Honestidade e Falsidade É impressionante como o campo que se cria entre duas pessoas pode ser espaço para manipulação das mais diversas e usos escusos dos mais variados. Isso é fonte de muita chateação e muita tristeza mesmo, na medida em que somos vítimas dos “golpes” e “arapucas” das relações humanas. Quer dizer, nos relacionamentos também existe “Conto do Vigário”, onde somos vítimas de “montagens” e só um leva vantagem. O relacionamento honesto e leal supõe que todos levem vantagem. Todo mundo sai no lucro, quer dizer, todo mundo fica com um pouco de bem estar. Já o “Conto do Vigário” dos relacionamentos só um leva vantagem, o bem estar fica só com aquele e o outro fica sem nada ou... Pior... Fica mal mesmo. Por exemplo, não há nada de errado em uma mulher querer ficar com um homem. Se isso fica claro, mesmo que o relacionamento não persista, houve vantagem para os dois. Ambos se sentiram bem, saíram se divertiram e suas vidas ficaram mais doces e “até hoje trocam risinhos quando se encontram pela rua”. Pronto. Isso é honesto. Já o Conto do Vigário do relacionamento é assim – vamos ver a posição de uma mulher para um homem: ela dá a entender para um homem que quer alguma coisa com ele ou que de certo modo está a fim dele. Dá aqueles mil recadinhos: olhares, tom de voz, roupas, postura, piadinhas... Aí, o cara fica entusiasmado – encorajado, seria a palavra mais correta – e vai em frente! Simplesmente, para tomar um fora. Um “não”, daqueles redondos! Assim, de modo, a moça tirou a sua vantagem: fez o cara chegar nela, fez com que ele abrisse o seu coração e mostrasse os seus sentimentos e desejos. Já ela, não se mostrou em nadinha. Só deu corda, só “deu a entender”... mas, não que ele pudesse usar em um tribunal. Sabe aquele tipo de coisa: “nãoooo... você é que imaginou... eu nuuuunca penseiiii numa coisa dessas... não sei de onde ele tirou isso...” Quer dizer, ela tirou muitas vantagens disso, mas se recusa a dar o mínimo de bem estar merecido a ele. É uma sovinice amorosa. Uma recusa a passar bem estar para os outros. O pior dos defeitos do coração: a falta de prazer de dar prazer. Só sabe tomar o prazer dos outros. Dar prazer, deixar as pessoas com bem estar é visto como se fosse tomado algo dela, que vai fazer falta a ela. É engraçado. Isso tem bastante também naquele tipo de situação chamada “ai, ele está me seduzindo...” Na verdade, a pessoa pode até ter estimulado a aproximação de outra. Na verdade, ela pode muito bem estar gostando de estar sendo seduzida e estar mesmo meio balançada... mas, não admite nada disse. Só sabe acusar a outra pessoa de “conduta imprópria”, quando a única conduta imprópria é a dela, que não sabe acolher um bom sentimento ou uma proposta honesta de aproximação, uma forma implícita de elogio... Tipo dizer “gostei de você” com ações... Quer dizer, uma pessoa se sente elogiada e apreciada, mas se recusa a dar qualquer espécie de bem estar de volta. É claro que isso é bem diferente da xavecada imprópria de gente sem desconfiômetro, tipo falar palavrão na porta do bar ou ficar se encostando no ônibus. Por outro lado é sacanagem a menina que vai com uma roupa super justa e super decotada e fica com a maior cara feia quando ficam olhando para ela, como que dizendo: “aiii... como eles são insuportáveis...” O mesmo vale para os homens, é claro, embora pela própria natureza do comportamento sexual, onde em geral o homem toma a iniciativa, é mais difícil. Mas, também acontece sim. Geralmente, são narcisistas que só precisam ser admirados e adorados e não têm a menor intenção de retribuir com qualquer afeto. Ou seja, a pessoa saudável sabe retribuir afeto, tem prazer em dar prazer, sabe compreender e receber o afeto dado, respeita os sentimentos que os outros demonstram e, principalmente, não fica sinalizando aquilo que não está a fim. Se a pessoa faz isso, de duas uma: ou não tem coragem de assumir o que está a fim ou está querendo dar uma “usadinha” na outra pessoa... sem qualquer projeto de retribuir de alguma forma. As pessoas defensoras “da moral e dos bons costumes” vão dizer que se assumir declaradamente é falta de vergonha, é indecência, mas, por isso, é que gosto de dizer: a verdadeira decência é assumir o que sente e deixar-se ver como se é. Indecente é fazer joguinhos com os outros, só prá se usar as pessoas para nossa vantagem. João Paulo Correia Lima Psicólogo clínico – Diretor Científico da Associação Brasileira de Medicina Psicossomática E-mail [email protected]