O problema não é o Petróleo
Antes de tudo, quero registrar que não estou fazendo apologia do petróleo com este artigo,
mas apenas uma provocação para chamar a atenção de um ponto que considero crucial na
arena da discussão do tema energia: a intensidade energética da sociedade atual. Ou seja: a
quantidade de energia direta e indireta (embutida nos produtos e serviços) consumida por
pessoa.
O que quero discutir aqui é:
“O quanto eu consumo de energia para satisfazer minhas necessidades e o quanto esta
quantidade vem crescendo ao longo dos anos para uns e o quanto estagnou para outros”.
E não exclusivamente pensar em “como posso substituir o petróleo por outras fontes mais
limpas e renováveis”, porém mantendo o mesmo padrão atual de uso e/ou apropriação de
recursos.
Por quê? Por que a substituição do petróleo por outras fontes – mantendo o mesmo padrão
de consumo atual – poderá mitigar o risco do aquecimento global, porém tem grande
potencial de gerar outros problemas ambientais, sociais e econômicos. Seria apenas trocar
de problema...
Isto aconteceria porque toda fonte de energia, para ser transformada em trabalho, gera
algum tipo de impacto na natureza. A fragilidade da geração de energia elétrica através das
células fotovoltaicas, por exemplo, são as baterias necessárias para armazenar a energia.
Imagine o impacto no meio ambiente do descarte de milhões de baterias (que contem
metais pesados) se pudéssemos substituir todo o petróleo por esta tecnologia! Não teríamos
o aquecimento global, mas em compensação teríamos lençóis freáticos contaminados.
Isso quer dizer que não devemos pensar em uma matriz energética menos dependente do
petróleo? De maneira nenhuma!
Quer dizer que, além de pensarmos em como será feita está transição de fontes, precisamos
pensar em como será a transição para uma vida de menor intensidade energética.
A figura ao lado mostra que, durante mais
de 100 mil anos a humanidade aumentou
sua intensidade energética em 0,0004 vezes
ao ano e, nos últimos 600 anos, este índice
passou para 0,5 vezes por ano. Um
crescimento de 125.000%.
Entretanto, mesmo com este grande
crescimento do consumo de energia, uma
questão imprescindível de se considerar
neste quebra-cabeça, é que existe uma
grande parte da população mundial que
consome menos energia do que necessitaria
para satisfazer ao menos suas necessidades
básicas. Complicou não é?
Ou seja, vemos que o acesso a esta energia
é desigual no planeta. Caso fosse bem
distribuída, nossa intensidade energética
média seria ainda maior!
O desafio, portanto, é muito maior, visto que não podemos negar acesso a este recurso a
fim de aumentar a qualidade de vida de grande parte da população mundial.
Em 2007 o mundo disponibilizou o equivalente à energia contida em mais de 12 bilhões de
toneladas de petróleo (tep*), o que resulta em uma média de 1,8 tep/por pessoa (EIA,
2009).
O gráfico a seguir mostra a evolução da intensidade energética do Mundo e também de
alguns grupos de países divididos conforme sua participação ou não na Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico**- OCDE. A população toda da China, Índia,
Brasil, incluída no grupo de países fora da OCDE, apresentou uma média de 1,13 tep/por
pessoa em 2007, enquanto os países do grupo da OCDE América do Norte apresentaram
uma intensidade energética de 6,34 no mesmo ano. Isto significa que, considerando a
população mundial de aproximadamente 6,5 bilhões de pessoas, mais de 5 bilhões delas,
incluídas no grupo de países FORA da OCDE, consomem menos do que a média mundial
(1,82 tep/pessoa) e as restantes 1,5 bilhões de pessoas chegam a consumir de 3 a 5 vezes
mais!
Intensidade energética
Fonte: EIA, 2009
A solução não é atingirmos o patamar de 6 tep/pessoa/ano, mas também não é restringir a
todos sem diferenciação. Sabemos que na média dos papíses fora da OCDE tem muita
energia a ser utilizada para colaborar com melhora da qualidade de vida destas 5 bilhões de
pessoas.
Se considerássemos por exemplo, que 2,5 tep/pessoa/ano seria a intensidade enegética
“ideal” para o mundo, já teríamos um acréscimo de necessidade de energia disponível
equivalente a mais 4 bilhões de toneladas de petróleo/ano. Isso mesmo considerando que
os países com intensidade energética maior que isso, fossem reduzir sua intensidade.
Sob esta ótica, considero que até para o Petróleo haveria lugar na matriz energética,
avaliando regionalmente qual seria sua aplicação mais útil e mais difícil de ser substituída,
por exemplo.
Nas próximas “escritas”, posso apresentar uma visão geral dos impactos que as demais
fontes de energia podem causar.
Assim, será possível termos ferramentas que poderão colaborar com a desmistificação dos
assuntos e o amadurecimento das decisões que convergem na criação de nosso futuro.
* tep – tonelada equivalente de petróleo – medida utilizada para uniformizar a quantidade de energia das diversas fontes de energia
utilizadas (petróleo, solar, hidráulica, etc)
** Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é uma organização internacional e intergovernamental que agrupa
os países mais industrializados da economia do mercado. Tem sua sede em Paris, França. Na OCDE, os representantes dos países membros
se reúnem para trocar informações e definir políticas com o objetivo de maximizar o crescimento econômico e o desenvolvimento dos
países membros.
Países membro da OCDE: Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Coréia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França,
Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Noruega, Nova Zelândia, Polônia, Portugal, Reino Unido,
República Checa, República Eslovaca, Suécia, Suíça, Turquia
Escrito por: Mariana de Oliveira Pedreira, doutoranda em Energia, PPGE-USP. Maio-2010
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