MÓDULO 2.1: COMO SE FORMOU A TERRA? A formação do planeta Terra é um tema fascinante que une áreas do conhecimento científico tais como a astronomia e a geofísica. O desenvolvimento do nosso planeta, até a forma que conhecemos hoje, ocorreu por colisões violentas, aquecimentos, resfriamentos e agregação de materiais. Esses processos duraram bilhões de anos. A história da formação da Terra faz parte da história da origem do nosso Sistema Solar. A maior parte do que sabemos sobre esse tema provém de simulações do modelo da nebulosa solar primitiva e de asteróides que são resquícios da formação do nosso sistema solar (Figura 1). Quando um asteróide cai na superfície terrestre, é chamado de meteorito. Os meteoritos são preciosas relíquias arqueológicas que preservam informações dos primeiros bilhões de anos do sistema solar. Eles são analisados detalhadamente para entender melhor os processos de formação do Sistema Solar e da Terra. A história da Terra começou há cerca de 4.6 bilhões de anos, juntamente com a origem do nosso sistema solar. Nessa época havia apenas uma nuvem de gás e poeira. A FORÇA DE ATRAÇÃO GRAVITACIONAL das partículas e gás desta nuvem causou um colapso gravitacional, reunindo a maior parte deste material no seu centro de massa. Este colapso, acompanhado de rotação, fez com que um disco se formasse em torno do eixo de rotação. O centro desta nebulosa foi se tornando extremamente quente devido ao atrito, formando uma proto-estrela. No entanto parte desta nuvem de matéria permaneceu orbitando a proto-estrela (Figura 2), com o raio de aproximadamente 50UA (UNIDADES ASTRONÔMICAS). Este é o princípio físico de formação da nossa estrela, o Sol. SAIBA MAIS SOBRE OS PLANETAS DO SISTEMA SOLAR Figura 2. Disco de matéria (gás e poeira) girando em torno do Sol. Figura 1. Asteróide Gaspra observado pela sonda espacial Galileo em 1991. Foi a primeira vez que uma sonda passou tão próximo a um asteróide. Gaspra é um corpo irregular com dimensão aproximada de 19x12x11km. No início do sistema solar existiam apenas grãos microscópicos de poeira (Figura 3A) que pela FORÇA DE ATRAÇÃO GRAVITACIONAL formavam corpos cada vez maiores e com mais massa (Figura 3B), aumentando assim sua capacidade de atrair outros corpos. Com esse processo de contínua agregação de matéria, formaram-se os chamados planetesimais (Figura 3C). Esses corpos possuíam quase um quilômetro de diâmetro e representam o primeiro estágio para a criação de um planeta. 1 A FORÇA DE ATRAÇÃO GRAVITACIONAL é uma interação existente entre os corpos que possuem massa. Essa atração existe em todo o universo, isso inclui seres humanos, pedras, plantas, etc. Mas, para que a força gravitacional seja significativa, o corpo deve possuir uma massa considerável. A Lei de Newton diz que a FORÇA DE ATRAÇÃO GRAVITACIONAL é diretamente proporcional ao produto das duas massas (m1 e m2), e inversamente proporcional ao quadrado da distância (r) entre elas. Matematicamente: onde G = 6,67x10-11m3/(kg.s2) é chamada constante da gravitação universal. A Lei de Newton mostra que a força gravitacional diminui com a distância. Por exemplo, nós não sentimos a força da gravidade do Sol porque a distância entre a Terra e o Sol é muito grande e a nossa massa individual é pequena. Mas é a gravidade do Sol que mantém a Terra em sua órbita! Nós tampouco sentimos a força da atração lunar nos nossos corpos, mas é ela a responsável pelas marés oceânicas da Terra. Uma UNIDADE ASTRONÔMICA é a distância média entre a Terra e o Sol, cerca de 150.000.000km. Se fizermos uma viagem de ida e volta do Rio de Janeiro até a cidade de Sydney, na Austrália, percorreremos cerca de 27.000km. A distância entre a Terra e o Sol corresponderia a cerca de 5500 viagens como esta! A velocidade da luz no vácuo é de aproximadamente 300.000km/s. Então, se fizermos a conta t=d/v, sendo t o tempo, d a distância e v a velocidade, a luz do Sol leva cerca de 8 minutos e 20 segundos para atingir a Terra. Continuando o processo de acreção, cerca de cem mil anos depois os planetesimais formaram corpos maiores, com alguns quilômetros de diâmetro, chamados de protoplanetas (Figura 3D), com massas comparáveis a da Lua e a de Marte. Os protoplanetas são considerados como o último estágio para formação de um planeta. Como os protoplanetas eram muito grandes, as interações gravitacionais entre eles geralmente resultavam em grandes colisões. É necessário um tipo específico de colisão para contribuir na formação de um planeta. Assim, como em um jogo de sinuca, os choques entre bolas com muita velocidade resultam no afastamento e fragmentação de ambas. Já o choque com baixa velocidade, faz com que os corpos permaneçam juntos. Imaginando esse tipo de interação entre protoplanetas, as colisões de alta velocidade, causavam o espalhamento do material, afastando os corpos e seus destroços. As colisões de baixa velocidade não resultavam no espalhamento de destroços e os corpos ficavam próximos o suficiente para interagirem gravitacionalmente, resultando na formação de um corpo ainda maior. Os planetas do nosso sistema solar são resultados de colisões de baixa velocidade entre protoplanetas (Figura 3E). Figura 3. Estágios de acreção planetária, desde poeiras até a formação de planetas. 2 O último grande evento de colisões de baixa velocidade é chamado de “Impacto Gigante” e foi responsável pela origem da Lua. Especula-se que este choque ocorreu entre a Terra, ainda em formação, com um protoplaneta do tamanho de Marte, chamado Thea (Figura 4). Esse impacto foi tão violento que praticamente derreteu todo o material rochoso existente na Terra. Uma nuvem de matéria superaquecida foi lançada em torno do nosso planeta e permaneceu em órbita. Os cientistas acreditam que essa nuvem de matéria demorou de centenas a milhares de anos para resfriar completamente. A interação gravitacional dessa matéria formou a Lua, como nós conhecemos hoje. O resto da matéria que não participou na formação do nosso satélite natural, caiu de volta na Terra. Para ilustrar melhor esse processo, recomendamos assistir ao vídeo abaixo: http://www.youtube.com/watch?v=P4h9lPA0iYk Desde seu processo de formação, a Terra esteve em constante mudança, tanto interna quanto externa. A formação do núcleo foi o processo de maior diferenciação da Terra, ou seja, com a maior mudança de características físicas e químicas. A razão pela qual a Terra possui um núcleo é muito simples: o ferro e o níquel são elementos mais densos do que os silicatos que hoje formam o manto. Os metais possuem um ponto de fusão menor e como consequência este ferro derretido poderia passar entre os cristais de silicato (Figura 5) e migrar para o núcleo. Figura 5. Ilustração da separação do ferro derretido dos cristais de silicato. Ainda há muitas dúvidas sobre o processo de migração do ferro líquido e formação do núcleo terrestre. Mas uma das hipóteses propõe uma rápida separação do metal e silicato líquidos, formando regiões de ferro acumulado, que tenderiam a afundar e formar o núcleo (Figura 6). Figura 4. Em A, impacto entre Terra e um protoplaneta. Em B, superaquecimento da Terra e a formação de uma nuvem de matéria na órbita da Terra. Em C, formação da Lua após colapso gravitacional da matéria. Figura 6. Esquema possível formação núcleo terrestre. da do 3 As principais camadas da Terra são: crosta, manto e núcleo (externo e interno). Elas foram descobertas principalmente por estudos de sismologia, como mencionado no módulo 1 deste curso. O limite entre o manto e o núcleo está a uma profundidade de cerca de 2.900 km. Nesta região foram observadas velocidades sísmicas diferentes daquelas que os cientistas estimavam para o manto. Então, isso significa que esta região possui propriedades físicas diferentes do resto do manto; esta camada é chamada de D’’ (lê-se “D duas linhas”). A espessura de D’’ é irregular (Figura 7), mas estende-se por aproximadamente 300 km. Esta camada foi formada como resultado de reações físicas e químicas, já que o manto se dissolveu Figura 7. Camadas principais conhecidas no planeta Terra, incluindo a região do limite manto-núcleo. parcialmente no ferro líquido do núcleo. Por conta desta variação composicional, há variações na condutividade elétrica nesta região, o que certamente causa consequências importantes para a morfologia do campo magnético gerado logo abaixo, no núcleo externo. Mas é importante lembrar que a Terra continua em transformação, mesmo depois da formação e estabilização das suas camadas. Há muitos estudos que debatem como os processos que ocorrem na crosta e manto estão ligados aos processos no núcleo terrestre. Por exemplo, as plumas são regiões mais quentes do que o manto em geral, compostas possivelmente de elementos mais leves, que por consequência boiam até a superfície. Essas plumas podem ser responsáveis pela erupção de magma na superfície terrestre. Desta forma, as plumas podem transportar calor do núcleo para a superfície terrestre, como mostra a Figura 8. As plumas são muito importantes no transporte de calor e convecção do manto, com consequências para o movimento das placas tectônicas. Pesquisas sobre o fluxo de calor do limite manto-núcleo estão ainda em pleno desenvolvimento devido às incertezas em características básicas, como: temperatura, composição e dinâmica do interior profundo da Terra. É muito importante conhecer sobre o fluxo de calor neste limite manto-núcleo já que influenciará nos processos dinâmicos que ocorrem no núcleo externo e que geram o campo magnético principal da Terra. Figura 8. Esquema dos componentes do fluxo de calor do manto inferior até a superfície terrestre. Algumas plumas chegam à superfície, enquanto outras são extintas no manto. As plumas na superfície influenciam na geração de uma cadeia de vulcões. O esquema também mostra zonas de subducção, ou seja, onde as placas tectônicas penetram abaixo da superfície terrestre. 4 R Autor: Don Dixon - cosmografica.com eferências Bibliográficas Arndt, N., (2000). Geochemistry: Hot heads and cold tails. News and Views. Nature 407, 458-461. Chambers, J. E., (2004). Planetary accretion in the inner Solar System. Earth Planet. Sci. Lett. 223, 241252. Condie, K. C., 2005. Earth as an Evolving Planetary System. Elsevier Academic Press. 447 páginas. Jeanloz, R. e Lay, T., (2005). The core-mantle boundary. Scientific American- Special Edition. Lowrie, W. (2004). Fundamentals of Geophysics. Cambridge University Press. ISBN 0521-46164-2. Merril, R. T., Mcelhinny, M. W.; McFadden, P. L. (1996). The Magnetic Field of the EarthPaleomagnetism, the core and the deep mantle. Academic Press. Volume 63. Minarik B., (2003). The Core of Planet Formation. Nature, News and Views. 422: 126-128. Figura 3: Condie, 2005. Earth as an Evolving Planetary System. Figura 4: Stevenson, 2008. A planetary perspective on the deep Earth. Figura 5: Minarik, 2003. The Core of Planet Formation Figura 6: Rubie, D. C., Nimmo, F., Melosh, H. J., (2007). Formation of Earth´s core. Em: Treatise on Geophysics Vol. 9: Evolution of the Earth, D.J. Stevenson (ed.). Elsevier, Amsterdam, pp. 51-90. Figura 7: Jeanloz, R. e Lay, T., (2005). The coremantle boundary. Figura 8: Lowrie, W. (2004). Fundamentals of Geophysics. Vídeo sugerido: Do programa “How The Universe Works – A formação da Lua” da Discovery Channel. A legenda do vídeo foi feita por Felipe Morais. http://www.youtube.com/watch?v=P4h9lPA0iYk Pahlevan, K., Stevenson, D., (2007). Equilibration in the aftermath of the lunar-forming giant impact, Earth and Planetary Science Letters 262, 438-449. Stevenson, D. J., (2008). A planetary perspective on the deep Earth. Nature, Vol 451. doi:10.1038/nature06582. F ontes das F iguras Figura 1: Homepage da NASA. http://nssdc.gsfc.nasa.gov/photo_gallery/photogall ery-asteroids.html Figura 2: Homepage de ilustrações científicas. 5