A Produção Acadêmica sobre Liderança no Brasil: Uma Análise Bibliométrica dos Artigos Publicados em Eventos e Periódicos Entre 1995 e 2009 Autoria: Islania Andrade de Lira Delfino, Anielson Barbosa da Silva, Leonardo Rosa Rohde RESUMO A liderança constitui um dos mais complexos fenômenos que permeiam os estudos organizacionais, apesar de muito explorado e discutido. Os estudos dos traços pessoais do líder, dos estilos de liderança, da liderança contingencial, da nova liderança e da liderança de equipes são as principais abordagens sobre o tema. Diante das tentativas de conceituação de liderança, pontos comuns podem ser observados, como a visão da liderança como um processo social, que envolve a interação entre líder e liderados e aspectos como influência, relacionamentos e resultados. Este artigo tem como objetivo analisar como está configurada a pesquisa acadêmica sobre liderança no Brasil no período correspondente aos anos de 1995 a 2009. Quanto aos aspectos metodológicos, trata-se de um estudo de natureza quantitativa, sendo a coleta de dados realizada por meio de um levantamento e análise bibliométrica dos artigos sobre liderança apresentados em todos os eventos da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração - ANPAD, e de periódicos nacionais classificados como Qualis A e B pela Coordenação de Aperfeiçoamento e Capacitação de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Foram encontrados e analisados ao todo 88 artigos. Os resultados mostram que os artigos sobre liderança são, em sua grande maioria, encontrados em anais dos eventos promovidos pela ANPAD. Apenas 9% dos artigos analisados foram publicados em periódicos no período correspondente a este estudo. Um total de 31 artigos abordam somente aspectos do tema liderança, enquanto 57 deles relacionam liderança a um outro tema vinculado aos estudos organizacionais. Os artigos apresentam-se em grande número como estudos qualitativos ou quantitativos e em número reduzido como estudos teóricos ou classificados como qualitativo-quantitativo. A maioria utilizou o questionário e a entrevista como técnica de coleta de dados. Os autores mais referenciados nos artigos são, em sua maioria, de origem estrangeira, observando-se que somente dois autores nacionais estão entre os mais referenciados. Diante dos resultados encontrados, percebe-se que alguns aspectos inerentes ao tema como o processo de liderança e os aspectos subjetivos que envolvem a relação entre líderes e liderados, além da liderança de equipes, liderança compartilhada e equipes auto-geridas, foram pouco explorados nos estudos nacionais. Considera-se que a pesquisa nacional sobre liderança precisa focalizar nas novas visões propostas na literatura, como as abordagens da nova liderança e da liderança de equipes, que são propostas como formas mais viáveis ao estudo da liderança diante do cenário atual. Diante da quantidade de estudos identificados nesse levantamento, conclui-se que a produção acadêmica nacional envolvendo a liderança tem aumentado significativamente no Brasil nos últimos anos, sobretudo em eventos. Um dos desafios a serem transpostos é ampliar a publicação de artigos em periódicos qualificados com o objetivo de dar mais visibilidade ao tema na comunidade científica e também no meio empresarial. 1 INTRODUÇÃO Um dos temas mais estudados e discutidos na área de comportamento organizacional é a liderança. O interesse pelo tema é perceptível nos dias atuais, e isso pode ser ratificado pelo aumento da quantidade de estudos que emergem nos meios de divulgação de ensino, pesquisa e promoção do conhecimento como livros, periódicos e encontros acadêmicos dentro do campo das ciências administrativas. A título de exemplo, 55% dos trabalhos envolvendo o tema nos anais do ENANPAD nos últimos 15 anos foram publicados entre 2006 e 2009. Apesar de muito explorado, o tema é complexo (VAN SETERS; FIELD, 1990) e ainda provoca muitos questionamentos. Na literatura atual, não há respostas totalmente rematadas sobre a natureza da liderança (se inata ou adquirida) e sobre a principal influência em seu processo (a figura do líder, os aspectos dos liderados ou a natureza da situação). O que tende a se considerar é o meio-termo entre os extremos. Assim, o processo de liderança seria composto por todos os elementos citados, mas de forma comedida, não descartando a influência de cada um. (BOWDITCH; BOUNO, 2002; ROBBINS, 2005). Bass (1981) apresenta diferentes formas de como a liderança vem sendo enfocada. Alguns autores como Rowe (2002) e Pettigrew (1987) acreditam na importância da liderança como fator estratégico e fonte de vantagem competitiva para as organizações. A influência e a identificação do líder com o grupo (DAVEL; MACHADO, 2000) ou a influência do líder no desempenho dos liderados (BASS, 1981; BOWDITCH; BOUNO, 2002; VECCHIO, 2005) e na cultura da empresa (PARDINI, 2000; SILVA, 2002; SHEIN, 2009; SILVA; KISHORE; REIS; BAPTISTA; MEDEIROS, 2009; VASCONCELOS; MERHI; SILVA JUNIOR; MARTINS, 2009), englobam alguns exemplos de pesquisas que procuram desvendar alguns dos vários aspectos envolvendo o tema. Uma questão que merece destaque envolve a configuração da pesquisa acadêmica sobre liderança e os principais direcionamentos dos trabalhos que abordam o tema e suscitou o interesse na realização de um estudo que tem como objetivo identificar como está configurada a produção científica sobre liderança nos artigos publicados nos eventos e nos periódicos da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração – ANPAD e nas revistas nacionais classificados como A e B pela Coordenação de Aperfeiçoamento e Capacitação de Pessoal de Nível Superior – CAPES, no período de 1995 a 2009. A importância da liderança nos processos organizacionais foi reconhecida nas edições do EnANPAD e do EnGPR em 2009, uma vez que foi proposto um tema específico na área de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho. Dentro desta área, um estudo que compara a percepção de acadêmicos brasileiros e norte-americanos sobre liderança conclui que estes últimos estão mais engajados com o tema por meio do desenvolvimento e adoção de múltiplas abordagens (apesar de que isso pode estar relacionado a outros fatores), enquanto que a percepção dos brasileiros é de esgotamento do construto (SANT’ANNA et. al, 2009). Por meio do levantamento de trabalhos sobre liderança nas publicações citadas anteriormente, este estudo espera contribuir para a percepção de direcionamentos, principais resultados e avanços na pesquisa sobre o tema. Embora a liderança seja um assunto dos mais explorados, não se encontrou até então nas publicações da ANPAD um estudo investigativo do que foi publicado sobre o tema em termos de quantificação de enfoques, métodos e referências de artigos nacionais, considerando um período de tempo maior como o proposto neste artigo. Outro aspecto referente ao ineditismo e relevância da pesquisa é o uso da análise bibliométrica que, apesar de cada vez mais recorrente na Administração nos últimos anos como forma de avaliar o conhecimento científico produzido por meio de medidas quantitativas, ainda é escassa no Brasil na área de Recursos Humanos (VIEIRA; FISCHER, 2005). 2 Para viabilizar o estudo, realizou-se um mapeamento dos trabalhos, e sua análise está dividida em três partes: a) na primeira parte, são apresentados os dados gerais com o levantamento da quantidade de autores por artigo, as principais vertentes conceituais; b) na segunda parte, são levantados os procedimentos metodológicos utilizados e c) na terceira parte são apresentados os aspectos gerais das referências constando as indicações dos autores mais citados e a quantidade de citações nacionais e internacionais dos trabalhos. O estudo conclui com um direcionamento sobre os aspectos que foram mais explorados na produção científica sobre liderança e a sugestão de outros ainda pouco explorados que merecem atenção no sentido de contribuir para o avanço da pesquisa envolvendo o tema. O referencial teórico é apresentado a seguir. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Nos estudos sobre liderança existem diferentes perspectivas quanto às definições e ao delineamento do tema. O termo é considerado um dos mais complexos e multifacetados dentro dos estudos organizacionais (VAN SETERS; FIELD, 1990). Diante da análise das tentativas de conceituação, existem pontos comuns entre elas que podem ser observados como por exemplo a visão da liderança como um processo social, que envolve a interação entre atores (líder e liderados) e aspectos como influência, relacionamentos e resultados (SADLER, 2001; BERGAMINI, 2009). Apesar da vasta literatura, até hoje algumas questões emergem e muitas vezes ficam sem uma resposta mais objetiva. Qual a melhor definição para o termo liderança? Qual o papel do líder em uma organização? A grande quantidade de estudos e teorias sobre liderança talvez justifique as dificuldades de definição do termo (BASS, 1981; BERGAMINI, 2009). Na maioria das tentativas de conceituação de liderança que perduraram até meados dos anos 80, o foco se estabelece na figura do líder como elemento principal, e termos como influência, grupo e metas quase sempre estão presentes (BRYMAN, 2004). Assim, liderança foi por muito tempo definida como o processo de influência de uma pessoa sobre as ações de outra ou de um grupo para conduzir seus esforços no estabelecimento e execução de metas (BOWDITCH; BOUNO, 2002; BRYMAN, 2004). Estudiosos como Mintzberg (1990) ao pesquisar o trabalho dos gerentes, visualizam a necessidade do desempenho de papéis informacionais, interpessoais e decisoriais. Dentre os papéis interpessoais do gerente está, segundo o autor, o papel de líder que se relaciona com a motivação e o incentivo aos subordinados de forma a conciliar suas necessidades individuais com os objetivos da organização. Evidencia-se assim, nos estudos de Mintzberg o elemento influência, seja pelo processo formal de autoridade, ou pelo exercício informal do poder, citado anteriormente como um dos termos mais utilizados na definição de liderança. Neste sentido, Davel (2005) acredita que um dos papéis do gerente perpassa pelas relações de poder e pela mediação dos interesses entre organização e trabalho. Silva (2009) define isso como a habilidade do gerente de conquistar seguidores para alcançar os objetivos organizacionais. Hill (1999, p. 249) utiliza o termo “negociar interdependências”. Assim, apesar da quantidade de conceitos, eles normalmente apresentam alguns elementos similares que abrem caminho para que se desenvolva um esquema básico de classificação de acordo com sua orientação ou ênfase, que varia com o tempo (BASS, 1981; BRYMAN, 2004). De acordo com Bowditch e Bouno (2002) e Robbins (2005), os diferentes focos de abordagem não seriam então excludentes entre si, mas complementares, pois nenhuma delas de forma isolada parece abranger toda a complexidade da liderança, e nem ser totalmente utilizável em todas as situações. A investigação científica sobre liderança começou a partir do século XX e deu origem a uma variedade de perspectivas (VAN SETERS; FIELD, 1990). Um dos primeiros estudos sobre liderança foi a Abordagem dos Traços. Este modelo direciona seu foco para a figura do 3 líder, identificado pelas suas características físicas e de personalidade. Desta forma, a liderança seria identificada de forma natural, pois o líder nasceria com certos traços diferenciados que o conduziriam ao sucesso. Esse pensamento perdura até o final dos anos 40 e muitas críticas foram feitas a ele pelo seu caráter universal, simplista e determinista (BOWDITCH; BOUNO, 2002). Com a evolução do conceito, e o foco ainda centrado no líder, mas agora no seu comportamento no grupo, do final dos anos 40 até o final dos anos 60 (BRYMAN, 2004), a liderança passou a ser idealizada por meio da identificação do estilo do líder, que estaria mais direcionado ao tratamento dos subordinados considerados como pessoas, ou mais absorvido com as preocupações relacionadas às tarefas. (BOWDITCH; BOUNO, 2002). A diferença fundamental entre os estilos de liderança assenta-se assim sobre sua orientação. A próxima etapa no desenvolvimento dos estudos sobre liderança surgiu no final dos anos 60 e suas idéias tiveram ênfase até os anos 80. Esta abordagem recebeu o nome de contingencial e defende a observação dos aspectos situacionais envolvidos no processo como forma de identificar o melhor caminho a ser seguido. Nesta abordagem, o melhor desempenho do líder é visto não como dependente de sua personalidade ou comportamento, mas intrinsecamente ligado ao contexto e seu poder de controle e interferência no processo de liderança. Defende-se, desta forma, que o líder deve mudar ou adaptar seu estilo de acordo com a situação vivenciada para que consiga exercer influência sobre o grupo (BOWDITCH; BOUNO, 2002). A partir dos anos 80, outros estudos surgiram com a proposta de uma liderança visionária, onde o líder é identificado como articulador de uma visão que reflete os valores e a missão organizacional. Surge então a diferença entre a liderança transacional – em que o líder exerce influência na condução das pessoas para o alcance das metas estabelecidas, especificando papéis e exigências das tarefas – e liderança transformacional – que confere ao líder de sucesso as qualidades de carismático, inspirador, estimulador e incentivador do desenvolvimento intelectual, atendendo e considerando as pessoas de forma individualizada. Segundo Robbins (2005), este último tipo de liderança em especial, considera as características pessoais do líder, a realização da tarefa e as necessidades dos liderados. O líder tende a ser visto frequentemente como o responsável pelo desempenho organizacional – seja ele favorável ou não – ou do setor específico pelo qual está responsável (BASS, 1981; BOWDITCH; BOUNO, 2002). As abordagens que focam no papel do líder como direcionador do processo de liderança contribuem para consolidar essa percepção. No entanto, a visão da figura do líder evoluiu, e alguns estudos propõem um modelo de liderança compartilhada, totalmente adaptado às atuais exigências do ambiente organizacional, que adota o estilo de equipes de trabalho auto-geridas (YUKL, 1998; HILL, 2004). Nessa abordagem, enfatiza-se o processo de influência social do grupo sobre seus membros e a influência da liderança informal, que neste caso não é definitiva, mas surge no interior do grupo e é compartilhada. A figura a seguir apresenta as principais abordagens sobre liderança, baseando-se nas obras de Bass (1981), Bowditch e Bouno (2002), Bryman (2004), Hill (2004), Sadler (2001) e Yukl (1998), contemplando as seguintes categorias: evolução, visão de liderança, foco e idéias centrais, críticas e percepção atual de cada abordagem. 4 Categoria de Abordagem dos Traços Pessoais Análise Abordagem do Estilo de Liderança Até o final dos Do final dos anos anos 40 40 até o final dos anos 60 Como uma Como uma característica característica inata comportamental Qualidades e Comportamento características dos líderes. pessoais dos Treinamento e líderes. Distinção não mais seleção entre líderes e de líderes seguidores ABORDAGENS Abordagem Contingencial Abordagem da Nova Liderança Nova Liderança Liderança de Equipes Do final dos anos Do início dos anos Durante os anos 80 Período 60 até o início 80 até hoje e 90 até hoje dos anos 80 Dependente dos Líder como um Dispersa no grupo Visão da fatores gestor de Liderança situacionais significado Baseado na visão No líder como Nas equipes como Foco de que “tudo é articulador de uma espaço de relativo” e a visão que reflete a liderança e no eficácia do líder missão processo de depende do organizacional liderança em si quanto a situação lhe é favorável Traços físicos, Identificação dos Idéia de controle Definição de dois Facilitação pelo Idéias habilidades e dois principais situacional tipos de liderança: líder do desenvolCentrais vimento de talencaracterísticas de estilos de envolvendo três transacional tos, capacidades de personalidade comportamento componentes: (recompensas identificam o do líder: relação lídercontingentes e liderança e motivapotencial de consideração membros; estru- gestão pela exce- ção dentro do gruliderança (pessoa) e tura de tarefas; e ção) e transforma- po, conduzindo as iniciativa para posição do líder. cional (carisma, pessoas a se lideestruturar O líder deve inspiração, consi- rar. Equipes auto(tarefa) adaptar seu estilo deração e estimu- geridas. Considera lação intelectual) a relação informal à situação Desconsideração Necessidade de Foco excessivo no O modelo de Principais Universalidade dos traços e das questões mudar situações líder, principalequipes autoCríticas predeterminação situacionais da devido à dificul- mente os de cúpu- lideradas pode não de líderes natos liderança e do dade de mudar la. Desconsidera a ser aplicável a seu aspecto pessoas; Descon- liderança informal. todas as informal sidera a liderança Risco de retorno à organizações e a informal visão universalista todas as situações Percepção de que Percepção Apesar de muito Pesquisas poste- Ainda tem consi- Tem causado criticada, estudos riores identifica- derável aceitação reflexões sobre este modelo de Atual da Abordagem foram retomados ram que o estilo apesar da conclu- missão e valores; equipes pode concluindo que mais eficaz seria são de que fato- Serve de base para aumentar a os traços pessoais a combinação res situacionais programas de sele- efetividade influem na perentre os dois não têm a impor- ção e treinamento organizacional cepção sobre a tância que se de líderes pessoa imaginava Figura 1: Evolução da teoria e pesquisa sobre liderança Fonte: Elaborada pelos autores A figura sistematiza os elementos centrais de cada abordagem com o objetivo de possibilitar uma maior compreensão sobre o desenvolvimento do constructo nas organizações. As seis categorias de análise ajudam a delimitar especificidades de cada abordagem e possibilitam uma análise da evolução teórica sobre a liderança. As abordagens mais modernas de liderança que canalizam seus esforços para os estudos das equipes multifuncionais – que possuem líder formal – e as equipes auto-lideradas – onde a figura do líder não é percebida como um posto de destaque – são formas de distribuição de liderança e poder entre os membros (YUKL, 1998). O autor enfatiza que este modelo não é totalmente adaptável a todos os tipos de organizações, sendo melhor utilizado 5 em grandes organizações, e que as condições necessárias para o seu sucesso não são ainda claramente entendidas. Sadler (2001) lembra que várias tentativas têm sido realizadas para traçar o desenvolvimento do pensamento e da pesquisa sobre liderança. Neste sentido, Van Seters e Field (1990) dividem os estágios da teoria da liderança em nove eras evolutivas: da personalidade, da influência, do comportamento, da situação, da contingência, transacional, anti-liderança, cultural e transacional (que seria a mais promissora). ERAS Era da Personalidade (dividida em dois grandes períodos) Era da Influência Era do Comportamento Era da Situação Era da Contingência (Maior avanço na evolução da teoria da liderança) Era Transacional Era Anti-liderança Era Cultural FOCO Período do Grande Homem: melhores líderes da história e suas características. O melhor caminho seria estudar suas vidas e copiá-las. Período de Características: ligação entre liderança efetiva e alguma característica individual ou grupos de características do líder A liderança é considerada como um processo que envolve relacionamentos entre indivíduos e que não se pode entender a liderança focando apenas o líder. Os padrões de comportamento dos líderes são examinados e são diferenciados os comportamentos efetivos dos não-efetivos. O contexto em que a liderança está sendo exercida passa a ser considerado. A liderança não é encontrada em nenhuma das formas puras, unidimensionais, mas contém elementos de todas elas. O líder efetivo é contingente ou dependente de um ou mais fatores de personalidade, influência e situação. A liderança reside não apenas na pessoa ou na situação, mas também, e talvez ainda mais, na diferenciação de papéis e na interação social. A liderança não é considerada como um conceito válido; ela existe apenas como uma percepção na mente do observador. A auto-liderança das pessoas é possível se o líder pode criar uma cultura forte na organização. A liderança consiste ao mesmo tempo em criar uma visão e conferir poder aos subordinados para levá-la adiante. Era Transformacional (A fase mais promissora) Figura 2: As eras da teoria da liderança Fonte: Elaborada a partir de Van Seters e Field (1990) Um aspecto direcionado como crítica por diversos autores à maioria das abordagens que surgiram com a evolução dos estudos sobre liderança é o fato de que normalmente desconsideram a liderança informal e sua influência nos processos grupais (BASS, 1981; BOWDITCH; BOUNO, 2002; BRYMAN, 2004). Hill (1999, p. 300) lembra que apesar do líder ser responsável pelo grupo, uma vez que seu trabalho não pode ser direcionado para cada indivíduo, mas para a equipe, “todo grupo tem seus líderes informais”. Sendo assim, os estudos que desconsideram este aspecto, acabam por dar margem a críticas, pois tendem a ser classificados como incompletos e carentes de maior consistência. Algumas teorias da liderança inicialmente podem parecer formas simplistas de se caracterizar um processo complexo como o que ora é discutido. No entanto, cada uma das abordagens descritas tem seu papel no estudo da liderança e entende-se que elas não são excludentes entre si, mas refletem o contexto das organizações e conseqüentemente as inquietações próprias da época em que foram criadas. Considera-se o contexto como um produto social e histórico produzido em sintonia com as atividades que ele apóia (agentes, objetos, atividades, artefatos materiais e simbólicos) que formam um sistema heterogêneo que evolui ao longo do tempo (GHERARDI;NICOLINI; ODELLA, 1998) Na verdade, em tempos de mudanças rápidas e ambientes complexos, a liderança assume um papel determinante (VAN SETERS; FIELD, 1990). Pesquisa realizada por Sant’Anna et. al. (2009) revelou que pesquisadores brasileiros e norte-americanos têm 6 diferentes percepções sobre o tema. Enquanto os brasileiros percebem o constructo como algo que chegou a um estágio de esgotamento, entre os norte-americanos, o que se observa é um maior interesse no tema pelo engajamento, e pela adoção de múltiplas e diversificadas abordagens utilizadas para compreendê-lo. Uma análise das pesquisas que representam o estado atual do desenvolvimento do tema indica que o processo de liderança decorre da integração de vários sujeitos que sofrem influência do contexto social e histórico em que se inserem. Neste contexto, estão implícitos recursos, capacidades e competências que influem direta ou indiretamente no desenrolar do processo, o que torna o desenvolvimento de estudos sobre o fenômeno da liderança uma tarefa complexa e desafiadora. 3 METODOLOGIA Este estudo teve como objetivo identificar como está configurada a pesquisa acadêmica sobre liderança na produção científica de artigos no Brasil entre 1995 e 2009. A metodologia adotada para a pesquisa foi a análise bibliométrica, por meio de um levantamento dos artigos publicados em eventos vinculados à ANPAD e em periódicos. Trata-se de um estudo de natureza quantitativa e caracteriza-se pela abordagem exploratória. Para análise da pesquisa científica sobre a liderança, utilizou-se a bibliometria, que envolve um conjunto de leis e princípios que são aplicados a métodos matemáticos e estatísticos com o objetivo de mapear e disseminar a produção científica por meio de documentos com propriedades similares (ARAÚJO, 2006; CAFÉ; BRÄSCHER, 2008; MACIAS-CHAPULA, 1998). Esse tipo de abordagem não é uma experiência nova e vem sendo utilizada por pesquisadores de diversas áreas do conhecimento (HAYASHI et. al., 2007). 3.1 Critérios de seleção da amostra de artigos O levantamento foi realizado em torno da pesquisa científica sobre liderança no Brasil nos últimos 15 anos nos artigos apresentados em eventos vinculados a ANPAD – Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, bem como nos periódicos nacionais classificados pela CAPES com o conceito Qualis A e B. O levantamento revelou que foram publicados 88 artigos em nível nacional envolvendo o tema liderança. Os artigos analisados foram encontrados nos eventos promovidos pela ANPAD: Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica, EMA – Encontro de Marketing da ANPAD, EnEO – Encontro de Estudos Organizacionais, EnANPAD – Encontro Nacional da ANPAD, EnAPG – Encontro de Administração Pública e Governança, EnGPR – Encontro de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho, EnADI – Encontro de Administração da Informação, EnEPQ – Encontro de Ensino e Pesquisa em Administração e Contabilidade, e 3Es – Encontro de Estudos em Estratégia. Para complementar e aprofundar o estudo, optou-se por incluir na pesquisa os principais periódicos nacionais classificados como A e B pela Coordenação de Aperfeiçoamento e Capacitação de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Foram eles: RAC – Revista de Administração Contemporânea, BAR – Brazilian Administration Review, RAE – Revista de Administração de Empresas, RAE Eletrônica, RAUSP – Revista de Administração da USP, BASE UNISINOS, RAM – Revista de Administração da Makenzie, Cadernos EBAPE-FGV, Revista de Administração Pública - RAP e REAd – Revista de Administração. Os autores não incluíram a Revista Organização e Sociedade – O&S, porque não tiveram acesso a todos os exemplares da revista no período analisado. 7 Nos artigos apresentados nos eventos EMA e EnADI, bem como nos periódicos BAR, BASE, Cadernos EBAPE-FGV e RAUSP não foi encontrado nenhum artigo sobre liderança, correspondente ao período proposto pela análise. A seleção inicial partiu da identificação dos trabalhos sobre liderança a partir do título de cada artigo. De acordo com Café e Bräscher (2008) essa padronização da descrição física e de conteúdo dos documentos científicos é essencial para que se possa coletar documentos que tenham propriedades similares. Ainda segundo as autoras, sem a identificação única de um item de informação, não se realiza uma análise bibliométrica. Em seguida, todos os trabalhos previamente identificados como objeto de pesquisa foram lidos, analisados e interpretados de acordo com os critérios escolhidos. Na fase de mapeamento, foram identificados trabalhos que continham a palavra liderança ou suas correlatas no título, mas que se referiam à empresas líderes em seus setores ou áreas de atuação, ou ainda outros que tinham por objetivo verificar a visão dos líderes de determinados setores sobre algum aspecto específico do âmbito organizacional ou social. Encontrou-se também dentre os periódicos, resenhas bibliográficas abordando o tema. Em todos estes casos citados os artigos foram desconsiderados, visto que se desvirtuaram de alguma forma do foco da pesquisa. Com o exame mais detalhado dos artigos percebeu-se que um dos que foram encontrados no periódico RAC, havia sido publicado anteriormente nos anais do EnANPAD. Optou-se então por considerar somente sua versão publicada no periódico considerando a assertiva de Dias, et. al (2008) de que publicações em revistas são posteriores e provavelmente, estão atualizadas e melhoradas com relação à uma versão anterior, publicada em anais de eventos. 3.2 Coleta e tratamento dos dados Os artigos foram separados por ano e por evento ou periódico onde foi publicado antes da realização de leitura sistemática de cada um deles. Posteriormente, identificou-se os temas principais dos artigos a partir do título e do objetivo. Na investigação do objetivo que norteou cada pesquisa, constatou-se que em alguns trabalhos este não se apresentava de forma explícita. Na coleta de dados, também foi realizada a classificação dos artigos quanto a metodologia, para identificar a abordagem utilizada, o tipo e as estratégias de pesquisa e as técnicas de coleta de material empírico. Foram quantificadas ainda as referências nacionais e internacionais utilizadas nos artigos e identificados os autores mais referenciados, tomando como base não a quantidade de vezes que o autor era citado em um mesmo trabalho, mas a referência indicada do final dos artigos. Optou-se por excluir as autocitações dos autores. O estudo apresenta, ainda, um direcionamento sobre os aspectos que foram mais explorados, no período analisado, nos trabalhos sobre liderança e a sugestão de outros ainda pouco explorados e que merecem atenção, visando contribuir para o desenvolvimento do tema. Por fim, foram apresentados os dados gerais levantados e as sugestões para pesquisas futuras. 4 ANÁLISE DA PESQUISA ACADÊMICA SOBRE LIDERANÇA Esta seção apresenta os resultados da análise e está dividida em quatro partes: na primeira, são apresentados os dados gerais com o levantamento da quantidade trabalhos anuais, os enfoques sobre liderança encontrados e a relação do tema liderança com outros temas de estudos organizacionais; já a segunda parte da análise envolve o levantamento dos procedimentos metodológicos utilizados; na terceira são apresentados os aspectos gerais das 8 referências constando as indicações dos autores mais citados e a quantidade de citações nacionais e internacionais dos trabalhos; e na quarta é apresentada uma análise da produção cientifica utilizado os princípios da Lei de Lotka. 4.1 Dados Gerais dos artigos 4 Periódicos Qualis AeB BAR RAC ERA BASE Cad. EBAPE RAM RAUSP REAd Total Total deEventos e Periódicos 2008 2007 3 1 1 2 2 2 1 3 4 3 3 1 3 4 4 9 6 2009 4 2006 2006 7 2005 2005 4 2004 2004 6 2003 2003 1 2002 2002 2 2001 2001 0 2000 2000 2 1999 1999 2 1998 1998 1 1997 1997 1 1996 1996 3Es EMA EnADI EnANPAD EnAPG EnEO EnEPQ EnGPR Simpósio Total 1995 Total 2 5 0 0 52 1 7 1 13 1 80 10 1 1 4 17 21 2008 2009 9 1 8 2007 Eventos da ANPAD 1995 A Tabela 1 apresenta a quantidade de trabalhos sobre liderança em eventos e periódicos. De 1995 a 2009 foram apresentados 80 artigos em eventos, e apenas 8 artigos publicados em periódicos. Esse resultado indica que os estudos sobre liderança ainda são escassos em periódicos, mas também revela que 57,5% dos artigos publicados em eventos ocorreu nos últimos 03 anos, refutando a afirmativa de Sant’ana et al (2009) sobre a percepção dos acadêmicos brasileiros de que o tema está esgotado. 0 0 1 1 0 0 1 2 2 1 0 1 0 0 0 1 0 2 3 0 0 1 0 2 8 2 2 1 2 4 8 5 7 5 4 17 8 22 88 1 1 2 1 1 0 1 0 0 Total Tabela 1: Quantidade de artigos publicados por ano Fonte: Elaborada pelos autores Quanto às variações nas quantidades de trabalhos por ano, percebe-se que a quantidade de artigos publicados em eventos aumentou, enquanto que nos periódicos manteve-se ínfima. Pela exigência de ineditismo dos estudos para a submissão em eventos e por não existir essa mesma exigência quando se trata de periódicos, subtende-se que após a apresentação dos trabalhos nos eventos, eles sejam posteriormente encaminhados à submissão em periódicos. No entanto, dos 8 artigos encontrados sobre liderança nos periódicos, somente 1 deles foi apresentado anteriormente no EnANPAD. Outros 2 artigos foram apresentados neste evento e publicados posteriormente nos periódicos analisados, mas com variações no foco do estudo. Por isso, considerou-se as duas versões. Dos artigos analisados, 31 deles abordaram especificamente o tema liderança, e nestes constatou-se os objetivos mais diversos. A variedade de temas propostos nos artigos foi disposta na Tabela 2. 9 Quant. 8 6 4 3 2 Tema Constructo de liderança Estilos de liderança Liderança Transformacional Habilidades de liderança Perfil de liderança Quant. 2 2 2 1 1 Tema Relação entre líderes e liderados Desenvolvimento de Escalas de liderança Desenvolvimento de liderança/líderes Liderança criativa Processo de liderança Total de artigos 31 Tabela 2: Artigos focados somente nos aspectos de liderança Fonte: Elaborada pelos autores Nos artigos identificados na Tabela 2 como ‘construto de liderança’ reuniu-se os que utilizam denominações diversas para estudar o conceito, as percepções, o perfil, os paradigmas ou o fenômeno da liderança. A quantidade relativa aos que foram classificados como Liderança transformacional engloba também os que utilizaram a denominação no artigo de liderança carismática, pelo fato de alguns autores como Bryman (2004) e Bergamini (2009) considerarem que o carisma é um dos aspectos desse estilo de liderança. Em relação as publicações sobre o perfil de liderança, foi incluído também um artigo sobre o potencial de liderança. Considera-se que um grande número de estudos direcionam seu foco para o estilo de liderança adotado pelo líder e para a liderança transformacional, que também caracteriza-se como um tipo de liderança. Isso condiz com as percepções de Bergamini (2009) de que estudos sobre as ações, comportamentos ou estilos de liderança ainda predominam até hoje. Percebe-se que na literatura analisada poucos autores visualizam a importância de estudar as relações entre líderes e liderados, o processo de liderança como um todo, além da liderança de equipes, liderança compartilhada e equipes auto-geridas, que são temas atuais presentes em trabalhos internacionais bastante divulgados como os de Yulk (1998) e Hill (2004). Quanto aos artigos que relacionaram o tema liderança com outros temas que fazem parte de estudos organizacionais, observa-se na Tabela 3 grande diversidade de correlações entre eles. No item que compõe o tema liderança e desempenho estão quantificados os trabalhos que usaram os termos produtividade, resultados e sucesso, que entende-se por sinônimos de desempenho. E no item liderança e conhecimento, considerou-se trabalhos sobre gestão e sobre criação do conhecimento. Além dos temas dispostos na Tabela 3, encontrou-se dentre os dados da pesquisa 4 artigos que buscaram a interação do tema liderança com mais dois temas distintos. Observouse ainda que em todos esses 4 artigos o tema cultura esteve presente. Desta forma, esses estudos relacionaram os temas cultura e liderança com os temas poder, recrutamento, controle e compartilhamento. Isso condiz com o pensamento de Shein (2009) de que os temas cultura e liderança caminham juntos. Esses quatro artigos foram categorizados na tabela 3 com o tema “liderança, cultura e outros”. A utilização do termo outros foi utilizada porque a diversidade de temas associando liderança e cultura envolve aspectos do comportamento e a gestão de pessoas. Quant. 6 5 5 5 4 4 3 Temas Liderança e Mudança Liderança e Empreendedorismo Liderança e Cultura Liderança e Identificação Liderança e Comprometimento Liderança e Estratégia Liderança e Gênero Quant. 2 2 2 1 1 1 1 Temas Liderança e Poder Liderança e Competências gerenciais Liderança e Comunicação Liderança e Religião Liderança e Educação Coorporativa Liderança e Bem estar/estresse Liderança e Criatividade 10 3 3 2 1 Liderança e Aprendizagem Liderança e Desempenho Liderança e Conhecimento Liderança e Confiança Liderança e Cooperação Liderança e Emoção Liderança, Cultura e outros 1 1 4 Total de artigos 57 Tabela 3: Estudos e liderança em conjunto com outros temas Fonte: Elaborada pelos autores Ainda conforme a Tabela 3, os temas mais abordados nos artigos em conjunto com a liderança foram mudança, cultura, empreendedorismo e identificação, sendo estes temas normalmente voltados para a identificação de melhorias no desempenho organizacional. 4.2 Procedimentos metodológicos encontrados nos artigos 2 1 2 5 3 3 1 7 1 2009 2004 2 1 3 2 2 3 1 8 2008 2003 1 1 2007 2002 1 1 2006 2001 1 2005 2000 Ensaio Qualitativa 1 2 1 Quantitativa Quali-Quanti 1 1 Total 1 1 2 2 Tabela 4: Classificação por abordagem Fonte: Elaborada pelos autores 1999 1998 1997 1996 Abordagem 1995 Quanto aos procedimentos metodológicos utilizados nos artigos, verifica-se na Tabela 4 que, com relação ao total de estudos analisados, não há uma diferença tão significativa entre a quantidade de estudos que utilizaram as abordagens qualitativa e quantitativa. Total 2 1 1 1 1 4 3 5 7 2 17 3 4 1 8 3 11 7 1 22 14 33 29 12 88 3 5 A pesquisa quantitativa da liderança, na percepção de Bryman (2004) oferece especificações claras e concisas de relações causais ao pesquisador como uma de suas vantagens. O autor destaca que grande parte da pesquisa sobre liderança foi tradicionalmente quantitativa, referindo-se aos primeiros estudos sobre o tema. Na Tabela 4, quando se observa a variação anual dos estudos quantitativos, constata-se que de 2007 a 2009 foram publicados em média 6 artigos por ano, enquanto que de 1995 a 2001 não foi publicado nenhum trabalho utilizando-se esse tipo de abordagem. Isso demonstra que a importância da abordagem quantitativa vem sendo novamente percebida nos últimos anos. No que se refere aos estudos de abordagem qualitativa, nota-se que eles eram utilizados nos primeiros anos desta análise, mas deram um salto significativo em termos numéricos no ano de 2009. A pesquisa qualitativa, de acordo com Bryman (2004) é também sensível aos contextos de liderança ao realçar, por meio de estudos de caso único ou da comparação entre casos, como os aspectos específicos do contexto afetam os líderes. Quanto aos estudos que se utilizaram desses dois tipos de abordagem de forma concomitante, classificados como estudos Qualitativos-Quantitativos, nota-se que sua média se mantém pequena e praticamente estável desde o ano de 2001. As pesquisas quantitativa e qualitativa são simplesmente abordagens diferentes do processo de pesquisa que vêm ao longo do tempo se mantendo quase inconciliáveis pelos seus fundamentos epistemológicos, mas elas podem ser combinadas e mutuamente informativas e esclarecedoras quando se trata de estudos como da liderança (BRYMAN, 2004). Entende-se assim, que essa conciliação poderia ser mais explorada em estudos posteriores, inserindo uma abordagem multiparadigmática para compreensão do fenômeno (SILVA; ROMAN NETO, 2006). 11 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Teórica 1 1 1 1 Empírica 1 2 1 1 Total 1 1 2 2 1 2 Tabela 5: Classificação por tipo de pesquisa Fonte: Elaborada pelos autores 2001 2000 1999 1998 1997 1996 Tipo de Pesquisa 1995 Os estudos empíricos sobre liderança claramente são mais utilizados nos últimos anos em comparação com a pesquisa de essência teórica como mostra a Tabela 5. Total 1 2 3 3 5 8 5 5 1 6 7 2 3 5 1 3 4 3 14 17 8 8 3 19 22 18 70 88 Godoy e Balsini (2006) em uma análise também bibliométrica sobre a pesquisa qualitativa em estudos organizacionais brasileiros, encontraram em seu levantamento grande predomínio de ensaios teóricos, correspondente a quase metade de todos os artigos analisados. Neste estudo, ao contrário, o predomínio de estudos empíricos envolvendo a liderança foi substancialmente superior em relação aos estudos teóricos. Isto pode ser identificado como uma das características específicas dos estudos sobre liderança pela necessidade de aplicar conhecimentos teóricos dentro de contextos específicos. Com relação a utilização das técnicas de coleta de dados, o número total apresentado na Tabela 6 é superior à quantidade de artigos analisados na pesquisa pelo fato de muitos estudos se utilizarem de mais de uma técnica de obtenção de dados primários, sendo a triangulação de dados identificada em alguns trabalhos. Este aspecto também foi identificado em outros estudos de análise de produção científica como o de Godoy e Balsini (2005). Quant. Técnica de Coleta de Dados 42 Questionário 33 Entrevistas 18 Análise Documental 13 Análise Bibliográfica (exclusivamente) 8 Observação Direta Tabela 6: Técnicas de coleta de dados Fonte: Elaborada pelos autores Quant. 2 2 1 7 28 Técnica de Coleta de Dados Diário de campo Grupos de Discussão (focus group) Relatos de Memória Não identificado Total Observou-se ainda que muitos trabalhos não definem de forma clara a metodologia adotada, havendo assim a necessidade de um esforço maior por parte do pesquisador em compreender o processo de coleta dos dados. Em 7 casos, como mostra a Tabela 6 não foi identificado nenhuma técnica utilizada e, em sua maioria, esses casos foram encontrados em estudos mais antigos. Isto pode estar relacionado aos critérios atuais de normatização e organização de artigos e ao maior rigor adotado para a análise por parte dos comitês avaliadores desses trabalhos. Diante da Tabela 6 percebe-se que é substancial o número de artigos que fazem uso da técnica de aplicação de questionários para coleta de dados. Nesta classificação, incluiu-se não somente os questionários elaborados pelos próprios autores dos artigos, mas também modelos, escalas e inventários criados e já validados em outros estudos, como é o caso do Grid Gerencial de Blake e Mouton e o questionário Multifactor Leadership Questionnaire MLQ de Bass e Avolio. Também é considerável o número de autores que se utilizam de entrevistas e de análise documental para a coleta dos dados e em número reduzido os que se utilizam de outras técnicas diário de campo e grupos de discussão. 12 Alguns autores mencionam exclusivamente a pesquisa bibliográfica como técnica de coleta de dados, como é o caso dos ensaios teóricos e dos estudos para a construção de escalas. Por isso a especificação na Tabela 6, pois se subtende que todos os artigos se utilizaram de pesquisa bibliográfica para a construção dos seus referenciais. 4.3 Aspectos gerais das referências Nesta fase, procedeu-se a quantificação das referências nacionais e internacionais de cada artigo. Somadas as quantidades dos 88 trabalhos, encontrou-se no total 1.517 referências nacionais e 1.360 internacionais. Assim, em média, cada artigo citou 17 referências nacionais e 15 internacionais. No entanto, nesta afirmação deve ser considerado o fato de que durante a análise de cada trabalho percebeu-se que esse número variou muito, encontrando-se inclusive dois dos artigos dos periódicos que somente continham citações internacionais. A Tabela 7 apresenta a relação dos 25 autores mais citados como referências bibliográficas nos artigos analisados, eliminando-se as referências em que os autores fazem menção aos seus próprios trabalhos anteriores. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Quant. citações 60 51 43 34 31 30 27 26 26 Autor BASS, B.M. BERGAMINI, C.W. AVOLIO, B.J. MINTZBERG, H. BENNIS, W. KOTTER, J.P. SCHEIN, E.H. KETS DE VRIES, M.F.R. YUKL, G.A. 10 11 12 13 14 15 16 17 18 Quant. citações 23 22 21 19 18 18 18 17 16 Autor DRUCKER, P.F. WEBER, M. ROBBINS, S.P. RICKARDS, T. NONAKA, I. BLANCHARD, K. H. HERSEY, P. BURNS, J. M. SENGE, P.M. 19 20 21 22 23 24 25 Quant. citações 15 15 15 15 15 15 14 Autor BRYMAN, A. MOTTA, F.C.P. MACHADO, H.V. MORGAN, G. KOUZES, J.M. SMIRCICH, L. CARLAND, J. W. Tabela 7: Os 25 autores mais referenciados nos 88 artigos Fonte: Elaborada pelos autores Analisando-se a Tabela 7, percebe-se que o autor mais citado é estrangeiro, enquanto que a segunda mais citada é nacional. Somente dois outros autores nacionais estão entre os mais citados. A maioria dentre os mais citados são norte-americanos. Os resultados indicam que os autores internacionais continuam sendo reconhecidos pela comunidade acadêmica nacional como os mais relevantes da área. Por outro lado, a escassez de artigos publicados em periódicos de autores nacionais contribui significativamente para tornar os autores brasileiros que pesquisam o tema pouco conhecidos na comunidade científica. 4.4 Análise da Produção Acadêmica sobre Liderança pela Lei de Lokta Nesta etapa, foi verificada a distribuição das publicações na área segundo a Lei de Lotka. A lei de Lotka indica que a quantidade de autores que fazem n contribuições para a ciência é definida pela função 1/n2.. Desta forma, uma pequena quantidade de autores é responsável por um grande número de publicações. Lotka ainda afirmou que aproximadamente 60% dos autores contribuem com a ciência apenas com uma única publicação. Pode-se definir a função de distribuição para a lei de Lotka da seguinte maneira: f(x) = C / xa, onde x é o número de publicações, C é o número de autores que publicaram na área e a é a potência que define o comportamento da função. Para definição das constantes C e a, duas alternativas foram analisadas: (i) considerouse apenas o primeiro autor de cada publicação; (ii) foram considerados todos os autores de cada publicação. O valor da constante a nas duas análises foi definido pelo método dos 13 mínimos quadrados, ou seja, a potência que melhor ajusta a distribuição de Lotka aos dados observados. A Tabela 8 resume os coeficientes utilizados para as duas análises. Considerando apenas o 1º autor de cada publicação Maior valor para x 3 publicações do autor Anderson de Souza SantAnna Constante a 2,9 Constante C 78 Tabela 8: parâmetros para distribuição de Lotka Considerando todos os autores de cada publicação 4 publicações do autor Anderson de Souza SantAnna 2,39 169 Após a definição dos parâmetros para construção da função de Lotka, procedeu-se a comparação entre as distribuições esperadas de Lotka e observada conforme apresentam as Tabelas 9 e 10. Public. por autor 4 3 2 1 Total Análise considerando todos os autores Distribuição esperada de Lotka Distribuição observada Qtd Autores Total de public. Qtd Autores Total de public. 6 24 1 4 6 18 2 6 20 40 27 54 137 137 139 139 169 219 169 203 Tabela 9: Distribuição esperada de Lotka e observada considerando todos os autores Fonte: Elaborada pelos autores Public. por autor 3 2 1 Total Análise considerando apenas o primeiro autor Distribuição esperada de Lotka Distribuição observada Qtd Autores Total de public. Qtd Autores Total de public. 3 9 1 3 7 14 8 16 68 68 69 69 78 91 78 88 Tabela 10: Distribuição esperada de Lotka e observada considerando o primeiro autor Fonte: Elaborada pelos autores É importante observar que, em média, as publicações analisadas tiveram 2,3 autores. Assim apesar das 88 publicações efetivas na área, para efeito de análise e considerando todos os autores por publicação, esse valor passa para 203. É importante ressaltar que o número de publicações na área considerando a quantidade de autores é menor do que a quantidade esperada de acordo com a distribuição de Lotka (219/203 e 91/88). Ainda, percebe-se que, nas duas análises, o número de autores com 3 ou 4 publicações é inferior ao esperado (12/3 e 3/1) enquanto o número de autores com 1 ou 2 publicações supera a quantidade esperada (157/166 e 75/77). 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados encontrados com a sistematização e análise da produção científica sobre liderança no Brasil nos últimos 15 anos revelaram que alguns aspectos envolvendo o tema, 14 tais como o processo de liderança e os aspectos subjetivos que envolvem a relação entre líderes e liderados, além da liderança de equipes, liderança compartilhada e equipes autogeridas, foram pouco explorados nos estudos nacionais. O relacionamento entre o tema liderança com outros temas vinculados aos estudos organizacionais encontrou muitos adeptos no período considerado nesta pesquisa, com destaque para os estudos envolvendo liderança e mudança, liderança e cultura, liderança e empreendedorismo, e liderança e comprometimento. Constatou-se, ainda, a publicação de poucos estudos relacionando liderança a temas como confiança, poder, cooperação, bem estar no trabalho, relações de poder e emoção. As pesquisas com abordagem quantitativa ou qualitativa foram as mais utilizadas nos artigos. No entanto, entende-se que a conciliação entre esses dois tipos de pesquisa poderia ser mais explorada em estudos posteriores se visualizados e utilizados como formas complementares e não excludentes para gerar informações de relevância mútua. Quanto às técnicas de coleta de dados, a maioria utiliza-se de questionário e entrevista, sendo interessante trabalhar também, de forma concisa, com técnicas de triangulação de dados. Dentre os autores mais referenciados nos artigos publicados em eventos e periódicos, somente dois deles são nacionais. Assim, na relação dos 25 autores mais citados nas referencias dos artigos, 23 deles são de origem internacional. Percebe-se, desta forma, uma maior disposição dos autores internacionais no desenvolvimento do tema, bem como uma supervalorização dos autores estrangeiros em detrimento dos nacionais. Por outro lado, essa constatação pode estar associada a pequena divulgação de artigos em periódicos nacionais, o que torna os autores brasileiro que pesquisam o tema pouco conhecidos na comunidade científica. A análise da produção acadêmica pela distribuição de Lotka revelou que a área carece de maior quantidade de publicações, uma vez que a quantidade de publicações apresentada está aproximadamente 7% abaixo da quantidade esperada. A distribuição de Lotka também mostra que a área precisa ampliar a quantidade de autores que publiquem mais de um artigo, como vem ocorrendo nos últimos anos. Essa ocorrência é facilmente percebida na análise, considerando todos os autores por publicação, onde esperava-se 12 autores com 3 ou 4 publicações e foi observado que apenas três autores conseguiram atingir essa quantidade. Considera-se que a pesquisa nacional sobre liderança precisa focalizar nas novas visões propostas na literatura, como as abordagens da nova liderança e da liderança de equipes, que são propostas como formas mais viáveis ao estudo da liderança no cenário atual. Diante da quantidade de estudos identificados nesse levantamento, conclui-se que a produção acadêmica nacional envolvendo a liderança tem aumentado significativamente no Brasil nos últimos anos, sobretudo em eventos. Um dos desafios a serem transpostos é ampliar a publicação de artigos em periódicos qualificados com o objetivo de dar mais visibilidade ao tema e tornar os autores brasileiros mais conhecidos na comunidade científica nacional. REFERÊNCIAS ARAÚJO, Carlos Alberto. 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