1 QUESTÕES AMBIENTAIS E SOCIAIS NO ESPAÇO URBANO DE SINOP (MT) Valdiney Vieira da Silva Professor da rede estadual de ensino de Mato Grosso Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT [email protected] RESUMO Os processos de degradações ambientais e sociais do espaço urbano não decorrem apenas em função de um simples desequilíbrio nas relações da sociedade com os componentes ambientais. Porém em decorrência de um complexo de problemas ambientais, sociais, econômicos e políticos que impactam diretamente o desenvolvimento das cidades. Observando a realidade de Sinop, percebemos comportamentos e fenômenos que se constituem evidências de situações de conflito. O artigo coloca em discussão se o que se propagandeia nas diversas mídias sobre a forte representação de Sinop como sendo uma cidade de vanguarda no quesito qualidade de vida e desenvolvimento socioespacial corresponde à realidade. Apresenta os resultados parciais da pesquisa de mestrado que tem como abordagem o espaço urbano de Sinop e, também, discute os resultados do trabalho de campo realizado no período de 17 a 21 de junho de 2013, como requisito parcial de avaliação da disciplina “A produção do espaço urbano”, do Programa de Pósgraduação em Geografia - Mestrado, da Universidade Federal de Mato Grosso. Palavras chaves: Questões ambientais; problemas sociais; Sinop (MT). INTRODUÇÃO A escolha do local para construir a cidade de Sinop, bem no centro da região norte do estado de Mato Grosso, às margens da BR 163 (Cuiabá – Santarém) foram determinantes no sentido de se criar uma cidade polo. Segundo Vilarinho Neto (2002, p. 92): O processo de urbanização tem provocado o crescimento intensivo das cidades em todo o território brasileiro, como também o surgimento de novos centros urbanos. Esse fenômeno é nítido na região Centro-Oeste, principalmente no estado de Mato Grosso, onde pudemos vivenciar o desenrolar desse processo. 2 O projeto urbanístico, para abrigar uma população de 150.000 habitantes foi pensado de maneira a atender as funções básicas de uma cidade planejada. E foi assim que a cidade passou a ser “vendida” para os migrantes das várias partes do Brasil, principalmente da região Sul como sendo uma das melhores cidades para se viver em Mato Grosso, conforme o Índice de Desenvolvimento Humano de 0,807 (IBGE 2000). Localizada em uma das áreas mais dinâmicas do estado de Mato Grosso, os administradores de Sinop buscaram incentivar e atrair pessoas e investimentos a fim de torna-la uma grande cidade sem contradições. De acordo com Carlos (2011, p. 68), “a sociedade produz o espaço e, ao fazê-lo, revela uma profunda contradição”. A prática tem demonstrado que o progresso historicamente centralizado, contrasta com riqueza e pobreza, ou seja, o fato de ter sido uma cidade que nasceu planejada e estruturada não conseguiu impedir que ocorressem problemas e contradições. A análise do espaço urbano está pautada em Corrêa (2001, p. 43), que afirma: A produção do espaço, seja da rede urbana, seja intraurbano, não é resultado da “mão invisível do mercado”, nem de um Estado hegeliano, visto como entidade supraorgânica, ou de um capital abstrato que emerge de fora das relações sociais. É consequência da ação de agentes sociais concretos, históricos, dotados de interesses, estratégias e práticas espaciais próprias, portadores de contradições e geradores de conflitos entre eles mesmos e com outros segmentos da sociedade. Sinop foi implantada pela Colonizadora Sinop S/A no começo da década de 1970, numa área denominada de “fronteira agrícola moderna”, que se caracteriza por atividades agrícolas com alto conteúdo tecnológico e organizacional, com a utilização de insumos e maquinários, formas de crédito e comercialização, armazenamento, beneficiamento e transporte. Resultado das políticas territoriais e dos respectivos subsídios da Superintendência da Amazônia (SUDAM) e Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste (SUDECO), situada no médio norte mato-grossense tem uma população estimada de 113.099 habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Seu projeto de colonização particular surgiu juntamente com os municípios de Vera, Cláudia e Santa Carmem. 3 Situada às margens da BR-163, o projeto urbanístico da cidade de Sinop é inspirado no traçado da cidade de Maringá (PR), apresentando características típicas das áreas de fronteira econômica agrícola. O núcleo de povoamento foi planejado e dividido em lotes rurais e urbanos, subdivididos em: residenciais, comerciais e industriais, circundados por um cinturão de chácaras de 5 a 10 hectares, para a produção de hortifrutigranjeiros. Localizada em uma das áreas mais dinâmicas do estado de Mato Grosso, Sinop tornou-se um ponto de atração migratória devido à facilidade de acesso rodoviário e à infraestrutura que a mesma possui. Segundo Souza (2005, p. 154): A construção e posterior pavimentação da BR 163 criaram condições objetivas para a ocupação da Amazônia Mato-Grossense, porém provocaram sérios problemas: impactos ambientais, através de seu desmatamento, e problemas sociais como a transferência dos índios Kayabi e Paraná para o Parque Nacional do Xingu. Os moradores de Sinop se orgulham do projeto arquitetônico e urbanístico da cidade, tido como moderno, com ruas e avenidas largas e arborizadas, dizendo-se preocupada em preservar as reservas florestais. Mas pesquisando em diversas mídias impressas, como revistas, jornais, não se constatam menção à da população indígena que outrora habitou as terras do que é hoje o município de Sinop. Mesmo no Museu Histórico de Sinop, criado por meio do decreto 015/08, que tem como finalidade preservar o patrimônio histórico e os bens culturais do município, não há registros sobre a história dos índios Kayabis e Paranás. Certamente isso ocorre porque os mesmos foram considerados “problemas” para os pioneiros na efetivação do processo de colonização de Sinop. Outra questão visível no espaço urbano é o fato de que à medida que nos afastamos do centro rumo à periferia da cidade, nota-se que a cidade tem padrão urbanístico extremamente segregador, correspondendo à análise realizada por Carlos (2011, p. 60): No capitalismo, a produção expande-se espacial e socialmente (no sentido que penetra toda a sociedade), incorporando todas as atividades do homem e redefinindo-se sob a lógica do processo de valorização do capital – o espaço tornado mercadoria sob a lógica do capital que fez com que o uso (acesso necessário à realização da vida) fosse redefinido pelo valor de troca. A produção do espaço se insere na lógica da produção capitalista que transforma toda a produção em mercadoria. 4 Desde a década de 1980, o município apresenta uma população predominantemente urbana, mas foi no ano de 2000, conforme a tabela 1 (Cf. anexo 1), que Sinop atingiu cerca de 90% da população urbana. Atualmente Sinop é a quarta cidade mais populosa do estado de Mato Grosso, conforme consta na tabela 2 (Cf. anexo 2). QUESTÕES AMBIENTAIS E SOCIAIS NO ESPAÇO URBANO A qualidade de vida urbana de Sinop está diretamente ligada a diversos fatores reunidos na infraestrutura, no desenvolvimento econômico-social e também à questão ambiental. Silva (2011, p. 25) diz que “a cidade capitalista é a cidade dos contrastes”. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), para iniciar uma gestão ambiental no município é necessário ter vontade política, buscar apoio da CNM, das federações e associações regionais, criar leis e capacitar técnicos. Segundo Moura (2012, p. 44): A partir de um levantamento feito em campanhas publicitárias especificamente nas mídias impressas da cidade, como revistas, jornais, folders públicos (produzidos pela prefeitura e secretarias municipais diversas), nota-se a forte representação de Sinop como uma cidade de vanguarda no que diz respeito à qualidade de vida e ao desenvolvimento socioespacial. Atualmente a cidade de Sinop com 33 anos de fundação, aberta no portal da Amazônia Legal é a quarta economia do estado de Mato Grosso e seus moradores se orgulham de chamá-la de “Capital do Nortão”. Formada por migrantes de todas as regiões do país, é uma cidade referência em “desenvolvimento e progresso” no contexto mato-grossense. Mas essa realidade é fruto de um processo histórico que começou na década de 1970, onde chegar à região partindo de Cuiabá, não era tarefa fácil, pois era necessário percorrer mais de 500 km atravessando trechos de cerrado e mata. Hoje a realidade é outra, haja vista que a BR-163 se encontra asfaltada e o aeroporto municipal consegue receber aeronaves de grande porte, fazendo assim com que a 5 cidade esteja conectada ao mundo. O que era mata ou cerrado se transformou em áreas incorporadas ao agronegócio, consolidando Sinop em um polo regional em todos os segmentos. Entre os motivos das pessoas que migraram para Sinop, segundo Picoli (2010, p. 37): A procura do “mel” é o objetivo de todos os migrantes, entretanto, poucos conseguem alcançá-lo, uma vez que é um fruto enigmático. Por outro lado, o sangue representa os silenciados, os que não conseguiram vencer por meio do projeto de colonização capitalista da Amazônia. O mesmo autor chama a atenção para que se relacione o processo econômico, político, social e ambiental no sentindo de perceber que mesmo com o passar do tempo, a mesma dinâmica de servir o mercado mundial continua a ocorrer, pois o mundo do consumo sempre se fez presente na região, bem como suas ações foram de cumplicidade no que tange à expropriação do homem e do seu ambiente. Sinop é uma cidade nova e rica. Pelo menos é o que se propagandeia. Um levantamento mercadológico, realizado por uma empresa de São Paulo especializada em consultoria, ajuda a responder por que Sinop é um lugar diferente. Dados cruzados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Prefeitura Municipal, da Secretaria de Indústria e Comércio, do levantamento socioeconômico e demográfico próprio, revelaram o perfil da população sinopense: nova, com um alto poder aquisitivo e renda bem distribuída. Segundo a “Revista News.com” (n. 05 2012/13), dos 116.000 habitantes de Sinop, 81,5 têm menos de 40 anos. Ainda segundo essa revista, a pouca idade da população contrasta com o poder aquisitivo. De acordo com o levantamento realizado, apenas 12,4% dos sinopenses pertencem às classes D e E, com renda familiar inferior a R$ 880.00. Quase não há pobres. A maior parte da população local, cerca de 65%, ganha acima de R$ 2.2 mil mensais. A classe A-1, com renda mensal média de R$ 23 mil, representa apenas 1% da população. Quase 4% da população estão na classe A-2, com renda mensal de R$ 9,8 mil. Sinop tem “poucos grandes ricos”. Ainda segundo o estudo, a renda local é bem distribuída. A classe “B”, de pessoas com renda média de R$ 6,2 mil, concentra 24,7% da população de Sinop. Em Mato Grosso essa mesma categoria representa menos de 13% e no país 10%. 6 Apesar do levantamento mercadológico ser favorável à cidade de Sinop, Carlos (2011, p. 70) chama atenção para: A análise do processo de produção do espaço urbano requer, portanto, a justaposição de vários níveis da realidade como momentos diferenciados da reprodução geral da sociedade, isto é, o da dominação política, o da acumulação do capital e o da realização da vida humana. Diante de tantos dados “positivos” apresentados se faz necessário questionar: Não há em Sinop sérias desigualdades socioespaciais? Também não existe uma estratificação social e uma desigualdade ao acesso pleno à vida urbana com qualidade e aos equipamentos básicos para a manutenção da existência? Segundo Cintra (1974, p. 126): Nas sociedades de classes, próprias do capitalismo, o maior dilema enfrentado pelo planejamento é o da igualdade vs. desigualdade na repartição dos benéficos coletivos. “A quem (que classes) beneficiam os planos? Consolidam desigualdades ou contribuem para atenuálas? Segundo estudos realizados por Romancini at. al. (2003), a dinâmica da produção do espaço urbano público e privado em Sinop revela a complexidade da estrutura social em classes, expressa pela segregação e formas espaciais do presente como resultado do processo histórico de ocupação. Sinop é uma cidade que se utiliza muito bem do marketing da sustentabilidade. No art. 4 do Plano Diretor estão escritos treze princípios que o regem; dentre eles: III – direito à cidade para todos, compreendendo o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura, ao transporte, aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer; IV – respeito às funções sociais da cidade e à função social da propriedade. Mas o Diagnóstico das Condições de Saneamento das Sedes dos Municípios do estado de Mato Grosso inseridos na Bacia Hidrográfica do Rio Xingu, fez uma análise dos sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário, de manejo de águas pluviais e de manejo de resíduos sólidos de 14 cidades, dentre elas Sinop. 7 Este diagnóstico apresenta dados, que mostram que o planejamento urbano de Sinop não conseguiu repartir os benefícios coletivos. Por isso é importante lembrarmos o que alerta Sposito (2011, p. 123), para que não tenhamos a tendência à visão de sobrevoo, “enxergando e analisando as sociedades e seus espaços quase sempre ‘do alto’ e de ‘longe’, como que em uma perspectiva de ‘voo de pássaro”. Antes de analisar os respectivos dados, é importante saber que para se chegar a tais informações foram avaliadas a estrutura física e operacional dos sistemas; as condições e necessidades de expansão, a oferta, qualidade e os custos dos serviços prestados; as condições ambientais, os conflitos de usos de água, impactos ambientais gerados; os conflitos de gestão dos sistemas; e os problemas de ordem técnica administrativa. Tais informações servem para subsidiar as cidades diagnosticadas na realização de estudos que contribuam para a elaboração de políticas de saneamento ambiental e que promovam a universalização dos serviços de água, esgoto, drenagem e manejo de resíduos sólidos, a melhoria da qualidade e eficiência dos serviços, o desenvolvimento de novas estruturas de prestação e regulação dos serviços, e o tratamento das questões relativas ao saneamento de forma integrada com outras políticas ligadas ao setor. Sobre os agentes de produção do espaço urbano, Rodrigues (1988, p. 20) destaca o papel do Estado : Dentre os vários agentes que produzem o espaço urbano, destacase o Estado, que tem presença marcante na produção, distribuição e gestão dos equipamentos de consumo coletivos necessários à vida nas cidades. Entre os consumos coletivos mais importantes no atual contexto histórico, destacam-se: abastecimento de água, luz, telefone e instalação de redes correspondentes; sistema viário e transporte coletivo; espaços coletivos de lazer e esporte, equipamentos e serviços de saúde, educação e habitação para as chamadas classes populares. Em Sinop, a Prefeitura Municipal sendo um dos agentes que produzem o espaço urbano, tem uma atuação extremamente precária. Isso porque não consegue distribuir e gestar de maneira eficaz os equipamentos de consumo coletivo necessários a todos os cidadãos. Os serviços de abastecimento de água, esgotamento sanitário, drenagem urbana e manejo de resíduos sólidos estão sob a 8 responsabilidade direta deste órgão. Não existem estruturas ou instalações de esgotamento sanitário e há poucas de drenagem urbana. O manejo de resíduos sólidos atende a toda a área urbana e o sistema de abastecimento de água atende somente cerca de 73% da população. Até recentemente não se conhecia investimentos, obras ou ações relevantes voltados para o manejo de resíduos sólidos em Sinop. Toda área urbana é atendida pelo serviço de limpeza pública, mas os resíduos sólidos são despejados no aterro controlado, sem os devidos cuidados e controle adequado, inerentes à técnica de disposição de resíduos. Muitos canais que fazem a drenagem das águas pluviais da cidade possuem certa quantidade de esgoto e lixo. Segundo informação do site “Só Notícias”, Sinop terá um aterro sanitário que poderá ser implantado em uma área de 700 hectares nas proximidades do bairro Camping Clube (saída para Itaúba). Ainda conforme a secretária municipal de Meio Ambiente, a definição saiu em parceria com a Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM). No entanto, apenas 100 hectares devem ser utilizados para o aterro e também atividades de reciclagem. A possibilidade de ele ser instalado em consórcio com outras cidades é discutida. Quanto à implantação e manutenção das estruturas de drenagem urbana em Sinop é de responsabilidade da Secretaria de Infraestrutura da Prefeitura Municipal. As instalações existentes cobrem apenas cerca de 50% da área urbana, o que provoca permanentemente reclamações referentes à ocorrência de empoçamentos e alagamentos nas ruas no período das chuvas. A drenagem na cidade é deficiente, visto que as galerias da região central não comportam adequadamente o volume de água a escoar. Esses problemas são recorrentes, tanto na área central como nas áreas mais afastadas do centro em consequência da pequena declividade do relevo da cidade. Ainda segundo o diagnóstico, o abastecimento de água de Sinop não tem capacidade de produção suficiente para atender à demanda devido ao alto índice de perdas, superior a 50% devido a medições inferiores ao consumo, por problemas de hidrômetros, cavaletes, fraudes, desvio de água, entre outros; e há intermitência do abastecimento em certas áreas da cidade. Quanto aos aspectos sanitários e ambientais relacionados ao abastecimento de água em Sinop, o Diagnóstico apresentou algumas observações, dentre elas: Há expressivas áreas urbanas carentes do abastecimento de água; 9 Há registros da ocorrência de numerosos casos de doenças de veiculação hídrica. Não existe um sistema público de coleta e transporte do esgoto sanitário em Sinop. São utilizadas soluções individuais, constituídas simplesmente de sumidouros, para a destinação final dos esgotos. Tal solução não é adequada à região, pois o nível do lençol freático está a pequena profundidade. Análises frequentes realizadas indicaram a contaminação do lençol freático, evidenciando a necessidade imediata de implantação do sistema de esgotamento sanitário. Atualmente, em notícia publicada pela assessoria da Secretaria de Estado de Cidades (SECID) no site da Secretaria de Estado de Infraestrutura de MT (SINFRA), Sinop terá a maior obra de saneamento básico da região Norte de Mato Grosso. Serão investidos R$ 43 milhões, sendo que R$ 35 milhões foram financiados pelo município junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e os outros R$ 8,8 milhões são uma contrapartida do Governo do Estado a fundo perdido. Com essa obra, o município que hoje não tem nenhum metro de rede coletora de esgoto, dará um salto quantitativo e qualitativo. A cidade sairá do zero e chegará a 51% de coleta e tratamento de esgoto do município. Serão construídos 206 quilômetros de rede coletora de esgoto, que atingirá 11 bairros da região central de Sinop. Todos os dejetos serão levados para uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) com capacidade para tratar 100 litros por segundo e serão feitas 116 mil ligações, tanto residenciais, quanto comerciais. Caso realmente tal obra se concretize, Sinop terá mais esgoto coletado e tratado que a Capital do Estado, que hoje apresenta índices em torno de 45%. Ainda segundo o Diagnóstico das Condições de Saneamento nas Sedes dos Municípios do Estado de Mato Grosso inseridos na Bacia Hidrográfica do Rio Xingu, são algumas das prioridades para a cidade de Sinop: Elaboração imediata de plano diretor de água e esgoto para definir as macro-estratégias de ação; Implementação de um programa de educação sanitária e ambiental para o manejo adequado de resíduos sólidos no município incluindo o desenvolvimento de ações que incentivem a reciclagem e a 10 seletividade na coleta dos resíduos sólidos, bem como a minimização da produção de lixo per capita; Implantação de sistema público de coleta e tratamento dos esgotos sanitários; Implantação de aterro sanitário onde atualmente está o aterro controlado; Implantação de sistema de drenagem (coleta, transporte e disposição final das águas pluviais) em toda a área urbana, na medida em que ocorra a pavimentação das vias públicas; Todas essas prioridades acima elencadas são ações de melhoria e ampliação dos serviços de saneamento ambiental em Sinop. Segundo a Lei Federal 11.107, no Art. 1o dispõe sobre normas gerais para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios contratarem consórcios públicos para a realização de objetivos de interesse comum e dá outras providências. Essa lei foi criada a partir de projetos que tiveram êxito e foram desenvolvidos na Europa a fim de superar segmentos públicos ineficientes. Em termos de desenvolvimento, todas as cidades, mais cedo ou mais tarde, enfrentarão contradições, pois o “progresso”, na maioria das vezes, não vem apoiado em planejamento e o crescimento não ocorre no ritmo e nas condições que permitem trazer benefícios a toda população. Toda cidade que visa incentivar a economia local para atrair pessoas que venham compor sua população, a fim de fixar residência, criando raízes, empreender e gerar riquezas, ou seja, criar um círculo virtuoso; enfrenta uma série de problemas. Com Sinop, a situação não está sendo diferente. Segundo Oliveira (2011, p. 178), “somos mais ou menos cidadãos de acordo com o espaço em que estejamos inseridos”. O que dizer diante das informações do Diagnóstico das Condições de Saneamento das Sedes dos Municípios do Estado de Mato Grosso inseridos na Bacia Hidrográfica do Rio Xingu com relação a Sinop. Será que o que propagandeia nas diversas mídias sobre a forte representação de Sinop como sendo uma cidade de vanguarda no quesito qualidade de vida e desenvolvimento socioespacial é verdadeiro? Segundo Carvalho (2009, p. 51): 11 O plano diretor é o instrumento por excelência de execução da política urbana na esfera local. Se o objetivo dessa política é “ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, o plano diretor é o instrumento para sua realização, pois a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressa no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das cidades” (art.39). Mas observando a realidade atual de Sinop, percebemos comportamentos e fenômenos que se constituem evidências das situações de conflito. Algumas dessas situações são perceptíveis, como por exemplo, a questão da rede de esgoto municipal, enquanto outras exigem instrumental mais refinado para sua identificação. Chama-nos a atenção, algumas situações de conflito, a saber: segregação socioespacial, a regularização fundiária, a produção imobiliária, contribuindo para o agravamento do processo de exclusão urbana. O que se nota é que a maioria dos procedimentos adotados pelo Estado, em geral, atende aos interesses do capital e não às necessidades da população. Para Rodrigues (2011, p. 214) “os setores imobiliários, mesmo quando não cumprem a legislação urbana e ambiental, são considerados alavancadores de desenvolvimento “sustentável” e do progresso”. Segundo a Secretária Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Sinop, uma situação de conflito que a mesma tem buscado solucionar é a regularização de loteamentos no município que não atendem à legislação vigente. Segundo a secretária, foi expedida pelo 1º Cartório Extra-Judicial de Sinop uma relação onde constam 17 loteamentos que se encontram irregulares e, conjuntamente com o Prodeurbs e a Comissão de Vereadores da Câmara Municipal de Sinop, se comprometeram a realizar a ordenação, legalização dos loteamentos da área urbana consolidada, a fim de garantir melhorias na qualidade de vida fazendo também com que a cidade cumpra sua função social. Para Lefebvre (1999), é necessário compreender como se deu o processo planificado através da dinâmica em que a cidade nasce para servir de centro do capital. Sinop foi fundada no dia 14 de setembro de 1974. A partir desta data se intensificou a chegada cada vez maior de novos moradores, que receberam da colonizadora, a título de doação, lotes para se instalarem. Por meio dessas doações foi possível alavancar o crescimento da cidade, que se transformou em polo 12 regional, destacando-se pela prestação de serviços como, por exemplo, o setor da educação superior. Isto fora percebido por Vilarinho Neto (2002, p. 367), onde ele diz que Sinop já vem demonstrando a clara vocação de transformar-se em Capital Regional, uma vez que sua influência chega a atingir cerca de trinta municípios da região norte do estado. Segundo Rodrigues (1998, p. 24): A ausência de análises consistentes sobre a produção sócio-espacial é visível em propostas de políticas públicas, onde se “planeja” o desenvolvimento com metas numéricas, onde o espaço onde se concretizarão estas metas é desconhecido (ou pelo menos não tem sido mencionado). Essa ausência de análises consistentes sobre a produção socioespacial a qual a autora se refere pode ser materializada em Sinop através do déficit habitacional, onde segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD-IBGE) mostrou que Mato Grosso é a unidade da federação com o segundo maior déficit habitacional, em termos proporcionais, no Centro-Oeste. Ele equivale a quase 12% (11,8%) do total de residências do Estado, cerca de 932,1 mil habitações. O maior problema é a coabitação nos lares, isto é, quando mais de uma pessoa ou grupos de famílias habitando um mesmo imóvel, cômodo, e que manifestam intenção de constituir um novo domicílio. O número absoluto de domicílios em situação caracterizada de déficit alcança 110.259 (IPEA), traduzindo assim a demanda explicitada. O conceito de déficit é definido a partir da avaliação de quatro componentes: moradias precárias, coabitação, o ônus excessivo com aluguel (se o peso do valor pago na locação for superior ou igual a 30% da renda domiciliar) e o adensamento excessivo em domicílios locados, ou seja, que ocorre nos locais que possuem mais de três habitantes por cômodo e que sirva como dormitório. Mas nem tudo são “flores” em Sinop. A música de Gilberto Gil retrata a realidade de muitas famílias sinopenses que não têm acesso à moradia digna. “Nos barracos da cidade, ninguém mais tem ilusão. No poder da autoridade de tomar a decisão”. Moradia digna não é apenas ter uma casa para morar. A população também deve contar com infraestrutura básica (água, esgoto e coleta de lixo) para ter habitação de qualidade – que é um dos componentes do padrão de vida “digno”. 13 No art. 5 do Plano Diretor da cidade de Sinop estão listados os treze objetivos gerais; dentre os quais se destaca: X – prevenir distorções e abusos no desfrute econômico da propriedade urbana e coibir o uso especulativo da terra como reserva de valor, de modo a assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Porém é nítido que a expansão urbana de Sinop obedece à lógica capitalista, onde grupos econômicos dominantes detêm sua influência sobre o mercado imobiliário. Ao mesmo tempo que os principais agentes produtores do espaço urbano (Colonizadora e Prefeitura Municipal) têm interesses no processo de expansão da cidade, a fim de obter mais lucro sobre o espaço urbano. Diante dessa realidade posta, quem tem condições financeiras consome a cidade, enquanto aos mais carentes resta apenas morar na periferia da cidade e lutar para que a mesma cumpra sua função social. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Sinop é considerada a “Capital do Nortão” em decorrência da diversificação econômica que passa o comércio, agroindústria, serviços, saúde, educação e as mais 40 instituições privadas e públicas, tanto estaduais quanto federais. A prefeitura municipal e a Colonizadora Sinop S/A sempre se dizem atentas com a qualidade de vida da sua população, com sua sustentabilidade econômica, social e ambiental. Porém, como lembra Rodrigues (2011, p. 222), “No espaço, está contido o tempo e, na cidade (insustentável), explicitam-se contradições e conflitos, desigualdades socioespaciais, disputas pelo poder e pela propriedade da terra”. A intensa ocupação urbana que está ocorrendo em Sinop tem como consequência a expansão do perímetro urbano. Juntamente com esse crescimento físico da cidade, está havendo a supervalorização da terra urbana o que acaba gerando uma especulação imobiliária. Qual é o limite do progresso? E o limite da preservação ambiental? Constata-se que a qualidade da vida urbana em Sinop se encontra insalubre, conforme as análises realizadas ao longo do artigo. Para Carlos (2009, p. 86), “a 14 natureza não é produto do trabalho, ela é brindada ao homem como um bem”. É preciso superar as desigualdades socioespaciais existentes por meio de um desenvolvimento integrado e harmônico, onde de fato haja respeito quanto às funções sociais da cidade. REFERÊNCIAS BRASIL, Ministério das Cidades. Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental – Programa de Modernização do Setor de Saneamento, Diagnóstico das Condições de Saneamento dos Municípios de Mato Grosso Inseridos na Bacia Hidrográfica do Rio Xingu – Sinop, 2005. CARLOS, Ana Fani Alessandri (Org.). A Geografia na sala de sula. São Paulo: Contexto, 2009. 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