Ser e Estar Já parou para pensar que o modo como falamos com os nossos filhos pode influenciar o desenvolvimento emocional deles? Vamos partir de dois exemplos: Cena 1: Uma menina recebeu um convite para a festa de aniversário de um amigo da escola. Foi com a mãe ao shopping escolher um presente. A mãe, preocupada com o que a filha vestiria na data, aproveitou para comprar uma roupinha nova. Compraram. A mãe todo orgulhosa, dizia para a filha que ela ficaria linda – a menina mais bonita da festa! A filha sorria feliz! Quando chegou o esperado dia, a menina vestiu a roupa nova, mas faltou algo! Talvez um esmalte que combinasse, um sapato novo – com saltinho de preferência, um penteado diferente! Pronto! Agora sim! A menina estava bem “feminina”. A mãe não se cansava de repetir que ela estava linda e a incentivava protagonizar um mini-desfile para o pai, a avó, a tia, a vizinha, enfim, a platéia que fosse. E a menina foi, e ouviu incansavelmente a mesma coisa que lhe dissera sua mãe e, por fim, acabou por se convencer de que realmente estava linda! Aliás, chegou a essa conclusão, enquanto se olhava ao espelho pela última vez, antes de saírem para a festa, certificando-se de que tudo estava certo, em seu devido lugar. Cena 2: A mãe tentou acordar o filho pela manhã para ir à escola, mas na primeira tentativa, falhou, o menino virou para o lado e voltou a dormir. A mãe, já um pouco irritada e com um tom mais alto de voz, começou a chamá-lo insistentemente, até que ele acordou de vez. Fez questão de deixar bem claro para a criança o quanto a achava preguiçosa e que isso era muito feio. No café da manhã, o menino foi apressado para terminar sua refeição, pois a família toda estava atrasada. Ele saiu correndo para entrar no carro, mas, voltou para buscar um caderno que havia esquecido, não sem ouvir o quanto era lerdo e desatento e que iria atrasar, mais ainda, toda a família. Chegou à escola e começou a assistir uma aula que não lhe motivou nem um pouquinho, logo procurou alguma distração. Conversar com o colega ao lado, que tampouco estava motivado pelo assunto, pareceu uma boa idéia. O preço dessa atitude foi ouvir da professora que ele era bagunceiro, distraído e que sempre atrapalhava o restante da sala. Na hora do intervalo foi excluído de uma brincadeira, ficou com raiva e empurrou um outro colega. Ouviu da diretora, enquanto ela escrevia um bilhete para a sua mãe, o quanto ele era agressivo. Em casa, já bastante estressado, a mãe lhe cobrou explicações sobre o ocorrido na escola. O menino saiu bravo, batendo a porta do quarto, mas mesmo assim conseguiu ouvir que ele precisava parar de ser nervosinho daquele jeito. Claro que são duas cenas caricatas, mas que nos trazem uma reflexão sobre o modo como estamos educando as nossas crianças e qual comportamento esperar a partir disso. Na primeira cena, acredito que não tenha problema algum a mãe se orgulhar da filha! Não, o problema também não é dizer para ela que ela está bonita! Não, não é esse! O que passa a ser um problema é a menina não ouvir no dia-a-dia que ela é bonita e que ela não precisa de nada mais para obter essa condição! Ela é uma criança que já tem um brilho próprio, todo especial, que a própria infância lhe atribui. Ela não precisa de vestido novo, sapato caro – ainda mais de salto, esmalte, penteados mirabolantes para se sentir bonita. Muito menos precisa que isso tudo atrapalhe seu desempenho em sua principal atividade – brincar! Como brincar espontaneamente se o penteado desmanchará? Como correr, pular, escalar com um sapato de salto? Como brincar na areia ou com tinta se correrei o risco de manchar o vestido novo? E sabe por que essa preocupação? Não porque a criança se preocupa com as coisas. Não, não é isso! Ela terá uma grande perda se tudo isso se estragar – ela não estará mais bonita e, muito provavelmente, pensará que sua mãe ficará triste! Com a auto-estima em desenvolvimento, quem quer sofrer uma perda dessas? E outra, bem provável que já tenha ouvido que ficar pulando para lá e para cá não é coisa de mocinha! E ela acreditou! E como acreditou! Na segunda cena, os adultos se mostraram incapazes de se colocarem no lugar da criança e tentarem compreender o que estava acontecendo. Nesse caso ninguém perguntou para o menino porque ele estava cansado, não perceberam que estava bagunçando, pois estava desmotivado, que foi agressivo porque não soube expressar de outra forma a sua raiva, que estava nervoso devido ao dia estressante que teve. Não, ninguém soube fazer essas interpretações e empaticamente pensar junto a ele, outros meios mais saudáveis de extravasar esses sentimentos. Provavelmente essa situação se repetirá muitas vezes ainda. Talvez por anos! E sabe o que irá acontecer? O menino acreditará que ele é isso tudo mesmo e passará a agir assim, pois lhe fizeram crer que essa é a sua natureza! Que perda! Assim, criamos rótulos, diminuímos a autoestima e aumentamos a estatística de crianças em tratamento e tomando medicamentos. Por detrás disso, pensamos ter uma família isenta de responsabilidades e zelosa por seguir as indicações médicas. Está certo que foram duas situações um tanto exageradas, mas foram colocadas para que pudéssemos pensar um pouquinho sobre como estamos conversando com nossas crianças e compreendendo os sinais que elas nos trazem! Como você tem usado os verbos ser e estar? Fonte: http://brincandoporai.com.br/ser-e-estar/