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Abril | 2013 | Direito do Trabalho
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COMENTÁRIO AO ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA N.º 6/2013 –
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA – RESPONSABILIDADE PELA REPARAÇÃO
DE ACIDENTE DE TRABALHO E EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO
Ana Fazendeiro e Ana Manuela Barbosa - Advogadas, Abreu Advogados
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05.03.2013
Uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: A responsabilidade pela reparação de
acidente de trabalho prevista na Base XVII da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, e no artigo
18.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, resultante da violação de normas relativas à
segurança, higiene e saúde no trabalho, por parte de empresa utilizadora, e de que seja vítima
trabalhador contratado em regime de trabalho temporário, recai sobre a empresa de trabalho
temporário, na qualidade de entidade empregadora, sem prejuízo do direito de regresso, nos
termos gerais.
Comentário:
O Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se, em sede de recurso, para uniformização de jurisprudência, sobre a oposição de acórdãos acerca da mesma questão de direito, proferidos pela
4ª secção do STJ nos processos n.os 289/09.0TTSTB.E1.S1, de 29/3/2012 (Recurso da decisão
proferida pelo Tribunal da Relação de Évora no processo n.º 289/09.0TTSTB.E1.S1 a 8/11/2011,
que foi confirmada), e 2555/2003, de 3/12/2003 (Recurso da decisão proferida pelo Tribunal da
Relação do Porto, no processo n.º 421/02 de 27/05/2002, a que foi concedida revista), ambos
do STJ. A questão objecto dos processos identificados recaía sobre a responsabilidade pela reparação
de danos emergentes de acidentes de trabalho, resultante da violação de normas relativas à
segurança, higiene e saúde no trabalho, de que foi vítima trabalhador contratado em regime de
trabalho temporário cedido a empresa utilizadora.
De acordo com o acórdão fundamento, a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes
do acidente de trabalho é imputada à empresa utilizadora, e não à empresa de trabalho temporário.
Por contraposição, o acórdão recorrido considerou a empresa de trabalho temporário responsável
pelos danos emergentes do acidente de trabalho que vitimou o seu trabalhador. Logo, encontramos
duas posições em contradição: (i) a primeira, responsabilizando a empresa utilizadora pela
reparação dos danos; (ii) a segunda, imputando essa responsabilidade à empresa de trabalho
temporário.
(continuação na página seguinte)
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DE JURISPRUDÊNCIA – RESPONSABILIDADE PELA REPARAÇÃO DE ACIDENTE DE TRABALHO
E EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO
(CONTINUAÇÃO)
Em face das posições jurisprudenciais contraditórias, foi reclamada a intervenção do STJ para que tomasse
posição, o qual veio reconhecer que é à empresa de trabalho temporário que cabe a responsabilidade
de reparação dos danos sofridos por um trabalhador cedido a uma empresa utilizadora na sequência de
acidente de trabalho, ainda que haja inobservância de regras relativas à segurança, higiene e saúde no
trabalho por parte desta última, sem prejuízo do reconhecimento do direito de regresso nos termos gerais.
No caso concreto, é importante, para melhor se apreender o sentido da decisão, conhecer a estrutura da
relação de trabalho temporário. Actualmente, encontramos as disposições relativas a este modelo de
relação de trabalho nos arts. 172º e seguintes do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de
Fevereiro, alterada pela Lei n.º 23/2012 de 25 de Junho.
Em traços gerais, mediante a celebração de um contrato de trabalho temporário, o trabalhador encontra-se
subordinado juridicamente à empresa de trabalho temporário, mas é cedido a uma empresa utilizadora que
tem o poder de conformar, enquadrar e orientar a prestação de trabalho e definir as condições em que o
trabalho é prestado. Podemos falar, como refere o Acórdão em apreço, de um “desdobramento do estatuto
da entidade empregadora entre a empresa de trabalho temporário e o utilizador, mantendo o trabalhador
um vínculo com a empresa de trabalho temporário, mas ficando a prestação de trabalho sujeita ao poder
de direcção do utilizador, ou seja da prestação do trabalhador”.
Este (talvez aparente) desdobramento da posição do empregador consubstancia-se na integração do trabalhador
no seio organizacional de uma empresa terceira (a empresa utilizadora) que não o empregador ao qual se
vincula contratualmente, e em consequência, a sua exclusão da esfera de controlo directo, ou pelo menos
imediato, da empresa de trabalho temporário. Em face desta cisão dos poderes de empregador, e no que
ao problema concreto da responsabilidade pela reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho
diz respeito, coloca-se a questão de saber sobre qual deles – a empresa de trabalho temporário ou a utilizadora – recai tal obrigação.
O Acórdão em apreço enfrenta algumas das principais questões que, nesta sede, habitualmente se colocam:
i) qual das entidades é o empregador do trabalhador temporário;
ii) em que qualidade actua a empresa utilizadora na conformação da prestação de trabalho do trabalhador
temporário; e
iii) qual a extensão da responsabilidade da empresa utilizadora em face do que actualmente se dispõe no
art. 16º da Lei n.º 102/2009, de 10 de Setembro, que consagra o regime jurídico da promoção da segurança
e saúde no trabalho.
(continuação na página seguinte)
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E EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO
(CONTINUAÇÃO)
O aresto em causa não hesita em afirmar que o empregador do trabalhador em regime de trabalho
temporário é a empresa de trabalho temporário, na medida em que não existe qualquer vínculo entre
aquele e a empresa utilizadora – daí que também não deva caracterizar-se a relação de trabalho temporário
como triangular, uma vez que entre esta última e o trabalhador não se estabelece um vínculo contratual.
A empresa utilizadora exerce o poder de direcção na sua vertente conformadora da prestação de trabalho
por via da delegação de poderes por parte da empresa de trabalho temporário e, nessa medida, como
se tal conformação decorresse desta última.
Daí que a empresa de trabalho temporário não se possa escudar a controlar as condições de trabalho
a que o seu trabalhador está sujeito – poder-dever que lhe cabe como decorrência do concreto quadro
do regime em causa, nomeadamente, do disposto no art. 186º, n.º 2, alínea d), do Código do Trabalho,
que obriga o utilizador ao cumprimento do dever de informação à empresa de trabalho temporário,
sobre o modo de o respectivo médico ou técnico de higiene e segurança aceder ao posto de trabalho
ocupado pelo trabalhador temporário. A consagração de tal dever não poderá ter outro sentido se não
o de permitir à empresa de trabalho temporário o controlo sobre as referidas condições e actuar sobre
as mesmas se necessário for. Sublinhe-se, ainda, que o destinatário deste dever não é o trabalhador
temporário, porventura mais impreparado para as questões relativas à segurança e saúde no trabalho.
Este poder-dever da empresa de trabalho temporário não se confundirá com a obrigação que recai
sobre a empresa utilizadora de garantir a segurança e saúde dos trabalhadores temporários no caso de
exercício de actividades simultâneas ou sucessivas no mesmo local de trabalho por várias empresas, a
que alude o art. 16º da Lei n.º 102/2009, também apreciada pelo acórdão em análise. Neste caso, tal
obrigação recairá sobre a empresa utilizadora, não na qualidade de empregador, mas antes enquanto
entidade titular do local da prestação, e como expressão do princípio de cooperação ínsito no n.º 4 do
art. 281º do Código do Trabalho.
Por essa razão, tal não significará a exclusão da responsabilidade da empresa de trabalho temporário
relativamente a danos decorrentes de acidentes de trabalho ocorridos com os seus trabalhadores em
tais circunstâncias. Isso mesmo resulta da parte inicial do n.º 2 do art. 16º da citada Lei n.º 102/2009,
ao estabelecer que a garantia de saúde e segurança no trabalho a cargo da empresa utilizadora existe
“não obstante a responsabilidade de cada empregador”, assim se mantendo as obrigações da empresa
de trabalho temporário – precisamente enquanto empregador do trabalhador temporário.
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DE JURISPRUDÊNCIA – RESPONSABILIDADE PELA REPARAÇÃO DE ACIDENTE DE TRABALHO
E EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO
A empresa de trabalho temporário será, em primeira linha, a entidade responsável pela reparação dos
acidentes de trabalho sofridos pelos respectivos trabalhadores temporários quando cedidos a empresa utilizadora sem prejuízo evidentemente, da possibilidade de exercer o direito de regresso contra esta no
caso de violação de normas relativas à segurança, higiene e saúde no trabalho e, parece-nos também,
contanto que aquela cumpra as suas obrigações de controlo ou vigilância relativamente às condições
de laboração dos trabalhadores temporários na empresa utilizadora.
Esta decisão terá ainda o mérito de impor às empresas de trabalho temporário o cumprimento efectivo do
dever de controlo das condições de trabalho dos trabalhadores temporários, em detrimento de um papel
de mero intermediário na colocação de mão-de-obra. Impõe-se-lhes um especial dever de cuidado,
que passará pelo conhecimento mínimo das condições de trabalho que o seu trabalhador vai encontrar.
Além disso, parece também resultar daqui a imposição de um (duplo) ónus de prova às empresas de
trabalho temporário para afastar a respectiva responsabilidade: o incumprimento das regras relativas
à segurança, higiene e saúde no trabalho por parte da empresa utilizadora e o seu próprio cumprimento do dever de vigilância das condições de trabalho dos trabalhadores temporários nas empresas
utilizadoras.
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