UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE RELIGIÃO E MEIO AMBIENTE Por: Susie Hitomi Nava Tatai Orientador: Prof. Francisco Carrera Rio de Janeiro 2010 UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE RELIGIÃO E MEIO AMBIENTE Apresentação de trabalho à Universidade Cândido Mendes – Instituto A Vez do Mestre - como requisito parcial para a obtenção do grau de especialista em Gestão Ambiental. Por: Susie Hitomi Nava Tatai AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus por ter me concedido a coragem de perseguir meus objetivos, aos meus pais pelo incentivo, aos meus colegas de curso pela cumplicidade e aos docentes pela qualidade do conteúdo apresentada. RESUMO O presente estudo tem como objetivo abordar a religião e o meio ambiente. Para tanto, buscou-se inicialmente contemplar a questão ambiental, sua contextualização, a discussão sobre a sustentabilidade, a educação, ética ambiental e a cidadania. Em seguida focalizou-se a visão sociológica da religião voltada para o meio ambiente, destacando a função social da religião e a sociologia da religião. Tratou-se finalmente das diversas abordagens religiosas acerca da questão ambiental destacando-se o posicionamento das diferentes teologias que tratam do tema. O estudo conclui que, na visão religiosa, a questão ambiental pode ser controlada a partir de uma posição ética que possa conduzir os programas tecnocientíficos, no sentido de mobilizar a população mundial a uma tomada de decisão que a situação exige. Palavras-chave: Meio Ambiente. Sociologia. Religião. METODOLOGIA Este trabalho pode ser classificado quanto aos procedimentos, como pesquisa bibliográfica, uma vez que abarcará a bibliografia relativa a Religião e ao Meio Ambiente a partir de um olhar crítico, visando a compreensão dos problemas sob um prisma teórico. A base da pesquisa bibliográfica está estruturada na análise a ser realizada em livros, artigos e portais da Internet. A pesquisa será realizada dentro de uma perspectiva de uma abordagem qualitativa, já que será desenvolvida por meio da pesquisa bibliográfica e de observações da realidade ambiental. A observação será feita de forma interativa com o objetivo de gerar informações detalhadas e que completem e ampliem a coleta e a compreensão dos dados, sendo assim, usada para constatação dos fatos e consequente comprovação das questões norteadoras e interpretação do fenômeno em questão. As questões norteadoras deste estudo estão embasadas nas situações reais que vivem as religiões no que se refere ao meio ambiente, uma vez que propõe uma estrutura ordenada para resolução de problemas e novos desenvolvimentos por ser flexível e adaptável, permitindo mudanças durante o período de experimentação. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 8 1. A QUESTÃO AMBIENTAL ...............................................................................11 2. VISÃO SOCIOLÓGICA DA RELIGIÃO E MEIO AMBIENTE ........................... 24 3. MEIO AMBIENTE E AS DIVERSAS ABORDAGENS RELIGIOSAS ............... 30 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 38 BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 39 8 INTRODUÇÃO Este estudo pretende apresentar um histórico da questão ambiental e a participação das religiões na sustentabilidade do planeta. Busca-se, por meio da sociologia e da religião, identificar as ações que visam a preservação do planeta. A espécie humana e a Terra encontram-se em um determinado estágio de evolução impossível de ser precisada, do qual dispomos de razoáveis informações retrospectivas sobre o caminho percorrido e, como meras hipóteses, de prospectivas sobre um futuro incerto e de horizonte curtíssimo. Com a reconstituição dos fatos podemos falar de tempos geológicos, tempos biológicos e tempos históricos. Sobre a previsibilidade da evolução, há falência de dados seguros e, em contrapartida, pesa sobre nós uma sombra inquietante. Com efeito, os tempos geológicos foram primordiais, longuíssimos e com poucos registros que nos permitam hoje tirar conclusões definitivas sobre as origens e as etapas de formação do nosso Planeta. A expressão “bilhões de anos” não nos comove nem esclarece suficientemente. Os tempos geológicos “perdem-se na noite dos tempos”. Os tempos biológicos, com os registros da vida, já não são assim tão remotos... dezenas ou centenas de milhões de anos. Esta expressão igualmente não nos abala nem esclarece a contento; mas ao menos sabemos que o fenômeno da vida marcou a Terra e, de alguma forma, selou a sua sorte. Os ecossistemas vieram formando-se e alterando-se, lenta e continuamente, à mercê das leis físicas. Espécies vivas, vegetais e animais, apareceram e desapareceram sem que nos seja possível, ainda, explicar como e por quê. Entretanto, a evolução seguia seu caminho e o habitat planetário vinha sendo preparado para outros saltos significativos. Os tempos históricos começaram a ser contados a partir da identificação e da presença da espécie humana nos ecossistemas naturais. São milhões de anos decorridos, e ainda hoje os cientistas procuram 9 registros convincentes sobre nossa idade neste Planeta e sobre as inúmeras transformações que produzimos ao longo da evolução. Uma coisa é certa: os tempos históricos atestam a presença e as atividades do homem, assim como a ocupação do espaço. Mais do que isso, testemunham as alterações por ele impostas ao ecossistema planetário: desta vez, não são apenas as causas físicas naturais; aparecem também as mudanças intencionais produzidas pelo homo sapiens. Os tempos históricos, estes sim, são os mais recentes e manifestam uma aceleração progressiva da evolução por que passa a Terra. Em um prazo muito curto — e que se torna sempre mais curto — são dilapidados os patrimônios formados lentamente no decorrer dos tempos geológicos e biológicos, cujos processos não voltarão mais. Os recursos consumidos e esgotados não se recriarão. Neste contexto, a destruição do ambiente constitui, sem nenhuma dúvida, um dos mais ingentes problemas que a humanidade tem deparado nesta primeira metade do século XXI, cuja gravidade é de todos conhecida, pelo que representa para a vida e para a própria sobrevivência do homem. No perpassar destes últimos anos, poucas questões suscitaram tão ampla e heterogênea preocupação. A luta pela defesa do patrimônio comum ecológico — de cunho verdadeiramente ecumênico — se converteu em um novo humanismo. O Informe sobre a Situação Social no Mundo, da Organização das Nações Unidas, de 1982, destacou que “há algumas grandes esferas de preocupação que são comuns a todos os países, tais como a contaminação que alcança níveis perigosos na água, no ar, no solo e nos seres vivos; a necessidade frequentemente urgente de conservar os recursos naturais nãorenováveis; as possíveis perturbações do equilíbrio ecológico da biosfera, emergentes da relação do homem com o meio ambiente, e as atividades nocivas para a saúde física, mental e social do homem no meio ambiente por ele criado, particularmente no ambiente de vida e de trabalho”. A reflexão difundida nos diversos meios de comunicação sobre as questões ecológicas é um indicador de uma nova realidade. A sociedade está sendo levada a repensar seu modo de viver. Propõe-se a formação de 10 sistemas que contemplem o caráter moral de justiça e uma ética ecológica equilibrada. Pensa-se no novo aprender diante de tais situações e suas implicações, para não apenas assistir passivos a exaustão, mas buscar preservar relações de interdependência e diversidade. A dimensão da atual crise ambiental, bem como suas implicações, tem sido o tema de muitas reportagens, protestos, conferências. Mesmo assim se deve reconhecer que apesar desta ampla divulgação há elementos que dificultam tal ação mobilizadora, os quais são barreiras e, portanto, podem ser contados como fatores prejudiciais à solução do problema. Exemplos disto são as barreiras culturais, linguísticas e religiosas. Neste sentido a eco teologia deverá contemplar como as religiões se posicionam de modo a contribuir para o desenvolvimento de uma ética que diminua a ação egoísta e predadora do ser humano no meio ambiente. Porém, mesmo dentro da teologia pode-se ver uma diversidade de reflexões que podem ser complicadoras para uma solução mobilizadora. 11 CAPÍTULO I 1. A QUESTÃO AMBIENTAL 1.1 Contextualização O desenvolvimento industrial, o progresso tecnológico, a urbanização desenfreada, a explosão demográfica e a sociedade de consumo, entre outros fatores, têm tornado atual e dramático o problema da limitação dos recursos do nosso planeta e da degradação do ambiente natural fonte primária de vida. Assim, por exemplo, a contaminação, sem precedentes, causada pela ação dos dejetos de tipo industrial, urbano, agrícola e por contínuos ataques à qualidade de vida - talvez o fator limitativo mais importante para o homem constitui mais um produto da civilização industrial surgida no século XX. Todavia, data de época recente o reconhecimento da importância da conservação do ambiente. Como meio natural dos seres vivos, o interesse por sua garantia provém do momento em que o homem se vê compelido a salvaguardar bens raros. Com efeito, as nações industrializadas conseguiram sucesso desvinculando temporariamente a humanidade da natureza, através da exploração de combustíveis fósseis, produzidos pela natureza e finitos, que estão sendo esgotados com rapidez. Contudo, a civilização ainda depende do ambiente natural não apenas para energia e materiais, mas também para os processos vitais para a manutenção da vida, tais como os ciclos do ar e da água. As leis básicas na natureza não foram revogadas, apenas suas feições e relações quantitativas mudaram, à medida que a população humana mundial e seu prodigioso consumo de energia aumentaram a nossa capacidade de alterar o ambiente. Em consequência, a sobrevivência humana depende do conhecimento e da ação inteligente para preservar e 12 melhorar a qualidade ambiental por meio de uma tecnologia harmoniosa e não prejudicial. A questão ambiental emerge, portanto, no terreno político econômicosocial e da própria concepção de vida do homem sobre a terra. Além disso, toda política ambiental deve procurar equilibrar e compatibilizar as necessidades de industrialização e desenvolvimento com as de proteção, restauração e melhora do ambiente. Trata-se, na verdade, de optar por um desenvolvimento econômico qualitativo, único, capaz de propiciar uma real elevação da qualidade de vida e do bem-estar social. Isso vale dizer: desenvolvimento sustentável, como desenvolvimento racional do ponto de vista ecológico (utilização racional e equilibrada dos recursos naturais), acompanhado de uma gestão judiciosa do meio. A ideia de desenvolvimento sustentável se vincula à utilização dos recursos naturais e de desfrute do meio ambiente de modo a satisfazer as necessidades do presente sem comprometer as do futuro. Três são os objetivos essenciais que se busca alcançar por meio do desenvolvimento sustentável: o econômico, referente à eficaz utilização dos recursos naturais e a um crescimento quantitativo; o sociocultural, relacionado ao desenvolvimento, à manutenção da vida social e cultural, e à maior igualdade e equidade social; e o ecológico, “consistente na preservação dos sistemas físicos e biológicos (recursos naturais lato sensu) que servem de suporte à vida dos seres humanos”. De modo similar, destaca-se que o desenvolvimento sustentável se assenta sobre três pilares básicos, que em realidade não se apresentam como conceitos homogêneos, mas sim como finalidades que têm a mesma natureza: o desenvolvimento econômico, o desenvolvimento social e a proteção ambiental. Entende-se, também, que o desenvolvimento deve estar vinculado, não tanto a critérios econômicos, mas a valores culturais. Como bem essencial da pessoa humana, o ambiente deve ser apropriado à satisfação de determinadas necessidades do homem, que “na prática deve se traduzir em seu bem-estar físico, mental, social e espiritual. 13 Entre as iniciativas que visam a preservação ambiental merece especial destaque a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, reunida em Estocolmo, em junho de 1972. A Resolução final dessa Conferência proclama solenemente: “o homem é ao mesmo tempo criatura e criador do meio ambiente que lhe dá sustento físico e lhe oferece a oportunidade de desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. A longa e difícil evolução da raça humana no planeta levou-a a um estágio em que, com o rápido progresso da ciência e da tecnologia, conquistou o poder de transformar de inúmeras maneiras e em escalas sem precedentes o meio ambiente. Natural ou criado pelo homem é o meio ambiente essencial para o bem-estar e para o gozo dos direitos humanos fundamentais, até mesmo o direito à própria vida”. A Declaração de Estocolmo é particularmente importante já que, além de permitir a criação de uma consciência universal sobre o tema, constitui o ponto de partida de uma nova etapa na trajetória de sua proteção. Trata-se de documento que inclui princípios voltados para as necessidades especiais dos estados do Terceiro Mundo, demandando a transferência de quantidades substanciais de assistência financeira e tecnológica para os estados em desenvolvimento, para superar as deficiências ambientais geradas pelas condições de subdesenvolvimento e preservar e melhorar o meio ambiente e cobrir os custos de incorporação de salvaguardas ambientais. Em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, realizou-se a Conferencia sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento — Cúpula da Terra - sob os auspícios das Nações Unidas. Alem de ratificar-se o contido na Declaração de Estocolmo, assentou-se nessa Conferência uma série de princípios para orientar a ação dos governos na gestão do desenvolvimento sustentável, estabelecendo a obrigação dos Estados de promulgar leis eficazes para a proteção real do meio ambiente, promover estudos e avaliações de impacto ambiental e disponibilizar a todos as informações sobre o meio ambiente. Instituiu-se também a denominada responsabilidade comum diferenciada dos Estados, pela qual se reconhece a assimetria existente 14 entre eles tanto na produção de danos ambientais, como na possibilidade econômica e tecnológica de evitá-los ou na restauração do ambiente degradado. 1.2 Sustentabilidade Neira Alva arquiteto e urbanista, ex-diretor da Comissão Econômica para a América Latina - CEPAL -, assim define o conceito e sustentabilidade: “A sustentabilidade pode ser entendida como um conceito ecológico — isto é, como a capacidade que tem um ecossistema de atender às necessidades das populações que nele vivem — ou, como um conceito político que limita o crescimento em função da dotação de recursos naturais, da tecnologia aplicada no uso desses recursos e do nível efetivo de bemestar da coletividade”. Do ponto de vista ecológico, sustentabilidade refere-se aos recursos naturais existentes numa sociedade que, segundo Neira Alva (1997, p.136), representam ‘a capacidade natural de suporte’ às ações empreendedoras locais. A sustentabilidade inerente aos próprios recursos da natureza prende-se às cadeias ecossistêmicas, nas quais a existência e perpetuação de alguns desses recursos dependem naturalmente de outros recursos. Sem essa sustentabilidade haveria o comprometimento da própria biodiversidade, com a aceleração da sua perda, culminando em riscos ao ecossistema planetário. Como se pode ver, a sustentabilidade vai mais além dos destinos da espécie humana: ela alcança a perpetuação da vida e o valor intrínseco da criação ou do mundo natural. (NEIRA ALVA, 1997, p.37) Sob a ótica política, a sustentabilidade representa a capacidade de a sociedade organizar-se por si mesma. É o que o autor denomina de ‘capacidade de sustentação’. Portanto, existem duas precondições para o desenvolvimento da sustentabilidade: a capacidade natural de suporte (recursos naturais existentes) e a capacidade de sustentação (atividades sociais, políticas e econômicas geradas pela própria sociedade em seu próprio benefício). 15 A capacidade natural de suporte compreende os ecossistemas os biomas e todos os tipos de recursos naturais existentes nas comunidades e sociedade, objeto das ações de empreendedorismo social. São os elementos que integram a ecologia local e regional”. Desde logo deve-se observar que a sustentabilidade não pode ser focalizada apenas como um requisito essencial para a sociedade industrial urbana. O paradigma da sustentabilidade, na relação economia – ambiente sociedade, deve ser entendido para além do tratamento da produção de bens e serviços no espaço urbano de forma isolada do espaço rural. Com efeito, embora os estilos de vida estejam cada vez mais distantes, as características de cada um desses mundos ainda os separam com nitidez. Conforme Milaré (2005, p. 155): O mundo rural é mais abrangente que essa relação, à primeira vista, pode supor. Por um lado, o complexo agroindustrial abarca quase todas as atividades antrópicas e se assenta cada vez mais na indústria, abrangendo a produção de bens e serviços de forma intensa e com visíveis impactos no ambiente. Por outro, (...), o espaço rural pode ser visto de forma bem mais ampla que o espaço agrícola, uma vez que, cada vez mais, a economia é determinada em grande parte por atividades não essencialmente agrícolas; assim, o espaço rural capta renda do espaço urbano por meio da presença sazonal de pessoas e da valorização das chamadas amenidades (natureza intocada, paisagens, patrimônio histórico-cultural, unidades de conservação, produtos de origem etc.), identificadas pelas pluriatividades, como o turismo rural, mas que caracterizam também a produção de manufaturados que tradicionalmente eram exclusivos dos distritos industriais localizados junto ao espaço urbano. Como atributo, a sustentabilidade dos recursos está associada à sua durabilidade, ou seja, um bem ou recurso é sustentável na medida em que pode — ou deve — durar para atender às necessidades dos ecossistemas naturais e às demandas dos ecossistemas sociais (em particular nos processos de produção e consumo). Infere-se, daí, que a sustentabilidade dos recursos naturais não é absoluta, é relativa: depende de sua disponibilidade real e do quanto e do como eles são explorados, transformados e utilizados, até serem reduzidos à condição última de rejeitos finais. Enfatize-se que a sustentabilidade dos recursos naturais não pode ser 16 considerada fora do quadro das suas diferentes condições de recursos renováveis e recursos não renováveis. Na gestão ambiental, a sustentabilidade deve ser abordada sob vários prismas: o econômico, o social, o cultural, o político, o tecnológico, o jurídico e outros. Na realidade, o que se busca, conscientemente ou não, é um novo paradigma ou modelo de sustentabilidade, que supõe estratégias bem diferentes daquelas que têm sido adotadas no processo de desenvolvimento sob a égide de ideologias reinantes desde o início da Revolução Industrial, estratégias estas que são responsáveis pela insustentabilidade do mundo de hoje, tanto no que se refere ao planeta Terra quanto no que interessa à família humana em particular. Em última análise, vive-se e protagoniza-se um modelo de desenvolvimento autofágico que, ao devorar os recursos finitos do ecossistema planetário, acaba por devorar-se a si mesmo. Segundo Trigueiro (2009, p.39): No caminho inverso ao do risco do colapso, a ONU vem organizando desde o início da década de 1970 sucessivos encontros internacionais para discutir os limites do crescimento, ou modelos alternativos de desenvolvimento que não ameacem a sobrevivência da espécie humana no planeta. Para Milaré (2005) a construção do paradigma da sustentabilidade está em permanente disputa, segundo as distintas visões de mundo, e pressupõe gigantescos desafios. Como gerar e distribuir a riqueza? A estratégia de crescer para depois repartir está mais presente do que nunca, embora tenha grande responsabilidade pelo imenso fosso material e espiritual existente entre as pessoas e destas com a natureza, tanto no âmbito internacional como no interior das nações. 1.3 Educação, Ética Ambiental e Cidadania Para modificar os padrões de degradação vigentes no planeta, existe a educação no ensino formal e no não formal, entendendo-se que é fundamental uma nova ética voltada à educação ambiental, haja vista que: a ética da sociedade dominante hoje é utilitarista e antropocêntrica. 17 Considera o conjunto dos seres a serviço do ser humano que pode dispor deles a seu bel-prazer, atendendo a seus desejos e preferências. Acredita que o ser humano, homem e mulher, é a coroa do processo evolutivo e o centro do universo (BOFF, 2004, p. 21). Morin (2003), à luz da teoria da complexidade, argumenta que a ética do gênero humano é um dos sete saberes necessários à educação do futuro, revelando-se, nesta perspectiva, uma atitude deliberada de todos os que buscam um mundo com mais sustentabilidade, e não meramente como um conjunto de proposições abstratas. Por sua vez, Singer (2002) explica que: A nova ética ambiental rejeita os ideais de uma sociedade materialista na qual o sucesso é medido pelo número de bens de consumo que alguém é capaz de acumular. Em vez disso, ele avalia o sucesso em termos do desenvolvimento de aptidões individuais e da verdadeira conquista da satisfação e realização. (SINGER, 2002, p. 302). Nesta linha, Boff (2004) acrescenta que, como o homem pode ser definido como um ser de comunicação e de responsabilidade, seria ético desenvolver um sentido de limite nos desejos humanos, em especial no que se refere ao padrão extravagante de consumo, porquanto este ocorre à custa da exploração dos recursos naturais. Isso, todavia, não significa que a ética ambiental é contrária ao prazer, mas que os prazeres que ela valoriza não decorrem do consumo desenfreado. Além disso, o mesmo autor assevera que também seria ético potencializar a solidariedade entre as gerações, oportunizando o direito de existir àqueles que ainda não nasceram, bem como destes coexistirem com os demais seres. Singer (2002), no entanto, adverte que os princípios éticos mudam lentamente, e o tempo de que se dispõe para construir uma nova ética, considerando o avançado comprometimento dos recursos naturais para as futuras gerações, é curto. Nas últimas décadas, contudo, desenvolveu-se uma diversidade de correntes da ética ambiental, e todas, sob diferentes enfoques, compartilham do mesmo propósito: “Salvaguardar o planeta e assegurar as condições de desenvolvimento e de coevolução dos seres humanos rumo a 18 formas cada vez mais coletivas, mais interiorizadas e espiritualizadas de realização da essência humana” (BOFF, 1999, p. 25). No que se refere à cidadania clássica, esta é constituída de três elementos dos direitos humanos que lhe são característicos: o elemento civil, relacionado com os direitos civis de liberdade individual; o elemento político, consubstanciado pelos direitos ligados à participação no exercício do poder político; e o elemento social, concernente aos direitos ligados ao bem-estar econômico e à herança social. Os direitos civis surgiram no século XVIII; os políticos, no século XIX; e os econômico-sociais, no século XX (CORRÊA, 1999, p. 214). Nesta perspectiva, com base no mesmo autor, a cidadania, enquanto vivência dos direitos humanos, Significa a realização democrática de uma sociedade, compartilhada por todos os indivíduos ao ponto de garantir a todos o acesso ao espaço público e condições de sobrevivência digna, tendo como valor fonte a plenitude da vida. Isso exige organização e articulação política da população voltada para a superação da exclusão existente (CORREA, 1999, p. 217). Para não relacionar, no entanto, a cidadania apenas com a noção de direitos humanos, é importante analisá-la de outra maneira que não unicamente adjetivada: cidadania civil, cidadania política, cidadania social, etc. Assim sendo, Leite e Ayala (2004, p. 304) lecionam que a cidadania, diferentemente dos termos Estado e nação, “refere-se à condição jurídica da pessoa em relação ao país em que se encontra”. Logo, “ao ser considerada cidadã de um Estado, a pessoa passa a portar direitos e deveres com relação a esse Estado determinado”. Uma pessoa, porém, pode vir a ser considerada cidadã mesmo não tendo nascido dentro dos limites territoriais de um determinado Estado, bastando, para isso, que sejam preenchidos os requisitos que o Estado em questão estabelece para que a condição de cidadão lhe seja conferida. Por essa razão, Leite e Ayala (2004, p. 304) entendem ser mais correto afirmar que “se adquire a cidadania, e não a nacionalidade, de um Estado”. 19 Há ainda uma outra distinção clássica a ser feita na medida em que se reduz a cidadania a essa condição jurídica da pessoa com seu respectivo Estado: aquela entre a cidadania passiva e a cidadania ativa. Na cidadania passiva a pessoa é considerada cidadã, porque preenche todos os requisitos exigidos pelo Estado para exercer tal condição, porém mantém-se inerte ao que acontece ao seu redor. Ao revés, a cidadania é exercida efetivamente quando se fala em cidadania ativa. Neste sentido, de acordo com o enfoque juridicista, a cidadania refere-se ao vínculo jurídico pelo qual todos pertencem àquele país, mas não necessariamente participam das tomadas de decisão para a sua construção e desenvolvimento (LEITE; AYALA, 2004). Cabe salientar que o exercício da cidadania por meio da participação é uma das principais características da democracia e mister se faz a sua plena colaboração na gestão do poder. Dessa forma, a cidadania só poderá ser exercida quando estiverem presentes a democracia e a liberdade como requisitos indispensáveis (BARACHO apud LEITE; AYALA, 2004). Feitas estas considerações preliminares acerca do termo cidadania, passa-se à análise do tema objeto deste ponto: a cidadania ambiental. Nos dias atuais, é certo que se vive em uma Sociedade Mundial do Risco, sujeita a catástrofes em escala planetária que ameaçam, perigosamente, a existência das presentes e das futuras gerações, bem como de toda a biosfera. Diante deste cenário, o modelo tradicional de cidadania, centrado no individualismo, na territorialidade e exercido minimamente, mostra-se insuficiente perante a recorrente exigência de preservação de um bem que pertence a todos de forma difusa: o bem ambiental. Observa-se então que com o advento da Sociedade Mundial do Risco, entre outros fatores, ocorreu uma mudança brusca nos interesses, nas relações e nos direitos do ser humano. Os interesses passaram a ser indeterminados “prima facie”, não exclusivos e anônimos por natureza. As relações, que antes eram bilaterais, agora se apresentam nas mais imprevisíveis formas e padrões (poligonais). E os novos direitos “não têm referência imediata nem a titulares estatais nem a titulares de espaços privados; são direitos que pertencem a todos e a ninguém ao mesmo tempo” 20 (LEITE; AYALA, 2004, p. 309). São direitos difusos, como o ambiental, por exemplo. Para contemplar esses novos interesses, novas relações e novos direitos, emerge a necessidade de uma outra cidadania. Este modelo novo e específico de cidadania denomina-se cidadania ambiental. Em uma definição sucinta, a cidadania ambiental é mais abrangente que a clássica, haja vista que não está circunscrita espacialmente a determinado território ou ligada a um povo específico, é transfronteiriça, tendo como objetivo comum a proteção planetária do bem difuso ambiental para as presentes e vindouras gerações, oferecendo, desse modo, resultados ecologicamente idôneos e adequados. Em decorrência disso, Sáiz (apud LEITE; AYALA, 2004, p. 318) enfatiza que no modelo de cidadania ambiental o cidadão não tem um compromisso de lealdade nacional apenas, mas um compromisso de lealdade ecológica. Além disso, a cidadania ambiental deve ser exercida de maneira dúplice indivíduo e coletividade, de forma solidária e mediante a ação de ONGs. Leite e Ayala (2004), no entanto, alertam que deve ser dada preferência ao exercício da cidadania coletiva, uma vez que esta demonstra mais pressão e força nas suas reivindicações de proteção ambiental, sem, contudo, menosprezar a relevância da cidadania individual. Para a concretização dessa cidadania ambiental encontram-se dois desafios a serem vencidos: a responsabilidade de todos os cidadãos pela proteção do bem ambiental e a sua efetiva participação nas tomadas de decisão sobre os assuntos de legítimos interesses geracionais. A cidadania ambiental, assim como a responsabilidade compartilhada e a participação cidadã, estão previstas, ainda que genericamente, no art. 225, caput, da Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever51 de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. O texto político fundamental brasileiro reconhece, pois, a cidadania ambiental nos precisos termos em que afirma a qualidade difusa do bem ambiental e estrutura um sistema de responsabilidades compartilhadas entre 21 todos, em uma orientação participativa, que inclui não só a defesa dos direitos daqueles que não possam exercer regularmente os seus direitos políticos, mas também os das futuras gerações (LEITE; AYALA, 2004). A partir da prescrição implícita de um sistema de responsabilidades compartilhadas, o art. 225, caput, da CF/88, atribuiu da mesma forma, “a todos, a obrigação constitucional de não poluir e não degradar o ambiente” (LEITE; AYALA, 2004, p. 322). Na sequência, o texto do parágrafo 1° deste mesmo artigo contraria a noção de responsabilidade compartilhada, na medida em que confere ao Estado a titularidade exclusiva do dever e obrigação de garantia da proteção do bem difuso ambiental: “Art. 225. [...] § 1° Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público [...]”. Para a concretização da cidadania ambiental, contudo, faz-se essencial uma repartição das responsabilidades, caso contrário se estará fortalecendo os elementos da cidadania tradicional, que como já foi mencionado, são insuficientes para tratar dos novos interesses, das novas relações, dos novos direitos, e entre eles o dado ecológico, eclodidos na Sociedade Mundial do Risco. Assim sendo, o art. 225 da Constituição Federal de 1988 deve ser interpretado de forma ampla, delegando a todos, coletividade e poder público, a responsabilidade pela proteção do bem difuso ambiental. Para a efetivação da cidadania ambiental, da mesma forma que a responsabilidade, também a participação deve ser compartilhada (solidária) entre o Estado, o indivíduo, a coletividade, as ONGs, etc., na consecução dos fins de proteção ambiental difusa. Desse modo, cidadania ambiental implica uma progressiva participação de todos “nos processos de tomada de decisões, não como consultores”, como ocorre nos moldes da cidadania tradicional, em que a participação é garantida aos cidadãos desde que não ultrapasse as fronteiras da ordem estabelecida, “mas como protagonistas com função decisiva e ativa no processo de orientação das escolhas e alternativas para superar os riscos da melhor forma permitida no caso concreto” (LEITE; AYALA, 2004, p. 343). 22 Neste sentido, participar significa “fazer parte e tomar parte, significa influir ativamente na escolha e na construção dos destinos sociais e na solução dos problemas vividos pela comunidade” (LIMA, 2005, p. 134). Ademais, para alcançar seus objetivos, a participação cidadã requer organização consciente de todos, “motivação comunitária e mobilização contínua a fim de resistir aos arbítrios do poder dominante, defender os interesses ambientais em questão e o avanço dos direitos já conquistados” (LIMA, 2005, p. 135). Sobre esta temática, Leite e Ayala (2004) questionam: De que forma o cidadão deve cumprir o seu dever de participar das decisões em matéria ambiental, diante do sistema normativo do Estado brasileiro? Os autores esclarecem que a questão pode ser resolvida mediante três mecanismos de participação populares na tutela do meio ambiente, a saber: “por meio da participação de criação de direito ambiental, na participação da formulação e execução de políticas ambientais e por meio da participação via acesso ao Poder Judiciário”. Diante do exposto, é notório que a cidadania ambiental compreende uma cidadania ativa, pois além da conexão jurídica da pessoa com o Estado (global), a cidadania ambiental refere-se, sobretudo, à efetiva participação de todos os cidadãos nas tomadas de decisão afetas à construção e crescimento de uma sociedade (global) socioambientalmente equilibrada para as gerações presentes e por consequência para seus descendentes. Santos (2001) no livro Pela mão de Alice: o social e o político na pósmodernidade, explica que a redefinição da cidadania para um conceito de cidadania ambiental é uma realidade distante, haja vista a crise em que vive a sociedade, marcada pelas desigualdades sociais, pelo empobrecimento de grande parte da população, degradação ambiental global, entre outros inúmeros problemas. A cidadania ambiental exige um novo paradigma de Estado e, mais do que isso, requer um Estado menos capitalista e com preponderância do aspecto social sobre o econômico, com uma profunda transformação dos modos de produção, do conhecimento científico e de consumo. 23 Para a materialização e difusão da cidadania ambiental com certeza é imprescindível uma nova postura do Estado e da coletividade, pois o homem não deve mais ser o cidadão que domina e explora a natureza para saciar os seus desejos e as suas necessidades. Faz-se necessária, portanto, uma transformação no modo de pensar e agir do próprio homem, que deverá inserir nos seus valores relevantes o viver em harmonia com a natureza. Por fim, reafirma-se que a cidadania ambiental, além dos elementos básicos da democracia, responsabilidade compartilhada e participação cidadã, requer uma visão consciente e solidária do cidadão como um bem indispensável a sua sobrevivência e de seus descendentes. Para trazer à tona esta consciência impende, obrigatoriamente, a educação e a ética ambiental, além da correta aplicação da legislação constitucional e infraconstitucional em matéria ambiental. Apenas depois disso, entende-se que estarão lançadas as bases para solucionar a crise da relação do homem com a natureza e, consequentemente, para a concretização do desenvolvimento socioeconômico e ambiental equilibrado da sociedade, ou seja, do desenvolvimento sustentável. 24 CAPÍTULO II 2. VISÃO SOCIOLÓGICA DA RELIGIÃO E MEIO AMBIENTE A principal preocupação da sociologia ambiental é a união da natureza física e das construções sociais da natureza. A habilidade de unir estes conceitos aparece como o centro da pretensão da área de ser a melhor das áreas da sociologia a se aplicar a um dos maiores problemas mundiais - o declínio do meio ambiente. Com o final da Guerra Fria, as preocupações sobre o aquecimento global e mudanças no meio ambiente mundial tomaram o lugar das preocupações com a guerra nuclear. Sendo assim, a sociologia do meio ambiente tem ocupado o cenário central na relação dos problemas mundiais. Conforme Giuliani (1998, p. 02), Os fundadores da sociologia consideram os aspectos físicos do ambiente como elementos relacionados às características da sociedade, porém de sociedades anteriores à sociedade moderna, industrial e capitalista. Durkheim (1978) refere-se a fatos sociais da ordem anatômica ou morfológica, tais como a distribuição da população no território, o número e a natureza das vias de comunicação, a forma das habitações. Estes fatos sociais devem ser vistos como "modo de ser" das sociedades, porém não podem ser relacionados às maneiras de agir, sentir ou pensar, aos fatos sociais da ordem fisiológica, os quais representam, estes sim, o objeto da sociologia. Para Weber, os determinantes sociais são tão numerosos e complexos que se torna impossível para o sociólogo não só pensar em explicá-los na sua totalidade, mas também supor que possa haver algum determinante universal. Os fenômenos sociais resultam de uma combinação de fatores cuja ordem e importância não estão associadas a leis previamente estabelecidas. Quanto aos fatores ambientais, o autor mostra em História Agrária Romana, em Sociologia Comparada das Religiões e em 25 História Econômica Geral como tais fatores não são determinantes universais, mesmo que possam assumir relevância causal em conjunturas específicas. Marx também se refere a elementos geoecológicos quando trata das formações sociais pré-capitalistas e relaciona, de forma bastante similar a Montesquieu, uma conformação geográfica específica ao sistema social despótico das formações sociais asiáticas (Marx, 1975). Conforme McReynolds (1999), a sociologia do meio ambiente está preocupada com uma vasta gama de questões, campos de estudo e disciplinas. Se por um lado essa amplitude é excitante, é fácil se perder no labirinto do que veio a se tornar a sociologia do meio ambiente. Nas páginas seguintes apresento uma bibliografia de fontes e uma lista de jornais que relevam o conhecimento da área. Nenhum deles pretende ser exaustivo. Ao contrário, eles têm a intenção de proporcionar ao estudante novo e intermediário da área um acesso mais direto à literatura histórica crítica, teórica e metodológica. Com essas bases, espera-se que o leitor fique mais preparado para pesquisar este crescente e importante campo da sociologia. É enquanto sistema de pensamento que a religião interessa à sociologia, uma vez que ela opera para uma dada sociedade a ordenação lógica do seu mundo natural e social, integrando-o em um cosmos. Ou seja, para a religião tudo que existe ou venha a existir tem sentido porque se integra em uma ordem cósmica. Há o consenso de que as religiões têm um papel fundamental para incorporar princípios éticos no estilo de vida e nas decisões científico técnicas e políticas que podem levar a humanidade para o desenvolvimento sustentável. Enquanto sistema simbólico, a religião é estruturada na medida em que seus elementos internos relacionam-se entre si formando uma totalidade coerente, capaz de construir a experiência. As categorias de sagrado e profano, material e espiritual, eterno e temporal, o que é do céu e o que é da terra, funcionam como alicerces sobre os quais se constrói a experiência vivida. Alicerces, porque, sendo revestidas de caráter sagrado, elas não 26 podem ser postas em discussão e podem assim assegurar o consenso lógico e moral de qualquer sociedade, segundo Durkheim. Bourdieu fala do poder de consagração, que “absolutiza o relativo e legitima o arbitrário”, para indicar a ação da religião sobre as instituições sociais. Sua força reside na capacidade de transfigurar as instituições sociais (portanto, construções humanas, culturalmente condicionadas) em instituições de origem sobrenatural ou inscritas na natureza das coisas. O mesmo efeito de consagração pode aplicar-se a atributos de grupos ou pessoas, que passam a ser considerados como frutos do desígnio divino ou de uma ordem natural intocável. Nesse sentido, a religião é uma força estruturante da sociedade, pois aplicada às relações sociais (em si mesmas arbitrariamente construídas) ela, “da necessidade, virtude”, transforma o “assim é” em “assim deve ser”, ou em “assim não pode ser” A isso Bourdieu chama de alquimia ideológica, porque ao revestir o que é produto humano (portanto uma criação arbitrária e relativa a seu tempo) com o caráter sagrado (inquestionável e perene), a religião desempenha a função simbólica de conferir à ordem social um caráter transcendente e inquestionável. Aí reside sua eficácia simbólica e, ao mesmo tempo, sua função eminentemente política. 2.1 Função Social da Religião O pensamento corrente reconhece na religião a função psicológica de livrar o ser humano das angústias que o afligem, na medida em que ela consegue definir “quem sou, de onde venho e para onde vou”. Para a sociologia, porém, a religião só se torna objeto de estudo porque desempenha funções sociais. Na verdade, ela não fornece justificação para a existência humana abstrata, mas sim na forma tal como existimos em situações socialmente determinadas (isto é, conforme os atributos do grupo, gênero ou classe a que pertence cada indivíduo). As teodicéias podem portanto ser interpretadas como “sociodicéias” que respondem às indagações sobre as causas das desigualdades, injustiças e privilégios, bem como sobre a origem e a legitimidade das instituições sociais. 27 Não basta, contudo, que o conjunto de práticas e esquemas de pensamento religioso seja coerentemente estruturado para exercer essa função social. Sua eficácia simbólica reside em sua capacidade de inculcarse nos membros de uma dada sociedade, e assim moldar seu comportamento. Em outras palavras, a religião só é socialmente eficaz quando seus esquemas de pensamento se inscrevem nas consciências individuais e nelas se incorporam como se naturais fossem, transformandose então em hábitos. Essa relação entre um dado sistema religioso e a sociedade na qual ele existe requer uma compatibilidade estrutural entre elas, pois nenhuma sociedade aceita um sistema religioso estruturalmente divergente dela. Por isso, embora as representações e práticas religiosas falem de “absoluto”, “cósmico”, “sobrenatural”, ou “transcendente”, de fato reproduzem, por meio de formas etéreas (e por isso mesmo irreconhecíveis, como Marx já percebera em sua crítica filosófica) relações sociais bem “terrenas”, que têm muito a ver com as alianças ou antagonismo entre os grupos ou classes, definindo sua posição na hierarquia do poder. Toda religião exerceria, assim, a função política de eternizar uma dada ordem hierárquica entre grupos, gêneros, classes ou etnias. 2.2 Sociologia da Religião A sociologia da religião tem por objeto de estudo a natureza do fenômeno social religioso, como componente da estrutura social. O estudo da sociologia religiosa desenvolve-se relacionado com o esforço por compreender o fenômeno religioso em todos os campos da atividade social. Numerosas são as tendências da explicação sociológica da religião. Weber fundamenta seu estudo sobre a religião como elemento causal independente, que, em toda a história, influi na ação social. A partir de todo o pensamento Weberiano, a sociologia da religião não se limita a uma estrita explicação do fenômeno religioso em si. Sua problemática resume em preocupar-se, ao mesmo tempo, como a conduta religiosa dirige ou condiciona em parte as outras atividades humanas, sendo reciprocamente condicionada por elas. 28 Para Weber não é o fenômeno religioso, mas sim seu comportamento ao qual dá origem, pelo fato de se fundamentar em certas experiências particulares, em representações, símbolos e fins determinados. Segundo Costa (2010, p.02), Weber se interessa pelo ‘significado do mal, sofrimento e morte’. Ele vê tais elementos como necessários à vida do homem e insolúveis em termos meramente científicos, sendo esses elementos provocativos, importantes ao desenvolvimento e na orientação da ação social do homem. O elemento principal para análise sociológica da religião é o comportamento do homem frente a forças sobrenaturais. Estando tais forças fora da dimensão cotidiana, o homem criou uma simbologia para entrar em contato com elas, representá-las e, principalmente, compreender sua ação. O permanente domínio de si mesmo, aliado à vontade metódica, teve como objetivo a racionalização do comportamento individual, com reflexos na gestão dos negócios. Assim, o tipo ideal puritano observado por Weber estaria pronto a estruturar empresas e racionalizar a economia. Segundo as leis de Deus, o que pode ser condenável para a ética protestante é o usufruto dos bens e suas consequências. A dedicação à religião leva o protestante a se dedicar ao trabalho, racionalizando essa dedicação, preenchendo assim os desígnios de Deus e, em consequência disso a produtividade e a austeridade, dando origem a um estilo de vida definindo diretamente a essência do capitalismo, criando um clima propício ao seu desenvolvimento. Costa (2010) afirma que Weber restitui à religião uma posição autônoma, ou seja, reconhece-lhe autonomia e capacidade de exercer um papel nos processos sociais. A abordagem weberiana, na obra A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, debate a contribuição que o cristianismo deu à gênese do mundo moderno, mostrando que o protestantismo, em sua versão ascética, favoreceram a afirmação do capitalismo. Do outro lado, discute o incontido processo de racionalização, que se traduz no plano religioso de desencantamento do mundo . “O interesse de Weber pela Religião nasce exatamente da convicção de que as imagens religiosas do mundo exercem um papel fundamental na formação das sociedade, mediante a legitimação de comportamentos tradicionais ou inovadores”. 29 Para Weber, nos calvinistas e seus adeptos saídos da Reforma Protestante, o controle constante dos próprios progressos morais foi a précondição para a instauração do racionalismo econômico. O ativismo racionalista dos puritanos foi um forte fator que predispôs a afirmação de um novo tipo de homem, o capitalista, “para o qual o cálculo do tempo e do aproveitamento são os pressupostos da habilidade na profissão e da audácia nos negócios: atitudes essas sempre acompanhadas pela sobriedade e vida e severa autodisciplina ”. Quanto ao processo de racionalização, Weber afirma que ela está baseada sobre aspectos não racionais, sobre instituições pré e meta racionais, e isso é verdadeiro não apenas sob o ponto de vista da desmarginação religiosa do mundo pregado pelo judaísmo e protestantismo, mas também na sua situação futura. A racionalização promoveu a concepção utilitarista do homem e a concepção manipuladora da natureza, além da fé no valor intrínseco do acúmulo, seja ele econômico, seja do tipo tecnocientífico. Esta racionalização está repleta de consequências negativas, não apenas para a relevância social da religião, como também para o desenvolvimento da própria sociedade moderna. O cientificismo ateu criou junto com outros elementos da cultura moderna, com o capitalismo e o utilitarismo, um mundo objetivado, no qual as relações interpessoais são impossíveis. Surgiu o que o próprio Weber afirmou: “o intelecto criaria uma aristocracia de posse da cultura racional que seria profundamente antifraterna”. Desse modo, o autor leva até as últimas consequências o processo do racionalismo ocidental, que comporta o desencantamento da própria imagem cientificista do mundo que, na época positivista, assumiu o papel de substituto funcional da religião. 30 CAPÍTULO III 3. MEIO AMBIENTE E AS DIVERSAS ABORDAGENS RELIGIOSAS A crise ecológica desperta nas sociedades o interesse pelo resgate do meio ambiente, bem como o resgate dos seres viventes. Tal tarefa que exige um conjunto de valores que desperte a mente e os corações da humanidade. A questão está no desenvolvimento de uma ética que funcione e ao mesmo tempo tenha penetração em todas as culturas e suas mais diversas crenças. 3.1 Teologia Bíblica A expressão teologia bíblia é usada para designar uma atividade que tem como finalidade esclarecer os temas e idéias da Bíblia, de modo a tentar determinar o que realmente é ensinado pela Palavra de Deus. Esta tarefa deve ser realizada mesmo que os resultados sejam embaraçosos. Também deve ser compreendida como a tentativa de construção de um completo sistema teológico tendo como instrumento a Bíblia como única fonte informativa. O pressuposto é que todos os autores da Bíblia concordam em seus pontos de vista fundamentais, e juntamente com suas exposições pretendem descobrir exatamente quais eram os pontos de vista daqueles autores sagrados. Dentro desta perspectiva, temos a abordagem ecológica do ponto de vista da Teologia Bíblica. DeWiit (1994) afirma que a Bíblia, sem a qual a civilização ocidental se torna inexplicável, tem os ensinos ecológicos poderosos que suportam uma visão ecológica. Ele defende a ideia de que enquanto estes ensinos não forem praticados amplamente em nosso tempo, a degradação continuará em nosso sistema ecológico. Da humanidade se requer um reexame por parte de ecólogos e da Igreja. Tal reexame pode ajudar desenvolver uma compreensão mútua e necessária para se fazer 31 julgamentos eticamente ecológicos e colocar estes ensinos em prática de uma maneira apropriada. O autor passa então a apresentar uma série de princípios que devem ser observados à luz da Bíblia. Neste sentido, ele prossegue dizendo que entre estes ensinos está a expectativa de que as pessoas venham a servir e cuidar da criação (princípio do cuidado da terra), e que as criaturas e ecossistema não devem ser cruelmente esgotados (princípio do sabbath), que as provisões devem ser feitas para florescer a biosfera (princípio da frutificação), que a terra deve ser preenchida com a diversidade abundante da vida biológica (princípio do preenchimento), que se deve evitar pressionar a absoluta e limitada biosfera (princípio do amortecedor), que as pessoas devem parar de procurar satisfação e a busca egoísta de ganho a qualquer custo (princípio da contentação), que os povos devem priorizar a melhor integridade da biosfera acima do próprio interesse (princípio da prioridade) e que os povos não devem falhar nas atitudes que sabem são corretas (o princípio da práxis). DeWitt (1994) conclui que os ecólogos necessitam reconhecer e respeitar estes e outros ensinos bíblicos ecológicos e estarem prontos para ajudar as igrejas em seu cuidado em manter a criação. E as igrejas devem juntar ecólogos no trabalho de assegurar a integridade continuada da biosfera. 3.2 Teologia Evangelical A teologia evangelical é fruto de um movimento moderno que transcende os limites denominacionais ou confessionais da igreja. A ênfase está na conformidade com as doutrinas básicas da fé e a proposta de alcance missionário de compaixão e urgência. Tal movimento crê no evangelho de Jesus Cristo e o proclama, e a palavra “evangelical” é derivada do substantivo grego euagelion, que significa boas novas, notícias de alegria e seu verbo correspondente, euangelizomai, significa anunciar as boas notícias (JOHNSTON apud ELWELL, 1990, v.2, p. 119). 32 O termo “evangélico” data do século XVI, usado para aqueles que desejavam um retorno às crenças e às práticas mais bíblicas em relação às práticas associadas no período medieval. Hoje tal termo é geralmente utilizado em relação a uma tendência, como já citado acima, supra denominacional, que é voltada para a teologia e para a espiritualidade, cuja ênfase está em se atribuir um lugar de destaque para a Bíblia na vida do cristão. McGrath (2005, p.160) entende que o evangelicalismo atual se concentra em torno de um conjunto de quatro pressupostos: 1) A autoridade suficiente das Escrituras; 2) A singularidade da redenção, por intermédio da morte de Cristo na cruz; 3) A necessidade de conversão pessoal; e 4) A necessidade de adequação e a urgência do evangelicalismo. A proposta de Land (1992) ao tratar do tema meio ambiente é fazê-lo dentro da reflexão desta teologia evangelical. Ele reconhece que combinar a introdução tradicional conservadora da religião com a introdução tradicional liberal de proteger o ambiente é uma tarefa difícil. O autor faz uma reflexão nesta obra e fornece uma boa introdução para aquelas que estão interessados no tema sobre a proteção do meio ambiente de um ponto de vista cristão. O destaque do autor é que este livro não é direcionado para aqueles que não estão interessados no envolvimento com a atual crise ecológica. 3.3 Teologia Histórica A teologia histórica tem como base a proposta de interpretar a Bíblia de acordo com os acontecimentos históricos do momento em que vive o teólogo, desenvolvendo as linhas de tal teologia, que, contrariamente à ideologia dos 38 historiadores e filósofos pagãos, insere os acontecimentos históricos do momento no contexto mais amplo da história universal, oferecendo ocasião para uma profunda e renovadora reflexão histórica e teológica (GIBELLINI, 1998, p. 255). No contexto da teologia histórica, uma obra de destaque é a do autor Sorrell, que propõe um trabalho a respeito de uma das figuras interessantes 33 de todos os tempos no tema ecologia, Francisco de Assis, frequentemente descrito, nos dias atuais, como um tipo do “proto hippie” ou então do ecólogo avant la lettre. Este livro é um estudo bem detalhado da visão de Francisco de Assis a respeito da natureza no contexto da tradição medieval. Ele expõe as modernas interpretações anacrônicas, discutindo convincentemente as idéias de Francisco de Assis, compreendidas no contexto do século XIII. Analisando os escritos de Francisco de Assis, particularmente o Cântico do sol, Sorrell mostra que grande parte da opinião de Francisco, a respeito da relação apropriada da humanidade com o mundo natural, tem seus antecedentes na Escritura Sagrada e nas ordens Monásticas Medievais, enquanto outras ideias e práticas, seu misticismo da natureza, seu conceito de relacionamentos familiar com as coisas criadas, e sua extensão de sua concepção medieval para as interações com as criaturas, são inteiramente suas próprias. Sorrell insiste, entretanto, que somente vendo Francisco de Assis nos termos das tradições ocidentais de que se levantou, podemos nós apreciar a originalidade verdadeira desta figura extraordinária e da relevância de seu pensamento aos interesses religiosos e ambientais modernos (SORRELL, 1988). Outra abordagem neste tema ressalta o fato de a atual crise ecológica ter criado um novo interesse num criticismo bíblico de atitudes bíblicas para com a natureza e para com o meio ambiente. No livro de Theodore Hiebert, podemos refletir sobre um exame detalhado da ideologia de um único suposto autor bíblico, o Javista (J), escritor das seções das narrativas, as mais velhas do Gênesis, Êxodo, e Números. Hiebert discute a importância de ler J em seu velho contexto do Oriente Próximo. Sua análise incorpora a evidência a respeito da ecologia, da economia, e da religião do antigo levante, extraído do trabalho recente na arqueologia, na história, na antropologia social, e nas religiões comparativas. Hiebert ressalta que, apesar das limitações da visão de mundo de “J” (e do mundo no qual tomou forma), sua ideologia é relevante aos esforços contemporâneos para moldar uma teologia da ecologia. Particularmente, o valor está na visão de “J” da realidade como unificada e não dualística, a humanidade como limitada e dependente, natureza e humanidade inter- 34 relacionadas e que prendem o significado do sagrado e da agricultura como um contexto para uma teologia ecológica (HIEBERT, 1996). 3.4 Teologia da Libertação A Teologia da Libertação é um movimento que defende os direitos dos pobres e oprimidos como obrigação da igreja, onde alguns defendem o Cristo como libertador, como se Sua missão pudesse ser compreendida em termos de luta de classes própria do marxismo. Segundo Webster: Trata-se mais de um movimento que procura unir a teologia e as preocupações sócio políticas do que de uma nova escola de teoria política. É mais exato falar das teologias da libertação, no plural, porque essas teologias de libertação acham expressão contemporânea entre negros, feministas, asiáticos, latinoamericanos e índios das Américas. A expressão mais relevante e articulada acontece na América Latina. Temas teológicos têm sido desenvolvidos no contexto latino-americano, servindo como modelos para outras teologias de libertação (WESBTER apud ELWELL, 1990, v 3, p. 479). Um dos principais arquitetos da Teologia da Libertação é Gustavo Gutiérrez. A despeito de sua característica, deve-se destacar a dedicação social de certos líderes do movimento. É fato que esta teologia encontra duras críticas dentro de sua própria denominação. Numa proposta de levar as pessoas a ouvir o clamor da Terra, Pitcher escreve de modo apaixonado e honesto sobre a destruição sistemática do planeta. Armado com as estatísticas assustadoras e os duros fatos, ele analisa a falha perturbadora de nossas instituições sociais e políticas em responder à atual crise ecológica. Pitcher (1993) propõe a formação “das comunidades da criação” baseadas em escutar não somente a terra, mas também a Deus. Na introdução de sua obra sobre o remir o tempo, no contexto da necessidade de uma política séria a respeito do meio ambiente, Steven Bede Scharper representa nossa difícil situação atual da crise ecológica global como “uma crise espiritual,” uma crise que desafia os teólogos e 35 ativistas a fazer uma séria reavaliação e talvez refazer o Cristianismo Cristão (uma redundância proposital) na luz de nossa atual crise ecológica. Começando pela suposição de que as comunidades da fé têm um papel crucial em reparar o cisma da humanidade com o mundo natural. Assim, num exame da teologia ambiental a partir de quatro pontos principais, Scharper (1998) olha primeiramente como o Cristianismo começou a olhar a crise ambiental e como tem respondido nestas últimas três décadas. Ele explora, então, os principais pontos: o processo da teologia, a nova cosmologia de Thomas Berry, o eco feminismo e a teologia da libertação. Na obra de Rosemary R. Ruether é apresentada uma discussão detalhada e importante a respeito de três mitos principais da criação, da destruição, e da dominação. Ruether, mostra como estas histórias patriarcais ainda estão permeando a cultura e a estrutura social do atual mundo ocidental. De maneira eloquente, Rosemary Ruether (1994) crítica estes valores de um ponto de vista ecológico e feminista, explorando como a dominação machista sobre as mulheres e sobre a natureza esta interconectada. A discussão segue no sentido de que este status, bem como os valores devem ser mudados. Ela desenvolve maneiras potenciais para trazer cura ao nosso planeta dentro das tradições religiosas existentes. Este trabalho é útil para coleções especiais na religião, nos estudos da mulher, e no campo dos estudos da ecologia. Assim, a autora e aclamada professora internacional, apresenta uma teologia arrebatadora do eco feminismo, no contexto da teologia da libertação, que traz luz para a direção “terra-cura”, num total relacionamento entre homens e mulheres, comunidades e nações. 3.5 Teologia Neo Ortodoxa A Teologia Neo Ortodoxa pode ser descrita como uma abordagem que iniciou num meio ambiente comum, mas que em pouco tempo passou a se expressar de vários modos. Começou com a crise associada à desilusão que seguiu a primeira Guerra Mundial, com uma rejeição do escolasticismo protestante e com uma negação do movimento liberal protestante que tinha ressaltado a 36 acomodação do cristianismo à ciência e à cultura ocidentais, a imanência de Deus e a melhoria progressiva da humanidade (SCHNUCKER apud ELWELL, 1990, v. 3, p. 13). A primeira expressão importante do movimento foi a obra de Karl Barth, Epístola aos Romanos, publicada em 1919. O movimento foi chamado assim por várias razões, uns como zombaria, outros o viam como um estreitamento da posição tradicional do protestantismo. Alguns viam na palavra ortodoxia o esforço ao retorno às idéias básicas da Reforma protestante, como meio de proclamar a verdade do evangelho no século XX, destacando o prefixo neo como a viabilidade dos novos princípios filológicos para se chegar a um conceito exato das escrituras. Assim em combinação, neo-ortodoxia, fornecia um testemunho poderoso da ação de Deus em Cristo para pessoas de um novo século. A aproximação da neo-ortodoxia foi possível para que a teologia recuperasse o significado verdadeiro da doutrina da criação. Gilkey afirmou: “pois nós somos as criaturas do Deus e que, em última instância, somos totalmente dependentes do poder e amor de Deus”. Portanto, foi extremamente importante para Gilkey afirmar que a neo-ortodoxia constituía uma terceira maneira no fazer teológico. A impressão que temos é que ele buscou certo equilíbrio entre as teologias fundamentalistas e liberais, de modo a propor uma resposta cristã para os problemas sociais, uma vez que foi profundamente tocado pelas atrocidades da guerra, bem como das injustiças contra a criação em geral. 3.6 Teologia Ecumênica Este é um movimento que tem como característica o envolvimento das Igrejas cristãs no objetivo de superar as divisões do passado e reintegrar a unidade da Igreja, podendo ter um significado ainda mais amplo. O termo “ecúmeno”, que deriva do grego oikuméne, significa a “terra inteira”, ou também “toda a terra habitada”, e no uso linguístico atual é assumido em um tríplice significado teológico: a) Pode indicar aquilo que diz respeito a toda Igreja Católica: neste sentido se fala dos concílios ecumênicos: b) Pode indicar, numa acepção mais ampla, aquilo que diz respeito à unidade dos cristãos e das Igrejas Cristãs sobre toda a face da terra: neste sentido se fala, desde o início do século XX, de movimento ecumênico; c) Mas pode indicar, numa acepção ainda mais ampla, mundialidade e universalidade: e neste sentido vai-se impondo o uso de expressão “ecumenismo ecumênico”, que se 37 estende aos problemas concernentes à comunidade mundial das religiões (GIBELLINI, 1998, p. 487). Esse autor afirma que as origens do movimento ecumênico, segundo pesquisas bibliográficas, situam-se nos inícios do século XIX, com o pedido do missionário batista William Carey de dar vida a uma associação geral de todas as denominações cristãs existentes nas quatro partes do mundo, pois a missão exigia das igrejas cristãs o ecumenismo. Na obra de Brockelman (2001) sobre o rejuvenescimento da fé na busca de uma existência entre meio ambiente e uma vida razoavelmente boa. A reflexão destaca que ninguém discute que a continua depredação de nosso ambiente tem ameaçado de maneira contundente nosso planeta, bem como a nossa existência. O destaque aqui é que o conflito está na busca de uma solução ao problema. Os autores sugerem que a panacéia oferecida pela ciência e pela tecnologia é demasiadamente estreita. Assim, quinze filósofos, teólogos e ecólogos discutem uma resposta a ecologia que reconheça as ferramentas da ciência, mas incluem uma solução mais espiritual, aproximam-se de uma visão mais humanista, mais holística baseada na reverência inerente inclinado para o mundo natural. Os escritores cujas orientações variam do budismo, cristianismo evangelical, catolicismo e à opinião americana nativa, exploram maneiras de se conseguir este deslocamento do paradigma, de modo a sugerir que o ambiente não é somente uma edição espiritual, mas a introdução espiritual de nosso tempo. 38 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo remete à conclusão de que na visão religiosa, a questão ambiental pode ser controlada a partir de uma posição ética que possa conduzir os programas tecno científicos, no sentido de mobilizar a população mundial a uma tomada de decisão que a situação exige. A visão sociológica apresentada neste estudo concentra-se na análise da religião como sistema cultural e de símbolos que definem e marcam as disposições e motivações dos seres humanos na história. Neste sentido, a religião pode ser mobilizadora da preservação do meio ambiente. A teologia da libertação se apresenta como base epistemológica de Boff, apontando para um desafio teológico ecumênico, onde só haverá libertação integral quando acontecer o resgate da dignidade da terra, destacando a necessidade de uma ética de ilimitada compaixão e da corresponsabilidade. Já a teologia evangelical se posiciona no sentido de que a igreja cristã deve ensinar os seus membros a respeitar o meio ambiente, atitude que faz parte do testemunho cristão, de modo que este preste atenção sobre a responsável utilização dos recursos dispensados à existência do planeta. Deve-se saber utilizá-los de modo criterioso, de modo a refletir sobre as necessidades atuais da humanidade. Não é demais ressaltar que a Educação Ambiental é elemento inserido em um contexto maior, que produz e reproduz as relações da sociedade as quais, para serem transformadas, dependem de uma educação crítica e de uma série de outras modificações nos planos político, social, econômico e cultural. A educação, ambiental ou não, é um dos mais nobres veículos de mudança na história, a conquista de um direito inalienável do ser humano, mas não age isoladamente. Entende-se que a Igreja, enquanto um espaço onde há reunião de pessoas e sabendo-se da sua influência nas atitudes cotidianas, pode-se mostrar uma grande aliada no desenvolvimento de ações de Educação Ambiental. 39 BIBLIOGRAFIA BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1999. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Atlas, 2005. BROCKELMAN, Paul. Cosmologia e Criação. A importância espiritual da cosmologia contemporânea. 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Rio de Janeiro: FEB, 2009. 41 INDICE AGRADECIMENTOS......................................................................................3 RESUMO.........................................................................................................4 METODOLOGIA..............................................................................................5 SUMÁRIO........................................................................................................6 INTRODUÇÃO................................................................................................8 CAP. I. A QUESTÃO AMBIENTAL..............................................................11 1.1 Contextualização.....................................................................................11 1.2 Sustentabilidade......................................................................................14 1.3 Educação, Ética Ambiental e Cidadania..................................................16 CAP. II. VISÃO SOCIOLÓGICA DA RELIGIÃO E MEIO AMBIENTE.........24 2.1 Função Social da Religião.......................................................................26 2.2 Sociologia da Religião.............................................................................27 CAP. III. MEIO AMBIENTE E AS DIVERSAS ABORDAGENS RELIGIOSAS.30 3.1 Teologia Bíblica.......................................................................................30 3.2 Teologia Evangelical................................................................................31 3.3 Teologia Histórica....................................................................................32 3.4 Teologia da Libertação............................................................................34 3.5 Teologia Neo-Ortodoxa...........................................................................35 3.6 Teologia Ecumênica................................................................................36 CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................38 BIBLIOGRAFIA.............................................................................................39 FOLHA DE AVALIAÇÃO..............................................................................42 42 FOLHA DE AVALIAÇÃO Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes – Instituto A Vez do Mestre Título da Monografia: Religião e Meio Ambiente Autor: Susie Hitomi Nava Tatai Data da entrega: 20/08/2010 Avaliado por: Prof. Francisco Carrera Conceito: