUS”, realizada entre 2008 e 2009 entrevistou médicos e pacientes dos serviços de saúde no sul do Brasil, a conversa com os profissionais revelou que a homossexualidade não é abordada durante as consultas por medo de que isto se configure como uma invasão à intimidade da paciente (Knauth; Meinerz, 2009).Isto remete ao conceito de heterossexualidade compulsória em Butler (2003), porque conversar sobre práticas homoeróticas seria invasivo enquanto se pode conversar confortavelmente sobre práticas heterossexuais? Esta é uma questão que encontra resposta na inadequação do profissional de saúde para lidar com a diversidade. Não há um preparo para lidar com o tema, a omissão é o caminho mais fácil e perigoso. Dados do Dossiê Saúde da Mulher Lésbica (Facchini;Barbosa,2006) apontam estatísticas feitas por estudos de outros autores como o de Campos (2001) onde se constata que entre as lésbicas que não revelaram sua orientação sexual ao médico, 30,6% deixou o consultório com indicação de contraceptivo e 19,6% recebeu orientações para uso de preservativo masculino 24 5 O papel da Comunicação e Saúde O papel da comunicação nas ações de saúde entre mulheres homossexuais deve considerando os seus contextos diversos. O espaço para falar da saúde da mulher lésbica ainda é pouco, e talvez nem tão bem localizado, pois está dentro do discurso da militância homossexual, espaço onde há uma opressão de gênero ainda forte. As ações para população homossexual se concentram majoritariamente na prevenção do HIV entre homens, os espaços de circulação destas informações como paradas gays, centros de referencia e ONGs têm este foco, o que deixa as mulheres como um subgrupo dentro do movimento homossexual, tanto que a sigla GLBT foi alterada consensualmente para LGBT, na tentativa simbólica de dar mais visibilidade a este grupo que já anda esquecido desde o início do movimento. Tanto tempo de negligencia tornou esta população difícil de ser acessada, talvez seja esta a maior dificuldade para a implantação de propostas eficientes, e a comunicação exerce papel fundamental neste processo, aproximando ou repelindo, dependendo das estratégias utilizadas. Por isto que o campo da comunicação e saúde tem papel central na formulação das políticas públicas. Segundo Araújo e Cardoso (2007) os modelos de comunicação e de saúde devem ser percebidos numa abordagem diacrônica, considerando suas interseções e articulações. A dinâmica da comunicação tem de ser compreendida, mas algumas teorias, como a matemática, por exemplo, que considera a comunicação como o envio de informação do emissor para receptor, classificando as outras referências como ruídos. Esta matriz, que tem como características principais a unidirecionalidade, a linearidade 25 e a bipolaridade, vê a comunicação como uma via de mão única, onde o receptor é tratado como um recipiente vazio, que deve ser vedado hermeticamente, proibindo que informações de outras fontes, portanto inadequadas, cheguem a ele. O que este modelo não comporta é o entendimento da linguagem como um mecanismo dinâmico, não estático, ou seja, a mesma coisa dita para duas pessoas diferentes pode ter sentidos completamente divergentes. O processo comunicacional não é algo tão simplório. Absorvendo em parte este modelo é que surgiu a perspectiva desenvolvimentista, para o qual através da educação é que se mudam as práticas de saúde. A causa de doenças, portanto seria a ignorância, a correção deste problema se daria com a confecção de cartilhas explicativas e de difusão de informação em escolas e entidades de base. Esta perspectiva autoritária, onde somente uma voz é autorizada a falar, encontrou grande resistência por parte dos que propunham uma sociedade mais justa e igualitária. Na contramão desta perspectiva Paulo Freire defendia um modo de comunicação mais dialógico, equilibrando o poder entre os saberes populares e científicos, minimizando as hierarquias. Este modelo ganhou adeptos no campo político e através dele se instituiu em departamentos públicos, entretanto não vingou como prática hegemônica (Araújo;Cardoso, 2007). Saltando da idéia de recepção passiva, a perspectiva dos estudos culturais considera a comunicação como um processo de consumo, permeado por mediações culturais e sociais. É necessário preocupar-se não só com a etapa de produção da mensagem, mas também como se dará a circulação e o consumo desta. Compreender todo o processo comunicacional faz uma enorme diferença na construção das estratégias, que devem ser construídas de acordo com cada realidade. 26 No caso das mulheres lésbicas ainda falta um investimento na construção deste diálogo mais próximo e participativo. Falta considerar a diversidade dentro do próprio grupo de mulheres homossexuais, falar com adolescentes e jovens é diferente de falar com adultos. As mediações individuais são essenciais para entender porque alguns canais de comunicação são legitimados ou não pela população como espaço de circulação consumo. É por isto que para Araújo e Cardoso (2007) a comunicação em saúde deve se orientar também pelos princípios do SUS, tem de ser formulada de maneira que permita a integralidade, a universalidade e a equidade, permitindo o acesso da população nas esferas de produção, circulação e consumo, democratizando o acesso e se constituindo como um direito de todos, não só dos detentores de conhecimento técnico-científico. Anualmente o Governo Federal libera recursos financeiros às ONGs para que sejam confeccionados materiais de comunicação sobre homossexualidade e cidadania, entretanto esta construção nem sempre se dá com a participação do público interessado, sendo o poder delegado a profissionais de comunicação e designers. O que ocorre também é que a grande parte das organizações é fundada por homens e para homens, as lésbicas, como já afirmado são invizibilizadas dentro do movimento homossexual. As organizações de mulheres, em sua maioria, adotam um padrão de militância que não atrai e nem contempla a diversidade dentro do grupo de mulheres homossexuais. 27 6 Metodologia Optamos pela realização de uma pesquisa qualitativa, que teve as entrevistas como principal recurso de coleta de dados. As metodologias quantitativa e qualitativa se diferem porque enquanto na pesquisa quantitativa a proposta é ter um questionário com respostas pré estabelecidas, que podem ser facilmente tabuladas a fim de gerar dados estatísticos, a pesquisa qualitativa se propõe a investigar através de perguntas mais abertas, sem a necessidade de respostas padronizadas. Segundo Jorge Duarte (2006), através das entrevistas é possível apreender informações subjetivas de fontes relevantes, optou-se por esta metodologia por se adequar à proposta do curso e ao tempo dado para o desenvolvimento do projeto. O objetivo era pesquisar os assuntos de interesse e as fontes de informações sobre saúde utilizadas por um grupo de jovens mulheres homossexuais. O grupo focal também seria uma metodologia adequada, entretanto pelo pouco espaço de tempo para a realização do trabalho, a falta de experiência da pesquisadora com esta dinâmica e a dificuldade de recursos, o resultado poderia não ser satisfatório. Escolhemos então realizar entrevistas semi-estruturadas com até cinco pessoas, escolhidas através de indicações. Os elos iniciais foram pessoas de origens diferentes e ligadas a grupos e espaços freqüentados por jovens homossexuais da cidade de Salvador. Foi pedido a um grupo de cinco pessoas que cada uma delas indicasse pelo menos duas pessoas dentro do perfil desejado. Em uma conversa prévia foram explicadas as características necessárias e assim que chegamos a uma conclusão sobre quem poderia ou não foram passados os contatos, e assim fizemos as primeiras abordagens, através de e-mail, MSN e telefone. 28 Por ser uma pesquisa qualitativa, não trabalhamos com o conceito de amostra, própria das investigações quantitativas, e sim com o de seleção, que neste caso obedeceu a cinco pré-requisitos básicos: 1) ser do sexo feminino; 2) auto definir-se como homossexual; 3) se relacionar exclusivamente com pessoas do mesmo sexo por no mínimo a 1 (um) ano; 4) ter de 18 a 25 anos completos na data da entrevista; e 5) não conhecer ou ter tido contato prévio com a pesquisadora. A composição do grupo foi orientada para garantir sua heterogeneidade, em termos de raça, classe social e escolaridade, buscando perceber se alguma dessas características se mostraria relevante no posicionamento das entrevistadas sobre os temas abordados. A partir das indicações foram selecionadas dez participantes que atendiam aos requisitos pré-estabelecidos. Enviamos e-mail para cada uma das possíveis entrevistadas, o que não deu muito resultado, pois apenas uma respondeu prontamente. A outra que se comunicou por e-mail respondeu posteriormente. Outra foi adicionada ao MSN e a partir daí entramos em contato, conversamos sobre o teor da pesquisa e marcamos o encontro. Com as outras duas o contato foi feito por telefone pois elas não responderam aos e-mails e não tinham MSN. As outras cinco não possuíam telefone disponível, o que impossibilitou o convite. O primeiro contato foi feito com Mayara, jornalista, 25 anos que respondeu ao email no outro dia, e se mostrou disposta a colaborar, querendo fazer a entrevista neste mesmo dia. Entretanto como a pesquisa ainda não tinha sido aprovada pelo comitê de ética não foi possível realizá-la. Quando a aprovação saiu tentou-se diversas vezes marcar um encontro, mas pelo período carnavalesco, que em Salvador se estendeu de 02 de fevereiro (lavagem de Iemanjá) até 09 de março (quarta-feira de cinzas) tornou-se 29 inviável que ela participasse. Por trabalhar com assessoria de comunicação este é o período mais agitado e ela disse não ter encontrado mais nenhum espaço na agenda. A segunda participante abordada foi Aline, 22 anos, cantora. O contato foi feito através de MSN, pois ela não respondeu ao e-mail. Durante o chat ela se mostrou reticente na maior parte do tempo, querendo explicações detalhadas sobre o que se tratava a pesquisa. Diante das respostas ela se mantinha monossilábica até que a conexão caiu. No outro dia ela se conectou novamente e voltou a perguntar como seria a conversa, depois de algum tempo decidiu marcar para o Salvador shopping, um dos maiores de Salvador, voltado para o público A e B. No dia e horário combinado ela apareceu e fizemos a entrevista. A terceira convidada foi Priscila, 25 anos, artista plástica. Ela também não respondeu aos e-mails e não tinha MSN, então o contato foi feito por telefone. Ela se mostrou muito interessada na pesquisa, disse que tinha muito interesse em colaborar com uma pesquisa que abordasse este tema. Tentou marcar a entrevista para a próxima semana, mas estava com compromissos de trabalho. Ficou de retornar a ligação indicando o melhor dia e horário, não retornou e após isto o telefone passou a estar sempre desligado. A quarta convidada foi M*, 22 anos, estudante de arquitetura. O contato com ela foi o mais rápido, feito através de e-mail. Imediatamente ela respondeu marcando para o mesmo dia, dali a duas horas, em um movimentado shopping da cidade. Compareceu pontualmente e então realizamos a entrevista. A quinta selecionada foi Júlia*, 25 anos, publicitária. O contato por e-mail não foi respondido então foi necessário usar o telefone. Prontamente ela se dispôs a 30 participar marcando a entrevista para a segunda-feira - o contato foi feito na sexta – às 19h na Livraria Cultura do Salvador Shopping. Houve um atraso de uma hora, entretanto ela enviou duas mensagens de texto explicando que estava num congestionamento, mas que chegaria logo, e chegou. O número de participantes foi reduzido por conta dos percalços de tempo sofridos durante o processo de coleta de informações, houve uma demora, devido ao calendário, da submissão do projeto ao Comitê de Ética da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, seguido a isso as festividades carnavalescas em Salvador impediram a participação de um número maior de pessoas. As entrevistas foram orientadas segundo um roteiro previamente estabelecido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio - Fiocruz, as questões foram desenvolvidas com base na metodologia apresentada por Gaskell (2002) que orienta o entrevistador a trabalhar com tópico guia que, segundo o autor, é o resultado da articulação do tema central com o problema de pesquisa, e deve caber em uma página. Para Duarte (2006) este modelo une a flexibilidade de uma questão não estruturada com o controle de um roteiro. Isto proporcionou mais segurança à entrevistadora, que pode ir aprofundando as perguntas gradativamente, sem interrupções abruptas de um tema a outro, dando assim o tempo necessário para que a entrevistada refletisse e respondesse com naturalidade. O roteiro foi dividido em quatro etapas: identificação, vivência, saúde e comunicação e saúde, e as perguntas seguiram uma sequência de acordo com os temas que poderiam surgir, mas a ordem foi subvertida sempre que necessário. As questões sobre buscaram facilitar a comunicação entre entrevistadora e entrevistada, já que a entrevista era semi-estruturada. Ou seja, optou-se por selecionar os temas abordados e 31 não pela definição rígida de perguntas que tinham de ser feitas a todas as participantes, com respostas pré-definidas. Este método orientou a entrevistadora e facilitou o posterior trabalho de sistematização e análise das informações. Durante as conversas, os temas foram contemplados, de acordo com as características, ritmo, história de vida e interesses peculiares de cada sujeito. Tanto nos primeiros contatos, como no desenrolar das conversas, que tiveram cada uma a duração de aproximadamente uma hora, a pesquisadora esteve atenta aos detalhes ambientais e de sua própria conduta (gestos, entonação, interrupções etc.) que poderiam facilitar inibir ou induzir a participação da entrevistada. Para cada entrevistada foi elaborado também um diário de campo, útil para o registro das impressões de cada experiência vivenciadas, contribuindo para a sistematização de idéias e aprendizado cumulativo. Neste diário foram anotadas as reações das convidadas desde o primeiro contato, assim como data e horário em que ocorreram. Também foram feitas anotações de como cada uma se portou, o que vestia e o que fez antes e depois do encontro. Como suporte para as entrevistas foi utilizado o gravador de áudio do smartphone modelo Nokia 5220, a fim de manter a maior fluência na conversa, sem a necessidade de anotações detalhadas das falas. Quando consultadas sobre o registro de voz as participantes se mostraram compreensivas e não apresentaram resistência. O processo de seleção do conteúdo e a decupagem do material, foram feitas posteriormente a cada entrevista, o que facilitou o registro das impressões fixadas na memória. Possibilitou também perceber se havia algum ponto a ser retomado, e se haveria a necessidade de uma segunda entrevista, mas não houve. As entrevistas foram transcritas preservando as falas das jovens, suas palavras e expressões foram 32 reproduzidas sem muita dificuldade, pois não havia gírias desconhecidas ou expressões de baixo calão. 33 7 Os encontros Os encontros foram realizados nos dias 9, 10 e 14 de março, no horário da noite por escolha das participantes. O primeiro foi no Salvador Shopping, complexo de compras e lazer da cidade de Salvador voltado para o público A e B, o segundo no Shopping Iguatemi, maior da cidade e o terceiro também no Salvador Shopping, mas em uma área reservada, o caffe da Livraria Cultura. A primeira entrevistada, Aline, é negra, cantora e tem o segundo grau completo. Trabalhando no momento como auxiliar de escritório, anseia para o seu futuro profissional ser produtora de uma banda de pagode e viver da música. A jovem de 22 anos é moradora da Mata Escura, bairro pobre de Salvador e afastado do centro, por isto o desejo de mudar de domicílio o mais breve possível. Por enquanto ainda vive com a família, que se resume à mãe e ao padrasto com os quais ela pouco se relaciona, é solteira e tem poucos amigos, sua companhia freqüente é um primo também homossexual com quem troca confidências. O custeio das necessidades, excluindo moradia e alimentação, é feito pelo salário recebido no emprego. A entrevista foi realizada no dia 9 de março, às 19 horas na praça de alimentação do Salvador Shopping. Ela vestia-se de modo sóbrio e casual, calça jeans, blusa básica e tênis. Seu visual não chamava a atenção, a não ser pelos piercings, orelha e nariz, e um colar com seu nome. A conversa durou aproximadamente cinqüenta e cinco minutos e as falas intercalaram momentos eufóricos e monossilábicos. Não se mostrou constrangida em falar sobre homossexualidade, sexo ou seus relacionamentos, as reticências apareceram quando o tema foi a prática sexual. Quando perguntada sobre métodos de prevenção a entrevistada riu bastante, tentando explicar o que segundo ela parecia ser ridículo, o que tornou a conversa mais descontraída dali por diante. Finalizamos e então ela fez questão 34 de me “entrevistar”, fazendo perguntas de caráter pessoal, a conversa durou mais trinta minutos. A segunda entrevista foi em uma temakeria do Shopping Iguatemi, às 18h com M*, que depois de refletir muito pediu para ser assim chamada. Ela tem 22 anos e é estudante de Arquitetura da faculdade mais cara de Salvador, a mensalidade do seu curso custa R$ 1.000 (mil reais) e é custeada pelos pais já que ela nunca trabalhou nem exerceu atividade remunerada. M* é branca, vive no bairro do Rio Vermelho, classe média, em um edifício bem localizado. Mora com os pais e a irmã mais velha e mantém uma boa relação com todos, possui carro, recebe mesada e vive na companhia dos amigos e da namorada com quem tem um relacionamento conturbado de dois meses. Gosta de música, por isto toca violão, teclado, violino e guitarra. No dia da entrevista ela se vestia de modo casual, mas sua calça larga, o tênis e o modo como se comportava, segundo ela, denotavam sua homossexualidade. Mostrou-se apreensiva durante toda a conversa, respondia quando perguntada, não desenvolvia alguns assuntos, omitia outros e quando não queria falar dizia não se lembrar, justificando ter pouca memória. Depois da conversa me convidou para comer pizza, aceitei e neste momento acabamos conversando sobre assuntos que não haviam sido contemplados, como seu problema de peso e baixa estima. A terceira entrevista foi no caffé da Livraria Cultura, também no Salvador Shopping. O encontro que estava previsto para começar às 19h só se iniciou às 20h. Júlia* é publicitária e tem 25 anos, vinda do interior do Estado mora em Salvador há quatro anos, dividindo apartamento no bairro de Brotas, classe média, com uma conhecida com a qual está brigada no momento, por isto se mudará em breve. Ela é parda e veste-se de modo básico, no dia estava com calça skin e bata. A conversa, que 35 durou 1h 20min, começou apressada, com a entrevistada falando muito mais do que era perguntado, por vezes atropelando suas próprias falas e tendo que retomar o raciocínio. Completamente à vontade com o local não se mostrou apreensiva com a possibilidade de que outras pessoas ouvissem a conversa, as mesas do local são muito próximas. Júlia se formou por uma faculdade particular e atua no mercado publicitário, mostra insatisfação com a carreira por isso pretende talvez migrar para a veterinária. A faculdade, assim como o apartamento em que vive ficaram por conta do pai, o seu salário é utilizado para as demais despesas, que incluem viagens periódicas à cidade onde reside sua namorada, uma psicóloga com quem mantém relacionamento há dois anos. Depois da conversa Júlia* me convidou para jantar e conversamos por mais uma hora. 36 8. As conversas As entrevistas foram, em geral, bastante descontraídas, os assuntos foram abordados com naturalidade e as participantes se mostraram dispostas a conversar sobre suas vidas e experiências. As entrevistadas têm em comum o fato de ter descoberto a homossexualidade ainda cedo, tendo a possibilidade de viver experiências homoeróticas na adolescência. Também nunca se relacionaram afetivamente ou sexualmente com homens, se autodenominam lésbicas e têm um grupo de amigos homossexuais/bissexuais com os quais convive. A dificuldade de aceitação da própria homossexualidade foi caracterizada como um momento de angustia para Júlia*, que durante a conversa se declarou hipocondríaca, revelou ter transtorno de ansiedade e já ter sofrido de síndrome do pânico e depressão. Quando ainda acreditava que a homossexualidade poderia ser um distúrbio psíquico, ela procurou ajuda espiritual na IURD (Igreja Universal do Reino de Deus) 3. Mesmo sem revelar sua orientação ela passou a freqüentar os cultos, depois de ter visto nos programas veiculados pela Rede Record, que mostravam pessoas testemunhando terem sido curadas do “encosto da homossexualidade”, como definem os pastores desta seita religiosa. Entretanto após alguns meses sem sucesso ela desistiu da idéia e, aos 16, anos decidiu aceitar-se homossexual. As outras duas entrevistadas não passaram por problemas de aceitação, somente M* que acreditava ser a única a ter desejos homoeróticos, mas depois que conheceu através da internet outras pessoas com a 3 A Igreja iniciou suas atividades em julho de 1977, por Edir Macedo, atualmente bispo e sócio de 120 emissoras de radiodifusão em todo o Brasil, incluindo a Rede Record que desponta como uma das grandes redes de televisão do país. Grande parte da programação da rede é dedicada aos cultos e programas da IURD, incluindo o “Fala que eu te escuto” veiculado nas madrugadas, os cultos e testemunhos de fé. 37 mesma orientação passou a aceitar tranquilamente sua orientação sexual. É de se esperar a dificuldade de compreender a homossexualidade como algo natural, possível. As pressões impostas pela sociedade heteronormativa e as dificuldades enfrentadas por quem vive o papel de ser o outro não são atrativos. É compreensível que se lute contra, ninguém quer ser excluído, marginalizado, mas há coisas que não são fruto somente de um processo de escolha, é por isso que o conceito de orientação substituiu o de opção sexual, conservando o entendimento de que não é uma condição anormal, é só mais uma possibilidade. Quando questionadas sobre as preocupações em saúde foram levantados temas como diabetes, hipertensão, alimentação, doenças sexualmente transmissíveis e prevenção, sendo que estes dois últimos temas ganharam destaque significativo, revelando os discursos das políticas de saúde e da militância homossexual. Os cuidados com o peso e a alimentação são considerados a maior preocupação por Aline e M*, que busca emagrecer, mas diz não conseguir. Elas buscam informações sobre alimentos mais saudáveis e emagrecedores, entretanto não praticam esportes e nem passaram por uma reeducação alimentar acompanhada, em suma, não mostram iniciativa para alcançar o que dizem querer, talvez por este não ser um problema de fato. Vive-se uma era de preocupação extrema com a saúde do corpo, que tem como grande exponencial a magreza, ser magro é ser saudável, logo todos buscam, ou deveriam buscar emagrecer. Durante a conversa, quando questões sobre os sentimento seram aprofundadas, apareciam preocupações como estima medo de rejeição e incapacidade de se relacionar afetivamente. A entrevistada M* revelou que sua maior preocupação tem a ver com sua “baixa - estima” e o medo de rejeição, ela vive um relacionamento com uma pessoa que 38 ela considera além de suas possibilidades, a menina seria muito bonita enquanto ela se acha “sem atrativos”. Isto talvez justifique o fato de que em dois meses ela já foi traída duas vezes – que ela saiba –e, mesmo assim, decidiu perdoar. Invariavelmente quando questionadas sobre as preocupações com a saúde as entrevistadas passaram a falar de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Saúde e doença foram tratadas como antônimas, seguindo o discurso do modelo biomédico para o qual ter saúde significa não ter patologias. As informações que circulam sobre saúde homossexual, ainda enfatizam a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, a associação entre homossexualidade e risco ainda está presente, mesmo que de forma indireta e predominantemente baseada nas relações entre homens. Para as mulheres o discurso da hiper prevenção assume outras características, se para os homens é tudo permitido, desde que com camisinha, para elas a atenção e o cuidado são exaltados como forma de permitir segurança. O medo de contrair alguma doença se mostrou acentuado em Júlia, que já realizou o teste de HIV diversas vezes. “Sou preconceituosa com meninas que são bi (bissexual), eu tive uma namorada bi e ela me deu ‘corno’três vezes, com homens. Quando é bi eu já fico com o pé atrás. Essa minha namorada agora, eu não tinha segurança pra fazer sexo, eu sou muito preocupada com isso, e eu estava apaixonada por ela, morrendo de vontade, mas eu não sabia o histórico. A gente só veio ter relacionamento sexual depois de oito meses.” (Júlia*). O que está presente nesta concepção é também a lógica heterossexista, que encara a monogamia como prova de confiabilidade. Não transar com uma menina que seja bissexual é também não aceitar que ela tenha “outro homem”, o amor está portanto 39 associado ao sentimento de posse da mulher, característica do machismo que ainda impera na sociedade. Um componente importante aparece como método de prevenção: a confiança na parceira. Nádia Meinerz (2004) conclui que “As estratégias preventivas das mulheres estão relacionadas a diferenciações de hierarquias morais e à preferência pela constituição de uma parceria estável”. Ou seja, conhecer a parceira e a melhor forma de prevenção. As entrevistadas citaram esta como a principal maneira de praticar sexo seguro, sendo que M* diz ter recebido esta orientação de sua ginecologista, durante uma consulta. Júlia* revelou que sua preocupação com as DST’s surgiu ainda em sua primeira experiência sexual, com 17 anos, que ela define da seguinte forma “eu nem falo que foi minha primeira vez, foi uma penitência que eu tive que pagar na terra”. Nesta relação ela contraiu hpv e teve de fazer tratamento com ácido para a retirada das verrugas, além de ter de mentir para a mãe sobre como havia contraído. Daí em diante ao fim de relacionamento ela diz esperar por três meses para fazer o exame, só se relacionando sexualmente quando tem certeza de que não tem HIV. Entretanto ela não solicita a mesma atitude das parceiras, ela diz que procura conversar sobre a vida da pessoa, descartando as que se declarem bissexuais por considerá-las promíscuas. Já M* além de conversar muito com a parceira se recusa a ter determinadas práticas sexuais, afirma já ter mantido muitos relacionamentos, mas sexo com apenas duas.“Oral eu nunca fiz, tenho nojo. Todo mundo acha uma besteira, eu não sei, fico com receio, tenho medo...” (M*). Já Aline diz que também conversa bastante antes de se relacionar, mas que depois que acontece não tem nenhum limite, pois acredita que se houver a possibilidade 40 de contrair doença isso ocorrerá independente da prática, para ela sexo oral, penetração e contato vagina-vagina oferecem os mesmos riscos. Como a prevenção de DST’s foi privilegiada nas conversas, os meios e canais de comunicação citados se referem em sua maioria à busca por informações sobre este tema. A internet se revelou como o modo preferencial, M* e Júlia* pesquisam em sites e blogs voltados para lésbicas. Foi citado o portal UOL, que tem uma área exclusivamente dedicada aos homossexuais, e “outros que eu não lembro o nome” como as principais fontes. Pela proliferação dos blogs e sites é compreensível que para além do endereço eletrônico o que se fixe é o modo de busca, por isto o Google foi citado com freqüência. Segundo Pierre Lèvy, o ciberespaço transforma a relação com o saber justamente por amplificar os mecanismos cognitivos das pessoas. A quantidade de informações armazenadas nos servidores é como uma memória exterior, facilmente acessada, portanto não há a necessidade de se anotar os endereços ou salvar as páginas, até mesmo porque os conteúdos tendem a se repetir. Os bancos de dados e os hiperdocumentos permitem que a busca pela informação desejada se torne um processo dinâmico, característico da contemporaneidade. Todavia não se pode considerar que somente por esta característica o acesso à comunicação se dá de forma democrática, há a questão do poder simbólico, da legitimidade e todas as outras que envolvem o processo comunicativo, assim como nos outros veículos. A Internet pode sim ser considerada como um meio mais permeável, e que comporta espaços de troca. Os sites de redes sociais são um grande exponencial desta comunicação mais dialógica. As ferramentas do Facebook, myspace, foursquare, Orkut e twitter são usados com os mais diversos interesses, através de suas comunidades, seguidores e marcações é possível compartilhar informações, ouvir opiniões, encontrar um lugar e postar noticias 41 e fotos em tempo real, com uma grande multiplicidade de produtores e reprodutores de conteúdo, que ampliam a circulação e as possibilidades de consumo. Quando perguntada sobre como se informa sobre os riscos de contrair HIV, sua maior preocupação, Júlia respondeu que o Orkut é um canal bastante utilizado. “No Orkut, eu lia nas comunidades os fóruns de pessoas com HIV ou que fizeram exames e estavam esperando o resultado... eu ia me acalmando porque via situações piores.” Durante as entrevistas um site que despertou a curiosidade foi oleskut4, primeiro site de redes sociais brasileira exclusivamente voltada para lésbicas, que só ingressam após terem seus cadastros analisados e aprovados pelos moderadores. Para Aline, o leskut é um espaço de consumo de diversos tipos de informação. “Hoje em dia eu gosto muito do leskut, tem muita coisa interessante. Tem blog, contos eróticos, tem vídeos, lá todo mundo bota sua opinião. Tem o Messenger lá, todo mundo conversando...” Entretanto para as conversas ela prefere os amigos, uma galera que ela define como composta 99% de gays e lésbicas. Júlia e M* também têm um grupo de amigos gays com os quais passa a maior parte do tempo, mas para conversar sobre saúde preferem suas parceiras. Isto porque as informações encontradas na internet nem sempre correspondem às expectativas, são consideradas inapropriadas e sem aplicabilidade real, a pouca oferta de material específico faz com que informações voltadas para o público masculino, ou heterossexual sejam apropriadas e resignificadas.“As coisas que eu via na internet eram tão“professor pardal” que chegavam a ser absurdas. Eu pegava também as cartilhas e adaptava pra minha realidade por dedução, eu trazia isso pra minha realidade, eu 4 “Ao criar o Parada Lésbica, queria fazer um site onde as lésbicas pudessem encontrar de tudo um pouco, textos, dicas, notícias, entretenimento. Um lugar para encontrarem informação e se conhecerem. Com a necessidade da criação de uma Rede Social o Leskut foi inaugurado.” Del Torres – Criadora do leskut. 42 adaptava as informações. Se dizia que não podia ter contato com fluidos na corrente sanguínea eu já pensava na minha realidade”. (Júlia*) A precariedade de material falando sobre sexualidade voltado para as mulheres, sejam homossexuais ou heterossexuais, é evidente. Para as jovens então, o sexo é associado aos riscos de gravidez na adolescência. Entretanto em 2011 a campanha de prevenção ao HIV se voltou para o público de mulheres heterossexuais jovens, porque o índice de contaminação deste grupo se elevou significativamente. Os conteúdos de textos oficiais – cartilha e material financiado pelo Ministério da Saúde - são reproduzidos na internet, através de blogs e sites é possível encontrar informações presentes nos discursos científicos dos textos oficiais, entretanto essa presença do Estado na formulação das políticas publicas não se mostra perceptível para as entrevistadas. Elas desconhecem a existência políticas públicas e de material específico do Governo para lésbicas. “E existe? Se existir deve ser em site, o pessoal mesmo que desenvolve seus métodos, mas do governo eu acho que não tem nenhuma preocupação com esse público, se tem eu não conheço ninguém que já tenha visto. Eu sempre procurava pelo Google. É preciso construir uma relação de confiança, para que então este público seja incluído e suas demandas reais contempladas. A comunicação em saúde ainda fica a cargo de ONGs e instituições que nem sempre contemplam a diversidade, ou que não permitem a participação popular. O problema da militância é que ela afasta os que não querem se mostrar, sair do armário. Então ela contempla apenas uma parte, pequena, dos homossexuais. O movimento já compreende que nem todo gay se veste de rosa e usa purpurina, mas ainda falta entender que nem toda lésbica usa coturno, ainda há uma 43 construção estereotipada da lésbica. É direito de cada um preservar sua intimidade, de não participar de demonstrações públicas da identidade sexual, a questão é que isto não é respeitado. Estas pessoas que não “saem do armário” são duplamente marginalizadas, dentro da sociedade e dentro do movimento homossexual. E estas pessoas não se mostram muitas vezes por medo, por não querer ter sua vida comprometida, por medo. Durante as entrevistas esta se mostrou ser uma grande preocupação para as meninas, o medo de se expor está presente em todas as atitudes. Talvez por não considerarem a saúde em seu conceito ampliado, incluindo as condições de vida, é que a violência não foi considerada um problema de saúde. A homossexualidade é definida por Júlia como um “ponto fraco em sua personalidade” que ela tem de defender dos outros, com medo de sofrer bullyng, se comportava não emitindo opiniões polêmicas e evitando conflitos. Já M* não tem medo de agressão na rua, por sempre andar em locais protegidos, mas da retaliação que possa sofrer em casa, se alguém a encontrar em “atitude suspeita”, que seria um momento de afeto com alguma namorada, e contar para sua família. Já Aline teve a experiência traumatizante de passar por uma situação de agressão verbal, foi expulsa, juntamente com a namorada, de um bar, porque se beijaram. As jovens prestaram queixa na delegacia, levaram testemunhas e estavam dispostas a pedir justiça, mas o caso não foi adiante. O acusado não compareceu no dia e hora marcados, e a polícia não tomou maiores providências. Há em trâmite no Senado um projeto de lei que busca criminalizar a homofobia, igualando este tipo de discriminação aos de raça, credo e gênero, crime passível de punição, reclusão e multa. O Projeto de Lei da Câmara – PL -122/2006 está aguardando aprovação, mas conta com grande rejeição da bancada cristã que já afirmou que fará de tudo para não aprová-lo. Alegam que o projeto 44 irá acabar com a liberdade de expressão e de culto religioso, pois as igrejas protestantes não poderiam mais se referir à homossexualidade obsessão espiritual ou encosto. O movimento LGBT rebate esta acusação afirmando que as igrejas não podem utilizar o discurso religioso para incitar a violência, prometendo cura para algo que a Organização Mundial de Saúde deixou de considerar como doença desde o século passado. Elas têm medo de que a homofobia afete suas vidas profissionais, ou que possa ser utilizada de forma que as prejudique, por isto não revelam e nem pretendem fazer isto no trabalho. Também há o medo de sofrer agressões em locais públicos, por isso elas evitam beijar, abraçar e trocar carícias com suas namoradas ou ficantes. Segundo Aline “namoram só de olhar”, restringindo o contato físico a ambientes particulares como casa de amigos, hotéis e espaços GLS como o beco da off ou a San Sebastian ( boates gays de Salvador). O medo e a privação constante a que são submetidas mascaram a realidade, impedindo que as situações de violência sejam vistas como tais, os processos de ocultação da identidade sexual são naturalizados, considerados o modo correto de agir para não causar distúrbios. O deixar de fazer um carinho na namorada para não chamar a atenção, o medo de que a família seja exposta e a série de mentiras e histórias fantasiosas que elas têm de inventar para os outros, são pequenas partes do processo de viver a homossexualidade em uma sociedade heteronormativa. M* relata que sua mãe se refere a ela com um sentimento de pesar, pois a filha nunca poderá ter uma vida normal. Entretanto esta própria mãe não aceita ver cenas de carinho entre sua filha e a namorada, dizendo não estar preparada para isso. “É, eu sinto que ela tem medo de ver alguma coisa, algum carinho, quando eu levo alguém lá em casa ela fica agoniada, se a porta está fechada ela já bate fazendo barulho pra, se eu estiver fazendo alguma coisa, 45 já me afastar.”(M*). Se a própria mãe não se sente confortável, por que os outros se sentiriam? É por isto que M* compreende a situação, e evita a todo custo ter gestos e atitudes que denunciem, como se fosse um crime, a sua homossexualidade. Durante o V Senale, realizado em 2003, foi apontada a preocupação sobre os textos que tratam sobre violência contra a mulher não abordarem a homossexualidade como fator agravante destas agressões. A violência intrafamiliar é a que mais afeta as jovens, que apanham, são violentadas sexualmente e expulsas de casa pelos próprios parentes. Como estas violências nem sempre são denunciadas, os dados sobre atos de homofobia contra lésbicas ainda estão longe de retratar a realidade. 46 7 Conclusão A análise dos dados coletados sobre a comunicação e saúde entre a população de lesbicas apontou que os canais de comunicação privilegiados são as namoradas e a internet, os amigos estão presente, mas não para conversar sobre estes assuntos. A internet é usada para dirimir dúvidas, pesquisar sobre possibilidades e casos, como as comunidades do Orkut, blogs e Google, mas na hora de conversar as namoradas são as fontes mais próximas e confiáveis. Por dividirem além da intimidade os problemas sociais decorrentes do preconceito o relacionamento tem embutido, além da paixão e do desejo, um sentimento de cumplicidade e parceria. As jovens entrevistadas tiveram grande preocupação em mostrar que sabiam dos riscos inerentes a prática sexual, e que buscam formas de prevenção das DST’s, mesmo sem saber a quais estariam vulneráveis, e se realmente há um risco aumentado. Elas concordam em seus pontos de vista por considerarem que não há métodos seguros nem confortáveis para a prevenção e, portanto, elas não os usam por inadequação, não por resistência. Por isso a confiança na parceira é um dado relevante na hora de decidir se haverá ou não contato sexual. As entrevistadas sentem uma ausência das políticas públicas, que existem, mas não se fazem presente. As entrevistadas não freqüentam ONGs nem espaços de militância LGBT, vivem a identidade sexual como mais um componente de sua vida, entretanto o discurso da militância, principalmente no campo da saúde, voltado para a prevenção de DST’s é acessado e incorporado por elas como o desejável no comportamento sexual. O medo da violência homofóbica, que não foi considerado por elas como um problema de saúde com o qual se preocupassem, é o que mais as assusta de fato. Isto fica evidenciado pelos relatos e pelo comportamento delas frente a situações onde evitam expor a sua orientação, com medo de perder o emprego, sofrer agressões ete. As meninas relataram situações de privação de direitos como o de se expressar livremente, beijando ou abraçando uma namorada, mesmo em casa, pois a família também não as aceita. O processo de ocultação da homossexualidade se naturalizou de tal forma que mesmo hoje, quando esta concepção já se encontra rompida, a sua manifestação ainda sofre preconceito social. Usualmente se apela para a presença de crianças como 47 justificativa para que duas pessoas do mesmo sexo não possam se beijar em público, entretanto são essas crianças que vêm cenas de sexo e violência na televisão que não podem presenciar momentos de carinho, amor e respeito. As entrevistadas mantêm esta postura de “não perturbação da ordem”, não por se considerarem erradas, ou que seja inapropriado ser lésbica, mas pela concepção de que há uma grande impunidade para este tipo de crime. Então, como estão desamparadas, é melhor evitar qualquer tipo de situação que possa ser alvo de olhares, xingamentos, espancamento e até morte. E como já se habituaram a ter este comportamento desde sempre, não lutam contra. Há também o medo de que ao “levantar a bandeira” da homossexualidade, a vida profissional seja comprometida. Ser lésbica não é um problema para elas, mas ainda é para os outros, então é melhor não provocar. Casa e escola não são os espaços privilegiados para falar sobre a homossexualidade, os amigos exercem papel importante no apoio psicológico e na sensação de pertencimento, prestando o apoio e a compreensão que não são possíveis na família. Os pais em geral têm conhecimento da orientação sexual das filhas, mas para nisto. O discurso heterossexista, de legitimação da família através da procriação também se mostrou presente, uma das entrevistadas inclusive revelou que se casaria com um homem para realizar o sonho de ter uma família. O Brasil se encontra em um momento de grande avanço nos direitos homossexuais, em 2011 foi aprovado pelo Superior Tribunal Federal a lei que reconhece a união de pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, este talvez seja o início de um processo de transformação do conceito de família. A internet, principalmente os sites de redes sociais, podem ser considerados um meio bastante confortável para estas jovens, a preservação da identidade, a possibilidade de não se expor diretamente e a oportunidade de conhecer pessoas que vivem a mesma situação são grandes atrativos. Poder buscar informações anonimamente, sem ter que passar por um profissional de saúde, ou freqüentar um espaço identificado como homossexual, dá uma sensação de autosuficiência muito grande, permitindo que os reais interesses sejam assistidos. Isto contempla a dimensão do consumo, e da circulação talvez, mas é necessário incluir esta população na esfera da produção em comunicação e saúde, criando suas próprias estratégias e direcionando as políticas para o que interessa 48 de fato. Não é aceitável que até hoje se recomende o uso de papel filme, por exemplo, quem em sã consciência irá propor embalar a vagina da namorada antes do sexo? Esta falta de sensibilidade, de noção da realidade, acaba interferindo na credibilidade das ações que por hora circulam. Os materiais e as informações têm que se adequar aos contextos, serem pautados na vida real e não nos ideais médicos, e isto só irá ocorrer quando a comunicação for entendida não como transmissão, mas como construção coletiva de conhecimento. 49 8. Referências ARAUJO, I.S; CARDOSO, J. Comunicação e Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007. BUTLER, J. Problemas de Gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. BRASIL. Conselho Nacional de Combate à Discriminação. Brasil Sem Homofobia: Programa de combate à violência e à discriminação contra GLTB e promoção da cidadania homossexual. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde Integral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Brasília, 2010. DUARTE, J. “Entrevista em Profundidade” In:BARROS, A.; DUARTE, J.(orgs). Métodos e Técnicas de pesquisa em comunicação.São Paulo: atlas, 2006. ENNE, A.L. Juventude como espírito de tempo, faixa etária e estilo de vida: processos constitutivos de uma categoria-chave da modernidade.Revista comunicação, mídia e consumo. São Paulo,vol.7, 2010. Disponível em <http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/issue/view/23> FACCHINI, R.;BARBOSA, R. M. Dossiê saúde das mulheres lésbicas: promoção da equidade e da integralidade. Belo Horizonte: Rede feminista de saúde, 2006. FACCHINI, R.; BARBOSA, R. M. Representações e práticas relativas à saúde sexual e reprodutiva entre mulheres que fazem sexo com mulheres. Campinas, 2004 (mimeo). FERNANDES,Vagner.'Barebacking' cresce no Brasil e torna-se caso de saúde pública. Jornal do Brasil Online, Rio de janeiro, 03 ago.2009. Disponível em: <http://jbonline.terra.com.br/extra/2009/01/03/e030115675.html> . Acesso em: 01 nov. 2009. FOUCAULT, M.História da Sexualidade I: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 2007. FREIRE COSTA, Jurandir. A questão psicanalítica da identidade sexual. In: Graña, Rober-to (org.). Homossexualidade. Formulações Psicanalíticas Atuais. Porto Alegre: Artes Médi-cas, 1998, p. 15-27. GASKELL, G. “Entrevistas individuais e grupais”. In: BAUER, M.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som – um manual prático. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002. LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho- ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica,2008. HALL, S. Quem precisa da identidade? In: SILVA, T. T. (org. e trad.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais.Petrópolis: Vozes, 2000. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A,2005. 50 KNAUTH, Daniela Riva. As faces da homofobia no campo da saúde. Fundação médica do Rio grande do sul. 2009. LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho- ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica,2008. MARTIN-BARBERO, J. Dos meios a mediações. Rio de Janeiro: UFRJ, 2003 MATTELART, A.; MATTELART, M. História das teorias de Comunicação. São Paulo: Loyola, 1999. MOTT, Luiz. O Lesbianismo no Brasil. Porto Alegre: Mercado Aberto,1987. MEINERZ, N. E. Método cem por cento garantido. Práticas de sexo seguro nasrelações homoeróticas entre mulheres de segmentos médios em Porto Alegre. NAVARRO-SWAIN, Tânia . O que é lesbianismo. São Paulo: Brasiliense, 2000. NORONHA, J.C; LIMA, L.D; MACHADO, C.V. O Sistema Único de Saúde. In: GIOVANELLAet al (orgs.) Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2008. PINTO, V. M. et al. Sexually transmitted disease/HIV risk behaviour among women who have sex with women. Disponível em PRINCÍPIOS DE YOGYAKARTA. Princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero.In http://www.clam.org.br/pdf/principios_de_yogyakarta.pdf, 2007. REDE FEMINISTA DE SAÚDE.Saúde das Mulheres Lésbicas – Promoção da Equidade e da Integralidade. Belo Horizonte. 2006. SILVA, T. T. (org. e trad.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais.Petrópolis: Vozes, 2000. 51 Anexo 1 – Roteiro de entrevista. Roteiro de Entrevista Semi-Estruturada O roteiro foi desenvolvido com base nas reflexões apresentadas por Gaskell (2002) que orientam o entrevistador a trabalhar com tópicos-guia. Segundo o autor,o tópico-guia resulta da articulação do tema central com o problema de pesquisa. O detalhamento da subdivisão dos tópicos em múltiplas perguntas seqüenciais talvez pareça excessivo e diretivo. Esclareço, contudo, que essa iniciativa visa apenas fornecer subsídios à apreciação do Comitê de Ética sobre o conteúdo e o desenrolar imaginado para a entrevista. I. Identificação 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. II. Qual o seu nome? Quantos anos você tem? Qual sua cor/raça? Você estuda ou já estudou? O que? Concluiu o curso? Você trabalha ou está procurando emprego? Qual sua profissão? Qual sua renda familiar mensal? Você mora sozinha ou com sua família? Gosta dessa condição? Por quê? Você mora em que bairro? Gosta de morar lá? Se sente segura? Vivência 1. Como você define sua preferência sexual (ou como prefere ser chamada)? 2. Como é sua relação com sua família? Vocês se dão bem ou brigam? Por quais motivos? 3. Você conversa sobre sua orientação sexual com sua família? E com os amigos? Eles aceitam bem? Como foi no início? Você precisou de algum tipo de ajuda ou orientação? 4. Você tem muitos amigos/amigas? Freqüenta locais GLS? O que há de melhor e de pior nestes lugares? 5. Para você e fácil ou difícil ser homossexual? Você vive ou já viveu algum conflito por causa disso? 6. O fato de você ser lésbica já lhe prejudicou ou ajudou de alguma forma? No seu trabalho/escola, sua orientação é conhecida? 7. Você já foi constrangida ou agredida seja verbalmente ou fisicamente? Onde ocorreu? Qual foi sua reação? 8. Você já foi vítima de homofobia? Denunciou ou teria coragem ir à polícia? 52 9. Você se preocupa com o futuro, tem planos ou vive o presente sem se preocupar com o que virá? III – Saúde 1. E com sua saúde, você se preocupa? Com o quê especificamente? O que você faz para se cuidar? Você faz ou gosta de algo que julga prejudicial à sua saúde? 2. Você freqüenta o ginecologista? Ele (a) sabe de sua orientação sexual? Você se sente a vontade para conversar sobre isso? 3. Nas suas relações com mulheres você já utilizou algum método de prevenção de doenças? Quais você conhece? O que acha, são confortáveis ou inapropriados? 4. Você pensa em ter filhos? Quer engravidar? Conhece as tecnologias existentes ou acha que tem pouca informação sobre o assunto? IV – Comunicação e Saúde 1. E quando você quer saber alguma coisa a respeito de sua saúde, o que você faz? Como você busca essa informação? 2. Você costuma ver TV, acessar internet ou ler jornais e revistas para se informar sobre sua saúde? Quais são seus preferidos? Por que? 3. Você se sente contemplada pelas informações? Acha que os meios de informação e comunicação têm interesse em falar para mulheres lésbicas? 4. E quando você quer saber sobre saúde sexual, em um enfoque mais voltado para a mulher lésbica, tem alguma revista, programa ou site preferido? Qual? Por que este e não outros? 5. Você se identifica com o que os meios de comunicação falam de mulheres homossexuais? O que mais lhe incomoda ou lhe deixa feliz nessas representações? 6. Você costuma freqüentar blogs, sites e páginas com conteúdo específico para lésbicas? Quais? 7. Há algum aspecto não abordado sobre o qual você gostaria de comentar? 53