GUARUJÁ: UMA
(IN)SUSTENTÁVEL
EXPERIÊNCIA
DE
DESENVOLVIMENTO
BRUM, Carla 1
Resumo: O objetivo manifesto deste artigo é mostrar que a expansão urbana de Guarujá, nas
últimas décadas, enveredou por uma política nada sustentável como efeito do elevado
crescimento populacional, da forte expansão do mercado imobiliário e da criação de bairros
periféricos carentes de infraestrutura. Como consequência, atualmente a realidade da cidade
está marcada por grande contraste urbano e desigualdade social, visto que no município
vivem famílias de baixa renda em favelas ao lado de condomínios sofisticados de classe alta.
A perspectiva futura de Guarujá adotar um modelo de desenvolvimento sustentável precisa
ser arquitetada imediatamente. Com tal intuito, a implementação do Plano Local de
Desenvolvimento Sustentável (PLDS), denominado “Agenda 21 do Guarujá 2034, por um
Centenário Sustentável”, com suas diretrizes incorporadas ao novo Plano Diretor do
Município, poderá ser uma oportunidade valiosa para os próximos anos. Esse trabalho
ressalta, ainda, a imprescindível inserção da Educação Ambiental como um dos processos
formadores da consciência cívica dos educandos e da população voltada para o
desenvolvimento sustentável de Guarujá.
Palavras-chave: Guarujá. Desenvolvimento Sustentável. Agenda 21. Educação Ambiental.
Abstract: The manifest purpose of this article is to show that the urban sprawl of Guarujá, in
recent decades, has taken a policy like nothing sustainable effect of high population growth,
the booming real estate market and the creation of underprivileged suburbs of infrastructure.
As a result, today the reality of the city is marked by great social inequality and urban
contrast, since the city low-income families living in slums alongside sophisticated high-rise
condos to. The future prospect of Guaruja adopt a model of sustainable development needs to
be devised immediately. With this order, the implementation of the Local Plan for Sustainable
Development (PLDS), called "Agenda 21 Guaruja 2034 for Sustainable Centennial," with its
built into the new Master Plan of the Municipality guidelines, can be a valuable opportunity
for the coming years . This work also emphasizes the essential inclusion of environmental
education as a process of forming the civic consciousness of students and the population
focused on sustainable development of Guaruja.
Keywords: Guarujá. Sustainable development. Agenda 21. Environmental education.
1
Carla Brum Carvalho Smorigo, é Mestre em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas
(UEA), Professora e Coordenadora da Faculdade de Direito do Guarujá (União Nacional das Instituições
Educacionais São Paulo – UNIESP) e Advogada. É autora da dissertação de mestrado A Educação Ambiental
no Processo de Valorização Cultural para a Conservação do Patrimônio Cultural, 2004 e do artigo "Flat Tropical
Manaus: um estudo de caso." publicado HILÉIA - Revista de Direito Ambiental da Amazônia, vol. 1,
Universidade do Estado do Amazonas , Manaus: 2003.
Introdução
O presente artigo tem por objetivo mostrar a experiência do desenvolvimento (in)
sustentável de Guarujá, nas últimas décadas, caracterizada pelo elevado contraste visual e
desigualdade social, visto que na cidade há numero elevado de pessoas de baixa renda
habitando em favelas e conjuntos populares ao lado de elevada quantidade de condomínios de
classe alta. Esse quadro é visto em várias regiões da cidade, destacando-se o distrito de
Vicente Carvalho onde seus moradores convivem com saneamento precário, falta de moradias
e uma estrutura insuficiente de educação, saúde e segurança.
A expansão urbana de Guarujá foi provocada pelo elevado crescimento populacional,
a forte expansão do mercado imobiliário e a criação de bairros periféricos carentes de
infraestrutura urbana, serviços e empregos. A ocupação de áreas de preservação permanente,
de encostas de morros, de mangues e de outras áreas de proteção ambiental foi inevitável pela
falta de acesso à terra urbana, atingindo principalmente a população mais pobre.
A perspectiva futura de Guarujá adotar um novo modelo de desenvolvimento não é um
processo simples e rápido, mas precisa ser arquitetado imediatamente. Nesse sentido foi
construído, com a participação do governo municipal e de segmentos representativos da
sociedade civil, o Plano Local de Desenvolvimento Sustentável – PLDS, denominado
“Agenda 21 do Guarujá 2034, por um Centenário Sustentável”, que traz no seu bojo a
sustentabilidade ambiental como diretriz para o planejamento urbano.
A sustentabilidade ambiental incorporada pelo PLDS e também pelo novo Plano
Diretor do Município são oportunidades para a recuperação dos danos provocados pela
expansão urbana do passado e criar novos caminhos para o crescimento sustentável. Ao
mesmo tempo, a Educação Ambiental é defendida como um processo de formação da
consciência cívica dos educandos e da população voltada para o desenvolvimento sustentável
de Guarujá.
1 Desenvolvimento Sustentável
A expressão “desenvolvimento sustentável” foi usada pela primeira vez pela Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Comissão Brundtland), da Organização
das Nações Unidas (ONU), em seu relatório “Nosso Futuro Comum”2.
2
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Comissão Brundtland), da Organização das
Nações Unidas (ONU), em seu relatório Nosso Futuro Comum (Our Common Future), publicado em 1987.
A idéia de sustentar a Terra é uma metáfora para despertar a conscientização e a
necessidade de um melhor gerenciamento do meio ambiente. A definição da Comissão
Brundtland – “satisfazer as necessidades da geração atual sem comprometer as necessidades
das gerações futuras” – foi incorporada ao dicionário corrente como o conceito mais usada
para o desenvolvimento sustentável nas suas vertentes ambiental, econômica e socio-política.
O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual,
sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas
próprias necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no
futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico
e de realização humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso
razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os habitats
naturais. (Relatório Brundtland)
Alcançar o desenvolvimento sustentável é o maior desafio dos governos e dos
organismos mundiais. Apesar do progresso registrado nas últimas décadas é significativo o
número de pessoas em todo do mundo que ainda vivem em situação de pobreza e têm acesso
precário aos recursos – educação, saúde, moradia, saneamento – de que necessitam para viver
uma vida melhor.
O papel do desenvolvimento é proporcionar oportunidades para que essas pessoas
possam aumentar o bem-estar. A melhoria do padrão de vida e igualdade de oportunidades é
fundamental no desenvolvimento econômico. A garantia dos direitos políticos e individuais
também é um objetivo desenvolvimentista mais amplo. O crescimento econômico é um meio
fundamental de proporcionar desenvolvimento, mas é também, em si mesmo, uma avaliação
muito imperfeita de progresso. Educação, mortalidade infantil e as condições nutricionais,
entre outros, constituem complementos essenciais ao Produto Interno Bruto (PIB) dos países.
Mesmo assim, todos reconhecem que o desenvolvimento é um objetivo a ser perseguido, mas
cresce a apreensão em saber se as restrições ambientais virão a restringi-lo e se o
desenvolvimento causará danos ao meio ambiente. A degradação ambiental prejudica o
Homem no presente e nas futuras gerações. Isso é mais uma base para reformularmos nossa
avaliação de progresso.
O valor do meio ambiente foi por muito tempo subestimado, o que prejudicou a
qualidade da vida, diminuiu a produtividade agrícola e comprometeu perspectivas de
desenvolvimento em todas as partes do mundo. Muito se destrói com pouco ou nenhum efeito
para o aumento da renda, e que uma avaliação cuidadosa de benefícios e custos redundaria em
um dano ao meio ambiente muito menor que o atual.
No cenário mundial, o impacto do aquecimento global é considerado pelos cientistas e
ambientalistas como "grave e irreversível", segundo o recente relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), da Organização
das Nações Unidas (ONU)3.
O documento do IPCC - sintetizado dos estudos de milhares de cientistas de todo o
mundo - é tido como o diagnóstico mais completo de todos os tempos sobre o impacto das
mudanças climáticas na Terra. O relatório aponta que até agora as conseqüências das
mudanças climáticas são sentidas de forma mais acentuada pela natureza, mas que haverá um
impacto cada vez maior sobre o Homem. Mudanças climáticas vão afetar, entre outros, a
saúde, a moradia, a alimentação e a segurança da população.
Mas nem tudo é pessimismo na visão dos cientistas. Os estudos asseguram que o
desenvolvimento humano e econômico permanente pode ser sustentável e compatível com a
boa qualidade ambiental, desde que com grandes mudanças comportamentais das pessoas.
Primeiro, é necessário tirar o máximo proveito da relação crescimento econômico e meio
ambiente. Isso exige, entre outros, o fim das políticas distorcidas que estimulam o uso
excessivo recursos naturais. É preciso estimular os detentores do poder decisório – governos,
empresas, famílias – a pensarem de forma mais positiva na construção de políticas e
programas para um desenvolvimento que seja sustentável. Felizmente, o presumível é que,
daqui por diante, cada aspecto das atividades econômicas sejam mais pressionados e
influenciados por restrições ambientais.
Para tanto, é imprescindível que haja um processo de participação da população local
na formulação das políticas de desenvolvimento, articuladas com programas de educação
ambiental. Nem os governos nem as agências de assistências estão equipados para julgar a
importância que a população confere ao meio ambiente
Decidir entre ganhos sociais e econômicos e custos ambientais requer de
discernimentos subjetivos e conhecimento detalhado das condições ambientais. A
participação da população local pode, em certos casos, atrasar o processo decisório, mas gera
muitos benefícios econômicos, sociais e ambientais na construção de projetos, tais como,
saneamento, gerenciamento dos solos e plano diretor da cidade. Por isso mesmo, a
Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas - IPCC, da Organização das Nações Unidas – ONU.
Publicado no site http://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/bbc/2014/03/31/impacto-doaquecimento-global-sera-grave-e-irreversivel-diz-onu.htm; acessado em 31/03/2014 – 08h03
3
experiência indica que as partes envolvidas necessitam de treinamento em técnicas de
participação e negociação.
Há muita oportunidade de “ganhar dos dois lados” que ainda não foram explorados. A
mais importante refere-se à pobreza. Combater a pobreza não é apenas uma obrigação ética e
moral, é intrínseca a gestão ambiental.
É, também, essencial dispor de solidas instituições publicas e políticas de proteção
ambiental. Ao longo das ultimas décadas, o mundo aprendeu a confiar mais nos mercados e
menos nos governos para promover o desenvolvimento. Por outro lado, a proteção do meio
ambiente é uma área em que o governo deve manter o papel central. Os mercados privados
nem sempre oferecem incentivo, espontaneamente, à defesa do meio ambiente.
2 Guarujá: Uma Experiência (In) Sustentável
Quando se fala do Guarujá, localizada na Ilha de Santo Amaro, litoral do Estado de
São Paulo, as pessoas lembram primeiramente das suas belas praias. Com uma natureza
privilegiada, distribuída por praias inteiramente distintas, milhares de veranistas são atraídos
para a região. Além de contar com a proximidade com a Capital. Guarujá já foi reconhecido
internacionalmente com o título de “Pérola do Atlântico”. Mas a realidade não é bem assim.
Como já destacamos, Guarujá é marcada pela presença de um forte contraste urbano e muita
desigualdade social, visto que no município moram famílias de baixa renda em favelas e
conjuntos habitacionais populares, ao lado de condomínios verticais ou horizontais
sofisticados de classe alta.
O município de Guarujá localiza-se na Ilha de Santo Amaro, litoral do Estado de São
Paulo, é uma das cidades pertencentes à Região Metropolitana da Baixada Santista, distante
cerca de 70 quilômetros da Capital. Área territorial de 142,9 km²; população de 290.752
habitantes (censo 2010), densidade demográfica de 2.035 habitantes/ km² 4
É em Vicente de Carvalho que podemos perceber os maiores desequilíbrios social e
urbanístico quando comparado às áreas nobres de Guarujá. Muitos dos moradores que
residem nesse distrito convivem com saneamento precário, falta de moradias e uma estrutura
insuficiente de educação, saúde e segurança. Vicente Carvalho é um populoso distrito de
4
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Censo Demográfico 2010;
“Guarujá
2034,
por
um
Centenário
Sustentável”,
”www.guaruja.sp.gov.br/sites/.../livro_agenda_21_guaruja_2034.pdf
publicado
Livro “Agenda 21 –
no
site
Guarujá, com a metade da população do município, sendo responsável por uma parcela
expressiva do imposto municipal, resultado das atividades econômicas desenvolvidas, entre as
quais, em terminais de contêineres e de fertilizantes e do vigoroso comércio local.
Apesar dessa contribuição aos cofres do município, seus moradores entendem que
Vicente Carvalho não tem o retorno dos investimentos capaz de melhorar os serviços públicos
nas áreas da infraestrutura urbana e social, motivo pelo qual parcela significativa de seus
moradores continua a manifestar o desejo de emancipação política e administrativa do distrito.
Vicente Carvalho apresenta uma grande diversidade cultural, com forte presença de
nordestinos, catarinenses e libaneses que se instalaram no comércio. É pitoresco lembrar que
em Vicente de Carvalho residiu o ex-presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, durante quatro
anos logo após sua chegada do Nordeste por volta de 1952. Mesmo tendo um ex-presidente
no passado do distrito, nestes anos todos, quase nada mudou para os seus moradores.
2.1. Breve Histórico da Expansão Urbana de Guarujá
Este capítulo relata um breve histórico da expansão urbana de Guarujá e o conflito
entre o crescimento desorganizado da cidade e o direito a um ambiente ecologicamente
equilibrado previsto no artigo 225 da Constituição Federal de 1988. A forma como a cidade
vem se “desenvolvendo” dá sinais claros de esgotamento com muitos problemas enfrentados
pela população no seu cotidiano, entre outros, nas áreas de mobilidade e acesso, saneamento
ambiental, habitação e desenvolvimento econômico.
Destacamos alguns dos principais marcos históricos relacionados à expansão urbana de
Guarujá:5
- 1.931, Guarujá foi integrado ao município de Santos ficando assim até 1.934.
- 1934, o Governador Armando Salles de Oliveira criou a Estância Balneária de Guarujá,
nomeando o seu prefeito o Dr. Cyro de Mello Pupo.
Livro “Agenda 21 – “Guarujá 2034, por um Centenário Sustentável” publicado no site
www.guaruja.sp.gov.br/sites/.../livro_agenda_21_guaruja_2034.pdf;
http://portal.guaruja.sp.gov.br/historia-ecultura/http://www.visiteguaruja.com/historico_cidade_guaruja.php;
http://www.nossosaopaulo.com.br/Reg_13/Reg13_Guaruja.htm
5
- 1946, construção do primeiro edifício para moradia na cidade o que anunciava a
transformação urbana que Guarujá sofreria pelos próximos anos (Edifício Sobre as Ondas
para atender a demanda por moradias de férias na região).
- 1947, Guarujá é promovida a município, sendo eleito como primeiro prefeito do município
o Sr. Abílio dos Santos Branco.
- 1.953, o governador Lucas Nogueira Garcez, criou o distrito de “Vicente de Carvalho”,
antigo Itapema, em homenagem ao poeta santista; conclusão da Rodovia Anchieta que
propiciou a vinda de novos turistas para a cidade. Iniciam-se as construções civis e a migração
nordestina.
- 1971, concluída a Rodovia Piaçagüera-Guarujá (atual Cônego Domênico Rangoni), ligando
Guarujá diretamente a Via Anchieta e as rodovias Rio-Santos e Mogi-Bertioga (acesso ao
Litoral Norte e ao Vale do Paraíba); explosão do turismo.
- 1976, inaugurada a Rodovia dos Imigrantes como parte de um complexo de rodovias
denominado Sistema Anchieta-Imigrantes, entre elas. a rodovia Cônego Domênico Rangoni.
O novo acesso atrai milhares de novos veranistas para a cidade.
- década 80, Guarujá vive um boom imobiliário nas praias de maior interesse dos
compradores de imóveis de renda média e alta. Esse segmento imobiliário se expandiu a partir
de Santos, avançando sobre as áreas junto às praias do Guarujá. Guarujá se consolida como
pólo turístico de veraneio, que atrai grande contingente de população.
- anos 90, recuperação progressiva do balneário de Guarujá, com investimentos em
saneamento, habitação. Expansão do turismo e da prestação de serviços.
- 2002, concluída a segunda pista da rodovia dos Imigrantes. Nova onda migratória.
Quadro da Evolução Populacional de Guarujá6
6
Ano
População
1940
7.539
Crescimento da Década
em %
-
1950
13.203
75,1
1960
40.071
202,5
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; SEAD - Fundação Sistema Estadual de Análise de
Dados.
1970
93.224
132,6
1980
150.347
161,3
1990
210.207
40,2
2000
264.812
25,7
2010
290.752
9,8
Pela evolução histórica vista não é difícil perceber que a população guarujaense
cresceu acima da média das cidades da região, principalmente entre as décadas 50 e 90. A
cidade expandiu-se de forma nada organizada com danos tanto contra a natureza, quanto ao
próprio homem.
A ocupação de áreas de preservação permanente, de encostas de morros, de mangues e
de outras áreas de proteção ambiental foi inevitável pela falta de acesso à terra urbana,
atingindo principalmente a população mais pobre. Esse processo de desmatamento, só foi
abrandado com a edição do Decreto Federal n° 750, de 10 de Fevereiro de 1993, que
estabeleceu medidas quanto ao corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos
estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, sendo esta legislação
responsável, ainda hoje, pela manutenção de grande parte da vegetação conservada.
Por outro lado, Guarujá ainda tem os problemas agravados pela população flutuante.
Segundo estimativas anuais, sua população flutuante gira em torno de 1.500.000 de pessoas,
somando os períodos de baixa e alta temporada. É conhecido que nos municípios com essa
sazonalidade, o poder público investe muito para ofertar água, serviços de coleta de lixo e
limpeza urbana, mobilidade e segurança, entre outros, dimensionados para uma demanda
muito superior à necessária ao consumo em épocas fora de temporadas em prejuízo da
população fixa residente da cidade.
Cabe aqui citar a urbanista Raquel Rolnik que em seu artigo “Legislação Urbanística e
Mercados Informais de Terras em Cidades Industriais: As Relações Perversas”7 denuncia as
políticas desenvolvimentistas, desde os investimentos em infraestrutura às políticas
habitacionais atuais, concebidas como elemento de dinamização econômica para enfrentar
uma possível crise e gerar empregos, sem qualquer articulação com uma política de
7
Raquel Rolnik é urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e relatora especial do Conselho de
Direitos Humanos da ONU para o Direito à Moradia. Coordenadora de Urbanismo do Instituto Pólis (1997-2002) e secretária
nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades (2003-2007. É autora dos livros “A Cidade e a Lei” e “O que é
Cidade”.
Site consultado:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-88391999000400011&script=sci_arttext
ordenamento territorial e fundiária que lhe dê suporte, especialmente no que se refere à
disponibilização de terra urbanizada para produção de moradia popular.
Continua a urbanista, “Trabalhadores que não tinham acesso a terra e habitação na
área urbanizada de Santos assentaram-se na porção noroeste da ilha vizinha de Guarujá,
formando o núcleo de Vicente de Carvalho, próximo ao canal que liga à ilha de Santos. Como
Diadema, nos anos 60 e 70, o município de Guarujá atraiu como população permanente quase
exclusivamente migrantes de baixa renda, pois funcionários mais qualificados das indústrias
da Baixada residiam em Santos ou São Paulo. Ao mesmo tempo, assentamentos populares
para a população permanente expandiram-se em Vicente de Carvalho sobre mangues, e
favelas formaram-se em morros voltados para o continente. Com esse padrão de urbanização,
foi possível proteger investimentos nos balneários de fim de semana, afastando a "invasão",
pelos pobres, de áreas ricas e urbanizadas”.
“Guarujá combina a "cidade-dormitório" ao turismo, utilizando sua porção Sudeste
como um balneário. Neste caso, a estratégia do Plano Diretor de Guarujá (de autoria de Jaime
Lerner, aprovado em 1978) e de sua legislação urbanística era preservar as áreas mais bem
urbanizadas para o uso balneário e simplesmente "esquecer" os mercados residenciais de
baixa renda, em um contexto de grande crescimento demográfico”, conclui a urbanista Raquel
Rolnik.
Do exposto até aqui, se torna nítido que a falta de políticas públicas voltadas para o
desenvolvimento sustentável de Guarujá originou um custo ambiental e social que perdura até
os dias atuais, sendo que a adoção de um novo modelo de desenvolvimento sustentável
passou a ser imediata.
Nessa direção de se construir um novo caminho para garantir o desenvolvimento
sustentável destaca-se a implementação, em andamento, do Plano Local de Desenvolvimento
Sustentável (PLDS), denominado “Agenda 21 do Guarujá 2034, por um Centenário
Sustentável”, a seguir comentado.
2.2 Agenda 21 do Guarujá 2034, por um Centenário Sustentável8
A Agenda 21 foi um dos principais resultados da conferência Rio-92, ocorrida no Rio
de Janeiro, em 1992. É um documento que estabeleceu a importância do planejamento para a
8
Material reproduzido do Livro “Agenda 21 – “Guarujá 2034, por um Centenário Sustentável”
publicado no site ”www.guaruja.sp.gov.br/sites/.../livro_agenda_21_guaruja_2034.pdf
construção de sociedades sustentáveis, em diferentes bases geográficas, que concilia métodos
de proteção ambiental, justiça social e eficiência econômica.
Em Guarujá, a Prefeitura foi à instituição que tomou para si a responsabilidade de
fazer o chamamento de toda a sociedade guarujaense para tomar parte deste processo, e vem,
desde 2006, trabalhando a fim de possibilitar o desenvolvimento das ações previstas na
elaboração da Agenda 21 e consolidação do Plano Local de Desenvolvimento Sustentável
(PLDS).
O Plano Local de Desenvolvimento Sustentável (PLDS) é uma análise dos maiores
problemas da cidade e propõe soluções para os mesmos. Elaborado pelas mãos de diversos
atores sociais, muito trabalho foi feito para identificar potencialidades, oportunidades,
desafios e ameaças locais e assim traçar objetivos e metas para chegar em 2034 comemorando
um “Centenário Sustentável”.
O Plano é composto de valores éticos, visões de futuro e do presente, princípios e
macro objetivos elaborados em concordância com a Agenda 21 Global, Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio, Plataforma Cidades Sustentáveis, bem como demais
documentos mundiais e nacionais como a Constituição Federal Brasileira, as legislações e
políticas públicas vigentes.
Ao mesmo tempo, foi parte integrante deste trabalho a chamada “Agenda 21 Escolar”
como um instrumento fundamental de educação ambiental e protagonismo desde a infância,
na construção de sociedades mais sustentáveis. A escola desta forma é um dos pólos
irradiadores desta construção, junto às comunidades/bairros.
Cabe ressaltar, ainda, que as diretrizes do Plano Local de Desenvolvimento
Sustentável (PLDS) foram incorporadas o novo Plano Diretor (lei complementar municipal Nº
156/2013, sancionada em 20 de dezembro de 2013, até porque ambos devem estar
compatibilizados.
Segundo o doutrinador e Promotor Público Paulo Affonso9, “o Plano Diretor é um
conjunto de normas obrigatórias, elaborada por lei municipal específica, integrando o
processo de planejamento municipal, que regula as atividades e os empreendimentos do
próprio Poder Publico Municipal e das pessoas físicas ou jurídicas, de Direito Privado ou
Publico, a serem levadas a efeito no território municipal. A existência de planejamento
obrigatório é imprescindível para que haja uma ordenação do crescimento e da transformação
da cidade”.
9
Machado, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 10 edição. São Paulo: Malheiros Editores. 2002, p. 356. O
autor é mestre em Direito Ambiental pela Universidade de Estrasburgo, França.
“O plano diretor tem prioridade sobre outros planos existentes no Município ou que
vir a ser instituído. O termo “diretor” tem dimensão jurídica considerável, pois é um plano
criado por lei para dirigir e para fazer com que as outras leis municipais, decretos e portarias
anteriores ou posteriores tenham que se ajustar ao plano diretor. O plano plurianual, as
diretrizes orçamentárias e o orçamento anual devem incorporar as diretrizes e as prioridades
contidas no plano diretor (art. 40 da lei 10.257/2001)”, conclui o autor.
3 Educação Ambiental para o Desenvolvimento Sustentável
A Consultora em Direito Ambiental, Gisele Ferreira de Araújo10, em seu artigo “Ações
simples de sustentabilidade podem ajudar a salvar o planeta” afirma: “O aquecimento global
não é apenas acelerado pelo desmatamento ou pelo derretimento da calota polar. Os produtos
que usamos, a energia que consumimos e diversas atitudes rotineiras também são
responsáveis pela alteração do clima no mundo”.
Para a Consultora, “pequenas ações simples em benefício do meio ambiente como a
coleta seletiva provocam um resultado sustentável imenso. A coleta seletiva permite a
reciclagem dos produtos, diminuindo o uso de matérias-primas. Respeitar os horários dos
caminhões de lixo impede que as chuvas espalhem os lixos pelas ruas, evitando o
entupimento de bueiros”.
Perguntamos: E o desperdício de água? É comum o costume das pessoas de varrerem
calçadas e quintal com mangueira, com a torneira toda aberta para aumentar o jato d'água.
Atitude impensável nos dias de hoje, em plena crise de abastecimento devido a uma longa
estiagem no estado de São Paulo.
A Organização das Nações Unidas (ONU) prega que cada pessoa necessita de cerca de
110 litros de água por dia para atender as necessidades de consumo e higiene. No Brasil, no
entanto, o consumo por pessoa pode ultrapassar a 200 litros/dia.
Hoje é defendida por muitos arquitetos, a chamada construção sustentável, significando que
as pessoas terão que se preocupar mais com a sustentabilidade ambiental antes de projetar
uma casa.
10
Giselle Ferreira de Araújo é pós-doutorada em Direito na Universidade de Lisboa. Doutora em Direito pela
Universidade de São Paulo; Especialista em Direito Ambiental pela Harvard Law School. É professora visitante
na Universidade de Oxford, Grã-bretanha. http://www.eduvale.br/colegio/index.php?abbree =pagina&id_
editoria =39&id=553
O conceito implica em construções que devem obedecer a códigos quanto ao uso
racional de energia e água e tratamento de resíduos sólidos. A respeito da energia, os “prédios
verdes” devem explorar a luz natural, utilizando janelas vastas e espaços amplos.
As soluções exemplificadas são atitudes do nosso dia a dia que colaboram com o controle do
meio ambiente. As pessoas não têm a dimensão de que os seus atos individuais, por menor
que sejam, contribuem para a preservação dos recursos naturais.
Segundo pesquisa do
Ministério do Meio Ambiente em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (Pneu ma), em 2012, apenas 13% dos brasileiros realmente se preocupa com os
problemas ambientais11.
A educação ambiental deve ser entendida como a ação educativa pela qual a
comunidade busca despertar tanto nas crianças, como nos adolescentes, adultos e idosos a
consciência de que o ser humano é parte do meio ambiente. Deve superar a visão
antropocêntrica, onde o homem se sente o centro de tudo colocando no segundo plano a
natureza da qual é parte integrante.
No Brasil, o direito ao ambiente equilibrado adquiriu status constitucional a partir da
Constituição da Federal de 1988, ao preceituar, no artigo 225, o dever do Poder Público e da
coletividade de proteger e preservar o meio ambinte para as presentes e futuras gerações.
Mais especificamente, dispondo sobre a educação ambiental, foi redigida a Lei nº 9.79512, de
27 de abril de 1999, que em seus dois primeiros artigos estabelece:
Artigo 1o Entende-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o
indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e
competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo,
essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.
Artigo 2°
A educação ambiental é um componente essencial e permanente da
educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e
modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal.
No Brasil, a Educação Ambiental assume uma perspectiva ampla, incorporando a
proposta de construção de sociedades sustentáveis. No Ensino Formal, a Educação Ambiental
deve ser desenvolvida no âmbito dos currículos das instituições de ensino públicas e privadas
11
Ministério do Meio Ambiente em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(Pneuma), em 2012. Site consultado: http://www.pnuma.org.br/interna.php?id=44
PINTO, Antonio Luiz de Toledo; WINDT, Márcia Cristina Vas dos Santos; CÉSPEDES,
Lívia. Legislação de direito ambiental. 3a. edição - São Paulo: Saraiva, 2010.
12
englobando: educação básica (educação infantil; ensino fundamental e ensino médio);
educação superior; educação especial; educação profissional; e educação de jovens e adultos.
A educação ambiental será desenvolvida como uma prática educativa integrada,
contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal, não devendo ser
implantada como disciplina específica no currículo de ensino.
A maneira encontrada para viabilizar a temática ambiental no ensino formal foi a sua inclusão
como tema transversal nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), abordado nas diferentes
disciplinas do ensino formal. Com isso, buscou-se que a Educação Ambiental permeasse o
conteúdo de todas as disciplinas.
Já a Educação Ambiental não-formal são as práticas educativas voltadas à
conscientização da comunidade sobre as questões ambientais e à sua participação na defesa do
meio ambiente, tais como, campanhas educativas sobre temas relacionados ao meio ambiente
e os benefícios consubstanciados no cotidiano; participação de organizações nãogovernamentais na formulação atividades vinculadas à educação ambiental não-formal;
ecoturismo.
Para concluir citamos o mestre Paulo Affonso13, “A Educação Ambiental não se limita
a tratar de questões somente cientificas. Ela forma a consciência cívica dos educandos e da
população”.
Considerações Finais
Este artigo, primordialmente, pretendeu mostrar que a realidade de Guarujá está
marcada por desequilíbrios multifatoriais, como o social, urbano e ambiental e que há
necessidade premente de adotar um modelo de desenvolvimento sustentável que perpasse
pela fundamental educação ambiental de forma transversal, tanto na educação formal quanto
na informal, respeitando a diversidade de escalonamento social e de influências regionais que
povoam e originaram a comunidade que atualmente habita a cidade.
A sociedade civil e as autoridades governamentais precisam ter consciência de que
existe um objetivo comum, e não um conflito, entre desenvolvimento e proteção ao meio
13
Machado, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 10 edição. São Paulo: Malheiros Editores. 2002, p. 97. O
autor é mestre em Direito Ambiental pela Universidade de Estrasburgo, França
ambiente, tanto para o presente como para as gerações futuras. A vida como objeto jurídico da
proteção ambiental conforme previsão do Artigo 225 da Constituição Federal de 1988, tanto
quanto o homem, objetivo de todas as ações que conduzem as atividades políticas
infraconstitucionais como o Plano Local de Desenvolvimento Sustentável agora ínsito ao
Plano Diretor datado de 2013 restam ser compatibilizados e praticados no âmbito da
sociedade.
A educação ambiental não pode mais ser pensada como atuação exclusiva de
professores em salas de aula do ensino fundamental, é construindo é implementando nas fases
posteriores da educação que perceber-se-á os resultados, em que pese, como a semântica do
vocábulo indica, que é fundamentalmente essencial a instigação à sustentabilidade nos
primórdios educacionais.
Entender que sustentabilidade é o uso de recursos naturais de forma a não exauri-los
protegendo a vida em seu mais alto modelo de sobrevivência, demonstrando que o uso dos
espaços territoriais, dos serviços sociais, da saúde e da educação podem e são capazes de
produzir riquezas na renda da população e produzir, concomitantemente, segurança para
administrá-la.
Tornar público a existência de um
complexo trabalho de comprometimento de
variados atores sociais com a sustentabilidade no município do Guarujá, é o maior desafio
para o início da implementação da alteração de rançosos paradigmas sociais. A identificação
das potencialidades, das fragilidades e das oportunidades que o município apresenta é a forma
estrutural para a implementação da efetiva sustentabilidade. O desafio é a implementação, é a
publicidade e fiscalização com atuação veemente do estado, através de atuações dos Poderes
Legislativo e Executivo e da sociedade organizada.
A "Agenda 21 do Guarujá 2034, por um centenário sustentável" é
um
documento
que espelha os anseios sociais, as fragilidades administrativas e os comprometimentos
necessários para que a cidade integre o ranking daquelas que possuem expressiva qualidade
de vida no Brasil,.
Faz parte deste processo a Educação Ambiental lato sendo, aquela que integra os
conhecimentos tradicionais e os científicos, que forma a consciência cívica e ambiental dos
educandos e da população, incorporando a proposta de construção de sociedades sustentáveis.
O universo acadêmico tem grande responsabilidade na sustentabilidade social, a
disseminação do conhecimento, a recorrência temática como forma de motivação, a busca de
inovações na metodologia de ensino, perpassam, também, pela atuação direta do professor
universitário que, em extensiva análise, é matriz derradeira do processo formal de Educação
Ambiental.
A responsabilidade sobre a inclusão da sustentabilidade que advém da missão do
ensino superior é a propulsão da atuação dos mestres e a certeza de que o município do
Guarujá possui elementos capazes de promover a proteção prevista do artigo 225 da CF/88 ao
"meio ambiente equilibrado, bem comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida",
através de seus atores sociais "impondo-se ao Poder Público e à coletividade" e
conseqüentemente à sustentabilidade, uma vez que " as presentes e as futuras gerações"
diariamente adentram nossas salas de aula.
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