Centro Universitário de Caratinga - UNEC
Programa de Pós-Graduação Meio Ambiente e
Sustentabilidade
Mestrado Profissional
ANIELY CONEGLIAN SANTOS
PERCEPÇÃO DAS FAMÍLIAS DO PROCESSO DE
REALOCAÇÃO DECORRENTE DA INSTALAÇÃO DA USINA
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI NO MUNICÍPIO DE PERIQUITO MG
CARATINGA
Minas Gerais - Brasil
Dezembro, 2009
Centro Universitário de Caratinga - UNEC
Programa de Pós-Graduação Meio Ambiente e
Sustentabilidade
Mestrado Profissional
ANIELY CONEGLIAN SANTOS
PERCEPÇÃO DAS FAMÍLIAS DO PROCESSO DE
REALOCAÇÃO DECORRENTE DA INSTALAÇÃO DA USINA
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI NO MUNICÍPIO DE PERIQUITO MG
Dissertação
apresentada
ao
Centro
Universitário de Caratinga, como parte das
exigências do Programa de Pós-Graduação
em Meio Ambiente e Sustentabilidade, para
obtenção do Título de Magister Scientiae.
Orientadora: Prof. D.Sc. Pierina German
Castelli
CARATINGA
Minas Gerais - Brasil
Dezembro, 2009
AUTORIZO A REOPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL
DESTE TRABALHO POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU
ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA
A FONTE.
Catalogação na publicação
Serviço de Pós Graduação Meio Ambiente e Sustentabilidade
Universidade de Caratinga – UNEC
Santos, Aniely Coneglian.
Percepção das famílias do processo de realocação
decorrente da instalação da Usina Hidrelétrica de Baguari
no município de Periquito – MG. Aniely Coneglian Santos.
____ Caratinga: UNEC, 2009, 150p.
1 Impactos Socioambientais
2 Hidrelétrica
3 Realocação
4 Lugar
5 Legislações Ambientais
6 Atingidos por Barragens
CDD:
ANIELY CONEGLIAN SANTOS
PERCEPÇÃO DAS FAMÍLIAS DO PROCESSO DE
REALOCAÇÃO DECORRENTE DA INSTALAÇÃO DA USINA
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI NO MUNICÍPIO DE PERIQUITOMG
APROVADA EM:
Prof. D.Sc. Pierina German Castelli
(Orientadora)
Prof.PhD. Franklin Daniel Rothman
(Convidado)
Prof. D. Sc. Marcos Alves Magalhães
(Convidado)
Prof. D.Sc. Leopoldo Loreto Charmelo
(Convidado)
ii
A Ponte
A necessidade de crescimento
Pessoal, empresarial
De dirigentes e dirigidos
De nação, mundo
De se emparelhar as nações
Nações do mundo
Modernidade
Aumento populacional
Diversificação industrial
Demanda energética
Energia gerada pelas barragens hidrelétricas
Energia humana, espiritual
Energia contida em nós
Nossas casas, nossas coisas
Nossa jarra, nosso alimento
Nossa ponte que nos leva
A outras situações
A outras pontes...
A outros sistemas
A outros ecossistemas...
E o homem, sua família
Sua história, seus relacionamentos
Psicossociais, sua escola, seu vizinho
Sua parteira, curandeiro
Seu hospital
Suas plantas, seu pomar...
E a flora e a fauna?...
O desenvolvimento global
É justo e necessário.
Que o homem
Principal ator desse desenvolvimento
Seja colocado em lugar de destaque
Com respeito, transparência, justiça
Sem ferir seu mundo
Sua esperança...sua alma!
Anna Maria Moreira
iii
AGRADECIMENTOS
A Deus, por me guiar até aqui!
Aos meus pais, exemplo de dedicação luta, e grandes incentivadores
desta e de tantas outras trajetórias de conquista em minha vida. Muito
Obrigada!
Ao meu irmão Vinícius, pela demonstração de sabedoria e apoio. Você é
um exemplo. Obrigada por tudo!!
Ao meu esposo Bruno, pela atenção, carinho, dedicação e compreensão
que se refletiu em todos os momentos em que estive ausente. Também
agradeço ainda pela sua presença diante dos trabalhos de campo. Obrigada,
amor!
À Professora Pierina, por ter assumido no meio desta trajetória a
orientação desta pesquisa. Obrigada pela atenção!
Ao Professor Luiz Cláudio, o qual foi o grande incentivador desta
pesquisa.
A Kelly, minha amiga, “companheira” e acima de tudo pessoa que me
estimulou a nunca perder minha indignação diante das atitudes injustas durante
o processo de construção deste estudo. Valeu amiga! Ainda escreveremos
nosso livro!
A Telma, amiga de profissão e grande espelho para meus projetos na
Saúde Pública. Obrigada pelos livros, sugestões e orientações conferidas
durante o processo de elaboração de minha Dissertação!
iv
Verônica, pessoa fundamental que me auxiliou na tradução dos dados,
formatação da dissertação! Meu muito obrigada!
Viviane e Jehonathan, obrigada pelo apoio nas pesquisas de campo.
A professora Michelle que contribuiu com seus conhecimentos.
Não poderia deixar de agradecer aos meus amigos Ângela e Adelmo, que
se dispuseram com grande prazer a auxiliar na fase final da coleta dos dados.
À Josiane, companheira, que algumas vezes me substituiu no trabalho
enquanto estive ausente para realização da pesquisa. Obrigada pelo apoio!
Aos amigos Nereu e Sabrina por me auxiliarem no momento de conclusão
dessa pesquisa.
À Tia Ana, pessoa inspiradora, e grande incentivadora! Obrigada pelo
carinho!
Libera, representante da população estudada, foi exemplo de luta e
conquistas diante de todo esse processo de implantação da UHE.
À todos os representantes das famílias em estudo, por terem aberto as
portas de suas casas para a realização desta pesquisa. Meu muito Obrigada!
Sem a colaboração de vocês nada disso seria possível!
A Dona Maria, que com seu carinho, e atenção, abriu as portas da sua
casa para nos acolher durante as fases de pesquisa.
As minhas amigas do Mestrado que compartilharam comigo os finais de
semana, no trajeto Ipatinga-Caratinga, e em sala de aula.
Também não poderia deixar de agradecer à Sandra Murta, pessoa que
não conheço pessoalmente, mas que contribuiu de maneira fundamental
enviando prontamente sua Dissertação de Mestrado.
Enfim, a todos os amigos que direta ou indiretamente contribuíram para a
concretização desta pesquisa. Concluímos mais uma fase de estudos!!!
v
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS .......................................................................X
LISTA DE ABREVIATURAS .......................................................... XI
RESUMO ...................................................................................... XIII
ABSTRACT .................................................................................. XV
APRESENTAÇÃO ...................................................................... XVII
INTRODUÇÃO ................................................................................ 1
CAPÍTULO 1 ................................................................................... 9
REALOCAÇÃO DE FAMÍLIAS NA IMPLANTAÇÃO DE
EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS ...................................... 9
1.1 HISTÓRIA DA ENERGIA HIDRELÉTRICA .............................................................. 9
1.1.1 O Marco do Referencial Hidrelétrico Brasileiro ........................................11
1.2 CLASSIFICAÇÃO DE USINAS HIDRELÉTRICAS ...................................................16
1.3 IMPACTOS SOCIAIS
NO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DE
USINAS HIDRELÉTRICAS
.......................................................................................................18
1.4 ESPAÇO, LUGAR E TERRITÓRIO: INFLUÊNCIAS SOBRE A SOCIEDADE ..................24
1.4.1 A busca da sociedade em defesa da Terra ..............................................27
1.4.2 A Importância da Comissão Mundial de Barragens diante de
empreendimentos hidrelétricos .........................................................................31
1.5 RELAÇÃO SOCIEDADE – NATUREZA .................................................................36
1.6 REALOCAÇÃO DE POPULAÇÃO .......................................................................38
1.6.1 Desapropriações ......................................................................................38
vi
1.7 REALOCAÇÃO DE POPULAÇÃO EM EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS ............40
CAPÍTULO 2 ................................................................................. 43
MEDIDAS AMBIENTAIS ENVOLVIDAS NO PROCESSO DE
IMPLANTAÇÃO DA USINA HIDRELÉTRICA BAGUARI ............. 43
2.1 IMPACTOS AMBIENTAIS
GERADOS POR IMPLANTAÇÃO DE
HIDRELÉTRICAS
E AS
LEGISLAÇÕES ENVOLVIDAS ..................................................................................43
2.2 IMPACTOS ESPERADOS PELO EMPREENDEDOR DA UHE BAGUARI ....................52
2.2.1 Saúde .......................................................................................................52
2.2.2 Saneamento Básico .................................................................................53
2.2.3 Habitação .................................................................................................55
2.2.4 Educação .................................................................................................55
2.2.5 Recursos Hídricos e Agropecuária ...........................................................56
2.2.6 Segurança e Lazer ...................................................................................57
2.3 ACORDO
FIRMADO ENTRE A
POPULAÇÃO ALVO
DE
REALOCAÇÃO
DA
ÁREA
URBANA E O EMPREENDEDOR ..............................................................................58
CAPÍTULO 3 ................................................................................. 60
O MUNICÍPIO DE PERIQUITO E A IMPLANTAÇÃO DA USINA.. 60
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI ..................................................... 60
3.1 CARACTERIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE PERIQUITO ...............................................60
3.2 A USINA HIDRELÉTRICA DE BAGUARI ..............................................................66
3.3 AS INTERFERÊNCIAS DA USINA DE BAGUARI EM PERIQUITO ..............................71
3.3.1 Realocação de famílias da Rua Francisco Diniz, Distrito de Pedra Corrida
do município de Periquito ..................................................................................73
3.3.2 Realocação de famílias da Rua Beira Linha, sede do município de
Periquito..................... .......................................................................................75
CAPÍTULO 4 ................................................................................. 77
ESTUDO DA REALOCAÇÃO DAS FAMÍLIAS AFETADAS PELA
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI NO MUNICÍPIO DE PERIQUITO 77
4.1 ESTUDO DAS FAMÍLIAS AFETADAS NA FASE DE PRÉ-REALOCAÇÃO ....................78
4.1.1 Grau de Insatisfação dos Moradores a serem Realocados .....................80
4.1.2 Grau de Satisfação dos Moradores a serem Realocados ........................94
4.2 ESTUDO DAS FAMÍLIAS AFETADAS NA FASE DE PÓS-REALOCAÇÃO, IDENTIFICANDO
A PERCEPÇÃO DAS FAMÍLIAS EM RELAÇÃO AO SEU NOVO LOCAL DE MORADIA ..........99
vii
4.2.1 Grau de Insatisfação dos Moradores Realocados .................................100
4.2.1 Grau de Satisfação dos Moradores Realocados ....................................107
CONCLUSÃO.............................................................................. 111
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................ 115
ANEXOS ..................................................................................... 127
ANEXO 1 – QUESTIONÁRIO PRÉ-REALOCAÇÃO.....................................................128
ANEXO 2 – QUESTIONÁRIO PÓS-REALOCAÇÃO ....................................................129
ANEXO 3 – TERMO DE CONSENTIMENTO ..............................................................130
ANEXO 4 – PRÉ-REALOCAÇÃO: RUA FRANCISCO DINIZ (DISTRITO
DE
PEDRA
CORRIDA): ........................................................................................................132
ANEXO 5 – PRÉ-REALOCAÇÃO: RUA BEIRA RIO (SEDE – PERIQUITO) ..............133
ANEXO 6 – INÍCIO DAS OBRAS NA ÁREA URBANA DE ALVO DE REALOCAÇÃO ...........134
ANEXO 7 – EVOLUÇÃO DAS OBRAS .....................................................................135
ANEXO 8 – CONCLUSÃO DAS OBRAS DE REALOCAÇÃO .........................................136
ANEXO 9 – EVOLUÇÃO
DA CONCENTRAÇÃO DAS USINAS HIDRELÉTRICAS NO
BRASIL
...........................................................................................................137
viii
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - CLASSIFICAÇÃO DE USINAS HIDRELÉTRICAS QUANTO À POTÊNCIA....... 18
TABELA 2: MUNICÍPIOS AFETADOS PELO RESERVATÓRIO - EXTENSÃO LINEAR ........ 52
TABELA 3: TIPOLOGIA DAS CASAS PARA REALOCAÇÃO ................................................ 59
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: “prainha” ..................................................................................................................... 58
Figura 02: Local de implantação da UHE Baguari - Imagem de Satélite ................................... 61
Figura 03: Vista da sede do município de Periquito, à esquerda a BR 381 e a direita o Rio
Doce. ........................................................................................................................................... 62
Figura 04: Vista Parcial da Rua Beira Linha sendo do município de Periquito .......................... 63
Figura 05: Rua Francisco Diniz , Distrito de Pedra Corrida, município de Periquito-MG. .......... 64
Figura 06: Rua Beira Linha , sede do município de Periquito-MG. (A) área a ser inundada ..... 65
Figura 07: Casas da Rua Beira Linha, sede do município de Periquito-MG .............................. 65
Figura 08: Casas da Rua Francisco Diniz, Distrito de Pedra Corrida, município de Periquito/MG.
..................................................................................................................................................... 66
Figura 09: Construção da Hidrelétrica de Baguari ...................................................................... 67
Figura 10: Construção da Hidrelétrica de Baguari ...................................................................... 68
Figura 11: Usina Hidrelétrica de Baguari, fase do enchimento do Reservatório. ....................... 68
Figura 12: Visão panorâmica da Usina Hidrelétrica de Baguari ................................................. 70
Figura 13: UHE Baguari após enchimento do reservatório. ....................................................... 70
Figura 14: UHE Baguari após enchimento do reservatório. ....................................................... 71
Figura 15: UHE Baguari após enchimento do reservatório. ....................................................... 71
Figura 16: Rua Francisco Diniz. Demonstrando a amplitude dos quintais, com muitas árvores
frutíferas. ..................................................................................................................................... 81
Figura 17: Margem do Rio Doce com bote para travessia ......................................................... 92
Figura 18 Rua Francisco Diniz. Demonstrando as trincas do lado externo................................ 96
Figura 19: Casa da Rua Beira Linha. Demonstrando a precariedade das casas no local. ........ 97
Figura 20: Casas na Rua Beira Linha. Demonstrando a proximidade do Rio. ......................... 105
x
LISTA DE ABREVIATURAS
ABNT: Associação Brasileira de Normas Técnicas
ADA: Área Diretamente Afetada
AE: Área de Entorno
AI: Área de Influência
ANEEL: Agência Nacional de Energia
CEMIG: Companhia Energética de Minas de Gerais
CMB: Comissão Mundial de Barragens
CME: Companhia Mineira de Eletricidade
CNEC: Empresa – CNEC – Engenharia S.A.
CONAMA: Conselho Nacional do Meio Ambiente
COPAM: Conselho de Política Ambiental
COPASA: Companhia de Saneamento de Minas Gerais
DIENE: Divisão de Infra-Estrutura de Energia
DST‟s: Doenças Sexualmente Transmissíveis
EIA: Estudo de Impactos Ambientais
EPI‟s: Equipamentos de Proteção Individual
FEAM: Fundação Estadual do Meio Ambiente
FMI: Fundo Monetário Internacional
IBAMA: Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis
ICOLD: Comissão Internacional sobre Grandes Barragens
INCRA: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IUCN: União Internacional para a Conservação da Natureza
xi
MAB: Movimento dos Atingidos por Barragens
MAIA: Manual de Avaliação de Impactos Ambientais
MME: Ministério de Minas e Energia
NBR: Normas Brasileiras
NEPA: National Environment Policy Act
ONU: Organização das Nações Unidas
PAC: Plano de Aceleração de Crescimento
PIB: Produto Interno Bruto
PND: Programa Nacional de Desestatização
PNMA: Programa Nacional do Meio Ambiente
RIMA: Relatório de Impactos Ambientais
SISNAMA: Sistema Nacional do Meio Ambiente
UHE: Usina Hidrelétrica
xii
RESUMO
SANTOS, Aniely Coneglian. Centro Universitário de Caratinga, dezembro de
2009. Percepção das famílias do processo de realocação decorrente da
instalação da Usina Hidrelétrica de Baguari no município de Periquito-MG.
Professora Orientadora: D.Sc.Pierina German Castelli.
Durante o século XX a energia elétrica foi considerada de importância nacional,
e o Brasil, que possui um grande potencial hídrico, executou o planejamento do
aproveitamento de todos os seus recursos para a instalação de várias
hidrelétricas. Os impactos gerados por estes empreendimentos podem
transformar a paisagem e principalmente, influenciar na maneira como os
homens vivem e se organizam sobre determinados lugares. Diante destes
aspectos, a presente pesquisa busca estudar o processo de realocação das
famílias da região urbana afetadas pela instalação da UHE Baguari no
município de Periquito/MG. Para a realização deste estudo, utilizou-se como
base
metodológica,
entrevistas
semi-estruturadas
com
a
população
diretamente afetada da área urbana, com análise qualitativa, e sendo
caracterizado como estudo de caso. O período de levantamento dos dados
ocorreu a partir de maio de 2007 a setembro de 2009, abordando 77 famílias
alvo de realocação. Os resultados evidenciados com esta pesquisa,
demonstraram a real necessidade de fontes de energia elétrica para estimular
o desenvolvimento, porém estas podem ser obtidas de outras formas além da
geração hidrelétrica, e que apesar de toda melhoria que tem sido realizada nos
xiii
processos de implantação de Hidrelétricas, os transtornos ocasionados em
relação a realocação de populações sempre vão existir, mas se houver a
participação popular desde o princípio destes processos os impactos serão
minimizados.
Palavras-chave: Impactos Socioambientais; Hidrelétrica; Realocação; Lugar;
Legislações Ambientais; Atingidos por Barragens
xiv
ABSTRACT
SANTOS, Aniely Coneglian. Centro Universitário de Caratinga, December
2009. Perception of the families of the relocation process resulting from the
installation of Power Plant in the city of Baguari Periquito – MG. Professor: D.
Sc. Pierina German Castelli.
During the twentieth century, electrical power was considered nationally
important, and Brazil, which has a great hydric potential, executed the planning
of using all its resources for the settlement of many power plants. The impact
caused by these enterprises can transform the landscape and mainly influence
the way mankind live and organize itself in specific places. Considering these
aspects, the current research seeks to study the process of realocation of the
urban families affected by the settlement of Baguari Power Plant in the town of
Periquito / MG. For the realization of this study, semi-structured interviews with
directly affected people in the urban area were used as methodological basis
with qualitative analysis and being characterized as a case study. The period of
data raising occurred from May 2007 to September 2009, approaching 77
families target of realocation. The results of this research showed the real
necessity of power sources to stimulate the development, but these ones can
be obtained fromother forms besides hydroelectrical generation, and that,
despite all the improvements that have been made in the processes of the
power plants settlement, the troubles regarding the realocation of populations
xv
are always going to exist, but if there is people participation since the beginning
of these processes, the impacts are going to be minimized.
Key words: Dams; Socio-environmental Impacts; Power Plant; Realocation;
Place; Environmental Legislation.
xvi
APRESENTAÇÃO
O estudo surgiu através da vivência e experiência do trabalho de
Consultoria realizado durante a fase do Mestrado em Meio Ambiente, que
despertou o interesse em conhecer o modo de vida de uma determinada
população angustiada diante dos possíveis impactos que poderiam sofrer com
a implantação de uma Usina Hidrelétrica local.
Esta pesquisa traduz o esforço empreendido nos últimos anos para
elaboração e desenvolvimento de um estudo diante das situações vividas por
uma comunidade afetada pela implantação da Usina Hidrelétrica de Baguari,
onde está voltada para os aspectos relacionados às questões da realocação de
diversas famílias residentes em área urbana.
A população em estudo apresenta sua característica histórica, de um
povo que durante anos e anos foi “esquecido” por um grande processo
evolutivo, apresentando um “lugarejo” repleto de vivências (porém como se
estivesse “parado” no tempo). A simplicidade e mesmo ingenuidade presentes
na comunidade não impediu que esta se organizasse para ter sua
representatividade expressa diante da transformação que ocorreria neste lugar
e que iriam mudar de modo radical suas vidas.
O contato contínuo por dois anos e meio de estudo, trouxe um
aprendizado diferenciado, onde os aspectos profissionais foram estimulados e
a impressão pessoal foi marcada pela necessidade de se resgatar as coisas
simples da própria vida, presentes no nosso cotidiano e que por muitos e
xvii
muitos momentos passaram despercebidas na correria do dia a dia, como
conseqüência do processo de desenvolvimento.
xviii
INTRODUÇÃO
Durante o século XX a energia elétrica foi considerada de importância
nacional, e o Brasil, que possui um grande potencial hídrico, executou o
planejamento do aproveitamento de seus recursos hídricos com a instalação de
várias hidrelétricas (BERMANN e FERNANDES, 2004).
Para a Comissão Mundial de Barragens (CMB), estas podem gerar
benefícios para a agricultura de irrigação, para ajudar a controlar inundações e
gerar energia elétrica, por outro lado podem desencadear grandes processos
desastrosos e irreversíveis, como alterar e desviar os rios, produzindo impactos
significativos nos meios de subsistência e no meio ambiente (CMB, 2000a).
Os impactos gerados por estes empreendimentos – entre outros vários,
fundamentalmente a inundação de áreas - podem transformar a paisagem e a
forma de exploração dos recursos naturais e, principalmente, influenciar na
maneira como os homens vivem, exploram e se organizam sobre determinados
lugares. Na área social, existem vários impactos que podem modificar o perfil
da sociedade de cada local atingido por este processo.
Segundo Piacenti et al. (2003), os maiores impactos desencadeados são
os de reassentamentos, desapropriações e migrações que podem alterar a
dinâmica demográfica e de vida. O movimento populacional pode ser
caracterizado pela demanda de mão-de-obra para a construção das barragens,
pela transferência de famílias do seu lugar de origem e suas historias pela
dinamização do comércio e da indústria local com os fluxos migratórios.
1
Neste contexto, a proposta é analisar todo o processo de realocação das
famílias referentes à área urbana que estão sendo afetadas pela instalação da
Usina Hidrelétrica (UHE) de Baguari, que residem ou residiam especificamente
nas Ruas Francisco Diniz situada no Distrito de Pedra Corrida e Beira Linha na
sede do município de Periquito, desde o momento da negociação, a mudança
do lugar de origem, e a avaliação do novo lugar de moradia.
A expectativa deste trabalho é que se possa demonstrar a relevância
sobre os aspectos que envolvem todo o processo de mudança de lugar das
famílias
que
são
diretamente
atingidas
por
estes
empreendimentos,
contribuindo assim para a melhoria da qualidade da avaliação e monitoramento
dos impactos ambientais no setor.
Historicamente, tem ocorrido uma grande expansão do setor energético
no Brasil, uma vez que este possui um grande potencial hídrico. Esta evolução
tem gerado situações de conflito direto ou latente em diversas comunidades
que são diretamente atingidas pela instalação de Usinas Hidrelétricas (UHE).
Entre as principais interferências diretas e indiretas advindas da
implantação de Usinas Hidrelétricas nas comunidades, destacam-se: a
realocação de populações para outras regiões. A análise da realocação de
famílias que são afetadas pela instalação de UHE, se faz necessário para
compreender quais impactos sociais são gerados por conseqüências de um
empreendimento como este, onde muitas vezes pode ocorrer a ruptura
expressiva nos estilos de vida destas famílias.
Atualmente no Brasil, tais impactos sociais podem apresentar um
significativo aumento, uma vez que o país optou por priorizar a geração de
energia elétrica a partir dos recursos hídricos.
Segundo Parmigiani (2006), apesar do vasto material sobre Hidrelétricas,
existem poucas pesquisas analisando de forma global o processo de
realocação
das
famílias
que
sofrem
com
a
implantação
destes
empreendimentos, ou seja, envolvendo desde a negociação, a fase que
antecede a “mudança de lugar”, até a fase de adaptação ao novo local de
moradia.
Normalmente, os estudos restringem-se apenas à avaliação dos impactos
e, posterior definição de medidas ambientais voltadas para a negociação e a
realocação, negligenciando o acompanhamento pós-início da operação do
2
empreendimento até sua finalização. Alguns estudos deveriam ser realizados a
fim de examinar histórias de vida das famílias destes lugares a serem afetados.
Diante do exposto, no intuito de fornecer maiores subsídios sobre todo o
processo que engloba a mudança de lugar das famílias afetadas por este tipo
de empreendimento, pensando na expansão energética que o país está
vivenciando, houve o interesse e motivação para a elaboração desta pesquisa.
Como diz Turatti (2001, p.01), “a energia também é objeto do campo
social”,
portanto
observar
este
contexto
social
é
fundamental
para
amenizarmos os impactos referentes às transformações geradas por novas
hidrelétricas.
Optou-se por analisar as famílias que residem no município de Periquito
porque este faz parte da Área Diretamente Afetada (ADA) que se localiza a
montante da instalação da UHE de Baguari, e que apresentará impactos
relevantes na realocação de famílias diante da expectativa do empreendedor.
Neste trabalho colocamos como objetivo geral estudar o processo de
realocação das famílias da região urbana afetadas pela instalação da UHE
Baguari, residentes nas ruas Beira Linha, localizada no distrito sede do
município de Periquito e Francisco Diniz, localizada no Distrito de Pedra
Corrida deste município.
Para tal colocamos como objetivos específicos: 1) Caracterizar os
aspectos socioeconômicos do município de Periquito e as interferências que
poderão surgir a partir da implantação da Usina Hidrelétrica de Baguari 2)
Analisar os aspectos e impactos sociais, bem como a efetividade das medidas
ambientais envolvidas no processo de implantação da Usina Hidrelétrica de
Baguari referente à realocação das famílias, no período de maio de 2007 até
junho de 2009; 3) Descrever o grau de satisfação e ou insatisfação das famílias
antes e após a realocação. 4) Identificar a percepção das famílias alvo de
realocação em relação ao seu novo local de moradia
Atualmente o país tem buscado padrões adequados de sustentabilidade
energética, mediante tantas transformações, mas preservando o enfoque
ambiental, a análise dos fenômenos que envolvem os agentes sociais tem
ganhado relevante espaço, o que desperta o interesse na abordagem das
diferentes problemáticas que abordam os impactos socioambientais de um
empreendimento hidrelétrico.
3
Tendo em consideração a necessidade de aprimoramento do setor
energético com a finalidade de se atingir as metas de desenvolvimento
econômico que se colocou o país, o presente estudo buscou contemplar a
identificação real das questões que influenciam no processo de realocação
aplicando nesta pesquisa um caráter qualitativo e exploratório, sendo o
delineamento da pesquisa adotado como estudo de caso, abordando a análise
da realocação de famílias na área urbana do município de Periquito, focando a
área diretamente afetada pela instalação da UHE de Baguari, a partir das
experiências, sentimentos, visão e satisfação diante do processo de
negociação e realocação da população diretamente afetada.
De acordo com Gil (1999, p.41), as pesquisas exploratórias, têm como
objetivo “proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a tornálo mais explícito”. Neste tipo de pesquisa está incluso levantamento
bibliográfico, entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o
problema pesquisado e análise de exemplos.
Segundo Silva (2001) a pesquisa qualitativa considera que há uma
relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável
entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido
em números. A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são
básicas no processo de pesquisa qualitativa. Não requer o uso de métodos e
técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para coleta de dados e
o pesquisador é o instrumento-chave. Os pesquisadores tendem a analisar
seus dados indutivamente. O processo e seu significado são os focos principais
de abordagem.
As famílias alvo de realocação que foram avaliadas residem ou residiam
especificamente na Rua Francisco Diniz e Rua Beira Linha, assim sendo a
pesquisa foi realizada com as famílias que residem ou residiam nas respectivas
ruas a partir do início das obras, que ocorreram em maio de 2007. Conforme
dados levantados a partir do Termo de Acordo com as famílias a serem
realocadas e o Consórcio Baguari, constavam 16 famílias pertencentes à Rua
Beira Linha e 61 famílias referentes à Rua Francisco Diniz; totalizando um
número de 77 famílias a serem acompanhadas. De acordo com CNEC (2002),
quando da realização da pesquisa para a elaboração do EIA foi solicitada a
participação de um representante de cada família do processo.
4
A amostra estabelecida para o estudo foi de 30% (trinta por cento) das
famílias alvo de realocação, porém foram realizadas 30 entrevistas em cada
fase
(pré-realocação
e
pós-realocação),
sendo
então
contemplados
aproximadamente 39% (trinta e nove) da amostra.
Esta pesquisa foi realizada através de entrevistas elaboradas a partir de
um questionário semi-estruturado, isto é, englobando perguntas abertas e
fechadas, aplicados a um representante de cada família em questão, levando
em consideração sua maioridade e vínculo com o proprietário ou responsável
pelo imóvel. O modelo semi-estruturado é uma forma de poder explorar mais
amplamente uma questão, permite ao entrevistado um discurso mais livre e,
em geral, as perguntas são abertas (MARCONI e LAKATOS, 2005).
A entrevista foi desenvolvida em duas etapas fundamentais, onde a
primeira ocorreu em janeiro de 2009, antes da mudança do imóvel e em plena
fase de construção das novas moradias onde denominamos de fase prérealocação, utilizou-se de um questionário contendo 10 (dez) questões abertas
(ANEXO 1); a segunda etapa foi realizada após o processo de realocação e
destruição da moradia antiga, sendo esta no período de setembro de 2009,
onde denominamos de fase pós-realocação, onde utilizou-se de um
questionário composto por 08 (oito) questões abertas e fechadas (ANEXO 2).
Foram realizadas diversas visitas ao local de estudo, algumas enquanto a
pesquisadora trabalhava com a equipe técnica contratada para a produção dos
Relatórios de Monitoramento de Impactos Socioeconômicos pela AMPLO
Consultoria, e outras pela própria pesquisadora para construção desta
Dissertação, que ocorreram no período de março de 2007 a setembro de 2009.
Houve participação da pesquisadora em reuniões com os representantes
do empreendedor (Consórcio Baguari) no município de Governador Valadares,
assim como visita ao sistema de barragem e reservatório, ao reassentamento
rural dos meeiros, aos distritos e municípios afetados e principalmente as
famílias alvo de realocação da área urbana, conforme fotos presentes nos
ANEXOS 4 e 5.
A percepção da fala dos “afetados” (atores da pesquisa) foram realizadas
em diversas fases do estudo, compreendendo os momentos de reuniões,
contatos telefônicos, e até mesmo na solicitação de permissão para a
apresentação dos dados obtidos.
5
No estudo realizado pelo Empreendedor da Usina Hidrelétrica de Baguari,
a classificação de remanejamento ficou assim definida: realocação, autorealocação, indenização em dinheiro e permuta. A Realocação se refere à
mudança, para outro local, de todas as edificações, assegurando às mesmas
condições verificadas durante o levantamento cadastral, sendo atualizadas até
a data da efetiva negociação, onde ficou este fato definido entre a Associação
de Moradores e o Consórcio. No que relaciona a Auto-Realocação abrange
os afetados que optam por fazer a sua realocação para o novo local por conta
própria, sendo responsabilidade deste pela construção de seu bem no novo
lote, após receber do Consórcio o valor referente à avaliação dos padrões em
que se encontram os bens. Já a Indenização em Dinheiro é a remuneração
de bens atingidos pelo empreendimento. Se torna válida a partir da negociação
entre as partes e acordo administrativo específico, após apresentação do
Consórcio ao atingido da avaliação dos bens que este possui referente a área
diretamente afetada. A Permuta consiste na troca dos terrenos atingidos pelos
terrenos do novo sítio, buscando atender à equiparidade de área por área
(CONSÓRCIO UHE BAGUARI, 2007).
Na primeira fase as entrevistas foram realizadas no próprio domicílio,
sendo estas no antigo local, onde a escolha de cada representante foi
aleatória, independente de agendamento, ou sorteio. Na segunda fase das
entrevistas, tentamos obedecer à reavaliação dos mesmos domicílios utilizados
na fase pré-realocação, porém não foi possível contemplar a pesquisa com os
mesmos 30 (trinta) representantes, onde 07 (sete) destes não foram
entrevistados no primeiro momento.
Os
dados
foram
coletados
mediante
assinatura
do
Termo
de
Consentimento Livre e Esclarecido (ANEXO 3), contemplado pela Resolução nº
196/96, conforme Diretrizes e normas reguladoras de pesquisas envolvendo
seres humanos (BRASIL, 1996). Durante a avaliação dos dados coletados e
sua utilização na dissertação, foram preservadas as identidades de cada
morador, onde foram citados nomes fictícios para designar determinadas
pessoas. Foram levados em consideração os consensos e diferenças a partir
dos depoimentos de cada entrevistado respeitando o grau de escolaridade e
idade.
6
Para análise detalhada deste estudo, a pesquisadora fez uso de gravador
e câmera fotográfica com permissão verbal dos entrevistados no intuito de
enriquecer o trabalho realizado. Foram totalizados aproximadamente 650
(seiscentos cinqüenta) minutos de gravação. Após o término de cada entrevista
foi feita a transcrição, seguida da análise das informações coletadas.
Referente à primeira fase das entrevistas (pré-realocação), as questões
abordadas, estavam relacionadas basicamente ao tempo de moradia, ao
número de pessoas residentes no domicílio, a forma de aquisição do imóvel, ao
sustento da família relacionado ao lugar de morada, foram também
questionados sobre o sentimento de deixar o lugar, foi solicitado para resumir o
que significa “mudança”, quais os aspectos positivos e negativos da mudança
de lugar, o grau de satisfação da negociação sobre realocação e indenizações,
e qual a expectativa da nova moradia, conforme demonstrado no ANEXO 1.
Na segunda fase das entrevistas (pós-realocação) foram abordadas
questões referentes aos aspectos sociais da relação com a mudança do
espaço habitacional e sua influência sob a vida destas famílias; avaliando o
grau de satisfação no processo de negociação da realocação; quais as
condições habitacionais da nova moradia; se o novo local de moradia facilitaria
ou dificultaria o acesso ao comércio, saúde, educação e trabalho; se a
percepção de mudança de lugar é positiva ou negativa para a família; quais as
facilidades ou dificuldades encontradas desde o momento da negociação até a
mudança habitacional, os aspectos da negociação da realocação, conforme
demonstrado no ANEXO 2.
Através deste contexto abordado pode-se estudar e compreender as
relações envolvidas no processo de realocação de famílias afetadas pela
relativa barragem.
Este trabalho foi estruturado em quatro capítulos. No primeiro capítulo
encontra-se a questão inicial para esta pesquisa que desenvolve os aspectos
da realocação de famílias no processo de implantação de hidrelétricas, onde se
aborda a história da energia elétrica no Brasil, a classificação de hidrelétricas e
os impactos sociais ocasionados por estas.
No segundo capítulo se destaca a apresentação dos impactos ambientais
desencadeados pela implantação de Hidrelétricas, e as principais legislações
7
envolvidas em todo processo, e os impactos esperados coma implementação
da UHE Baguari.
No terceiro capítulo é abordado a caracterização do município de
Periquito e seu Distrito de Pedra Corrida, sua localização e as principais
influências que podem ocorrer com o empreendimento da UHE Baguari, assim
como também todo o contexto do processo de construção da Usina.
Para finalizar, o quarto capítulo aborda a questão alvo desta pesquisa,
que é o estudo da realocação em área urbana das famílias afetadas pela UHE
Baguari, onde foi abordado o grau de satisfação dentro dos aspectos positivos
e negativos da realocação.
8
CAPÍTULO 1
REALOCAÇÃO DE FAMÍLIAS NA IMPLANTAÇÃO DE
EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS
1.1 História da Energia Hidrelétrica
A Energia compõe um dos ingredientes essenciais à evolução e vida
humana. Nas sociedades primitivas seu custo era praticamente zero.
Antigamente, a energia era obtida da lenha das florestas para aquecimento e
atividades domésticas. Porém, gradativamente, o consumo de energia foi
crescendo de forma expressiva, até que outras fontes se tornaram necessárias.
Na Idade Média, as energias de cursos de água e dos ventos foram utilizadas,
mas em quantidades insuficientes para suprir as necessidades de populações
crescentes, principalmente nas cidades (GOLDEMBERG e LUCON, 2007).
Com a evolução tecnológica, o homem passou a desenvolver novos
recursos para melhorar sua qualidade de vida; mas as descobertas ou as
criações realizadas por este podem afetar, de forma profunda, ampla e
generalizada, os conhecimentos, os costumes e as práticas cotidianas do seu
meio.
De acordo com Silva Filho (2003), o uso da energia da água fluindo de
rios (mesmo princípio utilizado atualmente nas hidrelétricas) tem sido feito há
cerca de 3.000 anos.
9
Para Sevá (2008) a ação de barrar rios e conduzir a água para outros
pontos de utilização ou aproveirtar sua força motriz já era praticado há
milênios, onde existem registros das obras do império, os arquedutos romanos;
sendo que sua forma de utilização é que vem sendo aprimorada. Houveram
grandes avanços tecnológicos em toda a história humana, e o Brasil também
acompanhou esta evolução, onde a industrialização cresceu de forma
expressiva como reflexo da globalização capitalista, na tentativa de suprir as
necessidades humanas através dos recursos naturais que possui.Estas
alterações estão relacionadas a processos desencadeados na natureza devido
à ação humana direta.
Para que essa revolução tecnológica ocorresse de forma marcante
levando à melhora social, foi fundamental o papel da energia elétrica, que
simbolizou expressivamente o progresso para muitos. A energia elétrica pode
ser
obtida
através
de
usinas
hidrelétricas,
usinas
eólicas,
usinas
termonucleares, e termoelétricas, sendo que no Brasil a forma mais utilizada é
a energia hidrelétrica, devido aos abundates recursos hídricos existentes
(PIACENTI et al., ibid).
Segundo Bermann (2007), a hidroeletricidade se constitui numa
alternativa de obtenção de energia elétrica a partir do aproveitamento do
potencial hidráulico de um determinado trecho de um rio, normalmente
assegurado pela construção de uma barragem e pela conseqüente formação
de um reservatório.
Para Barcellos (2007), o desenvolvimento é um fenômeno social e não
simplesmente natural, a tentativa de relacioná-lo aos processos naturais é um
tanto quanto problemática, pois as relações sociedade/natureza são mediadas
pela tecnologia e pelo mercado que são fenômenos sociais.
Percebe-se que atualmente, quanto melhor é a qualidade de vida de uma
população, maior será o seu consumo de energia, ou seja, quanto mais uma
sociedade se desenvolve, a demanda de energia aumenta, fornecendo maior
conforto para esta (SILVA FILHO, ibid). É óbvio que viver em um país rico ou
pobre não determina especificamente o consumo de energia de uma pessoa,
pois se deve atentar às desigualdades sociais, uma vez que ricos e pobres de
um mesmo país consomem energias de forma desiguais, até mesmo por
10
conseqüência de como estas obtêm este recurso, assim como seu custo
específico também pode influenciar no uso desta.
É notável os caminhos adversos que o desenvolvimento tecnológico
reflete diante da sociedade global, expresso pelas divergências culturais,
políticas e sociais das relações do homem com o meio ambiente (MONTE,
2005). Dentro deste contexto se faz necessário a ampliação de estudos, na
busca de compreender a relação sociocultural que pode ser afetada por um
processo de mudança de lugar, devido à influência tecnológica vivida pela
sociedade atual.
1.1.1 O Marco do Referencial Hidrelétrico Brasileiro
No Brasil, a exploração elétrica de forma hidráulica iniciou-se em 1883,
com a instalação da Usina Hidrelétrica Ribeirão do Inferno, destinada ao
serviço de mineração em Diamantina – Minas Gerais, porém para fins públicos
essa história se inicia em fevereiro de 1888 com a Companhia Mineira de
Eletricidade (CME) (TONIOLO, 2006).
Até a década de 1930, a energia elétrica no Brasil era de domínio
estrangeiro, onde se destacou nessa época a empresa Light, com suas outras
filiadas no Brasil, focando Rio de Janeiro, São Paulo e cidades ao redor. A
política de industrialização, nacionalismo visando o desenvolvimento almejado
por Vargas atingiu em cheio o setor de energia, estimulando a criação de
Hidrelétricas (ROCHA, 2008).
A regulamentação do setor elétrico no país iniciou-se com o Decreto
Federal nº 24.643, de 10 de julho de 1934 - Código de Águas, onde
caracterizou o projeto que colocaria uma grande intervenção na gestão do
setor de águas e energia elétrica, as concessões e autorizações nos serviços
públicos de energia elétrica passaram a ser de competência da União (BANCO
MUNDIAL, 2008).
No período entre 1930 a 1945, Getúlio Vargas incentivou o crescimento
econômico
autônomo,
tornando-se
de
11
fundamental
importância,
pois
caracterizou mudanças institucionais que levaram à uma grande centralização
na tomada de decisões referente a esfera federal, em concordância com as
mudanças estruturais do estado brasileiro (SANTOS, 2003). No Brasil uma das
principais mudanças foi referente à expansão de usinas hidrelétricas,
decorrente do aproveitamento do grande potencial de bacias hidrográficas. No
período do regime militar, por volta dos anos de 1960, os projetos hidrelétricos
de grande porte começaram a ter preferência, com criação de companhias
estaduais de energia elétrica e da Central Elétrica de Furnas. Esta fase
caracterizou uma modernização e desenvolvimento na produção industrial com
ampliação importante destas (BANCO MUNDIAL, ibid).
O ano de 1961 foi o marco da participação do poder público na economia
referente ao setor elétrico, através da criação do Ministério de Minas e Energia
(MME), levando ao fortalecimento das concessionárias públicas (TONIOLO,
ibid).
O modelo econômico militar após o golpe de 1964 focou o aceleramento
do crescimento econômico, com o incentivo da expansão industrial, com a
territorialização de grandes indústrias e a implantação de obras grandiosas.
Entre as décadas de 1960 e 1970, “barragens e outros projetos de grande
escala tiveram impactos adversos sobre recursos naturais, ecossistemas,
meios de subsistência e estilos de vida de pessoas nas comunidades do Brasil”
(ROTHMAN, 2008, p. 20).
A década de 1960 também foi marcada pela criação das Centrais
Elétricas do Brasil - ELETROBRÁS, intensificando o aproveitamento da energia
produzidas por hidrelétricas (SILVA, 2003).
A Eletrobrás, através da aquisição de algumas empresas também
empenhadas no quadro de expansão com a construção de novas hidrelétricas,
expressou nesse período uma grande fonte geradora de energia, mas apesar
de suas empresas adquiridas, essa demanda gerou a execução de outros
grandes projetos (SAMPAIO et al., 2005).
Em abril de 1973, os governos do Brasil e Paraguai, realizaram um acordo
para a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, utilizando como recurso
hídrico o rio Paraná, com potencial de instalação equivalente a 12.600 MW de
potência, na época equivalente 75% de capacidade de geração nacional
(LAMARÃO, 1997).
12
Com esta expansão da economia, houve um consumo de energia elétrica
com taxas elevadas até 1980, o que massificou os investimentos em geração
de energia elétrica no Brasil (LAMARÃO, ibid).
Neste período, não haviam ações expressivas voltadas à preservação do
meio ambiente, e as construções de Usinas Hidrelétricas eram propostas como
um marco do processo de desenvolvimento, sem preocupações com as
alterações e mudanças que viessem a ocorrer no ambiente natural. Muitos
idealizavam estas construções como algo evidentemente positivo, porque trazia
desenvolvimento da região e o conseqüente bem-estar da futura população,
porém, ainda não havia um olhar voltado para os verdadeiros atingidos com
estas construções (COLITO, 1999).
Segundo Rothman (ibid), em 1981 foi criada a Política Nacional do Meio
Ambiente, no intuito de implementar medidas de liberalização controlada,
devido às pressões para a democratização de grupos de base da sociedade
civil.
Por volta de 1987, devido à tentativa de responder à continuidade destes
protestos e estudos referentes aos impactos ambientais ocasionados pela
Instalação de Hidrelétricas, o Banco Mundial criou o Departamento de Meio
Ambiente, onde também adotou novas exigências e novos critérios para
elaboração de estudos dos impactos ambientais ocasionados por estes
empreendimentos (ROTHMAN, ibid).
A partir desse período, com a criação do Conselho Nacional do Meio
Ambiente (CONAMA), cuja finalidade é definir e implementar a Política
Nacional do Meio Ambiente, houve uma melhora na perspectiva da avaliação
dos impactos ocasionados pela implantação de Usinas Hidrelétricas. A
Resolução n° 1 do CONAMA, define impacto ambiental como as alteração em
propriedades físicas, químicas e biológicas que influenciam o meio ambiente,
causada por qualquer forma de matéria ou energia que resulta das atividades
humanas afetando direta ou indiretamente toda a questão de ordem social,
econômica, biológica, ambiental, referente a saúde e bem-estar de uma
população (BRASIL, 1986).
Como conseqüência deste processo, foi instituída a necessidade do
Estudo de Impacto Ambiental (EIA), sendo definido como a construção de um
documento técnico, detalhado sobre os impactos que poderão ser ocasionados
13
pela implantação de Usinas Hidrelétricas. Ainda, foi determinada a elaboração
de outro documento, conhecido como Relatório de Impactos do Meio Ambiente
(RIMA), o qual consiste em um relatório resumido do EIA; porém, o RIMA deve
apresentar uma linguagem clara e objetiva para que leigos também
compreendam (KARPINSKI, 2003).
Contudo, as metodologias utilizadas para a realização dos Estudos de
Impactos Ambientais (EIA‟s) continuam, conforme CASTRO (1993,
p.26) dando ênfase exagerada aos aspectos físicos-químicos e
biológicos, deixando as dimensões sociais numa posição periférica,
lançando por terra as importantes contribuições trazidas pela
ecologia, esquecendo de que o homem não só é parte do
ecossistema natural como, atualmente é o principal agente de
alteração do mesmo.
Novos conceitos foram implementados e aceitos pelo setor elétrico, pois a
análise dos efeitos diretos/indiretos dos empreendimentos não abordava os
problemas sociais. As noções de “área de influência”, de “usos múltiplos”, de
“inserção regional” e de “monitoramento” foram incorporadas aos (EIA´s) e aos
Relatórios de Impactos Ambientais (RIMA´s). Compreende-se então que esse
tipo de empreendimento pode gerar danos globais em todos os setores da vida
de uma população, desde as condições materiais de sua sobrevivência, até as
suas concepções de vida e visões de mundo, podendo também influenciar
inclusive na cultura local (SANTOS, ibid).
1.1.1.1 Privatização do Setor Elétrico
Devido à crise da dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e
com o Banco Mundial, envolvendo suas políticas desenvolvimentistas,
desregulamentação e privatização, o Brasil em 1990 passa a privatizar o setor
hidrelétrico, onde facilitou a formação de consórcios de empresas privadas,
aumentando significativamente o número de projetos neste setor (ROTHMAN,
ibid). Na década de 1990, já havia 544 barragens em funcionamento, onde 197
eram geradoras de energia com capacidade de 53.000 MW (TONIOLO, ibid).
14
Em 1996, com a Lei n. 9.427 foi criada a Agência Nacional de Energia
Elétrica – ANEEL, com a finalidade de regular e fiscalizar a geração de energia
elétrica (ANEEL, ibid).
A escassez de recursos energéticos e o medo de uma crise no
abastecimento de energia em 2000 levaram o governo Fernando Henrique
Cardoso à tomada de uma decisão ambiciosa: a privatização do setor de
energia elétrica, incluindo as empresas de geração. Isto foi com a inclusão dos
ativos federais da geração no Programa Nacional de Desestatização (PND)
(SAMPAIO, ibid).
Ao privatizar sem critérios as empresas de geração e distribuição de
energia elétrica, ao favorecer a concessão de direitos de exploração de
potenciais hidrelétricos a grupos privados, a reestruturação não rompeu apenas
com o processo anterior, mas colocou em risco muito do que havia sido
conquistado em termos sociais e ambientais (VAINER, 2007).
Um dos exemplos que abordam o contexto das privatizações, é o
referente a Hidrelétrica de Candonga, na microregião de Ponte Nova, entre os
municípios de Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado, que ocorreu entre o
período de 2001 à 2004; segundo Pinto (2005 apud Penido, 2008), o
reservatório afetou compulsoriamente as famílias em ambas as margens do
Rio Doce, além das demais famílias que tiveram outras capacidades
comprometidas.
As famílias realocadas devido a UHE de Candonga, foram para um
reassentamento planejado pelo Consórcio Candonga, onde este apresentava
uma configuração espacial diferente do “lugar” de vida anterior, onde o formato
era mais urbano do que propriamente rural. Mais de 270 pessoas foram
transferidas, mesmo apresentando total insatisfação, estas não tiveram seus
direitos respeitados Pinto (2005).
Segundo Bermann (2002), até 2002 as Usinas Hidrelétricas construídas
no Brasil resultaram em mais de 34.000 km2 de terras inundadas para a
formação dos reservatórios, e no deslocamento de cerca de 200 mil famílias,
todas elas populações ribeirinhas diretamente atingidas por empreendimentos
como estes.
Segundo Silva (2003, p.02) “o Brasil já se destaca no ranking de produção
de energia por hidrelétricas”. Porém para o autor, essa posição é
15
acompanhada de uma luta que tem colocado em pontos diferentes os
empreendedores e as populações afetadas por estes projetos,
As Leis Federais nº 10.847 e nº 10.848, de 15 de março de 2004, e pelo
Decreto Federal nº 5.081/2004, estabeleceram novas regras dando maior
seguridade em suas execuções, o que trouxe a possibilidade de expansão do
setor relacionado à geração, transmissão e distribuição de energia;
estabelecendo com nitidez suas responsabilidades (BANCO MUNDIAL, ibid).
Com todos os entraves a respeito das instalações de hidrelétricas, em
2007, o governo de Minas Gerais anunciou planos de aumentar as Usinas
Hidrelétricas. Outro fator que influenciou este aumento foi a estratégia de
desenvolvimentista adotada no governo Lula, através do Plano de Aceleração
de Crescimento – PAC (ROTHMAN, ibid).
Com esta situação, na procura de uma oferta maior de energia elétrica, se
estimulou também o aumento do consumo energético, onde ocasionou por sua
vez um crescimento na demanda de energia, desencadeando desta maneira
um círculo vicioso que perdura até os dias de hoje (SCHAPPO, 2008).
Atualmente o Brasil apresenta uma grande produção de geração elétrica,
sendo predominantemente hidráulica, onde a maioria das unidades concentrase na região Sul e Sudeste, totalizando aproximadamente 47,2 milhões de
unidades (TONIOLO, ibid).
1.2 Classificação de Usinas Hidrelétricas
Atualmente o potencial instalável, já inventariado no Brasil, ultrapassa a
260 GW. A produção bruta de energia elétrica nos anos 1990 ultrapassou a
250 bilhões de kWh, onde em média destas 97% eram de origem hidráulica
(SANTOS, ibid).
Por meio da repotenciação de Usinas Hidrelétricas, o Brasil tem buscado
alternativas para otimizar o desenvolvimento de sua matriz energética,
priorizando a geração hídrica e reduzindo, ou evitando, impactos nos
ecossistemas aquáticos e nas populações ribeirinhas (BERMANN et al., 2004).
16
Diante das revisões bibliográficas estudadas sobre todo contexto exposto
a respeito de matriz energética, optou-se por destacar somente alguns pontos
relevantes para discussão deste estudo, as quais serão brevemente relatadas.
Conforme a legislação do setor elétrico pela Resolução ANEEL nº 394, de
04 de dezembro de 1998, defini-se como sendo uma Pequena Central
Hidrelétrica (PCH) aquele empreendimento com potência superior “a 1.000 KW
ou 1 MW e potência inferior a 30.000 KW ou 30 MW, com área total de
reservatório igual ou inferior a 3 Km²” (ANEEL, ibid, p.01).
As PCH‟s são prioridades da ANEEL, pois atendem às necessidades de
carga de pequenos centros urbanos e rurais. Esses tipos de Usinas até o final
de 2003, foram beneficiadas pela isenção da taxa de uso da rede de
transmissão e distribuição, assim como na dispensa de remuneração dos
municípios e estados pelo uso dos recursos hídricos (MALFERRARI, 2000).
A estrutura de uma Usina Hidrelétrica é composta basicamente por:
“barragem, sistema de captação e adução de água, casa de força e
vertedouro”, que funcionam de maneira integrada. A barragem deve
principalmente interromper o curso normal do rio para formação do
reservatório, estocando a água para posteriormente configurar-se em energia
hidráulica (ANEEL, ibid, p.49).
Segundo Viana (2003, p.20) para a indústria, uma “grande barragem” está
inclusa dentro de alguns critérios como: “comprimento (igual ou superior a 150
metros); volume (igual ou superior a 15 milhões de metros cúbicos);
capacidade de armazenamento do reservatório (igual ou superior a 25
quilômetros cúbicos) e; capacidade de geração elétrica (igual ou superior a
1.000 Megawatts)”.
Geralmente utiliza-se o tamanho da barragem para se classificar se é uma
grande ou pequena barragem, porém de acordo com McCully (1996, p.24 apud
Viana, 2003, p.20):
O comprimento, freqüentemente, não é um guia confiável para se
avaliar os impactos de uma barragem. Uma barragem de 100 metros
localizada em um vale profundo pode inundar uma área menor e
conseqüentemente deslocar menos pessoas e gerar menores
impactos no rio do que uma barragem de 15 metros em uma região
densamente habitada.
17
A classificação de usinas quanto à capacidade de produção é
apresentada na tabela a seguir:
TABELA 1 - CLASSIFICAÇÃO DE USINAS HIDRELÉTRICAS QUANTO À POTÊNCIA
Tipo de Usina Hidrelétrica
Potência Instalada P (kW)
Micro Central
Mini Central
Pequena Central (PCH)
Média Central
Grande Central
P < 100
100 < P < 1.000
1.000 < P < 10.000
10.000 < P < 100.000
P > 100.000
FONTE: LEÃO, Ruth (2009) – Universidade Federal do Ceará (UFC).
De acordo com Sampaio (ibid), para a análise da energia produzida por
uma Hidrelétrica, é necessário se conhecer a potência instalada, que é a
quantidade máxima de energia que pode ser produzida por esta. Analisar a
quantidade de energia produzida de acordo com a potência instalada é verificar
se está usando a capacidade produtiva da mesma. A unidade usada para esta
variável é o MW.
Outra questão é a altura líquida de queda e a altura bruta:
Dada uma mesma altura de queda, a hidrelétrica será tanto mais
eficiente quanto mais energia gerar, mantidas as outras variáveis
constantes. A altura bruta é medida, em metros, pela diferença entre
as elevações da linha energética a montante e a jusante, ou seja, é a
diferença entre os níveis de água a montante e a jusante, com as
respectivas correções devidas às alturas cinéticas nas duas seções
consideradas. O nível de água de montante é o da bacia e o de
jusante o do canal de descarga (SAMPAIO, 2005, p.07).
Entretanto a CMB (2000a) assinala que a definição da Comissão
Internacional sobre Grandes Barragens (ICOLD) seria mais concreta, definindo
como uma grande barragem, aquela que tem altura igual ou superior a 15
metros (contados do alicerce). Também é classificada como uma grande
barragem aquela que apresentar entre 5 (cinco) e 15 (quinze) metros de altura
e seu reservatório tiver capacidade superior a 3 (três) milhões de m3.
1.3 Impactos Sociais no processo de Implantação de Usinas Hidrelétricas
18
Tundisi (2007) relata que o número de reservatórios hidrelétricos
construídos no Brasil nos últimos cinqüenta anos acarretou em uma extensa e
profunda alteração no funcionamento de rios, lagos, áreas alagadas,
influenciando na alteração do ciclo hidrossocial e hidroeconômico.
Para Castro (2003), na avaliação histórica das grandes hidrelétricas,
percebe-se que estas foram projetadas a princípio focando apenas a produção
de energia, onde muitas vezes não foram consideradas as inundações que
estas poderiam desencadear isto porque, geralmente havia uma baixa
ocupação próxima às usinas e também por não haver uma legislação
pertinente neste período. Com a expansão deste setor as “cheias” e
inundações se tornaram mais evidentes e seus impactos cada vez maiores.
O evento cheia é “caracterizado como a observação ou previsão de vazão
superior à restrição de vazão máxima, e o evento inundação é caracterizado
como o rompimento de uma restrição de vazão máxima considerada na
operação de controle das cheias”, controlar as cheias significa oferecer
segurança à população diretamente afetada e para o próprio sistema
(CASTRO, ibid, p.02).
Segundo Müller (1995), as construções de Hidrelétricas podem gerar
diversos tipos de impactos sociais. Segundo o autor, entre outros destacam-se:
um produzido pelo aumento significativo de pessoas para trabalharem no local
do empreendimento, que poderia desestruturar a vida social de uma
população, e outro seria a conseqüência do deslocamento das famílias
diretamente afetadas pela obra, que deverá ser retirada do seu local de
moradia e realocada para outra propriedade devido à influência da alteração
referente às cheias que o rio poderá sofrer.
É importante ressaltar que cada grupo possui uma maneira de relacionarse com outros grupos e comunidades, caracterizando um ideal social. As
mudanças sociais que se processam podem ser contínuas e aceleradas
(ROSA et al., 1988 apud MÜLLER, ibid).
Em muitas instalações de Usinas Hidrelétricas a população limítrofe é
afetada, desde que áreas extensas podem ser inundadas e, nem sempre esta
população recebe orientação técnica adequada sobre o processo de
realocação (BERMANN e FERNANDES, 2004). No Brasil, as barragens já
19
inundaram 3,4 milhões de hectares de terras produtivas e também já
desalojaram mais de um milhão de pessoas (ZHOURI e OLIVEIRA, 2007).
A
instalação
de
Usinas
Hidrelétricas
repercute
nas
sociedades
organizadas na região do projeto e além dos limites destas também. Aumentar
a oferta de energia representa uma conseqüência global de qualquer
empreendimento de hidrelétrico. Todos os eventos desencadeados pela
hidreletricidade, como “diminuição na qualidade de água, desagregação social
de comunidades locais e aumento na incidência de doenças seriam
conseqüências imediatas para os habitantes” da área de influência,
representando assim os impactos sociais do empreendimento (SOUSA, 2000,
p.11).
Segundo Scudder (1993 apud Bermann e Fernandes, ibid), no que diz
respeito à questão social, devem ser considerados os impactos sociais
adversos, que são uma séria conseqüência, principalmente quando referidos à
moradia, pois englobam o afeto com a terra, saúde, saneamento básico, e
outros. Também há grandes possibilidades de queda na renda da maioria das
populações que vivem nas bases dos rios em questão.
Diante de pesquisas realizadas sobre o caso da UHE de Candonga/MG,
fica evidente que os reassentamentos em Novo Soberbo causaram impactos
sociais relacionados a queda de renda, onde este não ofereceu possibilidades
de desenvolvimento para os meios de subsistência e de trabalho para os
atingidos, e menos ainda na representatividade das questões culturais para
reprodução dos modos de vida de toda a comunidade realocada (PENIDO,
2008).
Dentro
das
variáveis
inclusas
no
contexto
socioeconômico
do
empreendimento da UHE Baguari, serão avaliadas e acompanhadas questões
incluindo: saúde e saneamento, habitação, segurança, emprego, escolaridade,
que serão brevemente comentadas a seguir.
Na variável saúde são inúmeras doenças que podem estar vinculadas a
este processo, pois além das alterações na transmissão das doenças comuns
na região (endêmicas), estão relacionadas doenças que poderão surgir a partir
do deslocamento, ou com a chegada de um grande número de trabalhadores
da construção do empreendimento, entre outras as Doenças Sexualmente
Transmissíveis (DST‟s). (MCCULLY, 1996 apud MENDES, 2008).
20
O aumento do número de vetores pode trazer novas doenças (por
exemplo: leishimaniose) para os habitantes que permanecerão residindo no
local após a “elevação do nível da água na área diretamente afetada, pois as
condições de risco sanitário serão agravadas pelo desalojamento e emigração
dos animais transmissores de doenças para as imediações” (CNEC, ibid, p.15)
No campo do saneamento básico, podem ser modificadas questões
vinculadas ao abastecimento de água, esgotamento sanitário, drenagem
urbana e controle de inundações, coleta e disposição final de resíduos que
podem interferir nos recursos hídricos (BRASIL, 2005).
Relativo à moradia (habitação), diversas questões estão envolvidas, nem
sempre fáceis de serem avaliadas, entre as que se destacam: processo de
reassentamento; falta de oportunidades na busca por uma melhoria da
qualidade de vida e sustentabilidade da população; aumento da dependência e
valorização dos bens de família. Porém, a grande dificuldade no campo da
moradia relaciona-se à questão sentimental desde que não possui indicadores
de como mensurá-la (BERMANN e FERNANDES, ibid, p.03)
Segundo o EIA de Baguari (CNEC, ibid), indo de encontro com o Relatório
da
Comissão
Mundial
de
Barragens
(CMB,
2000), assinala
que
o
empreendimento Hidrelétrico, pode ocorrer a contratação de trabalho
temporário para a execução de tarefas que exigem maior esforço físico, ou
quantidade maior de mão de obra especializada. Esta ação, em geral, pode
gerar impactos referentes à segurança da população local, pois a formação de
repúblicas, alojamentos ou até mesmo a inserção de novas famílias podem
representar um aumento da violência local.
Pode também refletir diretamente na variável emprego, pois além da
contratação de trabalhadores de fora, há necessidade de um número
considerável de trabalhadores locais para auxiliar na obra, onde grande parte
dos empregos são temporários, assim terminando a obra, problemas de
desemprego também surgirão.
Referente à educação, pode sofrer influências como: abandono,
repetência, ou excesso de alunos, que são importantes indicadores para se
aferir o resultado do sistema de ensino. Estes surgem devido ao processo de
entrada e saída de alunos que podem ser trabalhadores relacionados ao
período de construção da Usina Hidrelétrica, ou até mesmo filhos destes que
21
necessitam permanecer estudando conforme os pais acompanham o
movimento destes novos empreendimentos. Outro fato importante seria se as
escolas locais apresentam infra-estrutura e pessoal suficiente para absorver a
demanda de novos alunos se necessário (BERMANN e FERNANDES, ibid).
É importante salientar, conforme Zhouri e Oliveira (ibid), que a
consolidação da implantação de uma Usina Hidrelétrica sobre um campo de
poder extremamente desigual, pode gerar confrontos violentos e experiências
diversas de violação de direitos humanos; o que pode ser ilustrado pelo
processo de desapropriação compulsória para a construção desta.
Estes empreendimentos devem focar na melhoria do padrão de vida e na
renda das populações afetadas, analisando uma mudança global, que envolve
tanto questões sociais como culturais (BERMANN e FERNANDES, ibid).
É importante ressaltar que há grupos sociais que podem sofrer os efeitos
dos empreendimentos hidrelétricos durante sua execução ou até mesmo antes
deste ser anunciado.
Referente aos aspectos sociais relacionados à população alvo de
realocação, afetadas diretamente pela Instalação de Usinas Hidrelétricas,
inúmeras vezes são desconsiderados diante da perspectiva da perda
irreversível das suas condições de produção e reprodução social, determinada
por este processo (BERMANN, 2007).
Para muitos, a construção de uma Usina Hidrelétrica significa a destruição
de seus projetos de vida, obrigando-os a sair da terra em que construíram suas
histórias, sem apresentar compensações que possam assegurar a manutenção
de suas condições de sobrevivência no mesmo nível que havia antes da
implantação do empreendimento (BERMANN, ibid).
Na leitura do livro “Vidas Alagadas” de Rothman, fica plenamente
perceptível os conflitos socioambientais que estão sendo enfrentados
constantemente pela população alvo de realocação:
Cada barragem anunciada causa apreensão e tristeza para inúmeras
famílias, cuja vida perde suas raízes e devem recomeçar em outro
lugar. Projeta-se um benefício energético, mas nem sempre há um
equilíbrio entre os frutos esperados do progresso, os acordos feitos e
o sofrimento e o desgaste dos atingidos. A história ainda recente das
indenizações revela muito sacrifício e dor para quem se vê obrigado a
deixar seu berço, suas terras, seus sonhos (BALDUÍNO, 2007 apud
ROTHMAN, 2008, p.07).
22
Após a análise do local que será alvo de realocação, iniciam-se as
negociações, que seguem um contexto lógico de valores capitais os quais são
parte fundamental deste processo; porém o grande destaque que não entra
muitas vezes nesta negociação por não possuir forma de se mensurar, são as
relações estabelecidas de algumas pessoas com determinados lugares.
Relacionando esta percepção com o comportamento e educação entre os
homens, Santos (1997), considera que como a nossa educação é feita de
maneira seletiva, as pessoas podem apresentar diversas versões de um
mesmo fato, ou seja, podem perceber as coisas de maneira distinta. Quem
está de fora observa de maneira superficial do que aqueles que vivenciam a
situação. Ainda afirma que:
A percepção é sempre um processo seletivo de apreensão. Se a
realidade é apenas uma, cada pessoa a vê de forma diferenciada;
dessa forma, a visão pelo homem das coisas materiais é sempre
deformada. A percepção não é ainda o conhecimento, que depende
de sua interpretação e esta será tanto mais válida quanto mais
limitarmos o risco de tomar por verdadeiro o que é só aparência
(SANTOS, 1997, p. 62).
De acordo com o Manual de Avaliação de Impactos Ambientais - MAIA,
haviam poucos estudos sobre as relações emocionais das comunidades que
são alvo destes empreendimentos que afetam seu local de moradia,
conseqüentemente
impedindo
a
identificação
de
algumas
situações
indesejáveis que poderiam ser avaliadas na abordagem dos impactos
ambientais. Atualmente estas preocupações estão se tornando mais evidentes
e quem conhece a realidade e suas necessidades de recursos para um bom
desenvolvimento, é a própria comunidade, onde esta é peça fundamental para
planejar o seu futuro referente a esta mudança territorial (SUREMANH/GTZ,
1995).
23
1.4 Espaço, Lugar e Território: influências sobre a sociedade
A designação do lugar em que a família reside, também pode ser
denominada de espaço ou território. Neste estudo será feito a princípio uma
abordagem de todos os aspectos para melhor compreensão da discussão do
“lugar” a ser pesquisado.
As discussões sobre lugar, será realizada a partir do estudo da Topofilia
que é um termo relativo a Geografia, onde é considerada "o elo afetivo entre a
pessoa e o lugar ou ambiente físico” (TUAN, 1980, p.106).
Segundo Silva (2007, p.2) a referência de lugar, a permanência neste e
seus sentidos estão diretamente ligados à dimensão espacial. “Lugar é a coisa,
isto é, a jarra, a casa, a poesia, a ponte”. Nesta perspectiva, o espaço assume
um significado de tempo, porém ele não se move, repousa. Na realidade a
origem ou compreensão de lugar existe como puro fato e não em algum
entendimento teórico.
Shneider (2004, p.08), afirma que a abordagem territorial deve ser o
espaço da ação em que ocorrem as relações sociais, econômicas e políticas;
onde este espaço pode ser construído a partir da ação entre os indivíduos e o
ambiente ou contexto objetivo em que estão inseridos. “Mas não se trata
apenas do entendimento teórico e abstrato, pois esta perspectiva também
propõe que as soluções e respostas normativas aos problemas existentes
nesses espaços encontram-se nele mesmo”.
Para Abramovay (1998, p.01), o território pode ser definido como lugar
que propicia a interação entre sociedades e ecossistemas, onde o acesso à
terra é uma das condições básicas para esta interação, porém esta só faz
sentido, se for associado ao conjunto de condições que alterem o ambiente
institucional local e regional e permitam a revelação dos potenciais com que
cada território pode participar do processo de desenvolvimento.
Segundo Barcellos (ibid), território pode ser classicamente uma
delimitação de poder, sendo usado para a dominação e apropriação de
recursos. Ainda, de acordo como o autor, território também pode ser
considerado uma instância de poder que é exercido não apenas pelo Estado,
24
mas por atores sociais com diferentes tipos de interesses, onde neste território
ocorrem a produção, o consumo e a interação humana, por isso sua conotação
de identidade e subjetividade coletiva.
Território também pode ser enquadrado como uma unidade política
estável; onde a vida humana sempre estará relacionada às relações sociais, de
suas práticas e representações (BARROS, 2006).
Segundo Sánchez (1997, p.339), “tanto a divisão do trabalho e da
produção como a divisão social são acompanhadas sempre de formas
coerentes de divisão do espaço-território”.
Para Muls (2008), os territórios seriam a construção socioeconômica e
institucional, onde as relações entre os atores deste cenário estariam voltados
para o peso das regras, normas, culturas de uma comunidade de forma bem
elevada; e onde as instituições encontram-se amplamente implicadas no
funcionamento e na dinâmica das economias locais.
É importante ressaltar que o espaço é anterior ao território, pois o território
se forma a partir do espaço, ou seja, resulta de um ator que executa um
determinado programa. “Ao se apropriar de um espaço, concreta ou
abstratamente [...] o ator territorializa o espaço” (RAFFESTIN, 1993, p. 143
apud BORDO et al., 2004).
Barros (ibid) analisa a comparativa entre espaço e território, e afirma que
um mesmo homem, em seu cotidiano e na sua relação com outros homens,
pode produzir territórios com variadas durabilidades. Quando o homem toma
posse de um determinado espaço e transforma-o em sua propriedade, já estão
constituídas outras relações, evidenciando que um sujeito humano define ou
redefine um território.
O espaço, segundo Bordo et al. (ibid), seria muito mais amplo que o
território, pois envolve também as áreas vazias que “ainda não se
territorializaram”, ou seja, que ainda não sofreu influência da ação humana
diretamente. Pode-se dizer que espaço é semelhante à união entre a
caracterização do território, com a paisagem e a sociedade.
O foco desta pesquisa esta centrada na visão de “lugar”, apesar da direta
relação entre espaço e território que este ocupa. A melhor definição de lugar,
segundo Duarte (2002 apud Ewald et al., 2008) seria: uma parte do espaço
com caráter significativo, onde estão inclusos os valores culturais de
25
determinados grupos ou pessoas, sendo que a cultura é vista como elemento
chave que se reflete nos objetos e ações do espaço.
O lugar se distingue por estar impregnado de cultura. Não é, pois, um
fenômeno necessariamente material, mas, sobretudo, uma
experiência. Por ser uma experiência, o lugar caracteriza-se por ser
uma parte do espaço que contém elementos cujos significados e
ordenação são atribuídos conforme a cultura e as expectativas de
quem o considera como seu lugar. É no lugar que fixos (objetos) e
fluxos (ações) ao adquirirem valor, fazem a história de quem os
experimenta e lhes atribuiu este valor. Portanto, se retirados dos seus
lugares, produtos ou populações serão meras abstrações (SANTOS,
1997 apud EWALD et al., 2008, p.760).
Segundo Mattos (2008), os fixos seriam elementos aos quais se atribui
uma característica, como por exemplo: uma árvore, um computador, um
personagem mítico; já os fluxos consistem nas informações que circulam com
base nestes fixos, que lhes servem de referência e catalisação como por
exemplo: a variação de temperatura, uma página web dinâmica. Diante disto,
fixos e fluxos tornam o espaço um elemento que remete ao lugar, onde estes a
cada momento, redefinem e recriam as condições ambientais e sociais de cada
lugar.
Outra concepção de lugar referida por Pádua (2005 apud Silva, ibid, p.03),
seria de que este possui limites, mas principalmente como a definição de uma
identidade: “um lugar é sempre um onde particular, delimitado, com uma
identidade própria construída ao longo de um tempo. Esta identidade é
partilhada, muito estreitamente, com os entes que nele se encontram”. Então,
lugares recebem a compreensão de lugares da existência, que constituem o
próprio fundamento de qualquer espaço possível.
Ainda na percepção de Albagli (1999, p.50), lugar pode ser definido como
“uma porção do espaço na qual as pessoas habitam conjuntamente”, sendo
considerado por alguns como idéia de localidade, referindo-se ao cenário físico
da atividade social como situado geograficamente.
Toda movimentação de uma dada população pode ocasionar um
fenômeno diferente, a circulação de pessoas em um lugar geográfico
específico pode ocasionar dominação de uns sobre os outros, onde podem se
construir inclusive suas bases políticas (MACHADO, 2002).
Conforme Lezzi (1998 apud Karpinski, ibid), as sociedades se organizam
produzindo seu território, gerando desmatamento e inserção da sua cultura,
26
com domesticação animal e utilização dos recursos hídricos ao seu entorno, e
principalmente influenciando na construção de novos recursos. E com o
progresso surge evidentemente a necessidade de se reavaliar os impactos
ambientais ocasionados por essa organização, principalmente analisando o
“lugar” que estes ocupam em dado território.
Para Leff (2001), o “lugar” também pode ser caracterizado por Habitat que
seria o lugar em que se constrói e se define a territorialidade de uma cultura, a
espacialidade de uma sociedade e de uma civilização, onde se constituem os
sujeitos sociais. Habitar e Habitat seria localizar no território um processo de
reconstrução da natureza, através da identificação cultural diferenciada.
É preciso analisar a forma em que será realizada a mudança de lugar,
pois é difícil as pessoas reproduzirem suas vidas aos mesmos moldes em que
antes se encontravam, devido às bases materiais e organizacionais, elemento
em alguns casos fundamental para o sucesso de suas atividades produtivas e
referencial simbólico máximo de espacialidade (KARPINSKI, ibid).
Contudo, é importante ressaltar que em cada tipo de empreendimento
específico, podem surgir diversas formas de relações sociais ocasionadas por
estes impactos, dependendo da região afetada, estes podem apresentar
maiores ou menores alterações, e o lugar onde cada família será realocada
apresenta aspectos diferentes, pois para uns o benefício da mudança de lugar
é evidente, para outros pode gerar grandes transformações em seu estilo de
vida.
1.4.1 A busca da sociedade em defesa da Terra
Todo o contexto abordado até o momento sobre a expansão energética
resultou na exigência da elaboração de projetos de reassentamentos que se
iniciaram na década de 80 (REBOUÇAS, 2000 apud PENIDO, 2008).
Devido à maior participação política no Brasil, como conseqüências da
redemocratização após a Ditadura Militar, surgiram movimentos sociais como
27
busca de algumas questões que permaneciam silenciosas sobre o problema do
monopólio da terra (BANNWART, 2008).
Não poderia ser excluída a questão da história ambiental que avalia retirar
seres humanos influenciados pelo seu ambiente natural, e como modificaram
esse meio-ambiente e as conseqüências dessa interação (BANNWART, ibid).
Foi a reação das populações rurais atingidas por empreendimentos
hidrelétricos que permitiu o reconhecimento destas instalações como uma
problemática complexa, diante da sua face técnico-econômica, onde se
destacam a grande reordenação territorial com remoção das populações
historicamente de seus espaços requeridos. De acordo com Reis, (2007, p.
474), autores como Germani (1982), Magalhães (1996), e Sigaud (1992)
assinalam que as questões ambientais e socioculturais “foram tratadas pelo
Estado brasileiro com negligência e irresponsabilidade na maioria dos casos
estudados”.
Há diferentes significados na prática e no aspecto jurídico a respeito de
assentamentos rurais – Movimento dos Sem-Terra (MST) e reassentamentos
de atingidos por grandes projetos, como Usinas Hidrelétricas. Segundo Penido
(2008), nos casos de assentamento há uma legislação própria que os
respaldam na obtenção de terras, principalmente nos que sofrem influência
pelo Setor Elétrico; já nos reassentamentos, existem diversas lacunas e
deficiências da legislação, que expõem a problemática sobre a reativação
econômica do reassentamento.
A cada dia surgem “novos” movimentos sociais, porém independente
destes movimentos “novos” ou “tradicionais”, ambos estão baseando suas
idealizações em meio às transformações ocorridas na economia, com a
expansão da industrialização, marcada pelas mudanças nos modelos de
organização da produção ou do trabalho diante da inspiração fordista. Muitos
movimentos sociais surgem a partir das condições de reprodução do capital,
portanto, a globalização exerce grande influência no comportamento destes
movimentos nos dias atuais (SIQUEIRA, 2002).
Na luta contra o regime autoritário, os movimentos sociais conduziram as
políticas públicas a favor da participação popular. Existem a legalidade e a
legitimidade destas práticas na Constituição de 1988, porém, as políticas
estabelecidas não acompanham estes movimentos, onde o intuito seria de
28
promover uma participação democrática, respeitando os processos legais de
cada representatividade. A mobilização da população e sua participação
política podem influenciar na eficácia dos Conselhos Locais de Meio Ambiente
ou em outros processos que modifiquem o contexto social desta população,
tornando-se importante sua representatividade através de associações de
bairro e participação sindical (LOPES, 2006).
Para Lemos (1999, p.20 apud Penido, 2008, p.04), os conflitos ambientais
“caracterizam-se como uma forma de luta social que não opõe o homem à
natureza, mas opõe os homens entre si, suas idéias, valores e representações
sociais”; todo este contexto remete às questões dos direitos sociais e da
apropriação desigual de territórios.
Apesar de não haver uma definição universalizante para Movimentos
Sociais, na visão de Gohn (1995), estes seriam evidenciados por ações
coletivas com característica social e política construída através de atores
sociais de diferentes classes sociais, onde estes politizam suas demandas e
geram um campo político de união social. As ações são desencadeadas a
partir de temas e problemas com situações diversas como: conflitos, litígios e
disputas; onde estas ações criam uma identidade coletiva, mas a partir de
interesses comuns. Toda esta identidade vem da força da solidariedade com
referencial nos valores culturais e políticos vividos pelo grupo.
O maior movimento social relacionado aos empreendimentos hidrelétricos
surgiu quando:
Os atingidos foram obrigados a escolher entre resistir à construção ou
desistir do seu modo de vida e de sua terra de trabalho. O que
ocorreu em alguns casos foi a união e organização do povo atingido,
como forma de resistência, ou ainda a “aceitação” da barragem e da
completa mudança de suas vidas. Esse processo de exclusão
desencadeado pelo atual modelo energético provocou uma nova
configuração territorial despertando novas lutas e novos sujeitos
políticos na organização do Movimento dos Atingidos por Barragens –
MAB a partir da década de 1970 (BORGES et al, 2004, p.04).
Tem sido significativo o crescimento e o desenvolvimento do Movimento
dos Atingidos por Barragens (MAB) nos últimos anos, em busca do
questionamento do modelo autoritário de planejamento do Estado brasileiro
relacionado à política energética do país. Atualmente o MAB consegue
demonstrar sua força e organização na luta social dos atingidos antes mesmo
da construção de barragens, questionando e impedindo os projetos que
29
possam desalojar milhares de camponeses com destruição do seu modo e
meio de vida (BORGES et. al., ibid).
Segundo o MAB, até o momento existem no Brasil cerca de 2.000
barragens, onde 625 encontram-se em operação; o plano até 2015 prevê a
construção de mais 494 barragens. Mas, em nenhum momento aparecem
dados de quantas famílias estão sendo afetadas pela implantação de
Hidrelétricas no país (MAB, 2009).
Para Reis (ibid, p. 498), o MAB vem abrindo novas frentes de luta, onde
contribui significativamente para mobilização de futuros atingidos por
empreendimentos hidrelétricos em diversos estados brasileiros. De modo geral,
foi o “I Encontro Nacional sobre Barragens realizado em Goiânia em 1989, que
deu origem a uma nova articulação para outros movimentos em torno do
mesmo problema”, no qual foi estabelecido o dia 14 de março como o Dia
Nacional de Luta Contra as Barragens”; a partir de 1997 quando houve a
realização do I Encontro Internacional dos Atingidos por Barragens, realizado
em Curitiba, a data passou a ser comemorada como Dia Internacional de Luta
Contra as Barragens. Porém, a partir dos desafios da privatização do setor
energético brasileiro, o movimento tem sofrido significativo retrocesso em
relação ao deslocamento compulsório das populações locais.
O MAB retomou suas intervenções de forma expressiva nos últimos anos,
mais precisamente a partir do novo século, devido a evidente expansão da
implantação de Hidrelétricas; fato este relevante para a representação social
(BOEIRA, 2006).
Embora a base fundamental do movimento seja a luta de camponeses em
busca de garantia da terra, outras questões sociais estão envolvidas; o MAB
contribui para chamar a atenção contra formas devastadoras de ações
humanas sobre o meio ambiente e na luta para obtenção de boas indenizações
para a compra de uma boa terra ou um adequado reassentamento, isto se
reflete na manutenção de valores e relações sociais que não podem ser
“realocadas”. É desta forma que a luta dos atingidos se amplia e alcança um
nível na questão da reforma agrária, porque a partir de então a luta passa a ser
entendida não só em prol da terra, mas como a busca pela manutenção e/ou
organização de um espaço integrado (BORGES et al., ibid)
30
1.4.2 A Importância da Comissão Mundial de Barragens diante de
empreendimentos hidrelétricos
Como anteriormente ressaltado, os enormes investimentos envolvidos e
as mudanças desencadeadas pelas grandes barragens provocam conflitos
acerca dos impactos dessas construções; tanto das já existentes como das que
estão em fase de projeto, tornando-se uma das questões mais importantes na
área do desenvolvimento sustentável.
No período de 1973 a 1993, as favelas de São Paulo cresceram de
700.000 habitantes para mais de dois milhões. No princípio os assentamentos
precários dispunham somente de uma ou outra conexão elétrica ilegal, porque
em parte a companhia elétrica não havia previsto a eletricidade para estas
habitações, e em parte porque as autoridades municipais não pensavam em
melhorar as favelas, pois estas eram originadas de ocupações ilegais. Em
1983, aproximadamente 100.000 moradias já possuíam acesso a eletricidade,
o que melhorou a qualidade de vida desta população, porém vale ressaltar que
o
consumo
de
eletricidade
por
unidade
familiar
também
aumentou
significativamente em menos de uma década dentro das favelas de São Paulo
(Boa Nova e Goldenberg, 1999, apud CMB, ibid, p.103).
Os defensores das barragens apontam para as necessidades de
desenvolvimento social e econômico que estas visam satisfazer, e que são
diversos, dentre eles a irrigação, a geração de eletricidade, o controle de
inundações, e outros. Os oponentes destacam os impactos adversos das
barragens, como o aumento dos orçamentos previstos, o deslocamento e a
mudança
socioeconômica
drástica
de
populações,
a
destruição
de
ecossistemas e recursos pesqueiros importantes, assim como a possível
divisão desigual dos custos e dos benefícios (MALFERRARI, ibid).
A Constituição da República Federativa do Brasil, no artigo 225 diz que:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes
e
futuras
gerações”
(BARROS
e
SYLVESTRE,
2004,
p.20).
Conseqüentemente, poder-se-ia argumentar que no estabelecimento de
31
empreendimentos devem tomar-se medidas para mitigar o máximo possível
todos os tipos de impactos ambientais e sociais.
O acesso a moradia deve ser garantido diante destes empreendimentos
Hidrelétricos, pois este é considerado um direito humano básico, o Brasil
assinou a Declaração sobre Assentamentos Humanos de Vancouver em 1976,
que dispõe o seguinte:
a moradia e os serviços adequados constituem um direito humano
básico que impõem aos governos a obrigação de assegurar seu
acesso a todos os habitantes, começando pela assistência direta aos
grupos mais vulneráveis mediante a orientação de programas de
ajuda mútua e de ação comunitária (BARROS e SYLVESTRE, 2004,
p.67).
Os autores supracitados ainda destacam que o Direito à Moradia
Adequada também fica evidente em duas grandes Conferências Internacionais
que o Brasil participou: a Agenda 21 (sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento - 1992), e a Agenda Habitat de 1996 (BARROS e
SYLVESTRE, 2004).
Com as discussões a cerca das instalações de hidrelétricas e seus
impactos cada vez mais presentes, em abril de 1997, com apoio do Banco
Mundial e da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN de
sua sigla em inglês), grupos representando diversos interesses reuniram-se em
Gland, Suíça, por ocasião da publicação de um relatório do Banco Mundial,
para discutirem questões envolvendo as grandes barragens. Neste workshop
estiveram presentes 39 participantes de governos, do setor privado, de
instituições financeiras internacionais, de organizações da sociedade civil e de
populações afetadas. Uma das propostas resultantes do encontro foi que todas
as partes trabalhassem juntas para estabelecer a Comissão Mundial de
Barragens - CMB (MALFERRARI, ibid).
A CMB é uma comissão internacional, independente e multilateral, que foi
criada com o intuito de esclarecer controvérsias referentes à construção de
barragens e buscar soluções através do “conhecimento humano e da expansão
das experiências, como o desenvolvimento de novas tecnologias e a mudança
para um processo de tomada de decisões mais aberto, participativo e
transparente” (BARROS e SYLVESTRE, ibid, p.13).
32
Em 2000, a CMB elaborou um relatório ressaltando que, enquanto
ocorrem justificativas para a construção de barragens “com fins de irrigação
agrícola, uso doméstico ou industrial, geração de energia elétrica ou controle
de inundações, o que elas têm gerado é cada vez menos riqueza, menos terras
irrigadas e servido menos água que o projetado”, porém, o mais importante são
os impactos ocasionados nas comunidades atingidas, influenciando inclusive
nos meios de subsistência destas (BARROS e SYLVESTRE, ibid, p.15).
Em Minas Gerais, segundo o Relatório da CMB, a situação é digna de
muito estudo, pois está se formando um conglomerado de centrais hidrelétricas
na região. Conforme registros do MAB existem mais de 19 mil pessoas
atingidas, contudo os números podem ser ainda maiores (BARROS e
SYLVESTRE, ibid).
Uma das principais reivindicações envolvendo diretamente populações
atingidas
por
barragens
está
relacionada
a
não
construção
de
empreendimentos hidrelétricos, onde estes alegam de uma forma expressiva
que as obras inviabilizam a reprodução dos seus modos de vida, pois “as
terras, lugares dessas populações que são alvo de negociação para a
construção de Usinas são entendidas como patrimônio da família, da
comunidade, assim como um ponto econômico” (RIBEIRO, 1993; OLIVEIRA,
2005; GALIZONI, 2000 e ZUCARELLI, 2006 apud ZHOURI e GOMES, 2007,
p.111).
A Comissão Mundial de Barragens considera que todo projeto de
barragens deveria apontar melhria da sustentabilidade do bem-estar humano,
isto quer dizer, um avanço significativo no desenvolvimento humano a partir do
fato de que seja economicamente viável, socialmente e ambientalmente
sustentável. O debate deve girar em torno de como buscamos o
desenvolvimento sem afetar nossos recursos naturais (CMB1, 2000b).
Ainda diante da visão da CMB, os problemas gerados por Hidrelétricas,
desencadeiam impactos não só para as populações diretamente afetadas, que
deverão deixar seu local de moradia, mas também, para toda a população ao
redor, que poderá apresentar alterações culturais, de seus meios de
subsistência como lazer, e outros.
1
Tradução livre de Aniely Coneglian Santos
33
O relatório da CMB é um marco na evolução das barragens com vistas ao
desenvolvimento. No estudo do desempenho das barragens, a Comissão
apresenta uma avaliação ampla de quando, como e por que estas conseguem
ou não obter necessariamente os objetivos de desenvolvimento, sugerindo uma
base racional para mudanças fundamentais na avaliação das opções, nos
ciclos de planejamento e projeto de aproveitamentos de recursos hídricos e
energéticos (MALFERRARI, ibid).
Conforme o modelo para tomada de decisões apresentado pela CMB
existem cinco valores essenciais: a equidade, sustentabilidade, eficiência,
processo decisório participativo e responsabilidade (MALFERRARI, ibid).
Diante dos impactos sociais gerados por barragens, a CMB (2000b)
constatou que muitas vezes os efeitos negativos não são adequadamente
avaliados, pois a intensidade desses impactos é considerável no que diz
respeito à vida, à subsistência e à saúde das comunidades afetadas que
dependem do ambiente ribeirinho.
Em muitos impactos evidenciados encontravam-se casos de milhões de
pessoas que viviam ao entorno das barragens, principalmente aquelas que
dependiam das funções naturais das planícies aluviais e da pesca. Em alguns
casos as pessoas deslocadas não foram devidamente indenizadas, ou aquelas
que foram reassentadas raramente tiveram seus meios de subsistência
mantidos, pois os programas de reassentamento em geral concentram-se na
mudança física, excluindo a recuperação econômica e social dos deslocados,
porém constatou-se que quanto maior a amplitude do deslocamento, menor a
probabilidade de que os meios de subsistência das populações afetadas
possam ser restaurados (MALFERRARI, ibid).
De um modo geral, os estudos realizados pela CMB, demonstraram que
eventos inesperados e mudanças no desempenho do desenvolvimento do
projeto hidrelétrico podem conduzir em uma demora significativa na conquista
da geração de energia elétrica. Uma busca por produção de energia elétrica
através de Usinas de grande porte como a Usina de Tucuruí pode ter seu
término sem relativa previsão de conclusão e lucro (CMB, 2000b).
Na visão da CMB, a barragem de Tucuruí (instalação hidrelétrica operada
pela Eletronorte até o ano de 2000) representou um prejuízo no início de seu
empreendimento, pois, neste período calculou-se custos de geração de energia
34
equivalente a US$40 a 58/MWh, porém em 1998 cerca da metade desta
produção foi para a indústria no preço de US$24/MWh. Diante da falta de
dados precisos, não se pode afirmar que Tucuruí poderia recuperar seus
custos diante desta disponibilização para o setor industrial (CMB, 2000b).
Há também as construções de barragens para tentar controlar as grandes
inundações. O Japão é o maior exemplo de implantação de Hidrelétricas para
controle de desastres como este, prevenindo catástrofes que influenciem no
meio social, como perda de propriedades, falta de alimentos e principalmente
os impactos que podem ser gerados na saúde (CMB, 2000b).
Ainda conforme a visão da CMB, os impactos ambientais gerados por
grandes barragens são classificados pelos estudiosos em: impactos de
primeira ordem, que implicam as conseqüências físicas, químicas e
geomorfológicas; os impactos de segunda ordem, que implicam as mudanças
biológicas dos ecossistemas; e os impactos de terceira ordem, que englobam
as alterações na fauna.
Outro aspecto relevante destacado no Relatório da CMB (2000b),
referente aos impactos socioeconômicos esta relacionado à etapa de
planejamento e desenvolvimento das obras de Hidrelétricas, que podem com
sua demora no processo de construção, levar comunidades a uma estagnação
no desenvolvimento e bem-estar, pois estas poderão permanecer por muitos
anos, ou até esperar por décadas a implantação de uma obra.
Há também a geração de novos empregos, previstos ou não no processo
de planejamento das Hidrelétricas, que podem favorecer ou prejudicar a
população local, trazendo novos empregados para o local, ou gerando
empregos temporários que futuramente poderão influenciar no parâmetro de
desemprego local.
Nos relatórios estudados sobre a CMB, percebe-se que esta busca
estabelecer através de seus estudos, um comprometimento com os valores
individuais e sem perder o propósito, onde as partes envolvidas precisam
participar ativamente no processo, porém sem deixar de levar em consideração
os direitos e riscos e a importância das dimensões sociais e ambientais das
barragens.
35
1.5 Relação sociedade – natureza
Desde os primórdios, o homem interage com a natureza em busca de sua
sobrevivência, muitas idéias e teorias foram criadas para compreender esta
relação que se reflete até os tempos atuais. Porém, no modo de vida
contemporâneo a tecnologia tem afastado a sociedade da natureza (CARMO,
2001).
Para Perondi (2004, p.02), a sociedade possui a função de ressocializar a
natureza, atuando nela a partir de dentro, mas a individualização do homem o
distancia de sua própria sociedade, e, por conseguinte da natureza. “Na
Renascença, a cidade se tornou sinônimo de civilidade, o campo de rudeza.
Tirar os homens das florestas e encerra-los na cidade era o mesmo que
civiliza-los”, mas a fraca infraestrutura para uma lotação cada vez maior
transformou o ambiente urbano.
De acordo com Oliveira (2001, p.52), a diferença entre comunidade e
sociedade poderia assim ser definida:
...a comunidade seria um agrupamento humano com um grau elevado
de intimidade e coesão entre seus membros e onde predominam os
contatos sociais primários, com influência fundamental da família. Já
a sociedade, seria estruturada por leis escritas, e as relações sociais
seriam mais formais e impessoais; com indivíduos que independem
uns dos outros para seu sustento e menos obrigados moralmente
entre si.
É possível perceber uma relação mútua entre sociedade e natureza, onde
a sociedade reage às mudanças da natureza, da qual ela é um dos pontos,
assim como a natureza, envolvendo-a, responde ao que acontece nas
sociedades de alto escalão nos ramos do mundo vivo (PERONDI, ibid).
Por volta dos anos 60, vários movimentos sociais acompanhados por
debates epistemológicos no campo da ciência, lançaram novas bases para
tentativa de superação dos pensamentos divergentes entre natureza e cultura.
Os ecologistas foram rotulados como românticos e ingênuos opositores do
progresso (LUDWIG, 2008).
O crescimento populacional muito influenciou no comportamento humano,
que em busca do desenvolvimento tem transformado o meio a sua volta. Os
36
fatores relacionados a este, são diversos incluindo: a produtividade de grãos,
água
para
oportunidade
consumo,
de
biodiversidade,
emprego,
alterações
plantações,
no
florestas,
clima,
habitação,
oceanos,
energia,
urbanização, áreas naturais para lazer, educação, lixo, produção de carne e
renda (CARMO, ibid).
Conforme Leff (ibid), o ambiente não é apenas uma realidade visível, mas
sim uma convergência de processos físicos, biológicos e simbólicos, que
através de ações econômicas, científicas e técnicas do próprio homem são
reorganizadas e reconduzidas. Este afirma ainda, que a cidade converteu-se
pelo capital, onde os processos urbanos se alimentam da super exploração dos
recursos naturais e desestruturação do entorno ecológico.
É importante ressaltar que para Leff (ibid), a relação entre o homem e o
ambiente, poderá resultar em drásticas influências socioeconômicas de caráter
ecodestrutivo, gerando um círculo vicioso de desenvolvimento de degradação
ambiental onde a pobreza pode ser o principal reflexo. Para o autor, não se
deve discutir a “tecnologia”, mas sim a sua influência sob o meio, de como esta
pode influenciar em todo contexto cultural, social, científico e no conhecimento
tradicional local.
Mariano Neto (2003), também relata a influência da cultura na percepção
das coisas inexistentes, onde o conceito de cultura e meio ambiente são
superpostos aos de homem e natureza.
Com o passar dos anos, a busca por maior rentabilidade virou um jogo de
acumulação de riquezas, onde as coisas naturais só são interessantes se
puderem ser transformadas em coisas monetárias (LUDWIG, ibid).
Analisando os diferentes impactos desencadeados pela produção de
energia elétrica em plena expansão, percebe-se que todas as modalidades de
produção desta energia provocam alterações na natureza (REIS e SILVEIRA,
2000 apud SILVA e CARVALHO, 2002). Porém, algumas destas podem
provocar maiores taxas de impactos não só ambientais mais também, culturais
e sociais (SILVA e CARVALHO, ibid).
37
1.6 Realocação de População
Realocação seria a transferência e reconstrução de bens ou instalações
comunitárias, de uso coletivo ou público (MÜLLER, ibid, p.298). Porém,
apresenta-se vinculada a questão de desapropriação das terras, ou seja, a
aquisição legal destas para execução de empreendimentos ou segurança da
população afetada.
A realocação de famílias é embasada na necessidade de transferência do
lugar, espaço ou território, os quais se iniciam pelo processo de desapropriação
da terra, onde serão realizadas as obras do empreendimento. No caso desta
pesquisa, abrange principalmente o risco da inundação de terras ocasionados
pela criação do reservatório da Usina.
1.6.1 Desapropriações
As palavras desapropriar e expropriar são utilizadas como sinônimos, e no
dicionário da língua portuguesa é definido como “privar alguém da propriedade
de”, não se pode ver como um meio de negar o direito de propriedade, mas sim
onde ocorre uma permuta de valores, substituindo um bem por outro bem
(FERREIRA, 1975, p.440 apud RIBEIRO, 2008).
Segundo Müller (ibid), para a formação dos reservatórios que são criados
para a implantação de Usinas Hidrelétricas, muitas terras são inundadas,
devido ao risco de acumulação de águas que são desencadeadas por este
processo. Neste contexto, há duas formas de desapropriação, uma relacionada
à utilidade pública e outra por interesse social.
Conforme Souza (2006, p.02), a desapropriação é um direito do Estado
traduzido no procedimento regido pelo Direito Constitucional-Administrativo,
“visando à imposição de um sacrifício total, por justa causa, de determinado
direito patrimonial, particular ou público”, respeitando a hierarquia e por através
de indenizações prévias e justas, com ressalvas constitucionais.
38
Com relação ao direito de propriedade, a Constituição Federal de 1988
prevê a possibilidade de o Poder Público retirar bem do patrimônio de particular
para atender ao interesse público, disposta no inciso XXIV do artigo 5°, da
Constituição Federal dispõe que “a lei estabelecerá o procedimento para
desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social,
mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos
previstos nesta Constituição” (BANCO MUNDIAL, ibid, p.14).
No intuito de maiores esclarecimentos sobre um paralelo a esta pesquisa,
abaixo está caracterizado conforme a lei de desapropriação - Decreto-lei Nº
3.365, de 21 de junho de 1941 os casos de desapropriação por utilidade
pública e interesse social.
Art. 1º A desapropriação por utilidade pública regular-se-á por esta
Lei, em todo o território nacional.
Art. 2º Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens
poderão ser desapropriados, pela União, pelos Estados, Municípios,
Distrito Federal e Territórios.
§ 1º A desapropriação do espaço aéreo ou do subsolo só se tornará
necessária, quando de sua utilização resultar prejuízo patrimonial do
proprietário do solo.
Art. 5º Consideram-se casos de utilidade pública: o aproveitamento
industrial das minas e das jazidas minerais, das águas e da energia
hidráulica; (LEI N° 3.365, 1941 apud BANCO MUNDIAL, ibid, p.15).
No caso de Utilidade Pública – que é o enfoque desta pesquisa – segundo
a disposição preliminar sobre legislação, caracteriza que, a Constituição
Federal, sem dúvida tenta conferir maior garantia aos cidadãos, quando
estabelece a necessidade de indenização justa e prévia ao ato de
desapropriação.
Contudo,
ainda
se
faz
necessário
uma
política
de
compensação social à população que tem sua terra desapropriada, onde
frequentemente, a retirada de determinadas comunidades geram tensão nos
processos de licenciamento ambiental.
Segundo Müller (ibid, p.292) no caso, de ações judiciais federais de
desapropriações, estas devem preceder a implantação do empreendimento. O
autor assinala que o processo de desocupação deve iniciar-se na fase de
estudos de inventário da bacia hidrográfica.
Para
Ribeiro
(2008)
as
desapropriações
em
empreendimentos
hidrelétricos envolvem três aspectos: perda patrimonial, das condições de vida
e produção, e expropriação simbólica. Estas questões podem ocorrer a curto,
39
médio ou em longo prazo, dependendo das condições de reprodução que a
população atingida irá desencadear durante as negociações.
Pode-se afirmar que muitas reivindicações inerentes à questão ambiental,
que surgem nas audiências públicas na fase de licenciamento de grandes
empreendimentos, resultam do fato de não propiciar à comunidade deslocada o
seu devido reassentamento ou indenizações justas (MALFERRARI, ibid).
1.7 Realocação de População em Empreendimentos Hidrelétricos
Com o processo acelerado do capitalismo em busca de maiores recursos
para o desenvolvimento tecnológico, a Energia Hídrica apresenta grande
potencial de expansão no Brasil. Como conseqüência destes empreendimentos
a realocação de pessoas que vivem acerca destas microrregiões estão sendo
diretamente afetadas, resultando em um cenário social completamente
modificado por estes empreendimentos.
Diante disto, muitos confrontos, desentendimentos podem ocorrer ficando
de um lado a população diretamente afetada e do outro o Empreendedor.
Neste campo de conflitos, onde diferentes posições sustentam forças
desiguais, prevalece muitas vezes uma política socialmente injusta e
ambientalmente insustentável (SIGAUD et al., 1987 e VAINER, 2004 apud
ZHOURI e OLIVEIRA, ibid).
Para Müller (ibid), qualquer atividade econômica pode provocar impactos
positivos ou negativos em seu entorno, onde em muitos casos estes impactos
desencadeiam processos de degradação ambiental.
De acordo com o CNEC (ibid), a avaliação das propriedades rurais e
urbanas a serem indenizadas devido ao empreendimento, deverá obedecer os
critérios estabelecidos pelas Normas Brasileiras – NBR2. Entretanto, nos
reassentamentos rurais devem ser obedecidos os critérios estabelecidos pelo
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) sobre módulos
rurais para a área de inserção do empreendimento.
2
Denominação de norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT
40
Segundo Ipardes (1977 apud Müller, 1995), nas realocações devem ser
considerados alguns campos que são relevantes neste processo:
1)
A História da ocupação, a qual leva em consideração particularidades
étnicas, culturais e econômicas;
2)
Os Fatores Demográficos, onde serão avaliadas a densidade rural e/ou
urbana e suas distribuições, levantamento da saúde e educação;
3)
Fatores Operacionais, no que devem ser avaliados os recursos naturais,
topologia, solos, hidrologia, geografia das comunidades e infra-estrutura;
4)
Estrutura Produtiva, onde se destacam o dinamismo econômico das
áreas, bem como a produtividade dos solos. A avaliação deste campo
depende de conhecer as variedades culturais como também de criações e
desenvolvimento tecnológico e industrial;
5)
Infra-estrutura econômica pertence ao grupo de transportes locais,
energia elétrica, comunicações, deve ser avaliada com cautela se estes
forem
diretamente
afetados
pelo
empreendimento
para
serem
devidamente deslocados;
6)
Infra-estrutura social, que englobam aqui os sistemas educacionais,
saúde, saneamento e habitação, onde diversos aspectos dentro destas
variáveis podem ser expressivos em termos de impactos sociais, e um
dos principais pontos a ser abordado nesta pesquisa;
7)
Desenvolvimento regional, seria considerado o dinamismo, como ocorre
ou irá transcorrer o processo de desenvolvimento local devido à influência
da UHE
Cada empreendimento hidrelétrico pode impactar de modo diferenciado
na população em questão, podendo desencadear um choque cultural sobre a
questão social, onde a realocação sempre gera desestruturação das relações
sociais e dos processos produtivos tradicionais na visão de Müller (ibid).
Segundo a CMB (2000a, p.12), foi constatado que muitos impactos
sociais negativos não são considerados, e um dos fatores que se destaca para
Comissão é que aquelas pessoas reassentadas raramente tiveram seus meios
de subsistência restaurados, pois no geral a preocupação dos empreendedores
“concentram-se na mudança física, excluindo a recuperação econômica e
social dos deslocados”.
41
Outra questão abordada por Penido (2008), no caso da UHE de
Candonga,
é
que
além
das
famílias
afetadas
diretamente
pelo
empreendimento, outras inúmeras famílias (que não sofreram o deslocamento),
tiveram
comprometida
sua
capacidade de
trabalho,
assim
como as
comunidades de cidades vizinhas.
No caso de Candonga, o uso de força policial foi aplicado para a
exigência de realocação a 20 (vinte) famílias que se recusaram a migrar para o
reassentamento de Novo Soberbo, gerando um impacto social alimentado por
ações de violência (PENIDO, 2008).
Nos EIA-RIMA‟s os programas para reassentamento, surgem como
medidas “mitigadoras, como forma antecipatória de relativizar/dissimular as
conseqüências ambientais dos empreendimentos nas áreas onde serão
instalados” (PENIDO, 2008, p.09).
Ainda
nesta
empreendimento
percepção,
como
os
um
discursos
fato
concreto,
ideológicos
abordam
indispensável
para
o
o
desenvolvimento do país, mas não é avaliado que mesmo o “antigo” lugar,
apesar de não possuir a modernidade das “novas” casas, era um lugar que
fornecia “os elementos básicos à reprodução do modo de vida de seus
moradores (PENIDO, 2008, p.11).
Portanto,
acompanhada,
a
estratégia
levando
em
de
realocação
consideração
as
precisa
ser
muito
peculiaridades
de
comunidade, tornando-se fundamental o estudo paralelo a este processo.
42
bem
cada
CAPÍTULO 2
MEDIDAS AMBIENTAIS ENVOLVIDAS NO PROCESSO DE
IMPLANTAÇÃO DA USINA HIDRELÉTRICA BAGUARI
2.1 Impactos Ambientais gerados por implantação de Hidrelétricas e as
Legislações envolvidas
Os Impactos Ambientais ocasionados pela implantação de Usinas
Hidrelétricas são muito amplos e envolvem um enfoque multidisciplinar na
abordagem do tema. Com a evolução tecnológica, e o processo de
industrialização, houve um aumento no investimento de geração de energia
elétrica,
com
isto
também
uma
crescente
denúncia
dos
impactos
socioambientais dos projetos de barragens em questão.
Conforme
cita
Rothman
(2008)
apesar
desta
representatividade
expressiva, não foi suficiente para minimizar as ideias de desenvolvimento
trazidas pelo Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) desenvolvido no
Governo Lula com o discurso de progresso. Com isso o PAC estimulou a
construção de grandes barragens, principalmente na bacia amazônica e Estado
de Minas Gerais, aumentando os debates e conflitos nesta área.
Como resposta aos estudos e protestos a nível mundial, “o Banco Mundial
criou um Departamento de Meio Ambiente e adotou exigências e critérios para
a elaboração de estudos de Impactos Ambientais como condição de
financiamento de projetos” (ROTHMAN, 2008, p.22).
43
A conceituação do que seja Impacto Ambiental a nível mundial data do
período da Revolução Industrial e este tem sido alterado constantemente. Isto
se deve às diferentes atividades humanas que podem afetar o meio ambiente.
Entretanto, a adoção de uma forma dinâmica para a avaliação de impactos
ambientais somente teve início na década de sessenta (SILVA,1999).
Estados Unidos foi um dos países pioneiros na definição legal de
objetivos e princípios da política ambiental, através da Lei Federal denominada
"National Environment Policy Act - NEPA" aprovada em 1969. Assim, começou
a ser exigido que todos os empreendimentos que pudessem gerar impactos
procedessem, dentre outras obrigações: “(a) a identificação dos impactos
ambientais, (b) a caracterização dos efeitos negativos e (c) a definição de
ações e meios para mitigação dos impactos negativos” (SILVA, ibid,p.01).
A partir de então, diversas organizações internacionais como a ONU
(Organização das Nações Unidas), passaram a exigir cooperação econômica
através dos estudos de avaliação de impacto ambiental (SILVA, ibid).
Durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano,
realizada em 1972 em Estocolmo, Suécia, surgiu a Declaração de Estocolmo
que, de acordo com McCormick (1992, p. 109 apud Viana, 2003, p.70) “não se
visava definir cláusulas de cumprimento obrigatório, mas „inspiracional‟,
registrando os argumentos essenciais do ambientalismo humano, e atuar como
um prefácio para os princípios, delineando metas e objetivos amplos”. A
responsabilidade dos Estados signatários é de assegurar que as atividades
empreendidas dentro de sua jurisdição ou controle não causem dano ao meio
ambiente ou a outros Estados foi estabelecida no princípio número 21 da
Declaração de Estocolmo (VIANA, ibid).
A Carta Mundial para a Natureza, criada dez anos após a Declaração de
Estocolmo, ampliou e reiterou a responsabilidade dos Estados e de outras
autoridades públicas, organizações internacionais, indivíduos, grupos e
corporações de assegurar que as atividades realizadas dentro de sua jurisdição
ou controle não causem danos ao ecossistema natural de outros Estados ou de
áreas externas à jurisdição nacional (VIANA, ibid).
No Brasil, a elaboração de leis para este fim, iniciou-se de forma
expressiva com a edição da Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, que
estabeleceu os critérios para uma Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA)
44
criando o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), o Conselho
Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), e os órgãos seccionais, entidades
estaduais responsáveis pela execução de programas e projetos de controle e
fiscalização das atividades capazes de provocar a degradação da qualidade
ambiental. O SISNAMA delega em caráter supletivo aos Estados a elaboração
de normas complementares abordando o desenvolvimento econômico e social
com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico
(CNEC, ibid).
Com isto também foram definidas as áreas prioritárias de ação
governamental; o incentivo ao desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias
nacionais priorizando o uso racional de recursos ambientais; pensando,
contudo, na divulgação de dados e informações ambientais de acesso facilitado
para a formação de uma consciência pública voltada para a preservação da
qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico (WUNDER, 2003).
Esta mesma lei, em seu art.10, estabeleceu como instrumento da Política
Nacional do Meio Ambiente, o licenciamento das atividades efetiva ou
potencialmente poluidoras, conforme citação abaixo:
Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e funcionamento de
estabelecimento e atividades utilizadoras de recursos ambientais,
considerados efetiva ou potencialmente poluidores, bem como os
capazes, sob qualquer forma de causar degradação ambiental
dependerão de prévio licenciamento por órgão estadual competente,
integrante do SISNAMA, sem prejuízo de outras licenças exigíveis
(CNEC, ibid, v.01, cap.03, p.09).
Percebeu-se que o contexto abordado pela PNMA precisava ainda de
uma regulamentação específica, através deste fato, algumas questões
pertinentes a esta Lei foram regulamentadas pelo CONAMA em 23 de janeiro
de 1986, através da Resolução nº 001, sendo atribuídas responsabilidades aos
órgãos públicos com atuação na área ambiental (BRASIL, 1986).
Através da Resolução n° 006, de setembro de 1987, foram estabelecidas
regras especiais sobre o licenciamento ambiental em obras de grande porte,
ficando determinada à obrigatoriedade da elaboração do Estudo de Impacto
Ambiental (EIA); e do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), (MÜLLER,
2006). Porém o que se percebe na elaboração destes instrumentos é uma
“prevalência da capacidade técnica sobre os demais aspectos da vida social,
uma vez que não são considerados os saberes populares para a elaboração
45
dos dois estudos ambientais, ou a validação de outras racionalidades que
pensam e discutem o projeto de desenvolvimento em avaliação” (WUNDER,
ibid, p.80).
Atualmente existem várias leis voltadas para a proteção ou autorização da
utilização de recursos hídricos, dentre destas, a Lei nº 9.433, de 8 de fevereiro
de 1997 - que Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, criando o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos; regulamenta o
inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal; e altera o art. 1º da Lei nº 8.001,
de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de
1989 (CNEC, ibid, v.01, cap.03, p.05).
Conforme CNEC (ibid) da Lei nº 9.433 destaca-se:
O art. 11 que define o regime de outorga de direitos de uso de
recursos hídricos tem como objetivo assegurar o controle quantitativo
e qualitativo dos usos da água e o efetivo exercício dos direitos de
acesso à água.
O art. 12 que determina que estão sujeitos a à outorga pelo Poder
Público os direitos dos seguintes usos de recursos hídricos.A outorga
e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia
elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos,
aprovado na forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei,
obedecida a disciplina da legislação setorial específica (§ 2º do
art.12).
O art. 24 que salienta que os municípios poderão receber
compensação financeira ou outro tipo que tenham áreas inundadas
por reservatórios ou sujeitas a restrições de uso do solo com
finalidade de proteção de recursos hídricos. No entanto, o § 3º dispõe
que o mesmo não se aplica às áreas de preservação permanente
previstas nos arts. 2º e 3º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de
1965, alterada pela Lei nº 7.803, de 18 de julho de 1989 (inciso I, art.
24) e aos aproveitamentos hidrelétricos (inciso II) (BRASIL, LEI Nº
9.433/97 apud EIA-CNEC, ibid, v.01, cap.03, p.06).
Muitos consideram o EIA e RIMA sinônimos, porém o Estudo de Impacto
Ambiental é descrito como de maior abrangência que o Relatório e o engloba
em si mesmo. O EIA compreende o levantamento da literatura científica e legal,
trabalhos de campo, análises de laboratório e a própria redação do relatório. Já
o RIMA, vem para esclarecer o empreendimento (MACHADO, 1992 apud
MÜLLER, ibid, p.63). O RIMA também deve traduzir as informações em uma
linguagem acessível, ilustradas por mapas, cartas e quadros, gráficos e demais
formas de comunicação para o bom entendimento das vantagens e
desvantagens do projeto, incluindo claramente as conseqüências ambientais
em sua implantação (SILVA et. al., 2006).
46
O objetivo central do Estudo de Impacto Ambiental seria evitar que uma
obra, aceitável pelo ponto de vista econômico, futuramente se transforme em
um desastre ambiental. Em suma, o EIA deve avaliar a viabilidade ambiental do
projeto, incluindo a avaliação de alternativas de localização do crescimento em
termos de impacto ambiental, custos, benefícios. O mesmo deve ser realizado
por uma equipe multidisciplinar habilitada, não dependente direta ou
indiretamente do proponente do projeto, onde será responsável tecnicamente
pelos resultados apresentados (MÜLLER, ibid).
Os EIA/RIMA, devem ser elaborados na fase preliminar do planejamento
do
empreendimento
e
devem
conter
requisitos
básicos,
orientações,
recomendações e limitações que deverão ser atendidas nas etapas de
planejamento, instalação e operação do empreendimento (CNEC, ibid).
O EIA e o RIMA, devem ser discutidos com a população do local do
empreendimento, através de audiências públicas, onde todas as perguntas
devem ser adequadamente respondidas. É neste momento que durante as
audiências, a comunidade deveria exercer seus direitos, mediante suas
opiniões, reclamações e sugestões exigindo medidas compensatórias pelos
impactos que o empreendimento irá causar ou até mesmo rejeitar o projeto
(CUT, 2000 apud SILVA, et al. ibid). Porém corresponde esclarecer que nas
audiências públicas dificilmente as comunidades conseguem de fato garantir
seus direitos.
Estes documentos deveriam demonstrar uma real percepção de quais
impactos ambientais poderão ser desencadeados a nível ambiental tanto
quanto referente às populações que pertencem a áreas de abrangência do
empreendimento; onde desta forma pode-se direcionar a viabilidade ou não da
obra (WUNDER, ibid).
Como já assinalado anteriormente, Impacto Ambiental de acordo com O
Art. 1º da Resolução do CONAMA nº 001, é definido como
qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do
meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia
resultante, das atividades humanas que, direta ou indiretamente,
afetam”: a biota, saúde, segurança e bem-estar da população,
atividades sociais e econômicas, condições estéticas e sanitárias do
meio ambiente, e qualidade dos recursos ambientais (BRASIL,
RESOLUÇÃO DO CONAMA Nº 001, Art.1º, 23 DE JANEIRO DE
1986).
47
Para Spadotto (2002), esta definição exclui o aspecto de significância, já
que considera como impacto ambiental “qualquer alteração...”, independente
de ser ou não significativa.
Diante desta definição, juridicamente o conceito de impacto ambiental se
refere exclusivamente aos efeitos da ação humana sobre o meio ambiente
(SILVA et al., 2006).
As formas de avaliação de impactos ambientais são aplicadas através de
instrumentos utilizados para “coletar, analisar, avaliar, comparar e organizar
informações qualitativas e quantitativas sobre os impactos ambientais
originados de uma determinada atividade modificadora do meio ambiente”
(SAPADOTTO, ibid, p.02).
Conforme a PNMA, foi estabelecido o licenciamento das atividades efetiva
ou potencialmente poluidoras, de acordo com a localização e a natureza do
projeto, a licença é concedida pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e
Recursos Renováveis (IBAMA), ou por alguma outra secretaria relacionada
com o SISNAMA (MÜLLER, ibid).
O processo de licenciamento deveria garantir o cumprimento da
legislação e das normas estabelecidas, possibilitando a participação social
envolvida, até mesmo através da Audiência Pública obrigatória. Nos últimos
tempos as discussões a cerca do licenciamento vêm sendo alvo dos meios de
comunicação, onde um grande debate de posicionamento foi traçado, um dos
lados desenham o licenciamento como um “entrave” para o desenvolvimento,
já o outro lado defende que ele serve de instrumento da avaliação ambiental
(ZHOURI et al., 2005).
Nesta visão Zhouri e Rothman (2008, p.125) assinalam que a análise dos
casos em Minas Gerais, “permite ainda uma leitura do processo de
licenciamento ambiental como espaço de confronto entre modos distintos de se
pensar o território e seus usos”.
É de competência do CONAMA fixar os critérios básicos segundo os
quais será exigido o EIA, e delegam ao Poder Público Estadual controlar e
expedir as seguintes licenças, conforme o Art. 8º , incisos I, II e III, da
Resolução N° 237, de 19 de Dezembro de 1997 (CNEC, ibid):
Licença Prévia (LP) – concedida durante a etapa de planejamento.
Contém informações sobre o local, a construção e o funcionamento
48
do projeto, assim como dados referentes às disposições previstas
pelo governo na região; Licença de Instalação (LI) – trata-se de
autorização para a construção do projeto de acordo com a última
análise dos planos de construção; Licença de Operação (LO) – é
concedida após controle da execução correta das exigências da LI,
como também das exigências do Estudo de Impacto Ambiental
(MÜLLER, ibid, p.88).
As orientações, recomendações e limitações estabelecidas no EIA/RIMA,
quando aprovadas pelo órgão competente, com a liberação da Licença Prévia,
após audiência pública, apresentam força normativa, diante do empreendedor
tanto quanto para a sociedade, visando a conservação e preservação do meio
ambiente, que pertencem a todos, por direito assegurado pela Constituição da
República Federativa do Brasil (CNEC, ibid).
Vale ressaltar que a Constituição Federal de 1988 também criou
condições para flexibilizar a administração da política ambiental, trabalhando
com a descentralização e permitindo assim que estados e municípios
adotassem posição ativa diante das questões ambientais locais. Porém, podese dizer que, ainda as questões ambientais são um grande desafio diante do
debate social (ROESLER et. al., 2005).
Nesta perspectiva, alguns estados brasileiros, como Minas Gerais e a
Bahia, buscam formas de tornar o processo de licenciamento ambiental mais
eficiente. A abordagem inovadora do Estado de Minas Gerais diferencia-se do
Federal, sobretudo pela classificação das atividades conforme o grau de
Impacto Ambiental. Essa definição permite que as atividades de impacto não
significativo sejam dispensadas do processo de licenciamento ambiental,
estando apenas sujeitas à Autorização Ambiental de Funcionamento emitida
pelo órgão estadual.
O Decreto Estadual nº 44.309, de 05 de junho de 2006, que dispõe
sobre o licenciamento ambiental estadual, atribui a competência para
sua realização ao Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM),
por intermédio dos órgãos que o compõem, quais sejam: a Fundação
Estadual do Meio Ambiente (FEAM), as Superintendências Regionais
de Meio Ambiente, as Unidades Regionais Colegiadas, o Instituto
Estadual de Florestas (IEF) e as Câmaras Especializadas do COPAM
(BANCO MUNDIAL, 2008, p.19).
A análise do processo de licenciamento, diante do Conselho de Política
Ambiental (COPAM) é feita em função do grau de impacto ambiental dos
empreendimentos. A necessidade ou não de licenciamento ambiental ou
Autorização Ambiental de Funcionamento é estabelecida no Decreto Estadual
49
nº 44.309, entretanto o COPAM é o responsável por estabelecer os critérios
para a definição de poluição ou degradação do meio ambiente (BANCO
MUNDIAL, ibid).
Para classificar as atividades sujeitas ao licenciamento ambiental, o
COPAM
estabelece
critérios
para
definir
o
porte
e
potencial
poluidor/degradador:
Art. 5º Para fins de licenciamento ambiental, de autorização ambiental
de funcionamento e de fiscalização ambiental, os empreendimentos e
atividades serão classificados, em função de seu porte e potencial
poluidor ou degradador, da seguinte forma:
I - Classe 1, formada a partir das seguintes conjugações: a) pequeno
porte e pequeno potencial poluidor ou degradador; b) pequeno porte
e médio potencial poluidor ou degradador;
II - Classe 2, formada a partir da conjugação de médio porte e
pequeno potencial poluidor ou degradador;
III - Classe 3, formada a partir das seguintes conjugações: a)
pequeno porte e grande potencial poluidor ou degradador; b) médio
porte e médio potencial poluidor ou degradador;
IV - Classe 4, formada a partir da conjugação grande porte e pequeno
potencial poluidor ou degradador;
V - Classe 5, formada a partir das seguintes conjugações: a) médio
porte e grande potencial poluidor ou degradador; b) grande porte e
médio potencial poluidor ou degradador;
VI - Classe 6, formada a partir da conjugação grande porte e grande
potencial poluidor ou degradador (MINAS GERAIS, DECRETO Nº
44.309/2006 apud CNEC, 2002, v.01, cap.03, p.10).
As informações referentes às características técnicas socioeconômicas e
ambientais de uma obra como as Hidrelétricas, fundamentam-se nos EIA/RIMA
como já exposto anteriormente. Estes documentos devem ser elaborados a
partir de um “Termo de Referência” que é emitido pelo órgão ambiental,
indicando ao empreendedor o que necessariamente deve estar incluso nos
EIA/RIMA, onde há um roteiro a ser seguido. A base do licenciamento é a
participação garantida das comunidades locais. “Por isso, os Termos de
Referência
deveriam
comunidades
ser
atingidas”,
discutidos
pensando
em
em
público,
suprir
as
sobretudo
demandas
com
as
destas
comunidades (ZHOURI et. al., ibid, p.104).
Para Lacorte e Barbosa (1995, apud Zhouri et. al., ibid), a transparência
da construção do EIA/RIMA não está pautada somente na participação e
construção destes pela comunidade, mas principalmente ao fato de que as
empresas de consultoria ambiental que elaboram os estudos serem
contratadas pelo próprio empreendedor; ou seja, desta forma o EIA/RIMA pode
50
ser visto como uma mercadoria que será adquirida pelo empreendedor, cujo
objetivo é ser aprovado pelos órgãos licenciadores.
Cortez (2005 apud Karpinski, ibid), também reafirma o relato acima,
referindo
que
os
EIA‟s
muitas
vezes
limitam-se
à
justificação
dos
empreendimentos ao contrário de relatar seus verdadeiros impactos. O autor
vai além, afirma que no Brasil há uma verdadeira indústria destes relatórios que
não se preocupa em questionar o empreendimento e sim justifica-lo a qualquer
custo, mesmo que ocorram omissões de informações significativas.
Desta forma, de acordo com autores Cortez (2005 apud Karpinski, ibid) e
Lacorte e Barbosa (1995, apud Zhouri et. al., ibid) , a comunidade passa a ter
conhecimento oficial do projeto somente durante a Audiência Pública, o que
cai em contradição com a Resolução do CONAMA 001, de 23/01/86, que
regula a estrutura do EIA/RIMA.
Referente à UHE Baguari, vários estudos ambientais citados acima foram
realizados para a viabilidade do empreendimento. Estes foram concretizados
em 2001, tendo se iniciado o processo de licenciamento ambiental em Janeiro
de 2002, quando o EIA/RIMA foi protocolado junto à FEAM e, solicitada a
concessão da Licença Prévia do empreendimento. A Licença Prévia da UHE
Baguari ao “no 156, de 29/10/2004, sendo concedida dentro do Processo
COPAM 046/2002/0001/2002 e conforme Parecer Técnico Divisão de InfraEstrutura de Energia (DIENE) 030/2004”. Sendo assim, se tornou viável a
participação do Consórcio Baguari, envolvendo as empresas Neoenergia,
CEMIG e Furnas referentes ao “Leilão ANEEL no 002/2005, através do qual
passou a deter a concessão do UHE Baguari”, iniciando a etapa de
Licenciamento de Instalação (AMPLO, 2007, RE-PCA-BAG-SOC-001, p. 03).
Neste mesmo período, houve a elaboração pelo Consórcio de um Termo
de Acordo, como resultado do processo de negociação com a comunidade
atingida, o qual definiu o processo das ações para a realocação das famílias.
Para desatacar a necessidade e amplitude do estudo referente ao
município de Periquito, a TABELA 2 demonstra a extensão linear dos trechos
que serão afetados pela UHE Baguari.
51
TABELA 2: MUNICÍPIOS AFETADOS PELO RESERVATÓRIO - EXTENSÃO LINEAR
MUNICÍPIOS
Governador Valadares
Periquito
Alpercata
Fernandes Tourinho
Sobrália
Iapu
SUBTOTAIS
TOTAL
TRECHOS AFETADOS (km lineares)
No Rio Doce
No Rio Corrente Grande
extensão
margem
Extensão
Margem
2,6
5,0
Esquerda
esquerda
17,4
5,0
Direita
0,4
13,8
direita
5,8
1,8
21,8
5,0
26,8
FONTE: EIA (CNEC, 2002, vol. 01, cap.02, p. 23)
Diante das discussões supracitadas, fica evidente que o licenciamento
ambiental é um procedimento administrativo realizado como uma exigência
legal do Estado na realização de atividades que poderão causar impactos
ambientais (Zhouri, et. al., ibid).
2.2 Impactos Esperados Pelo Empreendedor da UHE Baguari
Dentro do contexto de Impactos Ambientais direcionados aos aspectos
Socioeconômicos do empreendimento da UHE Baguari, o EIA levantadou
prognósticos referentes à previsão do cenário destes, nos quais destacam-se
de forma resumida (CNEC, ibid):
2.2.1 Saúde
As doenças prevalecentes na região sugerem a manutenção dos
elevados índices de morbimortalidade por doenças infecciosas e parasitárias
na região, evidenciando que não há iniciativas de melhorias sanitárias e de
condições de vida da população (CNEC, ibid).
No município de Periquito fatores que privilegiam a atenção ao indivíduo
não apresentam possibilidades de mudanças significativas relacionadas à
52
saúde coletiva. No entanto, de acordo com o EIA, não atuam em um grau
elevado de degradação ambiental e sociosanitário:
Tal prognóstico se explica pelos vários modos de exposição dos
grupos humanos aos riscos identificados na ADA (Área Diretamente
Afetada) e AE (Área do Entorno), destacando-se os usos do Rio Doce
nas estratégias de sobrevivência das populações ribeirinhas, ao
exercerem atividades de pesca, de agricultura, de retirada de areia e
atividades de lazer (CNEC, 2002, v.04, cap.08, p.02).
Com relação ao quadro geral de degradação e exposição da população
aos agentes endêmicos, estes poderão contribuir para que vigorem altos
índices de doenças como: hepatite, dengue, gastrenterite, hanseníase,
esquistossomose,
tuberculose,
febre
amarela,
malária,
leptospirose
e
leishmaniose. Assim a atenção durante o processo de instalação da UHE de
Baguari deverá estar focada nas atividades de Vigilância em Saúde, que
possivelmente registrará maior número de casos de doenças notificáveis,
contribuindo para elevação dos índices de morbidade. Referente às Doenças
Sexualmente Transmissíveis (DST‟s) a sua prevalência poderá aumentar,
também associada ao fluxo migratório entre a região de estudo e o número
elevado de pessoas desta população que buscam recursos nos Estados
Unidos, mas retornam posteriormente para seu local de origem (CNEC, ibid).
Mendes (2008, p.76) assinala que “a construção de hidrelétricas
sobrecarrega os serviços, principalmente públicos, ofertados à comunidade
local dificultando ainda mais, o acesso a estes serviços”. No município de
Periquito, referente à UHE de Baguari, a maioria dos migrantes não residem no
local, porém o contingente que assim o fez, foi suficiente para aumentar a
demanda nos serviços de saúde e educação, dentre outros. Em específico, no
serviço de saúde, um aumento não previsto, pode gerar diversos transtornos,
como inacessibilidade a vacinas, medicamentos e até mesmo ações de
prevenção à saúde.
2.2.2 Saneamento Básico
Embora o Consórcio responsável pela UHE de Baguari tenha tomado
providências quanto ao saneamento básico (através da construção de sistema
53
de esgoto), para as “novas” residências no qual esteve responsável para a
realocação dos diretamente afetados por este empreendimento, contudo o EIA
assinala que na região poderão surgir problemas futuros, razão pela qual,
deverão implementar-se medidas para sua solução.
De acordo com o EIA, antes do empreendimento a população era bem
servida por redes coletoras de esgotos e, a água era de boa qualidade e em
quantidade suficiente para atender as necessidades de higiene e conforto da
população. Entretanto, a coleta de resíduos sólidos não atingia todas as
residências, assim como sua disposição em lixões ou lotes vagos era
inadequada. O sistema de drenagem pluvial era deficiente e os esgotos
sanitários e industriais coletados eram lançados diretamente nos cursos d‟água
próximos às cidades, sem qualquer tratamento (CNEC, ibid).
A sede do município de Periquito não apresenta problemas relativos ao
sistema de abastecimento de água, pois a estação de tratamento de água
apresenta capacidade de produção de 12 l/s, assim sendo, não há previsão de
ampliação nos próximos anos. Porém, a sede do município ainda não é bem
servida por redes coletoras, que vem sendo implantadas gradativamente. O
sistema de drenagem pluvial também ainda é deficiente e a manutenção da
situação atual aponta para um prognóstico desfavorável, sendo um item que
deve merecer atenção especial, por parte do município. Diante do exposto,
para a melhoria das condições atuais de funcionamento são urgentes as
seguintes ações: ampliar o sistema de microdrenagem; adotar uma política
municipal de acompanhamento das áreas de ocupação por pessoas carentes;
realizar cadastro das redes de drenagem pluvial e esgotamento sanitário
existentes; coleta especial para os resíduos hospitalares; instalação de cestas
coletoras de lixo em diversos pontos; conscientização da população sobre a
limpeza urbana, preparando-se para a coleta seletiva (CNEC, ibid).
Por sua parte, no Distrito de Pedra Corrida, o abastecimento de água não
apresenta riscos com a implantação do empreendimento, porém este quase
não é servido por redes coletoras de esgoto, predominando ainda a utilização
de fossas rudimentares e lançamentos direto no rio Doce. Vale ressaltar que
conforme o EIA (CNEC, ibid), uma percentagem significativa da população
ainda não possuía nem banheiro no domicílio. O sistema de drenagem pluvial
também ainda era praticamente inexistente, sendo destacado dentro do EIA
54
como um item que mereceria atenção especial, por parte da municipalidade. A
coleta de resíduos sólidos era insuficiente, e foi sugerido a implantação de um
aterro sanitário através dos relatórios produzidos.
2.2.3 Habitação
Havia uma preocupação pelo empreendedor com o número de
trabalhadores que poderiam se fixar no município de Periquito devido à obra
situar-se próximo a este, podendo gerar impactos habitacionais, como aumento
do aluguel ou, até mesmo, falta de imóveis para atender a esta demanda
(CNEC, ibid).
Mas, abordando o foco principal desta pesquisa, com relação à análise do
processo de realocação, o EIA ressalta:
Para os habitantes que permanecerão residindo no local após a
elevação do nível da água na área diretamente afetada, as condições
de risco sanitário serão agravadas pelo desalojamento e emigração
dos animais transmissores de doenças para as imediações. Os
moradores que serão realocados receberão impactos positivos por
serem afastados das áreas de risco sanitário, mas sofrerão impactos
negativos advindos da necessidade de adaptação aos novos locais
de moradia (CNEC, 2002, vol. 4, cap. 8, p. 10).
Porém esta visão é contraditória, pois a realocação é uma ação
mitigadora necessária pelo impacto negativo do risco sanitário diante do
processo de ralocação.
2.2.4 Educação
O EIA destaca em termos de Educação que:
a persistência, agravamento ou melhoria do quadro educacional das
Áreas de Influência, Entorno e Diretamente Afetada, independe de
ocorrer ou não o empreendimento. É de se esperar que os poderes
públicos, estadual e municipal continuem a responder,
preponderantemente, pela oferta de ensino de primeiro e segundo
graus nos municípios, com soluções de cobertura apropriadas para a
realidade de cada um, bem como transporte escolar e adoção de
programas de bolsas. (CNEC, 2002, ibid, p.02).
55
Vale ressaltar que durante o período de coleta dos dados, foi questionado
a representantes da educação (professoras) do município de Periquito e
Distrito de Pedra Corrida sobre a observação de alterações nas Escolas em
decorrência do processo de implantação da UHE Baguari. Muitos dos
professores relataram que houve uma variabilidade no número de alunos, que
seriam filhos dos funcionários vindos para trabalhar temporariamente com a
barragem, assim como também os próprios funcionários estavam buscando por
estudo.
Diante deste aspecto, e assim como o Relatório da CMB (2000a) afirma,
processos como este poderão desencadear aumento na demanda, dificuldades
de acesso as escolas em alguns casos relacionados ao aumento do nível da
água, redução da freqüência escolar, assim como influenciar no aumento das
doenças.
Há o prognóstico referente ao aumento de dificuldade de acesso dos
residentes do município e distrito a Cursos Superiores na região, devido a
possibilidade de maiores gastos com transporte escolar.
2.2.5 Recursos Hídricos e Agropecuária
Com relação aos Recursos Hídricos Subterrâneos – de acordo com
trabalhos realizados anteriormente – em curto prazo não teriam modificações,
uma vez que os parâmetros físico-químico utilizados para avaliar os índices de
qualidade da água relacionados ao Rio Doce enquadravam-se como regular,
sendo oxigenadas e quimicamente equilibradas. Porém, apresentavam
elevadas concentrações de materiais contaminantes como matéria fecal
provenientes de dejetos de esgoto de cidades ribeirinhas, de toda forma, esta
água não é utilizada pela população, que como alternativa aproveita os
recursos hídricos subterrâneos através de poços escavados ou os recursos
hídricos superficiais, através de nascentes. Portanto, mesmo com a construção
da UHE de Baguari, este cenário não sofrerá modificações (CNEC, ibid).
No EIA destaca-se que “as culturas predominantes poderão ser
incentivadas no sentido da agregação de valor, através de implantação de
56
agroindústrias, contribuindo para elevar os níveis atuais de qualidade e
produtividade, além da geração de empregos pelo aumento da escala de
produção” (CNEC, ibid, v. 4, cap.8, p.08). Este tipo de impacto no setor
agropecuário, mesmo que direto e indireto poderá desencadear efeitos
positivos, pois parte da energia gerada pelo empreendimento pode ser
disponibilizado para o meio rural em termos de aumento da mecanização e uso
de irrigação, pouco difundidos antes deste.
Mas na realidade, é importante deixar em destaque que geralmente a
energia gerada com estes empreendimentos, visam lucro para empresas, e os
atingidos nem sempre precisavam ou desejavam aumento mecânico da
irrigação, assim como muitas vezes os produtores não contam com capital de
giro para arcar com os custos extras que esta mecanização origina.
2.2.6 Segurança e Lazer
Os impactos advindos da interação com o meio social, que poderão gerar
violência local, irão demandar um sistema de supervisão e acompanhamento
dos trabalhadores, sustentado por profissionais de competência na área de
psicologia e assistência social, bem como de policiamento local (CNEC, ibid).
Há uma proposta do empreendedor de reforçar o policiamento local com o
início das obras, assim como reestruturar um local em Pedra Corrida como
ponto de permanência de policiais, pois acredita-se que como o distrito tem
poucos habitantes, se os trabalhadores de fora se fixarem neste local poderá
desencadear impactos sociais referente à segurança da população.
Conforme o diagnóstico do EIA (CNEC, ibid), em Pedra Corrida, às
margens do rio Doce, existe uma área de lazer denominada de “prainha”,
amplamente utilizada pelos moradores. No local não há nenhuma infraestrutura, porém é reconhecido por estes habitantes como único tipo de lazer
para os mesmos, sendo inclusive referência de alguns eventos comunitários
deste núcleo.
Vale ressaltar que encontra-se no EIA, na forma de avaliação do impacto
a descrição de que com a formação do reservatório ocorrerá a extinção desta
57
área de lazer (Figura 01), sendo este “impacto direto, irreversível, permanente,
local, de alta magnitude e negativo, tendo em vista a relação
que os
moradores de Pedra Corrida mantêm com este local” (CNEC, ibid, v.04, cap.09,
p.65).
Figura 01: “prainha”
FONTE: AMPLO, 16/06/2006
Ainda nos estudos realizados no EIA, outro ponto a ser destacado é que
possivelmente, o lago formado poderá constituir em alternativa de lazer para a
população da área, passando a representar, por um lado, certo risco de
acidentes
por
afogamento
para
seus
freqüentadores.
Para
tanto,
o
empreendedor apresenta propostas através de Programa de Educação
Ambiental, e criação de novo local de lazer como uma praça.
A população local, consolidou suas reivindicações através da Associação
de Moradores, onde esta foi constituída a partir do início das negociações
sobre a implantação da UHE Baguari, porém muitos acreditam que uma “uma
praça” não substituirá satisfatoriamente a perda da prainha.
2.3 Acordo firmado entre a População Alvo de Realocação da Área Urbana
e o Empreendedor
58
Para o remanejamento da população urbana que se inclui na Área
Diretamente Afetada foi elaborado pelo empreendedor um Termo de Acordo,
onde a população afetada em acordo com o Consórcio assinou com
consentimento do processo de realocação (alguns recusaram assinar o Termo
e foram para o processo jurídico) porém aqui se encontra a definição desde
termo nos aspectos Habitacionais, com a determinação do Tipo de casa
(TABELA 3) que cada morador recebeu por direito. Para este acordo foi
realizado previamente pelo empreendedor um levantamento físico das
residências atingidas, levando em consideração a qualidade dos materiais e
mão-de-obra utilizada.
TABELA 3: TIPOLOGIA DAS CASAS PARA REALOCAÇÃO
TIPOLOGIA
01
02
03
04
05
CÔMODOS
2 quartos,sala, cozinha,
banheiro e lavanderia
2 quartos,sala, cozinha,
banheiro e lavanderia
3 quartos,sala, cozinha,
banheiro e lavanderia
4 quartos,sala, cozinha,
banheiro e lavanderia
4 quartos,sala, cozinha,
banheiro e lavanderia
ÁREA DE PISO (m2)
ÁREA TOTAL (m2)
50
60
66
80
90
105
104
120
120
140
FONTE: CONSÓRCIO UHE BAGUARI, 2007, a e b
Ainda respeitando o acordo, ficou definido que todas as casas teriam piso
de cerâmica, os lotes seriam todos cercados com muro de alvenaria. A escolha
do lote ficou a cargo da própria população, sem interferência do empreendedor.
Outra questão firmada foi o pagamento de benfeitorias presentes no
terreno/ lote/ quintal de cada morador a ser realocado.
Diante deste contexto as negociações ainda estão ocorrendo, mesmo
após o período de realocação.
59
CAPÍTULO 3
O MUNICÍPIO DE PERIQUITO E A IMPLANTAÇÃO DA USINA
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI
3.1 Caracterização do município de Periquito
A área de abrangência da UHE Baguari se encontra inserida na região
Leste de Minas Gerais, dentro da denominada macrorregião do Rio Doce (
FIGURA 02).
A região do Vale do Rio Doce, coberta no passado por uma rica Mata
Atlântica, vem sofrendo intervenções antrópicas através de atividades
econômicas ao longo do tempo, desde o garimpo de ouro em 1700,
passando pela cafeicultura e criação de gado no séc. XIX, e
chegando à siderurgia no séc. XX. Os usos decorrentes de suas
terras modificaram de maneira drástica a paisagem da região,
resultando na formação de fazendas, no extrativismo madeireiro e na
produção de carvão, sendo a mata progressivamente substituída por
extensas pastagens, pequenas áreas cultivadas e reflorestamento
homogêneo de eucalipto (CNEC, 2002, v.04, cap.07, p.01).
Os municípios da Macrorregião Rio Doce que são considerados Área de
Influência no aspecto da instalação da Hidrelétrica de Baguari são os
municípios de Governador Valadares, Periquito, Alpercata, Sobrália, Fernandes
Tourinho e Iapu, abrangendo uma área de 41.809,1 Km², correspondendo a
7,13% da área total do Estado de Minas Gerais (CNEC, ibid).
60
Figura 02: Local de implantação da UHE Baguari - Imagem de Satélite
FONTE: Limiar Engenharia Ambiental (Acesso: 14 de junho de 2009)
Atualmente, a Região do Rio Doce é marcada pelo contraste entre uma
porção industrializada composta pelo Vale do Aço, um importante pólo
microrregional de características terciárias, como Governador Valadares, e
uma outra porção sustentada economicamente nas atividades agropecuárias,
que agrega as demais microrregiões.
Os principais pólos são os municípios de Ipatinga e Governador
Valadares responsáveis, pela metade do Produto Interno Bruto (PIB) da região
em discussão, segundo dados do IBGE (2000 apud CNEC, ibid). Os demais
municípios da Área de Influência estão situados entre estes dois importantes
pólos e apresentam valores de PIB bem menos expressivos (CNEC, ibid).
Os primeiros povoamentos fixaram-se na curva do Rio Doce, nas
proximidades do ponto onde se destaca na topografia o Pico do Ibituruna, onde
o rio muda a direção de sudoeste-nordeste para sudeste até Aimorés, ainda em
Minas Gerais, quando segue para leste até a foz, no litoral do Espírito Santo. O
lugar, inicialmente chamado Porto de Dom Manuel, ganha no correr do tempo
outras sete denominações, como Baguari e Figueira, ultimando por Governador
Valadares (CNEC, ibid).
A estação da Estrada de Ferro Vitória-Minas foi inaugurada naquele local
em 15 de agosto de 1910, quando o futuro pólo se transformou em ponto de
troca de mercadorias transportadas pelos tropeiros. Em 1936 ocorreu a
conexão das Estradas de Ferro Vitória-Minas e Central do Brasil, que colocou o
61
espaço, então denominado Figueira, em contato direto com os grandes centros
consumidores, reafirmando o sítio como centro privilegiado da região (CNEC,
ibid).
O processo de desmatamento sistemático e sua natureza extrativa, sem
preocupações quanto à reposição, levou à exaustão de grande parte das
reservas naturais, deixando em seu lugar grandes áreas que cederam lugar às
pastagens, direcionando a característica regional para a pecuária extensiva. Os
demais municípios da Área de Influência (AI) e enquadrados na Área
Diretamente
Afetada
(ADA),
resultaram
de
sucessivos
processos
de
emancipação dos municípios de origem, de grande extensão territorial, com
destaque para Caratinga, Tarumirim e Açucena (CNEC, ibid).
Periquito, distrito criado em 1962, emancipou-se de Açucena em 1995, na
última leva de municípios criados em Minas Gerais. Possui, além da sede
(FIGURA 03), outros três distritos, Serraria, Pedra Corrida e São Sebastião do
Baixio, sendo estes dois últimos separados de Açucena e incorporados a
Periquito quando do processo de emancipação (CNEC, ibid)
Figura 03: Vista da sede do município de Periquito, à esquerda a BR 381 e a direita o Rio
Doce.
FONTE: Aniely Coneglian Santos, 2008.
62
O município é cortado pela BR-381, o transporte ferroviário é atendido
pela Ferrovia Vitória-Minas (FIGURA 04), monopolizada pela Vale, que
transporta a carga das fontes mineradoras até o Porto de Vitória-Tubarão
(CNEC, ibid).
Figura 04: Vista Parcial da Rua Beira Linha sendo do município de Periquito
FONTE: CNEC, 2002.
Segundo o EIA da UHE Baguari, o município de Periquito foi marcado
pelos movimentos campo-cidade, em conseqüência das oportunidades
sazonais de trabalho referente às atividades extrativas e de reflorestamento de
empresas como a antiga Acesita, Cenibra e Preservar, que dispõem de áreas
na região. Também se identificou movimentos migratórios para Governador
Valadares e Ipatinga, de ida para São Paulo, além de movimentos de ida-evolta para Vitória/ES, diretamente relacionada à fragilidade da economia
municipal. Constatou-se também migração de jovens para os Estados Unidos
da América, incluindo o distrito de Pedra Corrida (CNEC, ibid).
Outro fator relevante desta região é o clima, classificado como tropical
semi-úmido, onde é marcado pela sazonalidade, resultando em forte déficit
hídrico. Os impactos gerados por chuvas torrenciais, provocam erosões e
carreamento de detritos nas áreas mais planas, influenciando de forma
negativa na fertilidade natural dos solos, podendo ainda desencadear
assoreamento dos rios. Já as águas do Rio Doce, foram analisadas, e
enquadradas como de qualidade regular (CNEC, ibid), onde foram detectadas
63
concentrações elevadas de material fecal, resultado de dejetos dos esgotos
das cidades ribeirinhas.
Com referência à dinâmica demográfica, de acordo com os dados dos
Censos Demográficos de Minas Gerais de 1981 e 1990, Periquito registrou
uma perda de 1.729 habitantes, embora venha apresentando leve recuperação
a partir de 1991. Do conjunto de municípios, Periquito enquadra-se na pior
situação da região, ao computar perdas de população tanto rural como urbana,
o que culminou na expulsão de 1.834 habitantes entre os anos de 1980 e 1991
segundo dados preliminares do Censo Demográfico de 2000 (CNEC, ibid).
Com o início das obras da UHE Baguari em abril de 2007, houve um
aumento no número de habitantes em Periquito e região, atraídos pelo
empreendimento. O município possui a área central próxima ao canteiro de
obras e um corredor de rodovia (BR-381) que torna viável e rápido o acesso,
facilitando assim a moradia para estes trabalhadores.
As
famílias
alvo
de
realocação
são
parte
fundamental
deste
empreendimento Hidrelétrico, como está expresso através dos croquis abaixo
(FIGURAS 05 e 06) das ruas, e com fotos de alguns domicílios (FIGURAS 07 e
08) estas famílias pertencem a Área Diretamente Afetada (ADA) pela UHE, as
quais são o foco desta pesquisa.
Figura 05: Rua Francisco Diniz , Distrito de Pedra Corrida, município de Periquito-MG.
FONTE: CNEC, 2002.
64
Figura 06: Rua Beira Linha , sede do município de Periquito-MG. (A) área a ser inundada
FONTE: CNEC, 2002.
Figura 07: Casas da Rua Beira Linha, sede do município de Periquito-MG
FONTE: AMPLO, 2008.
65
Figura 08: Casas da Rua Francisco Diniz, Distrito de Pedra Corrida, município de Periquito/MG.
FONTE, AMPLO, 2008.
3.2 A Usina Hidrelétrica de Baguari
A Usina Hidrelétrica (UHE) de Baguari passou por vários estudos
referentes ao aproveitamento de seu potencial hidrenergético, porém, somente
a partir da década de 1990 foi permitida a intensificação de seus estudos
devido à iniciativa privada. A viabilização deste empreendimento está
relacionada às dimensões técnico-econômica e ambiental projetadas por
barramentos de pequena altura, que propiciam a formação de reservatórios
cuja área pouco excede a calha do rio (CNEC, ibid).
Para os estudos da viabilidade de engenharia da Usina, foram realizados
diversos estudos, incluindo o EIA/RIMA assim com outros monitoramentos
essências. “O aproveitamento hidrelétrico UHE Baguari está localizado na
cachoeira homônima, no Médio curso do rio Doce, 322,3 km a montante de sua
foz, logo a jusante da foz do rio Corrente Grande, tendo uma área de drenagem
66
de 38.350 km2” (CNEC, ibid, p.01). No EIA não é citada a possibilidade de
realização da UHE em outro local ao longo do Rio Doce.
A UHE Baguari foi planejada e está sendo interligada ao sistema da
CEMIG na subestação Governador Valadares, irá gerar energia de “140 MW
instalados, em quatro unidades tipo Bulbo de 35 MW cada, com vazão
turbinada nominal de 225 m³/s por unidade, perfazendo 900 m³/s” (CNEC, ibid,
p.13).
O
Consórcio
UHE
Baguari
é
composto
pelos
empreendedores:
Neoenergia3 (51%), CEMIG (34%) e FURNAS (15%), sendo construído no Rio
Doce. Com capacidade instalada de 140 MW, é considerado suficiente para
abastecer uma população de 450 mil habitantes. É um dos empreendimentos
integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com previsão
de conclusão de suas obras em janeiro de 2010. O funcionamento da primeira
unidade geradora de energia em Baguari entrou em vigor na data de 23 de
julho de 2009. No pico de sua construção, que ocorreu em maio de 2008, o
canteiro de obras contratou aproximadamente 1,7 mil trabalhadores (FURNAS,
2009).
As figuras 09, 10 e 11 demonstram as etapas dos processos que vão
desde a iniciação das obras até a fase de funcionamento da UHE Baguari.
Figura 09: Construção da Hidrelétrica de Baguari
FONTE: FURNAS, Fev. 2009
3
Neoenergia: um grupo de empresas reunidas para atuar no mercado de energia elétrica
brasileiro, através dos investimentos de três grandes sócios: Caixa da Previdência dos
Funcionários do Banco do Brasil (PREVI), BB Banco de Investimentos SA (BB BI) e Iberdrola
SA.
67
Figura 10: Construção da Hidrelétrica de Baguari
FONTE: Aniely Coneglian Santos (14 de abril de 2009)
Figura 11: Usina Hidrelétrica de Baguari, fase do enchimento do Reservatório.
FONTE: MAPS GOOGLE (Acesso: 05/10/2009).
Durante a construção de uma Usina Hidrelétrica os impactos ocasionados
por esta podem atingir direta ou indiretamente a população, no caso da UHE
Baguari, será destacada a influência da construção do Reservatório e a
Instalação do Canteiro de Obras.
68
Ribeiro (2003) relata que os reservatórios são lagos artificiais formados
em decorrência do represamento do rio, onde o volume armazenado depende
do tipo de cada Usina.
Em função de seu propósito e das dimensões do
reservatório, as Usinas são classificadas em usinas de acumulação ou Usinas
de fio d‟água. Usinas de acumulação são aquelas dotadas de reservatórios
para garantir uma maior regularidade de vazão entre os períodos de cheias e
estiagem, enquanto usinas a fio d'água são aquelas que dispõem de
capacidade de armazenamento muito reduzida, em geral apenas da vazão do
curso d'água, podendo eventualmente possuir um reservatório reduzido para
uso em horas de pico.
No caso da UHE Baguari, conforme as características de seu reservatório
(FIGURAS 13,14 e 15), a operação da Usina será a fio d‟água, “sendo que sua
queda de projeto e a capacidade do reservatório determinam sua vocação
como um aproveitamento com despacho provendo energia para a base do
Sistema Elétrico Interligado”, portanto, não apresentará variações significativas
de geração durante o dia, similar a operação de outras usinas com estas
características (CNEC,ibid, p.30).
A UHE Baguari foi planejada para ser interligada ao sistema da
CEMIG na subestação Governador Valadares. Alimentará em forma
direta, portanto, uma região do estado de Minas Gerais onde existem
atualmente problemas de qualidade de atendimento em função da
grande distância das fontes de energia, e da característica de “ponta
de linha”. Sua energia poderá ser comercializada através de contratos
de suprimento com concessionárias de serviço público de energia
elétrica e com consumidores finais habilitados, dando origem a fluxos
comerciais entre geradores, detentores de concessões de usinas, e
distribuidores e consumidores com opção de compra (CNEC, 2002,
vol. 1, cap. 2, p.35).
O reservatório da hidrelétrica terá 16 km² (FIGURA 12), abrangendo áreas
dos municípios de Sobrália, Fernandes Tourinho e Alpercata (margem direita) e
Governador Valadares, Periquito e Iapu (margem esquerda), todos na região
Leste do Estado de Minas Gerais. Além de aumentar a confiabilidade do
Sistema Elétrico Brasileiro, Baguari tem sua importância ressaltada por uma
peculiaridade: a Usina operará a fio d‟água com turbinas bulbo (FURNAS, ibid).
69
Figura 12: Visão panorâmica da Usina Hidrelétrica de Baguari
FONTE: CAENGE (Acesso: 05/10/2009).
Figura 13: UHE Baguari após enchimento do reservatório.
FONTE: CEMIG, 2009
70
Figura 14: UHE Baguari após enchimento do reservatório.
FONTE: CEMIG, 2009
Figura 15: UHE Baguari após enchimento do reservatório.
FONTE: CEMIG, 2009.
3.3 As interferências da Usina de Baguari em Periquito
Em todo empreendimento de instalação de Usinas Hidrelétricas, os
impactos sociais ocorrem antes, durante ou após a obra. Portanto, é
71
necessário que a população afetada tenha conhecimento do objetivo proposto,
como os riscos de mudanças positivas ou negativas face à incerteza do futuro,
pois se não houver participação e compreensão da população atingida pode
ocorrer uma tensão que desorganiza a vida social destes. Muitas pessoas,
diretamente ou indiretamente atingidas pela obra, sentem medo, o estresse
psicológico não pode ser mensurado no aspecto econômico, mas é um
problema real (WORLD, 2000b, p.99 apud ROTHMAN, 2001).
Dentro dos impactos sociais gerados por empreendimentos hidrelétricos,
várias interferências são apontadas, neste contexto, existem algumas áreas
que são mais ou menos afetadas por estes.
Segundo definição do EIA (CNEC, ibid), no item que se refere aos
“Procedimentos Metodológicos”, o diagnóstico de Área Diretamente Afetada
(ADA) foi dividido de forma distinta entre: Área do Reservatório/barragem (que
inclui os estabelecimentos rurais e ilhas, área urbana, reflorestamento e
extração de areia) e Área Jusante que está relacionada ao comportamento
hidráulico, resultante da operação da Usina. Portanto para este estudo, se faz
necessário caracterizar a Área Diretamente Afetada.
Como Área de Entorno (AE) foram definidos os distritos de Pedra Corrida
(parte deste), Senhora da Penha, Plautino Soares e Baguari, pertencentes,
respectivamente, aos municípios de Periquito, Fernandes Tourinho, Sobrália e
Governador Valadares, por apresentarem relações sociais e econômicas entre
estes núcleos e os moradores da ADA. A cidade de Periquito está
contextualizada como ADA, devido a sua proximidade do reservatório,
observando-se, porém, que a caracterização desta localidade encontra-se
contemplada no diagnóstico da Área de Influência (AI) (CNEC,ibid).
A ADA é caracterizada pelo conjunto de propriedades rurais pertencentes
a particulares e a empresas de reflorestamento (Arcelor Mittal e Vale), assim
como parcelamentos urbanos inseridos no distrito de Pedra Corrida e na sede
de Periquito, onde estas serão afetadas pela formação do reservatório e
também por demais estruturas do empreendimento, entre barragem, casa de
força, canteiro de obras (CNEC, ibid).
Para avaliação das propriedades urbanas que seriam indenizadas em
função do empreendimento, o Consórcio obedeceu aos critérios estabelecidos
pelas NBR`s, onde os trabalhos executados foram de acordo com as normas
72
da ABNT, em conformidade com a NBR 502/89 que trata da avaliação de
imóveis urbanos (CNEC, ibid).
No empreendimento a localização das áreas definidas de acordo com
cada classificação supracitadas, podem ser mais ou menos vulneráveis aos
impactos decorrentes da implantação da UHE Baguari. Consequentemente,
cada área exigirá medidas eficazes e adequadas à realidade destas com a
finalidade de garantir a manutenção da qualidade de vida das famílias
residentes nelas (CNEC, ibid).
Para melhor compreensão serão caracterizadas abaixo as ruas Francisco
Diniz localizada na Sede do município Periquito – MG e a Rua Beira Linha
localizada no Distrito Pedra Corrida deste, que foram as áreas afetadas
diretamente pelo empreendimento, e que são de fato o foco desta pesquisa.
3.3.1 Realocação de famílias da Rua Francisco Diniz, Distrito de Pedra
Corrida do município de Periquito
A Rua Francisco Diniz, no Distrito de Pedra Corrida, encontra-se em
traçado longitudinal paralelo ao Rio Doce, local que não possui pavimentação.
As famílias encontram-se distribuídas a ambos os lados, porém sem ordem
numérica respectiva. Assinala-se a presença de pequenos sítios de lazer,
assim como um local de lazer comunitário denominado pela população como
“prainha”,
um
trecho
de
aproximadamente
600
metros
(identificado
anteriormente como Figura 01).
Um dos maiores problemas enfrentados pela população relatados na
pesquisa para a elaboração do EIA, são os períodos chuvosos, onde a cheia
do Rio Doce provoca inundações no local, obrigando muitas famílias deixarem
suas moradias, ou acabam por perder seus móveis. As situações referidas
mais marcantes foram nos anos de 1979 e 1997, no entanto, as maiores
interferências têm ocorrido à margem esquerda da Rua que é a que apresenta
limitação com o Rio Doce (CNEC, ibid).
Na pesquisa realizada para a elaboração do EIA da UHE de Baguari, foi
apurado que, referente à Rua Francisco Diniz, esta era composta por “62 lotes,
73
25 instalados em seu lado esquerdo e 37 no lado direito”. Nesta pesquisa
foram abordados 53 parcelamentos, representando 85,5% do universo, não
sendo possível a cobertura total, devido as seguintes situações:
Quatro casas desabitadas, sendo que dois proprietários residem em
Pedra Corrida, porém não se encontravam neste local no período da
pesquisa, e outros dois residem em outro município; um lote vago,
sem identificação de proprietário; uma casa em construção, cujo
detentor é residente na cidade de Governador Valadares; duas casas
fechadas, cujos ocupantes encontravam-se na cidade de Resplendor
durante os trabalhos de campo; uma granja desativada e
abandonada, cujo proprietário reside em Pedra Corrida, mas
encontrava-se ausente durante o período da pesquisa (CNEC, 2002,
vol. 06, cap.03, p. 439).
Segundo o EIA/RIMA, e comprovado durante o trabalho de campo,
embora muitos domicílios apresentarem revestimento interno e externo, a
maioria
destes
encontravam-se
muito
desgastados,
o
piso
era
predominantemente de “nata de cimento”, os telhados a maior parte era de
amianto.
Apesar do abastecimento de água ser de responsabilidade da COPASA,
ainda havia domicílios sem canalização interna, e o esgoto sanitário
preferencialmente era lançado diretamente no Rio Doce, sendo uma situação
presente em 25 (vinte e cinco) domicílios dos 48 (quarenta e oito) imóveis
analisados pelo EIA (CNEC, ibid). O fornecimento de energia elétrica estava
presente em quase todos os imóveis, somente 2 (dois) não possuíam esta
disponibilidade devido aos fatores socioeconômicos dos moradores.
É importante ressaltar que apesar da avaliação realizada sobre cada casa
ou terreno, devem-se levar em consideração as benfeitorias, pois estas podem
significar a manutenção ou complementação familiar.
Para constatação das negociações, foi acessado o Relatório para
Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) do 1º trimestre de 2007, onde
ficou evidenciado por imagens e assinaturas registradas através de scanner,
que a maior parte da população alvo de realocação da área urbana teve sua
representatividade muito bem informada sobre a implantação da UHE de
Baguari (CONSÓRSIO BAGUARI, 2007 a).
A população afetada no município de Periquito e distrito de Pedra Corrida
– onde encontra-se a maior parte dos afetados – organizou-se enquanto
Associação de Moradores no princípio das negociações com o Consórcio
74
Baguari. O movimento surgiu a partir da história de alguns parentes de
moradores que também viveram esta mesma situação com a implantação da
Usina de Itueta em Aymorés.
3.3.2 Realocação de famílias da Rua Beira Linha, sede do município de
Periquito
Estes moradores estão localizados entre a linha férrea, de propriedade da
Vale, e o Rio Doce, onde foram encontrados no princípio do empreendimento
16 lotes de uso residencial, que se fixaram posteriormente à implantação da
ferrovia. O local de moradia foi resultante da invasão de terras há muitos anos
atrás, portanto alguns destes moradores estão subordinados à jurisdição
municipal no que compete aos serviços disponibilizados pela administração
pública do município de Periquito (CNEC, ibid).
Vale destacar também que há um risco eminente para esta população,
pois cada vez que precisam se deslocar devem atravessar a linha férrea. Os
imóveis são caracterizados como invasão de terras, distribuídos por uma única
via, denominada Rua Beira Linha, estes integram o perímetro urbano da cidade
de Periquito:
No entanto, sua localização pouco privilegiada frente ao núcleo
central, agravada, ainda, pela barreira representada pela ferrovia,
constituem-se entraves à ação do Poder Público na implantação de
serviços essenciais, bem como para seus moradores no que tange ao
acesso aos equipamentos de uso coletivo, uma vez que encontramse instalados na margem oposta à ferrovia, resultando esta
transposição em sérios riscos de acidentes, notadamente, para a
população idosa e infantil (CNEC, 2002, v. 06, cap.03, p. 451).
De acordo com a avaliação do EIA, dos 16 (dezesseis) lotes residenciais
identificados nesta área, 14 (quatorze) são ocupados com moradias e 2 (dois)
lotes vagos.
Quando a elaboração do EIA da UHE de Baguari, o tempo de residência
das famílias entrevistadas neste local era de mais de 20 (vinte) anos para
57,2% das famílias entrevistadas para o EIA, índice que alcança 64,3% quando
se analisa o intervalo de “mais de 15 anos”. No contexto geral apenas 3 (três)
75
famílias declararam ser este tempo inferior a 3 (três) anos, o que determina
uma ocupação já consolidada (CNEC, ibid).
Ainda conforme este estudo e corroborado durante as visitas do trabalho
de campo para esta pesquisa, na maioria das residências, as paredes internas
e externas apresentavam-se sem pintura ou até mesmo sem qualquer
revestimento, sendo pouco expressivo o número daquelas com melhor padrão
de acabamento. As casas eram revestidas por telhas de amianto, com exceção
de uma única residência; no piso predomina a “nata de cimento”, sendo ainda
encontrado um domicílio de terra batida.
A falta de esgoto sanitário foi o que mais chamou a atenção, onde até
mesmo durante visitas realizadas pela pesquisadora, evidenciou-se que a
maioria deles eram lançados diretamente no Rio Doce, sem qualquer tipo de
tratamento. No entanto, corresponde salientar que observou-se que a
disponibilidade de quintais nestas moradias ocupava um espaço estratégico
quanto à contribuição para a subsistência familiar, alguns propiciavam a
criação de diversos animais, entre outros, galinhas, o cultivo de hortas e frutas
que eram utilizadas fundamentalmente com fins de segurança alimentar
familiar.
76
CAPÍTULO 4
ESTUDO DA REALOCAÇÃO DAS FAMÍLIAS AFETADAS PELA
HIDRELÉTRICA DE BAGUARI NO MUNICÍPIO DE PERIQUITO
A barragem acaba os rios, também a vegetação, ela afoga a natureza
sem nenhuma compaixão, tira o nosso direito de fazer plantação,
mata a nossa alegria destrói nossa criação, coloca tristeza e dor
dentro do meu coração (Poema de Antônio José – MAB-CPT de
Manso, apud VIANA, 2003, p. 18).
Ao longo dos anos, o conceito para designar as comunidades que sofrem
impactos sociais a cerca de empreendimentos hidrelétricos tem sofrido grandes
alterações e estes variam de acordo com a concepção de cada autor. Pinheiro
(2007), destaca que existem diversas nomenclaturas adotadas para denominar
a situação destes grupos sociais, sendo muitas vezes motivos de grandes
debates, pois a classificação varia de atingido, expropriado, deslocado,
reassentado, e realocado; onde a justificativa para tais denominações variam
de acordo com o tempo, o espaço e o interesse dos envolvidos.
Para iniciar as discussões acerca do estudo sobre os “afetados” pela
Usina Hidrelétrica de Baguari, destaco aqui o termo utilizado até o momento
para caracterizar esta população alvo da realocação. A opção pela designação
de “Afetados” surgiu a partir da leitura dos Termos aplicados pelo
empreendedor, como Área Diretamente “Afetada”, e principalmente após a releitura do livro “O Afeto da Terra” (Brandão, ibid) que a todo momento se refere
a relação do Homem com a Natureza e os valores históricos que são
estabelecidos a partir desta. Diante de toda a pesquisa realizada, foi observado
77
que o termo ”atingido” não caberia neste estudo, pois em sua grande maioria
ele esta vinculado à percepção dos empreendedores como valores numéricos,
ou seja, contabilizado somente pela proporção e tamanho correspondente ao
seu deslocamento e deixando de ser enfatizado os seus sentimentos (SOUZA,
et. al., 2009).
Para Vainer (2008), quando se fala “atingido” está se referindo ao
reconhecimento legal dos direitos dos detentores, ou seja, é dizer que certo
grupo social/família/indivíduo que foi atingido por um empreendimento tem
direito a algum ressarcimento. Porém, para o autor esta palavra encontra-se
em constantes modificações nos últimos anos pela evolução da noção de
direito humano.
Na concepção da pesquisadora, todos os moradores que são alvos de
realocação terão suas histórias, recursos e condições de vida relativamente
afetados, pois a influência e o impacto deste empreendimento refletirá até
mesmo sobre as formas de obtenção de seus alimentos e suas relações.
4.1 Estudo das famílias afetadas na fase de Pré-Realocação
Conforme o referencial bibliográfico discutido nos capítulos anteriores, as
construções
de
transformações
Usinas
Hidrelétricas
socioeconômicas
em
podem
representar
diversas
localidades
importantes
onde
o
empreendimento estiver sendo construído, refletindo diretamente na qualidade
de vida da população local, principalmente na fase inicial de sua implantação.
Os processos referentes à Habitação exigem atenção especial, pois podem
atrair fluxos migratórios referente a mão de obra especializada, aumentando a
população local, ou primordialmente gerando situações complexas a nível de
satisfação dos moradores que deverão ser realocados.
Reigota (ibid), ressalta que haviam poucos trabalhos no Brasil
fundamentando as representações sociais até meados de 2004, apesar do
interesse evidente que estava sendo despertado nos novos pesquisadores. A
possibilidade da disseminação de discussões a cerca deste contexto aumenta
78
significativamente a cada dia, trazendo com isto a evidência de uma boa dose
de senso comum. A questão é que em todo o aspecto que se refere ao
“equilíbrio ecológico”, este começa a ser percebido pelo homem como algo que
ameaça a sua sobrevivência, caso não permaneça em harmonia.
Segundo Cabugueira (2000), outra questão que pode ter total influência
na implantação de Hidrelétricas, é referente a força que a expansão econômica
pode interferir nas desigualdades regionais, sendo visto pelo autor como um
processo cumulativo que pode trazer benefícios ou prejuízos a estes.
Para iniciar a avaliação do processo de realocação, destaco um
comentário de Thompson (1981, p.194), que pode direcionar as diversas
colocações evidenciadas nesta pesquisa: “Os valores, tanto quanto as
necessidades materiais, serão sempre um terreno de contradições, de luta,
entre outros valores e visão de vida alternativos...”, onde a pesquisa realizada
demonstrou tendências de percepções, sentimentos recorrentes relacionadas
as perdas materiais com valores simbólicos.
Diante deste aspecto, a abordagem do homem e seu local de moradia
sofre diversas influências com referência a valores, sentimentos e histórias que
demarcam esta relação:
A Geografia Humanista tem tido muito interesse em discutir e
analisar, a partir de conceitos como o “lugar”, enquanto identidade
espacial, o cotidiano das pessoas e seu espaço sentido, vivido e
concebido, reconhecendo o espaço como o lugar dessas pessoas,
porque foram elas em coletividade – família e comunidade – quem o
construiu, enquanto produto histórico do trabalho comunitário. Outro
conceito associado a esta perspectiva de análise se refere ao
território-identidade que também passa pela apropriação das
terminologias do sentido, vivido e concebido (SOUZA et al., 2007,
p.04)
O estudo realizado, não visa defender aspectos positivos ou negativos da
implantação de uma Hidrelétrica, mas sim contribuir com todos que acessarem
este material no âmbito de fornecer subsídios para a compreensão dos
aspectos que envolvem a “mudança do lugar de moradia” dos que são afetados
por estas obras.
Em todo o momento a palavra “lugar” é citada, horas evidenciando a
relação histórica dos moradores com este, em outras relatando a questão do
vínculo alimentar. Durante as entrevistas, uma parte significativa dos
entrevistados relatou a preocupação com a mudança pela relação da
79
“complementação” alimentar, mas diante de todo este período da pesquisa
notou-se evidentemente que a maioria das famílias cultivava frutas, hortas,
animais como meio de “sustento” alimentar, onde optou-se por remeter parte
deste estudo também a percepção da necessidade de manutenção do sustento
alimentar.
4.1.1 Grau de Insatisfação dos Moradores a serem Realocados
Para Hernández e Bermann (2006), com a expansão hidrelétrica, ocorrem
alterações na vida de toda sociedade envolvida no processo de instalação de
empreendimentos como este, visando a modernidade, onde os milhares de
trabalhadores que participam da construção da Usina, bem como toda a
sociedade diretamente afetada e do entorno terão que modificar as suas
rotinas e histórias conforme sobem as águas.
Quando falamos de modernidade, há uma tendência forte de significar um
processo de mudança, porém que não mostra em definitivo seu “rosto”, é um
risco a se considerar com o avanço das novas formas de organização industrial
(REIGOTA, ibid).
Uma percepção da pesquisadora deste trabalho durante a fase de
entrevista, e importante de ser descrita neste momento, é que a maioria das
moradias alvo deste estudo, apresentavam um amplo terreno, com muitas
árvores, em sua grande maioria sendo frutíferas, sem grandes delimitações
(muros ou cercas), lindas hortas, e inclusive de muitos quintais se avistavam o
Rio Doce. Com a finalidade de exemplificar visualmente esta percepção, ver
FIGURA16.
80
Figura 16: Rua Francisco Diniz. Demonstrando a amplitude dos quintais, com muitas árvores
frutíferas.
FONTE: AMPLO, 2007.
Segundo o Relatório de Monitoramento Socioeconômico realizado pela
AMPLO, o distrito de Pedra Corrida, pertencente ao município de Periquito, o
qual se apresenta mais próximo das obras do empreendimento, encontrava-se
com as características pouco influenciada pela dinâmica que habitualmente
marca a construção de obras de grande porte:
É destacável também o fato da localidade de Pedra Corrida mostrarse quase que imune aos efeitos decorrentes da etapa de instalação
da UHE Baguari. Tal área urbana não apresentou nenhuma forma de
crescimento ou de alteração em sua dinâmica que pudesse
contextualizar efeitos do empreendimento sobre o mesmo.
Obviamente, a população que será removida em função da formação
do reservatório guarda suas expectativas mediante ao desfecho de tal
contexto. Contudo, não há sinais evidentes na área urbana e nem no
cotidiano dos moradores que sejam evidências da instalação do
empreendimento em análise (AMPLO, 2007, RE-PCA-BAG-SOC-004,
p.13).
Isto se justifica pelo fato de que o movimento populacional ocasionado
pelo fluxo migratório de trabalhadores ocorreu na cidade de Governador
Valadares, onde foram direcionados os locais de acolhimento destes, ou seja, a
cidade de Periquito, mesmo sendo a mais próxima da UHE de Baguari, não foi
considerada local de dormitório. Dentro desta perspectiva, o maior impacto
81
percebido no município de Periquito está diretamente relacionado com a
variável Habitação, mas com relação à realocação.
Neste contexto avaliou-se o grau de satisfação dos moradores alvo de
realocação da área urbana diretamente afetada pela instalação da Usina
Hidrelétrica de Baguari, sobre seu processo de mudança. Antes do processo
inicial de obras, a percepção da realocação era de uma forma, onde 76,6% ou
23 dos entrevistados relataram algum tipo de insatisfação, evidenciado por
diversos moradores4:
“aqui na minha casa tem tudo, tem uma uva, tem jaca,
manga, goiaba, todas fruta o ano todo. Eles vão tirá a
gente daqui e colocá na “terra limpa”. Nóis tão muito triste,
vão mudá porque são obrigado. Cadê meu pé de manga,
cadê meus pé de jaca? Ô meu pé de jaca, esse ano é o
último ano que eu como do cês! Aqui tem de tudo, a gente
planta milho, feijão, verdura, olha (apontou o dedo) que
tanto de pé de banana. Nóis come banana assada o ano
inteiro”. (Maria)
“A gente senti muito, porque isso aqui é uma vida, eu tem
cinco anos que eu moro aqui mais a minha família sempre
moro aqui eu sempre morei aqui em Pedra Corrida, ai eu
acho que vai ser um vazio muito grande quando a gente
muda daqui por outro lado e vê derruba tudo né?
(Conceição)
Diante dos imóveis desta área urbana analisada pelo EIA (CNEC, ibid), e
também corroborado na visita de campo pela pesquisadora deste trabalho, os
quintais apresentavam dimensões apropriadas com o domicílio, onde haviam
preferencialmente plantio de árvores frutíferas, pequenas hortas, criações,
sendo estes importantes para a segurança alimentar do grupo familiar e da
comunidade.
Embora as residências tenham a função primordial de abrigar e
repousar as pessoas que nela vivem, elas são também o lugar onde
inúmeras atividades se desenvolvem no cotidiano e condicionam a
cultura de seus usuários (ALGRANTI,1997 apud NASCIMENTO,
2009).
O empreendedor, ao instituir valores as benfeitorias, não se preocupou
em saber se os “novos” quintais representariam o mesmo modo de sustento
4
Como já assinalado anteriormente, esclarece-se novamente que os nomes dos moradores
são fictícios a fim de preservar sua identidade.
82
alimentar garantido pelas terras do “lugar afetado”. Também não foi
demonstrado se havia, de fato, preocupação de como essa população poderia
investir o valor em espécie recebido. Surge uma grande indagação: As famílias
afetadas conseguirão reproduzir o lugar de seu sustento a tempo de não serem
influenciadas economicamente ou até mesmo saudavelmente?
Zhouri et. al. (ibid, p.12), relatam que problemas ambientais e sociais são
vistos
por
pessoas
de
“fora”
como
“meros
problemas
técnicos
e
administrativos”, sendo passíveis de medidas compensatórias, ou seja, para
estes a visão é que o dinheiro resolve tudo.
Para Silva (2003, p.03), o lugar de residência “é repleto de significados,
não se podendo considerar como reducionismo saudosista, pois é isso que dá
significado a sua vida”.
Como medir, quantificar os valores naturais, as plantas nativas,
pertencentes a cada quintal de casa? Percebeu-se que a população local
planta para o sustento, e também estabelece relações sociais, onde ocorrem
trocas, diálogos e a possibilidade de uma boa convivência com a vizinhança.
“A gente fica meio sentido que a gente já acostumo aqui
tem muitos anos, tem o pomar da gente lá a gente não vai
ter,vamos pra uma casa que não tem nada plantado
ainda, até que a gente consegue planta alguma coisinha
vai custa pra dá fruta né, principalmente fruta, horta é num
instante, mais fruta demora mais, a gente fica meio
sentido com que vai deixa de plantações, porque casa
não, casa constrói outra né, o problema é o pomar as
plantações, isso entristece a gente um pouco, mais como
se diz tudo em nome do progresso, hoje tem que se assim
né?!” (Efigênia)
A este respeito, Brandão (1999) no livro “O afeto da Terra”, faz referência
sobre este sentimento, relatando que toda a terra demarca uma relação, e
marca uma identidade estabelecida através da qualidade de reciprocidade
entre o ator e o relacionamento com a terra e seus frutos, do que geram e
determinam histórias cultivadas, onde estas permanecem no lugar.
Silva (2003) em seu artigo, refere que o espaço socialmente construído
realmente não é indenizado e muitas vezes nem sequer considerado pelo setor
elétrico.
83
Ribeiro (2008, p.111), denota em seu texto que “a desapropriação na
prática, transformou-se em um processo de expropriação sob três aspectos:
enquanto perda patrimonial, condições de vida, e produção”. Nesse contexto, o
autor ainda acrescenta “a terra passa a ser mais do que um meio de produção
por meio do qual” este indivíduo extrai a sua sobrevivência (LUDWIG, 2008,
p.241).
“A gente não fica bem, se fala é mentira, lugar que a
gente conviveu tanto tempo, né, já habituado com as
coisas, o barraco não era bão não, mais o lugar... é bão
demais. A gente gosta de saí não gosta não, se a gente
pudesse não saía não”. (Jeremias)
Outro fato importante observado, é que a maioria das famílias que
apresentavam seus quintais voltados para o Rio Doce, possuía uma extensão
maior do que as mencionadas e cadastradas pelo empreendedor, pois nos
períodos de pouca chuva, os quintais aumentavam seu tamanho, e ainda,
terras estas que apresentavam maior fertilidade.
Já o local da realocação, que foi escolhida pelo empreendedor, era um
Vale – distante do Rio Doce - onde foi feito terraplanagem para a construção
das novas moradias; porém não foi analisada ou verificada a possível
qualidade do solo, e o que este poderia desencadear para a reconstituição da
mesma diversidade de árvores frutíferas, hortas e criações para a manutenção
da subsistência familiar, processo que foi observado pela pesquisadora através
de visitas no local.
De certo modo essas “perdas” resultam muitas vezes em danos
irreparáveis, pois para muitos há um valor simbólico insubstituível relacionados
ao meio ambiente natural e aos bens que ajudaram a construir diversas
gerações que ali viviam, ainda a perda da qualidade do solo traz perdas
materiais como conseqüência da redução da produtividade da terra.
Um trecho da entrevista que chamou a atenção, foi sem dúvida esta
pequena fala do morador intitulado Messias, o qual mora no local alvo de
realocação há mais de 20 anos: “Eu to sendo levado, isso ta acabando com a
vida da gente...”.
Segundo o Relatório de Monitoramento da Área Urbana Alvo de
Realocação (AMPLO, 2008, RE 005, p.08), em entrevista realizada com os
84
moradores, muitos entrevistados afirmaram diante da mudança que: “aquele
lugar tem significado, tem história” (Maíza). Uma moradora ainda disse: “cada
telha que vai tirar vai ser uma lágrima que vai descer. Eu quero tá bem longe
daqui” (Aparecida).
Oliveira (2002) relaciona o significado histórico desta integração da
sociedade com a natureza desde os tempos de Karl Marx (séc. XIX), onde este
afirmava da necessidade de buscar a relação entre história e natureza.
Analisando os conceitos, percepções e definições da visão de natureza,
percebe-se que esta nunca existe em si, como diria o Professor Jorge, “ela
existe para quem a vê”, podendo ser construído de acordo com as referências
individuais de cada sujeito dentro de seu contexto socioeconômico e cultural;
sendo a fertilidade da terra algo relevante e demarcante para estes indivíduos e
seus grupos sociais, retomando as discussões evidenciadas anteriormente.
“Tem fruta, manga tem acerola, pé de mamão e a
hortinha. Fica sem hortinha é ruim, né” (Tatiana).
“Ah aqui tem uma hortinha ali, nóis sempre tem uma
hortinha, uma couvinha, uma cebola, sabe a gente planta
alguma coisinha, a gente vê a terra e não plantá e
lamentável num é?” (Pedro).
A fala dos moradores supracitados até agora, reflete que esta mudança
não só impactará na perda da identidade destes moradores com o lugar que
moravam a longa data, mas também, na segurança alimentar destas famílias.
Isto se dá a partir da influência do capital, que gera contradição – progresso
versus degradação ambiental – e, esta por conseqüência, gera a perda da
identificação do homem com a natureza local.
O sustento alimentar desses moradores não se encontra somente nos
seus quintais, mais na interação destes, ou seja, a troca de alimentos entre os
vizinhos e o restante da população local, foi algo muito evidenciado, até mesmo
durante a fase de entrevista. A pesquisadora recebeu diversas ofertas de
frutas, como forma de agradecimento pela atenção.
No que se refere a história do lugar, onde muitos moradores referiram-se
a este como o local onde foram criados ou criaram seus filhos, evidenciando a
mudança como realmente algo que não foi opcional, independente da melhoria
85
de moradia prometida com a realocação, conforme relato de moradora
entrevistada:
“Ai, fico triste, fosse por mim num sairia não. Vão tê que
sai, né? Uma que é muito tempo que a gente mora aqui,
outra que criei meus menino tudo aqui, mais infelizmente
tem que sai, queria sai não” (Joana).
Além desta percepção referida, outra grande questão que muitas vezes
incomoda estes moradores, é a preocupação com o meio ambiente e a
dificuldade de compreender até onde a disputa de poder e desenvolvimento
tecnológico pode afetar diretamente a sociedade.
O consumo capitalista se apresenta cada vez mais móvel, permitindo a
escolha de ambientes preferenciais para o desenvolvimento sem a percepção
dos riscos que o deslocamento forçado de pessoas podem impactar para uma
sociedade.
Esse ponto de vista também é percebido no livro de Zhouri et. al. (ibid),
que relatam a história de que no Brasil os confrontos enfrentados pelas
populações ribeirinhas que percebem e resguardam a terra como patrimônio
familiar e até mesmo comunitário é defendido pelo coletivo; porém há o outro
lado que exerce o poder, que é o Setor Elétrico, que a partir de uma ótica de
mercado entendem o território como propriedade, sendo este uma mercadoria
passível de valor monetário, ou seja:
No paradigma da adequação, a obra assumi lugar central,
apresentando-se de forma inquestionável e inexorável. Nesta
concepção, o ambiente é percebido como externalidade, paisagem
que deve ser modificada e adaptada aos objetivos do projeto técnico
(ZHOURI et al., 2005, p.53).
Para as famílias afetadas, a mudança é cheia de significados:
“Eu penso que vai se ruim mudá né? A gente tá
acostumado aqui. Aqui é liberal, aqui a gente planta, colhi,
onde eu vo muda num tem nada, só terra” (Joice).
“Não é só mudança de casa, é mudança de hábito. É
mudança geral, né? Porque quando você sai de uma casa
pra outra, você vai lá escolhe a casa aquela que te
agrada, você que escolheu. Agora aqui vai se diferente
você vai cê tirado daqui, do que é seu, colocado num
lugar, vão supor, você escolheu aquele lugar, é outra
86
situação, mais se fosse hoje, escolhe um lugar uma casa
pra eu mora, ia escolhe um se tivesse um espaço pras
criança brinca, mais favorável, do que lá em cima. Mais lá
a realidade é que a gente não ta tendo escolha. A gente é
obrigada a faze aquilo” (Iracema).
A escolha do “novo bairro” ou lugar a ser construído as novas casas
aconteceu sem participação direta dos afetados; isso implicou em um maior
grau de insatisfação da população em relação a percepção de mudança.
Uma das características entristecedoras nas obras hidrelétricas são as
decisões unilaterais respaldadas por critérios técnicos ou socioeconômicos,
onde a participação da comunidade afetada não ocorre de forma contínua do
momento de avaliação até a implantação, senão que muitas vezes são
impostas sobre estas populações (JERONYMO, 2007). Ao igual que na
construção de outras Hidrelétricas, no caso da UHE Baguari a população
diretamente afetada não participou das decisões, sendo-lhes permitido apenas
decidir aspectos relacionados à nova moradia.
Há que se pensar diante da implantação destas obras, se a configuração
do lugar poderá refletir grandes mudanças:
Distinta do lugar, a paisagem que se origina dos projetos industriais
guarda apenas os custos ambientais e sociais dos empreendimentos.
Através dos fluxos de capital e tecnologia que estes projetos
demandam, o local se transforma, assim, em um espaço de produção
transnacional, um verdadeiro não-lugar, ou seja, paisagem
homogênea que poderia reproduzir-se em qualquer espaço e que não
mantém vínculo algum com o local, perdendo qualquer sentido ou
significação para os grupos. Nesses ambientes já não há processos
de identificação individual ou coletiva. O espaço do não-lugar não cria
nem identidade singular nem relação, mas sim solidão e similitude
(AUGÉ, 2003 apud ZHOURI e OLIVEIRA, 2007, p.95).
Muitos dos entrevistados se referiam à mudança de lugar como sendo
algo sem opção, onde foram forçados a saírem do endereço em que
plantavam, colhiam, tiravam seu sustento, caracterizando a partir desse
momento, seus padrões de vida pautados na questão necessária do
desenvolvimento.
Roesler et al. (2004) afirmam que essa descrição do afeto pelo lugar,
pode significar para quem está de fora como algo supérfluo, e que poderia ser
suprido diante do pagamento de benfeitorias, porém, para estes moradores, no
momento em que antecede a construção de seus novos lares, perde-se a
87
necessidade de privilegiar a estreita relação homem-natureza, apresentando
um desrespeito ético pelas pessoas que não vivenciaram esta expectativa, pois
estão focados apenas nos avanços tecnológicos.
Não se pode pensar que seja uma fala ou visão romântica destes
moradores, mas sim a expressão singela de quem almeja perpetuar a história
vivida, onde independente de seu contexto socioeconômico se encontra feliz
nesse lugar.
Castelnou et al.(2003, p.52), ao analisar a visão de outros autores, entre
eles, Morelho (1986), Alcorn (1989) e Leff (2002), afirmam que o lugar “é onde
emergem as energias positivas da razão ambiental e o território é pleno de
significados”.
Estes autores, ainda fazem uma análise que demonstra claramente a
percepção que pode estar relacionada à população afetada pela realocação, ao
relatarem que na história da humanidade a maioria dos espaços e lugares
eram selecionados pelo homem para seu usufruto. Estes de fato, não foram
projetados por profissionais ou oficiais dês entendidos na área das relaçõeshumanas, e sim foram demarcados, escolhidos ou herdados com a expressão
de tradições ou relacionamentos sociais estabelecidos pelos indivíduos sem
uma específica influência.
De um modo geral, o espaço ou lugar construído pelo homem acaba
desencadeando um estilo de vida próprio para cada grupo social.
Gostaria de enfatizar neste momento o debate que faz Marandola Jr.
(2007) sobre território e espaço a partir da reflexão do artigo de Rigotto e
Augusto (2007), em que a grande questão em destaque se refere às relações
que são estabelecidas nestes territórios ou lugares e paisagens, que nos
permitem perceber as diferentes formas de iniqüidade na espacialidade e as
relações estabelecidas neles, deixando em evidencia a vulnerabilidade dos
aspectos sociais, culturais e ambientais.
Ainda podem ser citados os comentários de Amorim Filho (1996), quando
o autor afirma que os sentimentos presentes das pessoas que referem ligação
ou contato com seus “lugares”, podem interferir de maneira fundamental na
formação de valores e juízos sobre estes determinados lugares. O autor
também assinala que a importância da preservação desta relação esta
vinculada à valorização afetiva pelo homem como manutenção da memória
88
individual ou até mesmo coletiva, e se alterada esta percepção poderá interferir
na identidade cultural do local.
Segundo Murta (2004), as pessoas que estão de fora, podem perceber de
maneira superficial, alguns aspectos que são vistos de modo bem diferente, por
aqueles que vivenciam uma situação. Há que se considerar também o
conhecimento, comportamento e tradição local, o que para determinado grupo
de pessoas pode não significar nada de especial, porém pode ser altamente
importante para o grupo diretamente afetado.
Para muitos que viam o antigo local como algo feio, uma casa degradada,
precisando ser refeito, não poderiam entender que, para seus habitantes, ali
era o lar, o aconchego, e parte de uma história de vida que envolve lembranças
e de enorme simbologia.
“A gente senti tristeza né, aqui é toda uma vida né?
Vontade de sai mesmo à gente num ta não, a gente ta ino
tipo assim obrigado. Não tá sendo nada satisfatório né, tá
deixando muita coisa a deseja, muita coisa que eles
prometeram que ia faze pra comunidade e não fez. Eles
estão fazendo assim do jeito deles e de modo que eles
quê” (Álvara).
“Eu acho negativo mudá. Ah, porque luga que a gente
convevi muito tempo, criei a família, minha esposa morreu
aqui; cunhado tá tudo no local, tudo entra né, agora aqui
fica difícil...” (Jeremias)
“A gente infelizmente, somos obrigados, né? Não
podemos fazer nada, né? Não mudaria de jeito nenhum,
de forma alguma. Aqui é herança do meu pai...” (Isaac).
Para Zhouri e Gomes (2007), a construção de Usinas Hidrelétricas tem
sido geradora de conflitos e injustiças socioambientais, pois recaem sobre as
comunidades atingidas o fato do processo decisório e seus destinos ficarem a
encargo do empreendedor. O conhecimento prévio e aprofundado através de
acesso
a
todas
as
informações
e
documentos
relacionados
ao
empreendimento deveria ser completamente transparente, com a participação
a todo instante das comunidades atingidas nos processos decisórios.
Na realidade, o que foi percebido neste estudo é que a legislação
brasileira apresenta possibilidades da comunidade conhecer as regras diante
89
de sua participação, mas o que ocorre é que quando a comunidade é avisada
do processo, muitas decisões já foram estabelecidas entre o empreendedor e o
poder público.
Para a FEAM (Ribeiro, 2008, p.174), diante da trajetória de conflitos, o
problema sobre o meio ambiente é muito complexo, onde refere que “a
sociedade tem que decidir o que ela quer”, obviamente considerando toda a
interação de tecnologia, meio ambiente, política na sociedade e na economia.
Porém observa-se uma crescente intervenção do Ministério Público na busca
pela mediação de conflitos durante a fase de licenciamento.
Apropriar-se da natureza na tentativa de modificá-la para seu próprio
benefício ou de um determinado grupo social, poderá gerar um processo de
aceleração industrial, urbano e tecnológico que nem sempre acarretará
benefícios, como se percebe na fala de alguns proprietários que retratam o
sentimento de “perda”.
No processo de negociação, muitos moradores foram alertados que a
partir da data determinada para a realocação a mudança poderia ter atrasos ou
acontecer a qualquer momento. Isto trouxe para alguns moradores a
insegurança de permanecerem com o plantio ou cultivo de hortas, frutas e até
mesmo criação, pois acreditavam correr o risco de perderem este investimento,
como percebe-se na fala abaixo:
“Verdura aqui ninguém comprava, nóis que plantamo
horta, né? Agora esse ano nóis num plantamo porque se
o negócio dá gente sai, né num vai planta pra fica aí a toa,
desperdiçano num dá. Fruta, graças a Deus, ainda tem
pra nois” (Josiane).
Outra questão é a preocupação com a demora que poderá ocorrer para o
crescimento das plantas, árvores frutíferas até conseguirem fornecer a mesma
garantia de consumo que existia para estes moradores. Mesmo tendo
conhecimento do pagamento das benfeitorias, alguns acreditam que o dinheiro
pago não proporcionará o mesmo sustendo de hoje.
“Por um lado vai se ruim porque aqui a gente tem
costume. Aqui em baixo, pode planta, tem as coisa já
grande né? Fruta, pé de árvore tudo grande, até que a
gente planta cresce dá um pé de goiaba principalmente
que tem muito lá embaixo, pé de manga nem se conta
90
que tem muito, até chega da manga lá em cima já morri.
Eles já falaram que num vai pode planta árvore que dá
muita raiz né? Só pé de manga tem cinco aqui, tem pé de
coco” (Míriam).
Evidencia-se então que diante da insatisfação relatada pela maioria dos
moradores na fase de Pré-Realocação, o sentimento de “perda”, é o que
prevalece, sendo justificado pelo vínculo e afeto com a terra de seu domicílio,
onde propriamente retiram seu sustento, ou ainda sendo o mais relevante de
todos, onde está caracterizada a história pessoal de cada família/indivíduo
afetado.
Com o represamento do Rio Doce, possivelmente haverá uma grande
perda desta área produtiva, em conseqüência poderá ter uma redução na
oferta de alimentos entre esta população, pois no “novo local” a serem
realocados, já foi precedida a improdutividade da terra. Fato que reflete
diretamente na renda familiar como no bem-estar de grande parte das famílias
realocadas.
Outro fator relatado pelos moradores e que está também vinculado ao
local de moradia é o sustento através do Rio, onde este encontra-se presente
em muitos quintais à margem esquerda tanto da Rua Beira Linha (sede) como
à Rua Francisco Diniz (distrito Pedra Corrida). Durante o período de
entrevistas, foi feita uma travessia para o outro lado da margem do Rio Doce,
sendo esta realizada de bote com um dos moradores afetados que mantêm o
sustento familiar cobrando das pessoas por este transporte, uma vez que o rio
é dentro do seu quintal, conforme FIGURA 17.
91
Figura 17: Margem do Rio Doce com bote para travessia
FONTE: Aniely Coneglian Santos, 2009
Já alguns moradores também buscam o subsídio familiar através da
pesca, tanto para alimentação como para venda. A preocupação é como estes
irão manter seu sustento familiar e alimentar após a realocação?
Com relação ao lazer na apresentação do EIA (CNEC, ibid), - já descrito
no capítulo 3 – um dos impactos sociais previstos seria referente ao local de
lazer denominado “prainha” no Distrito de Pedra Corrida, pois com a formação
do reservatório a mesma será extinta. Por mais que foi questionado somente
na Pós Realocação sobre o ponto de lazer, em nenhum momento esta
preocupação foi comentada, ou se quer citada por qualquer morador afetado.
92
Acredita-se que este problema não tenha sido evidenciado por não ter relação
com a característica dos entrevistados, que na maioria eram os próprios
proprietários, ou seja, os tidos como “chefes de família”, e o local de lazer era
freqüentado em sua grande maioria por crianças e adolescentes.
Outro fator importante, é que a grande parte das famílias insatisfeitas na
fase de pré-realocação são moradoras da Rua Francisco Diniz no Distrito de
Pedra Corrida, ocorrendo o relato de insatisfação nesta fase apenas por duas
famílias da Rua Beira Linha na sede do município de Periquito.
Diante de todo o contexto abordado neste estudo, há diversas formas de
visualizar o processo de realocação, onde em uma delas pode estar
relacionado a visão do empreendedor “sujeitos de fora”, que não compreendem
os que “são de dentro” famílias afetadas.
Para Thompson (1981), Oliveira (2002), Rothman (2008), dentre diversos
outros já citados, há muitos valores atribuídos ao “lugar”, e estes são de modo
característico
imensuráveis
na
visão
dos
afetados,
pois
sentimento,
sustentabilidade são extremamente subjetivos no momento de se estabelecer
preços a estes. As indenizações foram pagas, mas como dizer que se pagando
R$1.000,00 em um pé de jaca, este saciará a fome e permeará as relações
sociais por anos? E se a terra não permitir o crescimento adequado das novas
mudas de plantas nos seus novos quintais?
Quanto a perda na fertilidade da terra dos moradores afetados, estes
deveriam ter recebido orientações sobre os tipos de investimentos na futura
terra (quintal), assim como em outros projetos.
Mas, há que se pensar sobre todo o impacto social que foi gerado ou que
ainda acarretará em grandes transformações significativas, muitas vezes não
mensuradas a longo prazo. No Distrito de Pedra Corrida, segundo o censo do
IBGE (2000 apud CNEC ibid) havia nesse período 1.200 habitantes. Então
quando analisamos que 66 famílias neste local foram realocadas, percebe-se
estatisticamente que aproximadamente 200 pessoas estão sendo deslocadas
de seu “lugar” de moradia, representando no geral 17% da população local.
Cada família que fez parte deste processo apresenta sua história de vida,
e estas devem ser respeitadas.
93
4.1.2 Grau de Satisfação dos Moradores a serem Realocados
Evidencia-se diante da revisão bibliográfica realizada, que a visão atual
dos empreendedores ou do setor elétrico diante das realocações tem evoluído
significativamente, estando cada vez mais próximos da percepção da
necessidade de maior investimento no Campo Social.
Müller (1995), assinala que, esta evolução não foi gratuita, senão que se
deve
ao
reconhecimento
de
que
a
não
compensação
dos
danos
socioambientais que podem ser causados pelos empreendimentos, poderiam
invalidar futuros projetos.
De um modo geral, as Usinas Hidrelétricas constituem a base do sistema
de geração energética no Brasil, correspondendo a 80% da oferta de
eletricidade. Porém, este potencial foi atingido nos últimos 30 anos, através da
construção indiscriminada de Usinas de grande porte, que desencadearam
graves problemas sociais e ambientais. Mas na atualidade, qualquer Projeto
para implantação de UHE deve passar por um longo processo de avaliação
antes de sua implementação (BERMANN et al., 2004).
Durante o estudo percebeu-se que somente 07 (sete) entrevistado, o que
representa 23,4% do total do universo estudado, relataram grau de satisfação
na fase de pré-realocação. No entanto, os moradores da Rua Francisco Diniz
(distrito Pedra Corrida), estavam sujeitos ao efeito das enchentes mesmo antes
das alterações provocadas no Rio Doce pelo início da implantação da
Hidrelétrica, desde que esta região apresentava períodos de chuvas intensas,
onde o rio aumenta seu volume além do esperado, e a maioria destas famílias
foi alvo de realocação temporária fruto das Cheias, perdendo grande parte de
suas mobílias, criações, alimentos e histórias. Como a área onde serão
transferidos apresenta uma distância considerável da região inundável, para
estes moradores a “mudança” se torna um aspecto positivo, como constatado
nos depoimentos a seguir:
“Muda é melhor né, porque quando chove a gente fica
com a cabeça quente né? Tem que corre, perde muitas
coisas, os móveis mesmo é tudo quebrado tem que
levanta tudo” (Cristal).
94
“Pra mim eu acho bom porque esse negocio de enchente
é chato de mais, tem saí,.muda de casa. Quando da
enchente enche tudo, já entro quatro veiz, teve até ali na
porta ali, então é ruim, fica mudando na cheia, estraga os
móveis da gente” (Lúcia).
A expectativa do empreendedor era que a população visualizasse de
forma satisfatória o processo de mudança da proximidade do rio pois desta
forma estão sendo afastados das áreas de risco sanitário, (EIA – CNEC, ibid).
Mas este mesmo relatório também destaca que os impactos negativos
previstos seriam advindos da necessidade de adaptação dos moradores aos
novos locais de moradia.
Alguns entrevistados também apresentaram mistura de sentimentos e
uma dupla visão referente ao grau de satisfação ou grau parcial de insatisfação
da realocação, como é percebido no comentário a seguir:
“De um lado é muito bão, por outro lado vai se ruim
porque aqui a gente tem fruta, manga. Só que por outro
lado num corre mais de dá enchente, que já deu duas
vezes esse ano” (Renata).
Nos registros fotográficos - como exemplo a Figura 18 - realizados
durante a fase de observação e entrevistas para coleta dos dados, notou-se
que a maioria das casas alvo de realocação, apresentavam-se em condições
precárias, ou eram muito antigas e para alguns moradores o fato de mudarem
para uma casa “nova” gerou satisfação, pois muitas destas estavam com
trincas e rachaduras significativas, sendo também evidenciado o relato destas
condições de moradia pelo EIA de Baguari.
95
Figura 18 Rua Francisco Diniz. Demonstrando as trincas do lado externo
FONTE: AMPLO, 2007
“Olha eu sinto maravilha, sabe? Eu num sô garrado com
nada. Mas uma casinha nova é bom demais. Porque se é
o progresso beleza, e se fosse por uma necessidade?”
(Lucas).
Para alguns a mudança está diretamente relacionada ao progresso, onde
este é percebido como algo positivo e que de fato poderá trazer melhorias para
a população local.
No estudo também foi encontrado, casas sem delimitações de espaço,
como muro. Ao mesmo tempo em que esta situação pode refletir em sensação
de liberdade, para outros pode simbolizar a perda de sua individualidade, como
a nova moradia será entregue toda murada, acabou gerando para alguns
moradores um certo grau de satisfação neste sentido.
“Casa toda murada, toda de acordo, os vizim não vão
perturba a gente, a gente combina bem com vizim, e se
for vizim que num combina com a gente, num precisa vê
nem o rosto dele, ta murado né?” (Araci).
“To sastifeita. Casa nova, casa bonita, muradinha, vai se
melho né?”(Joana).
As ruas em estudo apresentam características similares e distintas ao
mesmo tempo. Similares com relação ao tipo das casas (conforme Figura 19),
96
tamanho e histórias de contato com a área há muitos anos e distintas pela
localização e risco. A Rua Francisco Diniz no Distrito de Pedra Corrida
apresenta seu lado esquerdo limítrofe com o Rio Doce, assim como o risco de
inundações ocasionadas por este quando chega o período chuvoso, pois o
nível do rio é próximo, atingindo inclusive os quintais. Já a Rua Beira Linha na
sede do município de Periquito, está situada entre o Rio Doce e a linha férrea
Vitória-Minas da companhia Vale, onde conforme relato da população local, o
risco de inundações é menor, mais somado ao risco de atropelamento por
trem, os ruídos intensos e tremores que desencadeiam grandes trincas nas
casas, geram um desconforto para muitos.
Figura 19: Casa da Rua Beira Linha. Demonstrando a precariedade das casas no local.
FONTE: AMPLO, 2007
No entanto, na área alvo de realocação na sede do município, embora
ficassem explícitos os riscos conseqüentes de sua localização, estes não eram
considerados pela Prefeitura de Periquito, por se tratar de uma área de
invasão.
Então, diante das diferenças apresentadas, o grau de satisfação
relacionado aos aspectos positivos foi evidenciado na maior parte das
entrevistas pela população alvo de realocação da Rua Beira Linha, conforme
relatos abaixo:
97
“Mais de qualquer maneira tá bom a área aqui é muito
arriscada né? Não é uma necessidade, por causa do risco
né? Se não fosse a necessidade da realocação, nois teria
que fica aqui mesmo né? Lá fica perto da mercearia, sai
do risco da linha” (Roberto).
“To sastisfeita demais. Eu inté perdi uma menina minha
que morreu aí na linha. Ela não escutava do lado
esquerdo e não ouviu o trem passa” (Gleice).
Na análise do grau de satisfação relacionado, estes variam devido às
características da localização e a sua influência sobre os moradores.
Na percepção dos moradores na fase de pré realocação, uma nova fase
iniciou-se com o princípio das obras nos locais, onde muitas famílias passaram
a relatar outros aspectos positivos sobre a realocação, e este se referia ao fato
de estarem indo para uma casa “nova”.
Na fase de construção das “novas” casas, foi realizado o método de
observação pela pesquisadora, não sendo aplicada nenhuma entrevista até a
fase de “mudança”.
Nesse período, foi observado que a princípio havia uma percepção pelo
empreendedor de padronização das novas casas, onde a cor, o modelo de
porta, janela, dentre outros, seriam os mesmos. Em conversa com os
moradores percebeu-se muita indignação diante do fato, onde estes solicitaram
através da Associação de Moradores, uma reunião com o Consórcio do
empreendimento, gerando uma melhora neste aspecto, decorrente do qual
houve uma flexibilização no processo para escolha de 05 (cinco) tipos de cores
para as novas residências, dentre estas estavam: abóbora, vermelho, azul,
verde e amarelo. Também colocaram 05 (cinco) opções de cerâmica, da
delimitação da casa com a rua que poderia ser toda murada ou parcialmente
cercada; já as portas e janelas haviam somente 02 (duas) opções.
A construção das casas iniciou-se por delimitação de Quadras, sem
qualquer ordem de prioridade, pois os lotes foram escolhidos pelos próprios
moradores sem interferência do empreendedor; onde estes buscaram manter a
mesma vizinhança devido à relação estabelecida de anos de convivência.
O início da pavimentação do “novo bairro” chamou atenção, pois
enquanto era comentado por alguns o benefício de não ter mais “lama” na
98
porta de casa, para outros era percebido como mais uma forma de tornar
“quente” o novo lugar.
O acesso à obra era permitido a todos aqueles que seriam realocados ou
interessados em conhecer esta, bastava a identificação, o uso de EPI‟s e o
acompanhamento do encarregado da obra, onde a mesma era de uma
empresa terceirizada. Parte das fotos deste acompanhamento podem ser
evidenciadas nos ANEXOS 6 e 7.
Foi permitido às famílias alvo de realocação que retirassem tudo de suas
antigas moradias, onde o empreendedor realizou o transporte ou inserção
destes no
novo
local
de
residência,
porém
sem
assumir
qualquer
responsabilidade pelos danos causados durante a mudança.
Percebeu-se que algumas famílias tentaram reproduzir nas novas casas
os mesmos “moldes” das antigas, ou seja, na etapa que precedeu a entrega
dos imóveis, alguns já haviam contratado pedreiro, ou até mesmo levando
parentes para construir o característico fogão à lenha, a tradicional varanda e
até mesmo replantar as mudas em vasos, pois muitos percebíam no novo
quintal a impossibilidade de fazer hortas e plantações de árvores frutíferas.
Diante da fase de pré-realocação, ficou evidente que o grau de satisfação
relacionado aos aspectos negativos foi muito maior do que o positivo e nesse
sentido os relatos foram iguais na Rua Francisco Diniz quanto na Rua Beira
Linha, ou seja, a preocupação com o lugar referente ao “afeto” e ao “sustento
familiar” é marcante.
4.2 Estudo das famílias afetadas na fase de Pós-Realocação, identificando
a percepção das famílias em relação ao seu novo local de moradia
A “mudança” pode gerar diversos tipos de sentimentos, mas pode-se
resumir duas expressões abordadas neste estudo, uma de satisfação com a
moradia e outra de insatisfação com a mudança do lugar, com a falta de
suporte para garantia alimentar e todo o processo em si.
Neste momento será descrito a percepção desta população realocada
após a mudança para o novo local de residência.
99
A realocação de toda a população afetada iniciou-se em julho de 2009,
sendo finalizada em agosto do mesmo ano, onde as fotos que evidenciam a
conclusão das obras podem ser visualizadas nos ANEXOS 7 e 8. Todo o
processo que envolve uma mudança foi realizado pelo empreendedor conforme
acordo firmado. As entrevistas após a realocação ocorreram no mês de
setembro de 2009, sendo a coleta de dados neste período considerada pela
pesquisadora um momento de grande influência, pois havia pouco tempo que
as famílias estavam “fora” do seu antigo lugar de moradia para poder relatar os
sentimentos de “perda”, “saudade” ou “necessidade”.
Diante deste estudo, o grau de satisfação após a realocação, foi
discretamente maior quando questionados sobre a “nova” casa, mas quando foi
interrogado sobre o “lugar” a grande maioria acabou por referir que sentia falta
das frutas, plantas, árvores da antiga moradia, caracterizando assim a
insegurança alimentar desencadeada com o processo de mudança. Portanto,
pode-se concluir que os aspectos negativos foram mais relevantes do que os
positivos.
4.2.1 Grau de Insatisfação dos Moradores Realocados
Com relação aos impactos sociais provocados pela implantação de uma
Hidrelétrica, a CMB (ibid), constatou que por diversas vezes os efeitos
negativos destas não são avaliados a longo prazo, desconsiderando a gama de
impactos na vida destas comunidades afetadas por estarem distantes do
ambiente ribeirinho e serem diretamente influenciados.
Fica evidente em um dos relatos a referência da história com o lugar,
onde comprova que os reassentamentos, ou realocações não conseguem
assegurar as mesmas condições de vida anterior, onde já discutimos na
revisão bibliográfica em que autores como Bermann (ibid) caracterizam este
impacto.
Na avaliação dos efeitos negativos após a realocação dos moradores da
Rua Francisco Diniz do Distrito de Pedra Corrida, observa-se que estes ainda
permanecem vinculados ao “lugar”.
100
Para estes a mudança de “casa” aumentou o sentimento da saudade do
local anterior, e o que mais foi evidenciado se relaciona ao quintal, que
comportava grandes árvores, frutas, hortas e criações, podendo ser
correlacionado aos mesmos valores da fase de pré realocação.
Quando questionados da satisfação sobre o sentimento de sair do lugar
“antigo” e vir para um “novo”, alguns entrevistados expressaram as seguintes
opiniões:
“Nem um pouco. Por causa do costume né, foi todo
mundo criado lá então era herança do meu pai também
né, então começa todo aquele processo de como se diz é
obrigado, fazer o que?” (Isaac)
“Cê que a verdade, eu num trocaria minha casa nunca por
uma casa dessa aqui em cima, na rua debaixo minha
história fico toda lá, num é casa de cerâmica, casa de
janela de vidro eu num trocaria não, eu não gostava nem
daqui da rua de cima” (Conceição).
Novamente aparece em destaque a questão da relação com o lugar, já
comentado no capítulo 2, mas vale reafirmar, que Ewald et al. (ibid)
caracterizam o lugar como o local que é imediatamente associado à visão de
espaço particular com delimitação, onde ocorre um conjunto de relações
sociais, baseadas em fortes laços familiares e também vinculado ao tempo de
residência. Por isso, cada comunidade forma sua própria cultura e transforma
o local de acordo com suas interações do cotidiano a partir de um determinado
“lugar”.
A preocupação diante dessa influência é como estas pessoas
conseguirão reproduzir o modo de vida como anteriormente, pois durante a
fase de coleta de dados após a realocação, quando convidada para entrar à
casa das famílias, a pesquisadora observou que em praticamente todas haviam
comprado móveis novos. No momento da entrevista a pesquisadora aproveitou
a oportunidade para questionar sobre o pagamento das benfeitorias, foi onde
surgiu o relato de muitos moradores que com o pagamento destas compraram
“móveis novos” para ficar bonito na “casa nova”.
Neste estudo uma das grandes questões que incomoda enquanto
pesquisadora,
é
que
pagou-se
as
benfeitorias
mas
não
houve
acompanhamento da aplicação deste pelo empreendedor, ou seja, o dinheiro
101
que deveria ser direcionado para reconstruírem os mesmos modos de vida do
antigo lugar, agora foram investidos em móveis novos. A compensação deveria
ter sido suficiente para reconstruir e melhorar o padrão de vida, além de
comprar os novos móveis. Então como pode-se assegurar o sustento alimentar
destas famílias? Qual será o verdadeiro impacto socioeconômico do lugar a
longo prazo?
Restou também a insegurança, pois eram as frutas e hortaliças que
garantiam a alimentação destas pessoas, agora com que orçamento eles
poderão contar? Os quintais estão vazios, sem frutos ou hortas, alguns até
tentam recomeçar o que havia de produção dentro de pequenos vasos
espalhados em um canto de um quintal “pelado”. Mesmo levando as mudas de
suas plantações, quanto tempo pode levar para essas novamente conseguirem
garantir a alimentação destas famílias?
A percepção da ausência do plantio e contato necessário com as frutas,
hortas com a decorrente perda da segurança alimentar fica evidente na fala de
muitos moradores:
“lá naquela rua era muita fartura aquela rua lá que nois
morava era a melho rua que tinha era a nossa que é o
lugar de fartura que a gente tinha de tudo, pra gente vim
pra um luga desse. Tinha muita fruta no quintal, manga
agora tem que ta começando, muita banana, era coco,
cana, goiaba e pinha a gente tinha de tudo né, era muita
fartura, plantava milho, verdura era muito difícil deu
comprar porque eu tinha minha horta, plantava abobora,
quiabo, milho eu tinha de tudo” (Flávia)..
“É diferente né, é difícil ta aqui a plantação de lá era muito
maior, lá é plantação antiga” (Maria).
“Nem da pra resume é uma tristeza só é um deserto esse
trem aqui, essa terra num dá nada, lá tava cheio de planta
chega aqui esse deserto, aqui tem muito é azulejo e muro
só e mais nada, a minha casa não era aquela casa aquela
mansão não a casa aqui é muito boa melhor do que a
gente tinha lá, mais também num era só a casa o valor da
minha mãe que morreu tinha seis anos lá perto lá, minhas
plantas minhas coisas e eu num costumo até hoje ainda
sinto muita falta de lá vou lá busca uma plantinha” (Vilma).
102
Outro fator muito evidenciado foi o relato da ausência de árvores com o
sentido de proteção e conforto na área de realocação, gerando insatisfação
devido a falta de locais com sombra, desencadeando um ambiente mais
quente, e sem local adequado para as crianças brincarem.
“To me sentindo muito mal, é ruim o sol quente, num tem
uma árvore num tem nada olha como é que a gente ta
toda queimada de sol aqui. Com relação a casa eu não to
queixando não a casa é boa to falando assim tirar a gente
do luga onde a gente viveu tanto tempo nasceu viveu ali
entendeu, tira a gente pra coloca aqui é muito estranho
muito diferente acho que é todo mundo sentiu isso ai, é o
quintal que tinha banana, cê tinha cajá manga, cê tinha
manga, cê tinha mamão, cê tinha tudo, pro cê vim pro
trem desse aqui, começa tudo de novo, cerâmica, asfalto.
Não de jeito nenhum, não gostava dessa Rua” (Conceição
de Pedra Corrida).
“Em termos da casa, essa com certeza é melhor que a
outra, mas aqui tem muito sol, aqui num tem nenhuma
sombra pra gente esconder, os pequininim tadin tão
virando um tiçãozinho de tanto brincar pra lá e pra cá, lá
em baixo tinha sombra com fartura né” (Joice)
Diante destes depoimentos, percebe-se a atividade da memória coletiva
presente continuamente ao longo da história, e que se intensifica e ganha
relevo, reinventando o passado no presente conforme visão de Augé (2003
apud Zhouri e Oliveira, 2007), sendo empreendimentos como estes que
remetem o tempo todo a percepção do risco de desagregração social.
Um relato importante, que foi mencionado por apenas dois moradores,
como percepção de incomodo na nova casa, foi que com o enchimento do
reservatório, surgiram “pernilongos gigantes”, que eles nunca haviam percebido
no lugar.
“Menina, só cê vendo, tem aparecido uns pernilongão,
mais uns pernilongo gigante, preto, que ta incomodano,
foi desde o dia que represou aí em baixo, isso tá ruim, já
penso se fica assim? (José)”
O surgimento de vetores como evidenciado neste relato, também foi
evidenciado no trabalho de Koifman (2001, p.02) que assinala que entre as
principais interferências diretas e indiretas oriundas pela expansão do setor
elétrico, destacam-se: “a realocação de comunidades para outras regiões,
103
muitas vezes acompanhada de rupturas em seus estilos de vida; o alagamento
de grandes parcelas territoriais”, diminuindo assim a disponibilidade de áreas
cultiváveis; e principalmente aumentando a proliferação de vetores.
Já nesta fase de estudo houve uma inversão das percepções, que
surpreendem quando analisadas individualmente; pois antes da mudança a
maioria dos moradores da Rua Beira Linha (sede do município de Periquito)
denotavam satisfação com relação a realocação, porém pós-realocação, a
grande maioria em seus depoimentos demonstrou insatisfação quando se lhes
pergunto sobre questões como acesso do “novo” local de moradia para escola,
igreja, comércio, e trabalho, como evidenciados nos depoimentos a seguir:
“Até ontem eu comentei lá na igreja, que com 5 minutos
eu chegava na Igreja, agora morando aqui é 10 minutos”
(Joice).
“Mudo drasticamente. Pra questão da casa ficou bom não
tenho do que me queixar. Pra ir pro meu trabalho foi
péssimo, porque às vezes tem que trocar de roupa e num
tem luga pra trocar de roupa, ficou mais longe ainda onde
eu to pescando é seis quilômetros pra ir e seis pra volta e
tem dia que eu tenho que ir de manhã e voltar de tarde
então fica mais de vinte quilômetros por dia” (João).
Antes da realocação as casas da Rua Beira Linha possuíam seus quintais
às margens do Rio Doce (Figura 20). Após a realocação, o acesso ao Rio é de
aproximadamente 5 km; sendo o local inserido no centro do município de
Periquito, onde verifica-se no ANEXO 6 nas FIGURAS 3 e 4.
104
Figura 20: Casas na Rua Beira Linha. Demonstrando a proximidade do Rio.
FONTE: Aniely Coneglian Santos, 2009
Em outra fase da entrevista, este mesmo morador relata a sua indignação
também com a dificuldade de conseguir manter o sustento para sua família:
“Pescando eu to, todo dia, num ta pegando peixe esse é o
problema. Antigamente eu pescava uns seis quilo de
peixe, hoje se pesca um é muito. O rio ta diferente”
(João).
O enchimento do reservatório transformou o Rio deixando-o com
características de lago, desencadeando ainda alterações na quantidade de
peixes, conseqüentemente houve impactos negativos na renda de muitos
moradores, desde que sua fonte de renda provia da pesca e sua venda na
comunidade, assim como esta mudança também impactou no suprimento
alimentar de muitas famílias ribeirinhas. Em decorrência, esta mudança
contribui para que estas famílias percebam a realocação como um processo ou
experiência traumática, onde os laços podem ser afetados, agravando a
dependência desses grupos com relação a sua base de recursos naturais que
já foi completamente alterada pela implantação da Usina Hidrelétrica.
Quando questionado aos afetados se haviam procurado o empreendedor
para relatar as dificuldades encontradas, manifestaram que tinham entrado em
contato com a advogada de defesa da comunidade, mas que esta ainda não
105
tinha nenhuma resposta do caso. Não foi questionado sobre o possível contato
com Movimentos Representativos como MAB, Igrejas ou Associações.
Finalizando, o depoimento embaixo deixa evidente que esta mudança tem
desencadeado o endividamento de alguns dos moradores.
“Me atolei em dívida, inclusive eu tomei, pra mim não suja
meu nome, tomei um dinheiro emprestado segunda-feira
passada, então quer dizer a coisa parece, pra quem tá de
fora, parece mil maravilha mais no fundo no fundo não é
bem assim e eu vou te falar porque hoje eu num to
trabalhando, hoje porque minha bicicleta quebro” (João).
Segundo a CMB, as grandes barragens afetam os recursos hídricos que
são responsáveis pelo sustento da vida, como terras produtivas, a pesca e a
seguridade de acesso a água doce, que esta sendo considerado um recurso
cada vez mais escasso.
O Empreendedor da UHE de Baguari; só fez transferir as famílias e os
trabalhadores de suas casas para uma outra parte do Distrito ou Município,mas
esta mudança de local não respeitou o modo de vida destas famílias, assim
como também não houve acompanhamento a estas. Corresponde ressaltar
que esta mudança gerou uma perda de seus referenciais e da forma de
subsistência,
sem
qualquer
busca
de
melhoria
econômica
ou
de
desenvolvimento profissional; e ainda há a degradação de seus recursos
naturais que não foram reconstruídos.
No EIA havia previsão de diminuição da quantidade de peixes, no
entanto, não houve compensação para aqueles que declararam a pesca como
único meio de subsistência. De fato, deveria ter havido uma forma de
recompensar as famílias que retiram parte de seu sustento a partir deste,
criando outra(s) alternativa(s) de empregabilidade que pudesse(m) assegurar
seu sustento por tempo indeterminado, pois estes impactos são em longo
prazo e geralmente imprevisíveis enquanto à garantia da manutenção destes
mesmos recursos como eram antigamente.
Todavia soma-se a problemática da distância das novas moradias ao Rio,
local que fica de acordo com depoimentos dos moradores em torno de 6 (seis)
km deste, fato que contribui ainda mais à insegurança alimentar destes
moradores, não só pela ausência dos alimentos obtidos do próprio rio como
106
conseqüência das mudanças na oferta de peixes, senão também pela
impossibilidade da manutenção das criações no local.
Um fato que chamou atenção da pesquisadora foi que quando estava
realizando a última entrevista pós-realocação na Rua Beira Linha, uma
moradora - que não permitiu a gravação de seu depoimento - fez um desabafo
muito importante: ela referia que na casa “antiga” a beira do rio, ela possuía
criação de galinha, e gado, porém estes permaneciam em terra que não eram
deles, literalmente soltos a beira do rio; com a mudança, a família foi realocada
para o centro da cidade, e tiveram que se desfazer das criações. No seu relato
ela deixou clara a insatisfação, pois na nova casa não há espaço para criação,
nem para fazer uma horta ou plantação de árvores frutíferas.
Outro depoimento de um morador da Rua Beira Linha que estava
satisfeito com a realocação no processo inicial, agora relata insatisfação:
“Pra dormi tá pior porque lá o ambiente era mais sozinho
não tinha muito carro buzinando só as vaca né. Os
cômodos aqui são menores. Lá era mais perto da
natureza, dos pássaros” (Joaquim).
É o reflexo da saída da beira do Rio, que era bem distante do centro da
cidade, agora a “nova” casa fica em uma rua com certo movimento de pessoas,
automóveis e motocicletas.
Os valores e referencias são diversos, mas de um modo geral a
necessidade da segurança alimentar e a história do lugar, da relação com a
natureza, estão presentes em quase todos os depoimentos.
4.2.1 Grau de Satisfação dos Moradores Realocados
Após a realocação as causas de satisfação por uma pequena parcela da
população entrevistada deveu-se à “casa nova”, recém construída, ainda em
alguns destes primava o alívio de não estarem mais suscetíveis às enchentes,
que como já assinalado anteriormente, geraram grandes perdas familiares para
algumas
dessas
famílias.
Este
fato
depoimentos:
107
fica
evidenciado
nos
seguintes
“Lá é diferente com a daqui, olha a casa daqui tem laje,
cerâmica e lá não tinha isso, e o quintal aqui é maior. Fico
mais fácil de pega o ônibus, ele para logo ali.
Eu acho assim né, a gente morava lá numa casa bem
velha, antiga mesmo, a casa quase caino, pra mim eu
achei muito bom sabe, facilito muito pra nois, melhoro
muito porque morava numa rua que não era asfaltada não
tinha esgoto, tinha água e luz mais num tava muito bom
não, foi bom” (Joana).
“Olha minha fia eu vo fala com cê, é tudo de alegria, eu
tinha mesmo que saí um dia porque todo mês de
novembro e dezembro a gente já ficava preocupada com
a enchente, saía quando voltava as coisa da gente que já
era poquinha tudo sumia, cama de solteiro sumiu, ferro. A
água chegou lá dois metro minha fia, em 79 eu perdi tudo,
casa, tudo que tinha, porque a gente saiu e achou que a
água não ia subi muito e quando volto, a segunda casa
que caiu foi a minha ficou 12 dias a água dentro de casa e
essas outras a gente saía e depois voltava mais dava
muito trabalho, a gente ficava até assim dois dias pra
volta a muda” (Ilma).
“Bem melhor, morava num buraco lá né, um buracão
danado, lá chovia arrumava aquele barraco arrumava,
arrumava só os trincado” (Zeca).
“Aqui ta é bom não tem nada que fala mal daqui, muito
bom graças a Deus. Só de num ser na beira daquele rio
né. Quantas noite de sono eu já passei sentada lá
naquele luga pra vigia a água se chegava lá em casa”
(Cristal).
Outro aspecto positivo percebido pela população, em relação a
reestruturação do local, foram as mudanças como: a pavimentação das ruas,
construção de uma praça para convivência e lazer, e a presença de muros em
todas as casas.
“Lá toda vida foi estrada de chão bagunça, aqui não é
asfaltado é muito mais sabe, igual a gente nunca moro em
casa assim murada tudo aqui pelo menos murada se fica
a vontade, aqui cê vai pode sai fecha o portão e fica a
vontade que ninguém, apesar que todo mundo aqui é
conhecido aqui de todo mundo mais hoje em dia cê sabe
num pode confiar em ninguém pode ser amigo, mas cê
tranca seu portão e ta numa boa, fica a vontade” (Dinho).
108
Nas entrevistas pós-realocação destacou-se que boa parte da população,
embora se referencie à “nova casa” positivamente, no entanto, quando
consultados com sua satisfação a respeito do “novo lugar” (bairro) mostram de
maneira significativa sua insatisfação, podendo-se inferir que a percepção de
“casa”e “lugar”são completamente distintos, como fica evidente no depoimento
a seguir.
“Depende da forma que a gente vê né, lá a gente já tinha
digamos assim planta no quintal tudo que precisava tava
no quintal, depois que a gente veio pra cá não tem planta
nenhuma nada, mais é se for olha que lá tinha enchente a
casa que eu morava era bem negoçada na verdade. E pra
mim que tenho filho ficou melhor, porque lá na beirada de
rio era muito perigoso, agora aqui não, eu posso fechar o
portão e deixar ela brincar no quintal a vontade (Tatiana)”
“Bom muito melhor, só to sentindo falta da plantação mais
no mais não, não tenho o que reclamar não. Aqui é
melhor, tem asfalto aí, num tem lama num tem nada”
(Dionísio).
“A gente vê assim: teve uma vida toda lá, e o novo chama
atenção por ser novo, assim as coisas que a gente
possuía lá como questão da área toda plantada do quintal
tudo, então de início a gente ta tendo essa preocupação
de planta, de substituir o que tinha lá, então da questão
da casa aqui é muito bom” (Rita).
Fica claro que este estudo não esgotou a temática da realocação,
evidenciando-se a necessidade de continuação de novos estudos sobre seus
impactos socioambientais em longo prazo, pois, avaliar estes apenas um mês
após a transferência para as “novas casas”, é de fato pouco tempo para
mensurar a dimensão das possíveis alterações que serão desencadeadas
neste processo, como comprova-se no depoimento abaixo:
“Só com o tempo né que vai passar, aqui realmente é
uma casa nova né, maior que a minha, mas lá a gente já
tinha uma história, as vezes fico pensando assim, olho pra
um lado,... olho pro outro, e as plantas da gente que ficou
pra trás, horta, fruta que com muita dificulidade levo pra
conservar”(Alice).
De fato o espaço físico socialmente construído poderá perder as
referências criadas através do modo em que foram estabelecidas as relações
109
no cotidiano de muitos anos, mas seus múltiplos significados não são
totalmente considerados.
A realização deste estudo deixou evidente que não existe por parte do
empreendedor uma compreensão diferenciada entre as percepções de “lugar”
e
“moradia/casa”,
Corresponde
mas
salientar
sim
que
são
evidentes
estas
na
diferentes
população
percepções
realocada.
não
são
compreendidas pelo empreendedor como passíveis de impacto social que
afetam tanto as relações de convívio como sua segurança alimentar, ou seja,
que afetam o bem-estar da população realocada.
A ênfase dada pelo empreendedor com respeito à realocação, resume-se
apenas ao aspecto da “casa/moradia”, acreditando que a população afetada
ficaria
satisfeita,
ou
em
outras
palavras,
sentir-se-iam
plenamente
compensadas – diante de tantas perdas – quando estivessem vivendo em uma
“nova casa”.
Segundo Müller (1995), será que a visão atual dos empreendedores ou do
setor elétrico diante das realocações tem evoluído significativamente? De que
maneira? Com qual preocupação?
A duplicidade de percepção dos realocados diante de todo processo, foi
visivelmente registrado e interpretado da maneira mais transparente possível,
buscando-se não denotar somente a visão de pesquisadora, e sim na tentativa
de conseguir estudar, e transmitir passo a passo este processo tão delicado no
sentido social e, que ainda será vivenciado por milhares de pessoas em todo o
mundo.
110
CONCLUSÃO
As permanentes construções de grandes barragens retratam a direta
relação do poder industrial e o capital financeiro, distanciando a população
afetada de atuarem de forma integral em um processo democrático. As fontes
utilizadas para gerarem Energia Elétrica no Brasil expressam a ação do
Governo sobre as formas de produção de energia a partir da utilização de
recursos hídricos, sem muito investimento nas fontes de energia alternativas,
que poderiam minimizar os impactos sociais e ambientais com relação a
formação de barragens.
Nos últimos anos, percebe-se que a mídia tem tratado de forma mais
evidente a real limitação dos recursos hídricos, onde a categoria que afetam o
meio ambiente envolve diferentes sentidos sociais, culturais e com múltiplos
interesses.
O município de Periquito foi fortemente demarcado pelo movimento
campo-cidade, e sofre constante influência pela sua situação geográfica. Com
a implantação da UHE Baguari, diversas áreas do município foram
compreendidas na Área Diretamente Afetada pelo empreendimento, sendo que
uma parcela significativa de sua população seria alvo de realocação.
Embora na legislação sobre Licenciamento Ambiental esteja prevista a
participação da população diretamente afetada durante todo o processo, no
empreendimento em questão (UHE Baguari) apesar de existir uma Associação
de Moradores representativa, os espaços para participação da população
foram limitados.
111
Embora existam
diversos
instrumentos
para
avaliar
os
impactos
socioambientais destes projetos, ainda são insuficientes para que no
planejamento proposto se contemplem os interesses de ambas as partes,
população afetada e empreendedor, dado o poder diferencial destes autores.
A partir do estudo realizado, percebe-se que a energia elétrica nos
tempos atuais tem influenciado para o crescimento da economia e
desenvolvimento de um país; contudo a crescente exploração de fontes de
recursos naturais para suprir o auto consumo energético, ainda permanece
desencadeando impactos socioambientais relevantes nos níveis mundial e
local.
Apesar da grande maioria das Referências Bibliográficas utilizadas nesta
pesquisa demonstrarem que os impactos sociais gerados pela implantação de
Hidrelétricas causam muito mais percepção negativa do que positiva na
população alvo de realocação, neste estudo constatou-se dois grandes
momentos de evidente variação do grau de satisfação, que podem refletir
significativamente nos impactos sociais futuros.
Diante do estudo realizado sobre a realocação destas famílias,
evidenciou-se que a percepção dos moradores sobre os impactos sociais
desencadeados pela implantação da UHE Baguari, foram em sua grande
maioria negativos. Na fase de pós-realocação o grau de satisfação com a “nova
moradia” aumentou, mas com relação ao “lugar” o grau de insatisfação
permaneceu prevalecente, indo de encontro com a literatura analisada nesta
pesquisa sobre a temática. Tanto na Literatura como nesta pesquisa destacouse que a Habitação é uma variável de extrema importância a ser acompanhada
como impacto social diante destes empreendimentos, e vale ressaltar a
necessidade da avaliação desde o momento da negociação até alguns anos
após o funcionamento da Usina em questão.
Também tornou-se evidente, que a elevação do nível das águas pelo
enchimento do reservatório extinguiu o ponto principal de lazer da população
local, no caso do Distrito de Pedra Corrida. Embora no momento das
entrevistas a população não tenha demonstrado preocupação com o fato,
porém cabe perguntar-se e avaliar qual será o real impacto que a
desapropriação deste sítio de lazer terá sobre a população no período de
intenso calor na região.
112
Sem dúvida, a participação da população é de fundamental importância
para auxiliar na tomada de decisões sobre o planejamento das ações de
implementação de UHE, o que deslindaria numa minimização dos impactos
desencadeados pela sua implantação. Pode-se desta forma, se espelhar na
atitude de países como a Alemanha, que para seu licenciamento ambiental,
aborda
etapas
de
aprovação
com
completa
permissão
popular
(Verwaltungsverfahrensgesetz, parágrafos 72 a 78, apud ZHOURI, et. al.,
2005).
Embora haja melhoria nos processos de avaliação dos impactos
socioambientais decorrentes dos empreendimentos hidrelétricos, corresponde
destacar que os transtornos ocorridos fruto da realocação de populações, ainda
geram conflitos neste setor, pois o homem diante de todo avanço tecnológico
não consegue reproduzir a mesma relação com o lugar ou história existente
entre uma família e seu local de moradia.
A questão é que, associado à perda do “lugar”, também está a perda de
sua identidade e, no caso concreto deste empreendimento, associa-se a perda
de sua segurança alimentar, assim os valores instituídos a este, vão além de
apenas sua
reconstrução, podendo-se dizer então que há somatórias de
perdas.
Nessa perspectiva, observou-se a importância da participação ativa da
população afetada no acompanhamento do processo de implantação de uma
Hidrelétrica. Também ficou evidente a importância de que os empreendedores
percebam a necessidade de maior monitoramento antes, durante e após (à
longo prazo) a finalização do empreendimento diante dos impactos
socioeconômicos desencadeados por este.
Com todo o estudo realizado, conclui-se que há necessidade de
permanente investigação do grau de satisfação destas famílias realocadas,
pois os impactos sociais gerados poderão ser ainda maiores à longo prazo,
devido as novas relações que estão sendo estabelecidas, reafirmando assim a
descrição presente no relatório da CMB (2000a), que justifica a criação de um
sistema à longo prazo para rever periodicamente o desempenho, os benefícios
e os impactos socioambientais de todas as grandes barragens existentes.
Neste momento é importante realizar um paralelo, diante de todas as falas
evidenciadas na pesquisa com a percepção dos autores Lestingi e Bermann
113
(2007), que afirmam que nestes processos há que se levar em consideração a
dignidade humana dos que vivem as margens dos rios, pois muitos acabam
ficando indiferentes diante do progresso, e assim destroem os sonhos de vida
de milhares de pessoas.
Diante de todo estudo, percebe-se que os impactos socioambientais
sempre estarão presentes em empreendimentos hidrelétricos, e que a
participação da comunidade no processo de tomada de decisões é
fundamental para minimizar os impactos.
Finalmente, ressalta-se a necessidade de uma investigação permanente
do grau de (in)satisfação das famílias realocadas, pois os impactos
socioambientais gerados poderão ser ainda maiores à longo prazo, devido aos
impactos tanto na desestruturação inter e intra familiares, na (in)segurança
alimentar, assim como na(s) fonte(s) de subsistência familiar.
114
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Licenciamento e Barragens. Viçosa – MG: Editora UFV, 2008. p.64 -82.
WUNDER, Roni. Processos de interação social do setor elétrico brasileiro e da
legislação ambiental: entre o mundo sistêmico e as racionalidades do mundo
da vida. Desenvolvimento e Meio Ambiente, v. 7 (2003). Disponível em:
http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/made/article/viewArticle/3045. Acesso: 19
de agosto de 2009.
126
ANEXOS
127
Anexo 1 – Questionário pré-realocação
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE CARATINGA – UNEC
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO
MESTRADO PROFISSIONAL EM MEIO AMBIENTE E
SUSTENTABILIDADE
ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
NOME:__________________________________ IDADE: _____ Gênero: ___
Endereço: (diretamente afetado): ____________________________________
Relação Familiar: _________________________
QUESTÕES
Foco da Pesquisa: Percepção da realocação pelas famílias afetadas pela
instalação da Usina Hidrelétrica de Baguari no município de Periquito – MG
1- Há quantos anos vocês moram ou moravam na casa que será alvo de
realocação/ permuta ou indenização, devido ao empreendimento da
Barragem?
2- Quantas pessoas moram ou moravam nesta residência?
3- A atual residência foi adquirida de que forma? (herança, compra,
financiamento, morava de favor, aluguel).
4- Você ou sua família obtém algum sustento desta habitação atual (ou
habitação negociada)?O que você sente quando pensa que terá de
deixar o local da sua residência e irá para uma nova?
5- Como você resumiria a necessidade de “mudança” de residência?
6- Esta mudança para você apresentou mais aspectos positivos ou
negativos? Porque?
7- Como você avalia o papel do Consórcio neste processo de realocação?
8- Você está satisfeito com o processo de negociação para realocação/
permuta ou indenização?
9- O que você espera encontrar lá na nova moradia?
128
Anexo 2 – Questionário pós-realocação
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE CARATINGA – UNEC
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO
MESTRADO PROFISSIONAL EM MEIO AMBIENTE E
SUSTENTABILIDADE
ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
NOME:__________________________________ IDADE: _____ Gênero: ___
Relação Familiar: _________________________
QUESTÕES
Foco da Pesquisa: Percepção da realocação pelas famílias afetadas pela
instalação da Usina Hidrelétrica de Baguari no município de Periquito – MG
1 – Como você poderia resumir o sentimento de sair do lugar “antigo” e vir para
um lugar “novo”?
2 – O lugar da nova casa é melhor ou não? Porque?
3 – Você está satisfeito com a mudança? ____sim ____não ____ em parte.
Explique o porquê da resposta
4 – O que você encontrou de novo nas condições da nova moradia?
5 – O novo lugar facilita ou dificulta o acesso da sua família a: escola? Ao posto
de saúde? Ao local de trabalho? Ao comércio? Ao lazer?
6 – Quais as facilidades e as dificuldades encontradas desde o momento da
negociação até a mudança de moradia?
7 – O que mais se destacou para você e sua família nessa mudança de lugar?
8 – Suas relações do dia a dia com seus amigos, vizinhos e ou família
mudaram? Explique como mudou esse convívio e se de alguma maneira essa
mudança lhe afeta.
129
Anexo 3 – Termo de consentimento
CENTRO UNIVERSITÁRIO DE CARATINGA
Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão
COMITE DE ÉTICA EM PESQUISA – CEP/UNEC
E-Mail: [email protected] Telefone: (33) 3329- 4555
Comitê de Ética e Pesquisa – UNEC
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Você está sendo convidado para participar da pesquisa “Percepção da
realocação pelas famílias afetadas pela instalação da Usina Hidrelétrica
de Baguari no município de Periquito – MG”, Você foi selecionado por morar
em Periquito desde novembro de 2006 e sua participação não é obrigatória. A
qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento.
Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou
com a instituição.
Os objetivos deste estudo são: 1) Estudar o processo de realocação das
famílias da região urbana afetadas pela instalação da UHE Baguari, residentes
nas ruas Beira Linha, localizada no distrito sede do município de Periquito e
Francisco Diniz, localizada no Distrito de Pedra Corrida deste município.
2)Identificar as necessidades básicas de cada família em relação ao seu novo
local de moradia: 3)Analisar os aspectos e impactos sociais, bem como a
efetividade das medidas ambientais envolvidas
Sua participação consistirá em responder algumas perguntas feitas pelo
pesquisador que utilizará um questionário para anotar suas respostas.
A entrevista não apresentará risco algum para sua integridade física, sendo as
mesmas orientadas e supervisionadas pelos responsáveis pelo projeto.
Os benefícios relacionados com a sua participação são: fornecer um maior
conhecimento científico sobre o tema; contribuir para que sua opinião possa
ser relacionada com os dados e informações oficiais obtidas no EIA/RIMA e se
for encontrada alguma alteração o empreendedor do Consórcio Baguari será
comunicado. As informações obtidas através dessa pesquisa serão
confidencias e asseguramos o sigilo sobre sua participação. Os dados não
serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação sendo que, você será
identificado por nomes fictícios para análises posteriores. Você receberá uma
cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço do pesquisador
principal, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora
ou a qualquer momento.
______________________________________
Aniely Coneglian Santos
RG: 6.538.275-0
Rua Osvaldo Cruz, 301. Cidade Nobre. Ipatinga-MG. Tel: (31)9135 1008.
130
Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na
pesquisa e concordo em participar.
Sujeito da Pesquisa:
Nome:
_____________________________________Tel:_____________________
End:
_______________________________________________________________
_________________________________________
Assinatura Sujeito da pesquisa
131
Anexo 4 – Pré-realocação: Rua Francisco Diniz (Distrito de Pedra
Corrida):
(FONTE: AMPLO, 2007)
FIGURA 1: Processo 24 PC
FIGURA 2: Processo 78 PC
FIGURA 3: Processo 23 PC
FIGURA 4: Processo 75 PC
FIGURA 5: Processo 46 PC
FIGURA 6: Processo 21 PC
132
Anexo 5 – Pré-realocação: Rua Beira Rio (SEDE – PERIQUITO)
(FONTE: AMPLO, 2007)
FIGURA 1: Processo 17PQ
FIGURA 2: Processo 06PQ
FIGURA 3: Processo 07PQ
FIGURA 4: Processo 08PQ
FIGURA 5: Processo 13 PQ
FIGURA 6: Processo 10 PQ
133
Anexo 6 – Início das obras na área urbana de alvo de realocação
(FONTE: Aniely Coneglian Santos, 2009)
FIGURAS1 e 2:Início da Construção da Área de Realocação em Pedra Corrida no período de
janeiro de 2009.
FIGURAS 3 e 4: Início da Construção da Área de Realocação na Sede de Periquito no período
de fevereiro de 2009.
FIGURAS 5 e 6: Obras no ínicio das Construções em Pedra Corrida (março de 2009)
134
Anexo 7 – Evolução das obras
(FONTE: Aniely Coneglian Santos, 2009)
FIGURAS 1 e 2: Visão interna e Externa de casa em processo de construção no Distrito de
Pedra Corrida, em abril de 2009.
FIGURAS 3 e 4: Evolução da Obra em Pedra Corrida, maio de 2009.
FIGURAS 5 e 6: Fase de Finalização das Obras em Pedra Corrida, julho de 2009.
135
Anexo 8 – Conclusão das obras de realocação
(FONTE: Aniely Coneglian Santos, 2009)
FIGURAS 1 e 2: Entrega das Casas de Realocação em Pedra Corrida, final de agosto de 2009.
FIGURAS 3 e 4: Área de Lazer construída no início do “novo” Bairro em Pedra Corrida, agosto
de 2009.
136
Anexo 9 – Evolução da concentração das usinas hidrelétricas no Brasil
(FONTE: ANEEL, 2002 apud SCHAPPO, 2008)
FIGURA 1: Mapa das UHE no Brasil.
137
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1) Avaliação dos impactos sociais no município - Biblioteca