Revisão de Literatura VALIDAÇÃO DO PROCESSO DE LIMPEZA DE ARTIGOS ODONTO-MÉDICO-HOSPITALARES: UMA REVISÃO INTEGRATIVA MEDICAL DEVICES AND CLEANING VALIDATION: AN INTEGRATIVE REVIEW VALIDACIÓN DE LA LIMPIEZA DE DISPOSITIVOS ODONTO-MEDICO-HOSPITALARIOS: UNA REVISIÓN INTEGRADORA PINTO, Marília de Bastos; VILAS–BOAS, Vanessa Aparecida; FREITAS, Maria Isabel Pedreira de RESUMO: A limpeza do artigo após seu uso remove a matéria orgânica e reduz a carga microbiana do material, sendo esta a etapa mais importante do reprocessamento. Objetivo: Identificar na literatura metodologias reprodutíveis de validação do processo de limpeza. Método: Revisão integrativa utilizandose as bases de dados MedLine/PubMed, LILACS, BDENF e SciELO, a partir de descritores registrados nos DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), no período de dez anos. Os artigos foram selecionados por critérios de inclusão/exclusão predefinidos e submetidos à análise de conteúdo. Resultados: De 251 estudos encontrados, seis foram analisados. Observou-se a contaminação artificial dos artigos odonto-médico-hospitalares (AOMH), sendo a limpeza automatizada mais utilizada. As principais metodologias para avaliação dos processos de limpeza foram técnicas de biologia molecular, análise microbiológica e teste de identificação de resíduos de matéria orgânica e proteínas. Conclusão: Não há métodos para limpeza de AOMH que sejam padronizados e que estejam validados. Palavras-chave: Instrumentos cirúrgicos. Avaliação de processos. Estudos de validação como assunto. Processo de limpeza. ABSTRACT: The cleaning of the device after its use removes organic matter reduces the bioburden, being the most important step of reprocessing. Objective: 64 Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. To identify, in the literature, reproducible methodologies for validation of cleaning process. Methods: Integrative review using the databases MEDLINE / PubMed, LILACS, SciELO and BDENF from descriptors recorded in DeCS (Descriptors in Health Sciences), within ten years. Articles were selected by criteria of inclusion / exclusion predefined and submitted to content analysis. Results: Out of 251 studies found, six were analyzed. The artificial contamination of DMHD was observed, being automated cleaning the most widely used. The main methods for evaluation of cleaning processes were molecular biology techniques, microbiological testing and identification of organic waste material and proteins. Conclusion: There are no methods for DMHD cleaning that are standardized and are validated. Key words: Surgical Instruments, Process Assessment, Validation Studies as Topic, Cleaning Process, sterilization. RESUMÉN: El artículo de limpieza después de cada uso elimina la materia orgánica y reduce la carga microbiana del material, que es el paso más importante de reprocesamiento. Objetivo: Identificar metodologías reproducibles en la literatura para validar el proceso de limpieza. Métodos: Revisión Integradora utilizando las bases de datos PubMed / MEDLINE, LILACS, SciELO y BDENF de descriptores registrados en el DeCS (Descriptores en Ciencias de la Salud), en el período de diez años. Los artículos fueron seleccionados por criterios de inclusión / exclusión predefinidos y sometidos a análisis de contenido. Resultados: De 251 estudios que se encuentran, seis fueron analizados. Se observó la contaminación artificial de DMHD, siendo la limpieza automatizada la más utilizada. Los principales métodos para la evaluación de los procesos de limpieza fueron las técnicas de biología molecular, las pruebas microbiológicas y la identificación de los residuos orgánicos y proteínas. Conclusión: no hay métodos para la limpieza DMHD que están estandarizados y validados. Palabras clave: Instrumentos Quirúrgicos, Evaluación de Proceso, Estudios de Validación como Asunto, Proceso de Limpieza, Esterilización INTRODUÇÃO O Centro de Material e Esterilização (CME) é, por excelência, o local da instituição de saúde onde é realizado o reprocessamento dos artigos odonto-médico-hospitalares (AOMH) e no qual se busca o aprimoramento, tanto das técnicas de limpeza¹, quanto das técnicas de preparo e esterilização. O processo de limpeza visa a remoção de sujidade visível e, por consequência, a retirada da carga microbiana inicial do material¹. Como adjuvante no processo, utiliza-se detergente enzimático. A utilização destes produtos, juntamente com a limpeza mecânica na rotina diária do CME, pode proporcionar a redução da sobrecarga de trabalho no setor². A limpeza automatizada dos AOMH com o uso de lavadoras termodesinfectadoras ou ultrassônicas, permite a lavagem de maior volume de instrumentos cirúrgicos e outros artigos, otimizando essa etapa do reprocessamento e liberando recursos humanos para os procedimentos seguintes, como secagem e inspeção final do material. Devido à necessidade de protocolos bem estabelecidos e validados do processo de limpeza, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) publicou a Resolução Específica - RE 2.606, de 11 de agosto de 2006, que dispõe sobre as diretrizes para elaboração, validação e implantação de protocolos de reprocessamento de produtos médicos³. O item XII do artigo 1° define protocolo de reprocessamento como a descrição de todos os procedimentos na realização do reprocessamento do produto médico e que deve ser instituído por meio de instrumento normativo interno do estabelecimento de saúde. Esse protocolo deve ser validado por meio da execução de protocolos-teste estabelecidos pela equipe da instituição de saúde3. Além disso, o item XVI do mesmo artigo estabelece que a validação deve ser um processo estabelecido por evidências documentadas que comprovem que a atividade específica de reprocessamento estabelecida esteja em conformidade com as especificações predeterminadas, atendendo ao requisitos de qualidade³. Recentemente, devido ao aumento da frequência de surtos de infecção hospitalar ocasionados pela Mycobacterium, foi publicada a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 75, de 27 de outubro de 2008, que dispõe sobre a comprovação da eficácia de agentes esterilizantes e desinfetantes hospitalares para artigos semi-críticos frente a micobactérias das espécies abscessus e massiliense4. Para garantir a segurança ao cliente, com base na sistematização do reprocessamento, é necessária a avaliação e a validação dos artigos e dos equipamentos, com possibilidade de rastreabilidade do processo de limpeza dos artigos, para que a competência possa ser demonstrada e assegurar uma prática realizada com qualidade5. Considerando-se que o Brasil não possui normas para operacionalização da avaliação das lavadoras5 e a necessidade da utilização desses equipamentos para uma limpeza efetiva de artigos mais complexos, este estudo teve por finalidade realizar uma revisão integrativa da literatura publicada sobre o tema validação de processos de limpeza de AOMH críticos. Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. 65 OBJETIVO especificamente. Identificar, na literatura, metodologias reprodutíveis de validação do processo de limpeza de artigos odonto-médico-hospitalares classificados como críticos. Foram também excluídos trabalhos referentes à contaminação por prions e os métodos de limpeza para sua eliminação, uma vez que esse microrganismo não é, no momento, prioridade dentro do tema. Apenas um trabalho científico com utilização de contaminação com prions de forma experimental foi utilizado nesta revisão, por possuir metodologia de limpeza e validação muito bem especificados, facilitando sua reprodutibilidade e podendo servir de base para estudos futuros. MÉTODO Esta revisão da literatura teve como questão norteadora: “Existem métodos sistematizados de limpeza, descritos na literatura, que forneçam subsídios para validar o processo de limpeza de AOMH e que diminuam o risco de infecção ao cliente submetido a procedimentos invasivos?” Para sua realização, foram utilizados os artigos indexados nas bases de dados LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde), BDENF (Base de Dados de Enfermagem), MedLine/PubMed (Medical Literature Analysis and Retrieval System Online) e SciELO (Scientific Electronic Library Online). Os descritores utilizados estavam todos registrados no MeSH (Medical Subject Headings) e nos DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), quais sejam: Validation studies as topic; Method e surgical instruments. As palavras utilizadas para complementar a pesquisa foram: Cleaning , Validation, Validação e Limpeza. Foi utilizado o conector boorleano AND. Foi feita a busca por artigos em língua portuguesa, inglesa e espanhola, publicados desde 1999 até os dias atuais, que estavam indexados e que utilizavam os descritores escolhidos, em um período de dez anos para a revisão bibliográfica. Os critérios para inclusão dos artigos analisados foram: estar no período estabelecido; estar relacionado ao objetivo proposto; e fornecer dados que possibilitassem a aplicação da validação do processo de limpeza. Os critérios de exclusão do estudo foram: publicações fora do período estabelecido; artigos não indexados nas bases de dados selecionadas e artigos que não se referiam a processos de limpeza e nem validação de processos de limpeza de AOMH, 66 Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. Após seleção dos artigos, por título e resumo, foi realizada leitura cuidadosa e análise de conteúdo. Para isso, usou-se o instrumento modificado de Ursi e Galvão6, que aborda cinco aspectos relevantes nos estudos encontrados e utilizados na coleta dos dados da revisão, quais sejam: identificação do estudo, autores, intervenção estudada, resultados e recomendações, e conclusões. Além desses, abordou-se ainda a “metodologia utilizada”, para deixar explícita a metodologia utilizada nos artigos que foram selecionados, “objetivo proposto”, “objetivo alcançado” e “análise”, a fim de se obter dados mais claros para análise individualizada. RESULTADOS Em cada uma das bases pesquisadas, os resultados foram os seguintes: na PubMed foram encontrados cinco artigos e, destes, três foram selecionados para a revisão; na LILACS foram encontrados 12 artigos e quatro foram selecionados para a revisão; na MedLine, foram encontrados 223 artigos e selecionados três; na base SciELO foi encontrado um artigo, que foi selecionado para a revisão; na base BDENF, seis artigos foram encontrados e três selecionados. Para seleção dos artigos em cada uma das nas bases de dados, foi realizada a leitura do título e do resumo de todos os trabalhos encontrados. Foram excluídos os trabalhos que se não referiam ao tema de validação de limpeza de AOMH, que não estavam indexados nas bases escolhidas e que não obedeciam ao período de tempo estabelecido, conforme os critérios de exclusão estabelecidos. Das 14 referências utilizadas para a revisão integrativa, oito foram excluídas. Dessas oito, quatro referências eram repetidas e quatro não se adequaram ao tema da revisão, utilizando-se, então, para análise neste trabalho seis referências bibliográficas (Quadro 1). Quadro 1. Seleção dos artigos que fizeram parte da amostra do estudo, segundo bases de dados. Base de dados Artigos encontrados Artigos selecionados por título e resumo Artigos que entraram na revisão MedLine 223 03 - LILACS 12 04 04 BDENF 06 03 - PubMed 05 03 02 SciELO 05 01 - Total 251 14 06 Para classificação dos estudos quanto à cientificidade, utilizou-se a classificação de Stetler7. Foram utilizados dois estudos experimentais e randomizados, classificados em nível II de evidência e dois estudos experimentais não randomizados, classificados em nível III. Durante a busca pelos artigos, obedecendo aos critérios de inclusão e exclusão estabelecidos, foram encontrados dois trabalhos8-9 relacionados com validação de limpeza de AOMH. Esses dois estudos não se entraram na revisão por não serem artigos científicos elaborados com metodologia rigorosa. Caracterizam-se por trazerem apenas uma apresentação de conteúdos diversos sobre o tema; no entanto, não trouxeram conhecimentos novos ou metodologia aplicável. Entre as publicações utilizadas nesta revisão, duas eram internacionais, publicadas em revistas médicas, classificadas como estudos randomizados e experimentais10-11 e duas eram nacionais, publicadas em revistas de enfermagem, classificadas como experimentais e não-randomizadas5,12. No que se refere aos métodos de limpeza e desinfecção utilizados (Quadro 2), um estudo realizado na Suécia10 desenvolveu um método que pudesse ser utilizado para validar processos de limpeza de instrumentos laparoscópicos sob o aspecto quantitativo. Os instrumentos foram contaminados artificialmente, com suspensões bacterianas com 106log de Escherichia coli e Bacillus subtillis, variedade níger, com secagem desse material por 30 minutos. Como método de limpeza, foi usada a lavadora desinfectadora, contendo detergente enzimático, em ciclo regular para lavagem, desinfecção e secagem do material por um minuto, à temperatura de 90ºC. Os AOMH foram embalados e transportados para o laboratório onde foi borrifada com seringa, 10 ml de solução salina de PBS (Phate-Bufferd Saline) nos artigos canulados. Os AOMH sólidos foram imersos em 10 ml dessa solução e abertos e fechados por 25 vezes, passando por agitação em banho ultrassônico. Esses lavados foram então incubados em ágar-sangue por 48 horas a 36ºC. Depois disso, foi realizada a contagem de unidades formadoras de colônia (UFC), comprovando ou não a eficiência da limpeza e da desinfecção realizada pelo equipamento. Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. 67 Quadro 2. Classificação dos artigos selecionados, segundo autores, ano, local, métodos de desinfecção e validação de limpeza. Autores, ano, local 68 Método limpeza e desinfecção Bergo, 2006, Brasil5 Lavadora termodesinfectadora usando programas com diferentes tempos e temperaturas. Ransjö et al, 2001, Suécia10 Tipo de instrumental utilizado Instrumentais cirúrgicos diversos. Método de validação de limpeza Microrganismo utilizado na contaminação artificial Identificação de resíduos e proteínas e análise Sangue de placenta após parto normal. Lavadora desinfetadora Itens de com detergente enzimático, instrumentos em ciclo regular a 90oC. laparoscópicos, da marca Karl Storz Endoskop Sverige AB: trocartes, mandril, cânulas, tesouras, tubos, pinças e válvulas. Análise Suspensões bacterianas de Escherichia coli e Bacillus subitillis variedade níger. Lemmer et al, 2004, Alemanha11 Desinfecção com hipoclorito de sódio, ácido peracético, limpador alcalino, hidróxido de sódio, ácido acético + hidróxido de sódio, tiocinato de guanidina, uréia + SDS. Fios de aço DIN- nº 1.4301, Forestadent, com diâmetro de 0,25mm. WesternBloot e SDSPAGE. Proteínas-prion patogênicas PrPSc/PrP27-30. Bergo e Graziano, 2003, Brasil12 Lavadora termodesinfectadora usando programas com diferentes tempos e temperaturas. Raspa acetabular, raspa femoral, pinça Crile, pinça Kelly, pinça Hartman, pinça de Backey, Kerrison, pinça vascular Glover, entre outros. Identificação de resíduos e proteínas e análise Não houve contaminação artificial. Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. Ransjö et al10 demonstraram que em todos os experimentos com Enterococcus faecallis, antes da desinfecção, mostrou >106 bacterias/ml e pós-desinfecção não mostrou crescimento. Nos experimentos com Bacillus subitillis, trocarte grande, mandril grande, válvula fixa, trocarte pequeno, mandril pequeno, cânula e mandril Verres, tubos de tesouras, tubos de ganchos mostraram uma redução média de 710log quando conectados aos carros de lavagem por meio de funis ou outros conectores. Tesouras e pinças mostraram redução de 7-610log, caso pudessem ser desmontadas. Instrumentos de uma peça colocados na parte inferior do carro de lavagem demonstraram redução de 310log, mas isso melhorou significativamente quando esses instrumentos foram adaptados no carro de lavagem. Pequenos objetos (válvulas fixas, móveis e ganchos) mostraram redução média de 410log. Os tubos das tesouras foram limpos nos dois tipos de conexão. A colocação das tesouras nas caixas diminuiu a contaminação restante significativamente. Colocar as pinças nos adaptadores ou nas caixas não modificou a contaminação significativamente, em comparação com a bandeja. Na Alemanha, um estudo realizado em 2004 11, analisou a contaminação residual sob diferentes condições e agentes químicos, em lotes de fios de aço reprocessados e posteriormente contaminados com 263K de fragmentos de cérebro de hamster, homogeneizado, contendo proteínas prion-patogênicas PrPSc/PrP27-30 e para a etapa de limpeza e desinfecção foram usados: hipoclorito de sódio, ácido peracético, limpador alcalino, NaOH, ácido acético com NaOH, tiocinato de guanidina e ureia com SDS . A diminuição total de PrPSc/PrP27-30 em cada corpo de prova foi monitorada por meio de SDS-PAGE e Western Blotting. Para isso, lotes de 30 fios foram incubados em porções de 500μl dos vários reagentes num termomixer a 400rpm em tempo e temperaturas específicos. Posteriormente, as soluções de limpeza foram diretamente misturadas na proporção 1:1 com duas vezes uma solução-tampão e fervida por cinco minutos ou submetida à digestão por proteínaquinase (PK). Depois, 10μl das soluções de limpeza foram diluídas em 42μl de TBS-Sarkosyl contendo 150mg de PKμl-1, incubados, então por uma hora a 30°C e misturados, subsequentemente, na proporção de 1:1 também com duas vezes a solução-tampão e finalmente, fervida por cinco minutos. SDS-PAGE e Westerning Blotting, foram então realizados, com alíquotas de 20μl dessas amostras. Os experimentos mostraram que, em condições apropriadas, reagentes leves como SDS 0,2% e MaOH 0,3%, limpadores alcalinos disponíveis comercialmente, desinfetante contendo 0,2% de ácido peracético e baixa concentração de NaOH ou SDS 5% exercem potente ação desontaminante sobre PrPSc impregnado na superfície dos corpos de prova. Nos estudos realizados no Brasil5,12, o método de limpeza utilizado foi o automatizado, com lavadora termodesinfectadora. Foi avaliado o desempenho de equipamentos para limpeza e desinfecção de artigos, usando programas com diferentes tempos e temperaturas, preconizados por órgãos oficiais distintos. Foi feito o cálculo e a análise da taxa de letalidade mínima e do nível de segurança de desinfecção, comparando-as com o cálculo teórico requerido de acordo com a norma ISO 15883-1999 e do cálculo teórico e com termopares, de acordo com as normas BGA, DHSS/HTM, RIVM, SPRI/SIS e no ciclo com tempo e temperatura de pasteurização. A qualificação de desempenho do equipamento foi realizada por equipe especializada, com ciclos vazios e com carga. Realizaram contagem de UFC antes e depois da lavagem. Os testes para detecção de resíduos de sujidade e proteínas foram: Biotrace-Protect, Kit-proteína Miele e testes de resíduo Soil-Test. Bergo5 demonstrou que os resultados da média da carga microbiana viável inicial encontrada dos AOMH que foram avaliados foram de 108 UFC e o da carga microbiana viável verificada na avaliação, após os processos de termodesinfecção pautados nos tempos e temperaturas estabelecidos nas diferentes normas. Foi observado também que no ciclo com tempo e temperatura de pasteurização não houve crescimento, com um resultado expresso por <10² UFC. Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. 69 Em relação aos instrumentos utilizados, os estudos usaram itens de instrumento laparoscópicos da marca Karl Storz Endoskop Sverige AB: trocartes, mandril, cânulas, tesouras, tubos, pinças e válvulas10; fios de aço DIN nº 1.4301, Forestadent, com diâmetro de 0,25 mm, cortados em pequenos pedaços de 5mm11 e 514 instrumentais diversos12. Em Bergo5, os instrumentos escolhidos não são mencionados e são citados os instrumentos em que foram identificados resíduos de contaminação com o teste Soil-Test: Cizalia Ruskin, Goiva Leksell, Goiva Luer Stille, Cizalia e Kerrison. No que se refere à metodologia, todos os estudos selecionados possuem metodologia reprodutível. Ransjö et al10 descreveram a metodologia de validação microbiológica que pode ser reproduzida em estudo posterior. Lemmer et al11, usando técnicas de biologia molecular, descrevem todos os passos realizados para garantir a fixação do microrganismo no instrumental a ser testado no estudo e o processo de limpeza monitorado pelos métodos de SDS-PAGE e Western Blotting, caracterizando a reprodutibilidade do estudo. Os estudos brasileiros5,12 também trazem sistematizada a metodologia de realização dos trabalhos, facilmente reprodutíveis. DISCUSSÃO Com os avanços da medicina moderna e a introdução de novas técnicas cirúrgicas, torna-se cada vez mais importante e necessário garantir a segurança do paciente que é submetido a procedimentos invasivos, de forma a se evitar a transmissão de infecção decorrente do ato cirúrgico. Assim, todo AOMH utilizado deve estar esterilizado, livre de quaisquer microrganismos que possam vir a provocar infecção, mesmo que sejam considerados saprófitos ou nãopatogênicos. Deve-se atentar para todas as etapas no reprocessamento do artigo, pois, para se obter sucesso no processo de esterilização, é necessário garantir sua limpeza. Em três dos quatro estudos incluídos nesta revisão 5,10- 70 Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. , observou-se ter sido realizada a contaminação artificial dos AOMH com diferentes microrganismos e com matéria orgânica. O estudo sueco10 utilizou suspensões bacterianas de Escherichia coli e Bacillus subitillis variedade níger; o estudo feito na Alemanha11 utilizou tecido cerebral contaminado com proteínas-prion patogênicas PrPSc/PrP27-30 e o estudo brasileiro de Bergo5 utilizou sangue de placenta, após parto normal, para contaminação dos instrumentos. 11 Os estudos sugerem que, para haver garantia de que houve remoção das espécies de microrganismos presentes nos AOMH, é necessário o uso de microrganismos-controle. Após a contaminação artificial, para fixação das espécies, recomenda-se a secagem do artigo por tempos determinados em temperatura ambiente, sendo que Ransjö et al10, e Lemmer et al11 estabeleceram 30 minutos e Bergo e Graziano12 estabeleceram uma hora. Essa etapa é importante e deve ser seguida para garantir uma contaminação significativa dos instrumentos. Também pode simular a situação real do tempo que o material, após o uso, aguarda ser encaminhado ao expurgo para iniciar o processo de limpeza, a fim de remover a matéria orgânica aderida. Ransjö et al10 usaram instrumentos que são utilizados em cirurgias laparoscópicas, quais sejam: trocartes grandes e pequenos com mandril, válvulas de mola e válvulas fixas, cânulas com mandril, pinças, tesouras e ganchos. Lemmer et al11 utilizaram fios de aço como corpos de prova, e Bergo e Graziano12 utilizaram os AOMH empregados em procedimentos cirúrgicos de rotina: raspa acetabular, raspa femoral, pinça Crile, pinça Kelly, pinça Hartman, pinça de Backey, Kerrison, pinça vascular Glover, entre outros que não foram mencionados no trabalho. Esses instrumentais caracterizam-se por apresentarem conformação complexa, o que poderia interferir no processo de limpeza. Em relação aos processos de limpeza, a limpeza automatizada foi a metodologia mais utilizada, sendo realizada pela lavadora termodesinfectadora, equipamento com alto poder de limpeza e termodesinfecção. Os estudos que se utilizaram da lavadora para a limpeza5,10,12 fazem uso de detergente enzimático como agente na desinfecção. Os testes de eficácia do equipamento foram realizados em ciclos regulares, com e sem carga, reproduzindo as etapas do processo de limpeza e desinfecção realizados nas instituições hospitalares. Nos estudos de Bergo e Graziano12 e de Bergo5 houve validação do equipamento por equipe especializada. Lemmer et al11 realizaram o processo de desinfecção química. tou na análise de seis referências, sendo duas em português e quatro em inglês. Os estudos encontrados possuem metodologias reprodutíveis para aplicação nos artigos e equipamentos descritos, por se tratarem de métodos rigorosos, em que os objetivos propostos foram alcançados, com níveis de evidência II e III. Porém, não existem, registrados na literatura, métodos para limpeza de AOMH que sejam padronizados e que estejam validados. REFERÊNCIAS Para a limpeza automatizada, é importante enfatizar a necessidade de validação do equipamento utilizado por equipe especializada, para assegurar o correto funcionamento da lavadora. Para validação dos processos de limpeza, constatou-se que as principais metodologias utilizadas são: técnicas de biologia molecular, análise microbiológica e teste de identificação de resíduos de matéria orgânica e proteínas. Os testes de biologia molecular identificados foram aqueles que determinaram se houve degradação de príon-proteínas patogênica: Western-Bloot e SDS-PAGE11. É importante mencionar que esses métodos são efetivos e seguros; no entanto, são caros. O que dificulta sua utilização nas instituições hospitalares. Os estudos de Bergo e Graziano12, Bergo5 e Ranjö et al10 apresentam análise microbiológica como método de escolha na validação de limpeza. Além da análise microbiológica, foi utilizada, nesses estudos, a identificação de resíduos e proteínas com a utilização de testes específicos. Os instrumentos utilizados como corpos de prova demonstram que sua complexidade e seu posicionamento no equipamento interferem no processo de limpeza10. CONCLUSÃO A seleção dos artigos científicos nas bases de dados pesquisadas (PubMed, LILACS, MedLine, SciELO e BDENF), com recorte temporal de dez anos, resul- 1. Graziano KU, Balsamo AC, Lopes CLBC, Zotelli MFM, Couto AT, Paschoal MLH. Critérios para avaliação das dificuldades na limpeza de artigos de usoúnico. Rev Lat Am Enferm. 2006;14(1):70-6. 2. Schmidt DRC, Yonekura CSI, Gil RF. Instrumento para avaliação de detergentes enzimáticos. Rev Esc Enferm USP. 2008;42(2):282-9. 3. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Resolução RE n. 2606, de 11 de agosto de 2006. Dispõe sobre as diretrizes para validação, elaboração e implantação de protocolos de reprocessamento de produtos médicos e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 ago. 2006. 4. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Resolução RDC n. 75, de 23 de outubro de 2008. Dispõe sobre a comprovação de eficácia de esterilizantes e desinfetantes hospitalares para artigos semi-críticos frente às micobactérias Mycobacterium abscessus e Mycobacterium massiliense e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 27 out. 2008. 5. Bergo MCNC. Avaliação do desempenho da limpeza e desinfecção das máquinas lavadoras desinfectadoras automáticas em programas com diferentes tempos e temperaturas. Rev Lat Am Enferm [Internet]. 2006 [citado 2011 jul 07];14(5). Disponível em: http:// www.scielo.br/pdf/rlae/v14n5/pt_v14n5a15.pdf Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72. 71 6. Ursi ES, Galvão CM. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura. Rev. Lat Am Enferm. 2006;14(1):124-31. 7. Stetler CB, Morsi D, Rucki S, Broughton S, Corrigan B, Fitzgerald J, et al. Utilization-focused integrative reviews in a nursing service. Appl Nurs Res. 1998;11(4):195-206. 8. Griep R, Picolli M. Validação dos processos de limpeza e desinfecção dos artigos de inaloterapia e oxigenoterapia. Cogitare Enferm. 2002;7(2):65-7. 9. Oliveira AC, Lucas TC. Desafios e limitações da validação dos materiais de uso-único: um artigo de revisão. Online Braz J Nurs. 2008;7(1). 10. Ransjö U, Engström L, Hakansson P, Ledel T, Lindgren L, Linquist A-L, et al. A test for cleaning and disinfection processes in a washer- disinfector. APMIS. 2001;109(4):299-304. 11. Lemmer K, Mielke M, Pauli G, Beekes M. Decontamination of surgical instruments from prion proteins: in vitro studies on the detachment, destabilization and degradation of PrPSc bound to steel surfaces. J Gen Virol. 2004;(85):3805-16. 12. Bergo MCNC, Graziano KU. Validação das máquinas lavadoras desinfectadoras automáticas conforme ISO 15.833 e HTM 2030. Rev Enferm UERJ. 2003;11(2):238-44. Autoras Marília de Bastos Pinto Enfermeira Especialista em Controle de Infecção Hospitalar do Hospital e Maternidade Metropolitano de São Paulo. E-mail: [email protected]. Vanessa Aparecida Vilas-Boas Enfermeira Mestre em Enfermagem, Enfermeira do Centro Cirúrgico do Hospital da Mulher “Prof. José Aristodemo Pinotti”, Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM/UNICAMP). E-mail: [email protected]. Maria Isabel Pedreira de Freitas Enfermeira Mestre e Doutora em Enfermagem pela Universidade de São Paulo (USP), Professora Associada do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM/UNICAMP). E-mail: [email protected]. 72 Rev. SOBECC, São Paulo. jan./mar. 2013; 18(1): 64-72.