20/01/2014 às 00h00 Preço e câmbio ajudam indústria a recuperar parte da rentabilidade Por Denise Neumann | De São Paulo Dois terços da indústria brasileira de transformação chegaram a 2014 com recuperação de parte da rentabilidade perdida ao longo de muitos anos de sobrevalorização cambial e de forte aumento de salários e outros custos. Parcela expressiva dessa recuperação decorreu de um aumento nos preços - em dólar - de exportação do respectivo setor, mas essa regra não vale para todos os segmentos. Câmbio, em maior grau, e redução de custos, com menor participação, parecem ter feito diferença. De 23 segmentos da indústria de transformação, 13 registraram aumento de rentabilidade na comparação entre setembro e novembro de 2013 e igual período de 2012, segundo dados da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) compilados pelo Valor Data. Três desses setores mantiveram estabilidade e sete encerraram o período em queda. Essa comparação foi escolhida por serem os últimos dados disponíveis capazes de refletir parte da desvalorização cambial de 2013, que na média do ano chegou a 15%. Dos 13 setores com recuperação de rentabilidade, 7 subiram o preço em dólar e 6 ofereceram preços menores aos clientes no exterior no período de comparação. Com exceções, o preço foi um componente importante na recuperação da eficiência de setores de menor valor agregado, como fumo, bebidas, couro e calçados e produtos de madeira, observa Cristina Reis, professora da Universidade Federal do ABC. "Esse não é o melhor jeito de recuperar competitividade", diz ela, ponderando que quando o ganho decorre só de preço e câmbio, e não de outros elementos, nem sempre ele representa maior capacidade de conquistar - ou reconquistar mercados. Se para alguns setores específicos o preço ajudou, na média não foi o principal fator para explicar a recuperação geral da rentabilidade, mas sim os custos e o câmbio, diz Cristina. Como seis setores recuperaram eficiência mesmo sem aumento de preços, Cristina conclui que outros elementos influenciaram. "Entre esses fatores extras, acredito que o câmbio seja o principal", diz ela. Para José Tavares de Araújo Jr, diretor do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento (Cindes), câmbio deixou de ser a variável mais relevante para devolver competitividade à indústria brasileira. A taxa cambial, diz ele, é relevante para setores onde a concorrência no mercado internacional é definida quase exclusivamente por preço, como calçados e têxteis (em parte), entre outros. Para outros setores, diz, logística boa é mais importante que câmbio. Ao mesmo tempo, para um conjunto especial de empresas, como Embraer e Natura, cita ele, a competição se dá por outros fatores. Para 2014, diz Araújo, o câmbio pode ajudar - de leve - alguns poucos setores, mas a diferença para a indústria só virá no longo prazo e depende de outras questões. Ele lista três: progressos tecnológicos (necessidade de inovação), melhora da infraestrutura e redução dos custos de transação, entre eles os tributários. "As empresas não só pagam muitos impostos, como gastam muito para manter uma estrutura administrativa para cuidar desses impostos", pondera o diretor do Cindes. A infraestrutura, diz ele, deve ter um efeito benéfico para as exportações da indústria brasileira em dois ou três anos, quando várias das concessões dos últimos meses e anos, associadas a investimentos do próprio setor público, trarão um ganho logístico ao país. Cristina espera uma recuperação fraca da exportação de manufaturados em 2014 e afirma que isso vai depender mais de variáveis que o país (ou as empresas) não controla, como a demanda externa. Outras indústrias - como a asiática e a europeia, inclusive - também estão saindo da crise mais fortes e competitivas, lembra. Marcelo Azevedo, economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), aponta, além da demanda externa, o "desmonte" da estruturação da exportação brasileira de manufaturados ao longo da sobrevalorização do real como um elemento a ser superado para devolver vigor às exportações brasileiras desse segmento. As empresas brasileiras, diz ele, precisam remontar redes de distribuição, reconquistar clientes, voltar a investir em marketing no exterior. "Tudo isso leva tempo, é cedo para que esse pequeno ganho em rentabilidade se transforme em mais exportações", pondera. O ganho, porém, não é inócuo. Ajuda o investimento ao sinalizar perspectivas de operações mais rentáveis, afirma o economista. Azevedo observa que o câmbio fez diferença para a indústria em 2013, pois pesquisas da CNI apontam aumento dos custos industriais em 2013, apesar das medidas de redução do preço da energia e da desoneração da folha de salários. No terceiro trimestre do ano passado, o custo aumentou 3,7% sobre o segundo trimestre, puxado pelo aumentos das matérias-primas, principalmente as importadas. E antes daquele trimestre, as quedas desde 2012 foram ínfimas: 0,3% e 0,1% no primeiro e segundo trimestres de 2013.