artigo original / original article Avaliação da reprodutibilidade entre duas classificações de fraturas da coluna tóracolombar e suas correlações com o tratamento Evaluation of the reproducibility between two classifications of fractures to the thoracolumbar spine and their correlations with treatment Evaluación de la reproducción entre dos clasificaciones de fracturas de la columnatoracolumbar y sus correlaciones con el tratamiento Carlos Henrique Maçaneiro1 Ricardo Kiyoshi Miyamoto2 Rodrigo Fetter Lauffer2 Ribamar Volpato Larsen3 RESUMO Objetivos: avaliar a reprodutibilidade e a força de concordância entre as classificações Arbeitsgemeinschaft für Osteosyntesefragen (AO) e Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score (TLICS) para fraturas da coluna toracolombar e a correlação entre essas classificações e o tratamento proposto. Métodos: um total de 40 casos de fraturas da coluna toracolombar foram distribuídos em CD-ROM a nove cirurgiões de coluna vertebral, incluindo o exame clínico e exames de imagem. Um dos cirurgiões foi excluído por não ter respondido todos os itens do protocolo. A análise estatística foi realizada utilizando-se o teste de Cohen Kappa para a avaliação da força de concordância. Resultados: ABSTRACT Objectives: to evaluate the reproducibility and the agreement strength between the “Arbeitsgemeinschaft für Osteosyntesefragen” (AO) and Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score (TLICS) classifications for thoracolumbar spinal fractures and the correlation between these classifications and the proposed treatment. Methods: a total of 40 cases of thoracolumbar spinal fractures were distributed on CD-ROM to nine vertebral spinal surgeons, including the clinical exam and image exams. One of the surgeons was excluded for not answering to all items of the protocol. The statistical analysis was done utilizing the Cohen Kappa test for the evaluation of the agreement strength. RESUMEN Objetivos: evaluar la reproducción y la fuerza de concordancia entre las clasificaciones “Arbeitsgemeinschaft für Osteosyntesefragen” (AO) y “Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score” (TLICS) para fracturas de la columna toracolumbar y la correlación entre esas clasificaciones y el tratamiento propuesto. Métodos: un total de 40 casos de fracturas de la columna toracolumbar fueron distribuidos en CD-ROM a nueve cirujanos de la columna vertebral, incluyendo el examen clínico y exámenes de imagen. Un cirujano fue excluido por no haber respondido todos los ítems del protocolo. El análisis estadístico fue realizado utilizando el teste de Cohen Trabalho realizado no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Instituto de Ortopedia e Traumatologia de Joinville - IOT - Joinville (SC), Brasil. Chefe do Serviço de Residência em Ortopedia e Traumatologia do Instituto de Ortopedia e Traumatologia de Joinville - IOT - Joinville (SC), Brasil. Médico do Grupo de Cirurgia da Coluna Vertebral do Instituto de Ortopedia e Traumatologia de Joinville - IOT - Joinville (SC), Brasil. 3 Residente em Cirurgia da Coluna Vertebral do Instituto de Ortopedia e Traumatologia de Joinville - IOT - Joinville (SC), Brasil. 1 2 Recebido: 11/03/2008 Aprovado: 02/07/2007 COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):153-159 Maçaneiro CH, Miyamoto RK, Lauffer RF, Larsen RV 154 na avaliação da classificação TLICS a reprodutibilidade interobservador se mostrou leve para as lesões do complexo ligamentar posterior e para a morfologia da fratura e quase perfeita para a avaliação da integridade neurológica. A classificação AO se mostrou com força de concordância leve. A concordância entre as opções de tratamento foi moderada. As classificações mostraram uma tendência à orientação da escolha tratamento, mas não apresentaram uma correlação absoluta. Conclusões: as classificações apresentaram uma reprodutibilidade leve, enquanto a concordância para o tratamento foi moderada, o que evidencia uma escolha de tratamento baseada não apenas em critérios objetivos, mas também na experiência pessoal de cada profissional. Results: in the evaluation of the TLICS classification the inter-observer reproducibility was weak for the lesions of the posterior ligament region and for the morphology of the fracture, and almost perfect for the evaluation of the neurological integrity. The AO classification showed weak agreement strength. The agreement between the treatment options was moderate. The classifications demonstrated a tendency to the orientation of the treatment choice, but didn’t present an absolute correlation. Conclusions: the classifications presented weak reproducibility, while the agreement for the treatment was moderate, which gives evidence to a treatment choice based not only on objective criteria, but also on the personal experience of each professional. Kappa para la evaluación de la fuerza de concordancia. Resultados: en la evaluación de la clasificación TLICS, la reproducción entre observadores se mostró leve para las lesiones del complejo de ligamentos posterior y para la morfología de la fractura, pero casi perfecta para la evaluación de la integridad neurológica. La clasificación AO se mostró con fuerza de concordancia leve. La concordancia entre las opciones de tratamiento fue moderada. Las clasificaciones mostraran una tendencia a la orientación de la opción del tratamiento, pero no presentaron una correlación absoluta. Conclusiones: las clasificaciones presentaron una reproducción leve, mientras la concordancia para el tratamiento fue moderada, lo que indica una opción de tratamiento con base no solo en criterios objetivos, sino también en la experiencia personal de cada profesional. descritores: Fraturas da coluna vertebral/classificação; Fraturas da coluna vertebral/ terapia KEYWORDS: Spinal fractures/ classification; Spinal fractures/ therapy DESCRIPTORES: Fracturas espinales/ classificación; Fracturas espinales/ terapía INTRODUÇÃO Um sistema de classificação apresenta múltiplos propósitos, entre os quais facilitar a comunicação entre profissionais, auxiliar na documentação e pesquisa médicas, e principalmente associar um valor de prognóstico e tratamento para os pacientes1. Portanto, apresenta utilidade quando considera a gravidade da lesão e serve como base para o tratamento e avaliação dos resultados2. Muitas classificações de fraturas da coluna vertebral têm sido desenvolvidas desde 19493, cada uma delas com características próprias que consideram a estabilidade, o mecanismo de trauma, as lesões neurológicas e ligamentares, o conceito de colunas e a morfologia das lesões ósseas3-16, com o objetivo de compreender melhor a complexa apresentação de cada fratura e homogeneizar as condutas dos profissionais. Apesar de tantas classificações desenvolvidas, poucas são validadas antes de serem promovidas e aceitas pela sociedade médica1. Três fases são propostas na literatura para que este processo esteja completo1 (Figura 1). Figura 1 Fases da validação de uma classificação Fonte: traduzido de: Audige L, Bhandari M, Hanson B, Kellam J. A Concept for the validation of fracture classifications. J Orthop Trauma. 2000; 19(6):404-9. COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):153-159 Avaliação da reprodutibilidade entre duas classificações de fraturas da coluna tóracolombar e suas correlações com o tratamento Em 1994, o sistema de classificação Arbeitsgemeinschaft für Osteosyntesefragen (AO) 17 para fraturas da coluna toracolombar foi introduzido por Magerl e colaboradores após uma revisão de 1445 casos de fraturas da coluna toracolombar, primariamente baseado em características morfopatológicas e critérios radiográficos. Esse sistema 155 hierarquiza a lesão conforme a gravidade e apresentase alfanumericamente dividido em tipos (A, B e C) de acordo com o mecanismo de lesão, grupos (A1, A2, A3, B1, B2, B3, C1, C2, C3), subgrupos (A1.1, A1.2, A1.3, A2.1 etc.), e subdivisões (A1.2.3, B3.2.1 etc.) (Tabela 1). TABELA 1 - Classificação AO “Arbeitsgemeinschaft für Osteosyntesefragen” Tipo A Compressão 1. Fraturas impactadas 2. “Split” (separação) 3. Explosão Tipo B Distração 1. Lesão posterior ligamentar 2. Lesão posterior óssea 3. Lesão anterior - hiperextensão Tipo C Rotação 1. Tipo A + rotação 2. Tipo B + rotação 3. Cisalhamento + rotação 1. Impacção da placa terminal 2. Encunhamento 3. Colapso do corpo vertebral 1. Sagital 2. Coronal 3. Pinça 1. Incompleta 2. Explosão-separação 3. Completa 1. Com rotura transversa do disco 2. Associada a fratura tipo A 1. Fratura transversa na vértebra (Chance) 2. Lesão transversa no disco 3. Associada a fratura tipo A 1. Hiperextensão-subluxação 2. Hiperextensão-espondilólise 3. Luxação posterior 1. Impactada 2. Separação 3. Explosão 1. B1 + rotação 2. B2 + rotação 3. B3 + rotação 1. Fratura tipo “slice” 2. Fratura oblíqua Fonte: traduzido de: Magerl F, Aebi M, Gertzbein SD, Harms J, Nazarian S. A comprehensive classification of thoracic and lumbar injuries. Eur Spine J.1994;3:184-201. Em 2005, um novo sistema de classificação conhecido como Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score (TLICS)18 foi introduzido por Vaccaro e colaboradores após uma revisão de 127 casos de fraturas da coluna toracolombar por 40 cirurgiões experientes de 15 instituições distintas. É primariamente baseado em três variáveis (morfologia da fratura, integridade do complexo ligamentar posterior e comprometimento neurológico) divididas em subgrupos aos quais são atribuídos pontos de acordo com o comprometimento de cada uma dessas variáveis (Tabela 2). A proposta de tratamento é influenciada e direcionada pela soma desses pontos. Os objetivos deste estudo são os seguintes: avaliar a concordância interobservador da Classificação AO, levando-se em consideração os tipos e os grupos; avaliar a concordância interobservador da classificação TLICS, levando-se em consideração a morfologia da fratura, o exame neurológico e o complexo ligamentar posterior; realizar uma avaliação da concordância interobservador do tratamento proposto, considerando-se as opções cirúrgica e não-cirúrgica; e correlacionar as duas classificações à indicação do tratamento, levando-se em consideração a opção cirúrgica e não-cirúrgica. COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):153-159 Maçaneiro CH, Miyamoto RK, Lauffer RF, Larsen RV 156 TABELA 2 - Classificação TLICS “Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score” Morfologia da lesão Qualificador Compressão Pontos 1 Explosão 1 Translação / rotação 3 Distração 4 Integridade do Complexo Ligamentar Posterior Pontos Intacto 0 Suspeito / indeterminado 2 Lesado 3 Envolvimento Neurológico Qualificador Pontos Intacto 0 Raiz 2 Medula / cone medular Completa 2 Incompleta 3 Cauda equina 3 Fonte: traduzido de: Vaccaro AR, Lehman RA, Hurlbert RJ, Anderson PA, Harris M, Hedlund R, et al. A new classification of thoracolumbar injuries: the importance of injury morphology, the integrity of the posterior ligamentous complex, and neurologic status. Spine. 2005;30(20):2325-33. MÉTODOS Um total de 40 casos de fraturas da coluna toracolombar atendidos pelo Grupo de Cirurgia de Coluna Vertebral do IOTJoinville-SC foram distribuídos em CDROM para nove cirurgiões de coluna vertebral com experiência mínima de dez anos, incluindo oito ortopedistas e um neurocirurgião, em nove instituições distintas. Um dos cirurgiões foi excluído por ter preenchido o protocolo de forma incompleta, o que inviabiliza a análise com o teste Cohen Kappa. Os casos clínicos incluíram a anamnese, o exame físico e exames complementares de imagem: radiografias padrão em ântero-posterior e perfil, tomografias e ressonância nuclear magnética (Figura 2). Foram apresentados os seguintes exames de imagens: radiografias (raios-X) e tomografia axial computadorizada (TAC) em 25 casos (62,5%); radiografias e ressonância nuclear magnética (RNM) em dois casos (5%); e todos os exames (raios-X, TAC e RNM) em 13 casos (32,5%). Todos os pacientes apresentavam-se esqueleticamente maduros, vítimas de trauma e sem doenças sistêmicas com comprometimento ósseo. Não foram incluídas fraturas patológicas. Os cirurgiões receberam os artigos originais que descrevem detalhadamente as duas classificações17-18, além de um protocolo de pesquisa (Tabela 3), que foi preenchido de forma individual. Figura 2 (Paciente 18) 23 anos, trauma automobilístico, dor lombar de forte intensidade, neurológico íntegro COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):153-159 Avaliação da reprodutibilidade entre duas classificações de fraturas da coluna tóracolombar e suas correlações com o tratamento A concordância interobservador da classificação AO foi realizada entre os três tipos (A, B e C) e entre os nove grupos (A1, A2, A3, B1, B2, B3, C1, C2, C3). Não foram levados em consideração os 25 subgrupos (A1.1, A1.2, A1.3, A2.1, etc.) e as 55 subdivisões (A1.2.3, B3.2.1 etc.). A concordância interobservador da classificação TLICS foi realizada entre as três variáveis (morfologia da fratura, lesão do complexo ligamentar posterior e comprometimento neurológico), separadamente. A concordância interobservador do tratamento cirúrgico ou não cirúrgico foi analisada, assim como a correlação entre as classificações e a opção de tratamento. A análise estatística foi realizada com o uso do teste Cohen Kappa (κ) para determinar a concordância interobservador, os valores para interpretação foram utilizados conforme orientação da literatura (Landis e Koch)19 e são apresentados na Tabela 4. Não há consenso sobre os valores κ que devem ser considerados aceitáveis para os sistemas de classificação de fraturas20-21, entretanto, sugere-se um valor κ > 0,5520,22. 157 grupos foram citados em pelo menos 12 oportunidades, sendo mais comum o A3, em 30% dos casos. As fraturas foram classificadas mais freqüentemente como tipo A (55,5%), seguidas pelo tipo C (26,5%). O tipo C obteve recomendação cirúrgica em 98% dos casos, enquanto as do tipo B em 91%. O tipo A recebeu tratamento cirúrgico em 45% dos casos, divididos conforme se segue: 4% A1, 1% A2 e a grande maioria pertencendo ao grupo A3 (40%) (Tabela 5 e Figura 3). A concordância interobservador obtida foi κ=0,396 (tipo) e κ=0,325 (grupo), com nível de significância α=0,05 e P<0,001. Os subgrupos e as subdivisões não foram avaliados. TABELA 5 - Correlação AO x tratamento Tipo Total % cirúrgica A 55,5% (178/320) 45% (81/178) B 18% (57/320) 91% (52/57) C 26,5% (85/320) 98% (83/85) TABELA 3 - Protocolo de pesquisa Classificação AO Classificação TLICS Tipo Grupo Subgrupo Morf. CLP Neur. * ** *** Operar? Sim/Não Caso 1 Caso 2 Caso ... Caso ... Caso 39 Caso 40 Morfologia; **Complexo ligamentar posterior; ***comprometimento neurológico * TABELA 4 - Força de concordância segundo o Coeficiente Kappa(κ) Coeficiente Kappa(κ) Força de Concordância < 0,00 Sem concordância 0.00 – 0.20 Desprezível 0.21 – 0.40 Leve 0.41 – 0.60 Moderada 0.61 – 0.80 Grande 0.81 – 1.00 Quase perfeita Fonte: traduzido de: Landis JR, Koch GC. The measurement of observer agreement for categorical data. Biometrics 1977;36:207-16. RESULTADOS Classificação ao Os 40 casos foram avaliados por oito observadores, o que proporcionou 320 respostas. À exceção do grupo B3, que não foi citado nenhuma vez, todos os outros COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):153-159 Figura 3 Correlação entre a Classificação AO e o tratamento cirúrgico Classificação TLICS Os mesmos 40 casos foram avaliados pelos oito observadores, o que nos proporcionou 320 respostas em cada uma das três variáveis. A morfologia das fraturas apresentou concordância interobservador de κ=0,258,e as mais comuns foram por compressão (40%). O comprometimento neurológico apresentou concordância de κ=0,859, e o exame neurológico intacto foi o mais freqüente (82%). A avaliação da integridade do complexo ligamentar posterior apresentou concordância κ=0,318 e foi considerado intacto em 50% dos casos (Tabela 6). A Figura 4 evidencia a correlação entre a pontuação obtida com a soma das três variáveis e o tratamento. Tratamento cirúrgico Apresentou concordância interobservador κ=0,536, com nível de significância α=0,05 e P<0,001. As indicações ficaram divididas em 68% (217) tratamentos cirúrgicos e 32% (103) não cirúrgicos. Maçaneiro CH, Miyamoto RK, Lauffer RF, Larsen RV 158 TABELA 6 - Correlação entre a classificação TLICS e a força de concordância segundo o coeficiente Kappa Pontos Quantidade 1 40,63% (130/320) 2 18,75% (60/320) 3 25,31% (81/320) 4 15,31% (49/320) Integridade do complexo 0 50% (160/320) ligamentar posterior 2 17,5% (56/320) κ=0,318* 3 32,5% (104/320) Envolvimento neurológico 0 82,81% (265/320) κ=0,859* 2 10,94% (35/320) 3 6,25% (20/320) Morfologia κ=0,258* Nível de significância κ=0,05, com P<0,001 * Figura 4 Correlação entre a pontuação TLICS e o tratamento cirúrgico DISCUSSÃO Sistemas de classificação são úteis para profissionais que estão interessados não apenas no tratamento, mas também em compreender os mecanismos envolvidos na fisiopatologia da lesão23. Nas fraturas da coluna toracolombar muitas variáveis estão envolvidas em descrever a anatomia e a fisiopatologia, o que torna incompletos aqueles sistemas desenvolvidos com simplicidade e, ao mesmo tempo, muito complexos e de difícil reprodutibilidade aqueles sistemas que se utilizam dos mínimos detalhes. Apresenta-se aqui a dificuldade na escolha entre sistemas simples, que omitem informações, e sistemas complexos, que não permitem aos profissionais emitirem a mesma opinião. Muitos autores têm participado deste processo evolutivo tentando agrupar e avaliar, da melhor forma possível, os dados que direcionam a uma padronização de classificação, compreensão e tratamento. Wood et al.23, em um estudo com 31 casos clínicos e 19 observadores, realizaram a avaliação interobservador entre a classificação AO e a classificação desenvolvida por Denis8. Obteve-se uma reprodutibilidade moderada para os três tipos e também para os nove grupos AO. Os quatro tipos propostos por Denis mostraram-se com moderada reprodutibilidade, enquanto os 16 subtipos obtiveram resultados desprezíveis (Tabela 7). COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):153-159 TABELA 7 - Comparação da força de concordância (κ) entre as classificações Estudos Öner20 AO Tipos: κ= 0,31 (Rx + TAC) Tipos: κ= 0,28 (Rx + RNM) Wood23 Tipos: κ=0,475 Grupos: κ=0,537 Denis Tipos: κ= 0,45 (Rx + TAC) Tipos: κ= 0,39 (Rx + RNM) Tipos: κ=0,606 Subtipos: κ=0,173 Morf: κ=0,33 Neuro: κ=0,91 CLP: κ=0,35 Vaccaro24 Presente estudo TLICS Tipos: κ=0,396 Grupos: κ=0,325 Morf: κ=0,258 Neuro: κ=0,859 CLP: κ=0,318 Morf: morfologia; Neuro: comprometimento neurológico; CLP: complexo ligamentar posterior Öner et al.20, em um estudo com 53 fraturas e cinco observadores, encontraram uma reprodutibilidade leve para a classificação AO e moderada para a classificação de Denis. Apresentaram também uma divisão em dois grupos: o primeiro com pacientes que apresentavam radiografias e TAC e o segundo com pacientes que apresentavam radiografias e RNM. A classificação AO mostrou-se com força de concordância leve nos dois grupos, enquanto a classificação de Denis mostrou-se moderada no primeiro grupo (r-X e TAC) e leve no segundo grupo (Tabela 7). Vaccaro et al.24, em um estudo com 71 casos e cinco observadores, encontraram um coeficiente de concordância leve para a morfologia da fratura, quase perfeito para o comprometimento neurológico, leve para as lesões do complexo ligamentar posterior e também leve quando considerada a somatória dos pontos (Tabela 7). Os resultados obtidos no presente estudo se mostraram semelhantes aos da literatura (Tabela7). Os dados que se apresentaram mais próximos da concordância perfeita se referem ao comprometimento neurológico, mas não pode ser inferida grande importância a este achado, uma vez que, diferentemente dos outros dados, não depende da avaliação isolada de cada observador, mas da informação clara e objetiva que foi fornecida pelos autores na anamnese e no exame físico de cada paciente na apresentação do caso clínico. Apenas sete casos apresentavam lesão neurológica, dos quais cinco Frankel A, um Frankel B e um caso Frankel C. A força de concordância foi perfeita (κ=1 com nível de significância α=0,05 e P<0,001) nos casos sem lesão neurológica ou Frankel C, embora se apresentasse leve (κ=0,31 com nível de significância α=0,05 e P<0,001) na avaliação isolada dos outros seis casos (Frankel A e Frankel B). A associação entre a pontuação obtida com a classificação TLICS e o tratamento proposto na literatura foi concordante em 75% dos casos. Quando se avaliou os resultados entre um e três pontos, 59% (97/195) optaram pelo tratamento conservador, e quando se avaliou entre cinco ou mais pontos, 97% (120/123) optaram pela cirurgia. Na situação intermediária, ou seja, Avaliação da reprodutibilidade entre duas classificações de fraturas da coluna tóracolombar e suas correlações com o tratamento quatro pontos, 90% se mostraram ser casos cirúrgicos. Nosso resultado se mostrou diferente da literatura24, que aponta 96,4% de concordância entre a classificação e o tratamento proposto. Mostrou também uma tendência à indicação cirúrgica em lesões que foram classificadas com menos de 5 pontos, contrariando mais uma vez a orientação do artigo original24. A classificação AO mostrou-se com forte tendência ao tratamento cirúrgico quando classificada como grupo A3, tipos B e C, reservando-se o tratamento conservador para grande parte dos grupos A1 e A2. Não se deve esquecer a ausência de alguns exames complementares nos casos selecionados, o que, de alguma forma, pode ter prejudicado a avaliação dos observadores. Entretanto, cabe lembrar que os pacientes foram avaliados 159 clinicamente em um serviço de urgência e emergência em traumatologia por profissionais experientes e que esses exames foram considerados suficientes para que os pacientes fossem submetidos a um tratamento adequado, sem prejuízo de resultados. CONCLUSÃO A força de concordância interobservador segundo o coeficiente Kappa (κ) apresentou-se como leve para as duas classificações avaliadas neste estudo, enquanto a força de concordância em optar pelo tratamento, conservador ou cirúrgico, mostrou-se moderada e evidenciou uma tomada de decisão baseada não apenas em critérios objetivos, mas com forte influência da experiência pessoal de cada profissional. Agradecimentos - Os autores agradecem aos colegas observadores que contribuíram com o desenvolvimento deste estudo e também ao Dr. Luis Carlos Daquino que contribuiu na realização da análise estatística. REFERÊNCias 1. Audigé L, Bhandari M, Hanson B, Kellam J. A concept for the validation of fracture classifications. J Orthop Trauma. 2000; 19(6):401-6. 2. Müller ME, Nazarian S, Koch P, et al. The Comprehensive Classification of Fractures of Long Bones. Berlin; New York: Springer-Velag; c1990. 3. Nicoll EA. Fractures of the dorsolumbar spine. J Bone Joint Surg Am. 1949; 31B(3):376-94. 4. Holdsworth F. Fractures, dislocations, and fracture-dislocations of the spine. J Bone Joint Surg [Br]. 1963; 45(1):6-20. 5. Holdsworth F. Review article: Fractures, dislocations, and fracturedislocations of the spine. J Bone Joint Surg Am. 1970; 52(8):1534-51. 6. Whitesides TE Jr. Traumatic kyphosis of the thoracolumbar spine. Clin Orthop Relat Res. 1977; (128):78-92. 7. Chance CQ. 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