7º Curso Teórico-Prático de Ultra-sonografia Clínica para Gastrenterologistas – Equipamento e artefactos
Equipamento
A ultra-sonografia é uma ferramenta na qual, através de um conjunto
complexo de instrumentos e software, nos é permitido adquirir e aperfeiçoar
projecções de imagens num monitor. Desta forma é crucial não só o
conhecimento dos princípios básicos da ultra-sonografia mas também os
componentes físicos dos aparelhos que os aplicam. Globalmente os aparelhos
são constituídos por um monitor, um painel de controlo, sondas transdutoras e
uma fonte de impressão.
Tipos de sondas
Existem vários tipos de sondas, cada uma com vantagens e
desvantagens.
A
B
C
Figura 1 – A) Sonda sectorial; B) Sonda linear; C) Sonda convexa.
A sonda sectorial que produz uma imagem triangular, tem a vantagem
de permitir a utilização através de janelas acústicas estreitas. A resolução das
estruturas próximas da sonda fica, no entanto, prejudicada. A sonda linear que
origina uma imagem rectangular, produz imagens com boa resolução das
estruturas próximas à sonda, sendo útil para a observação dos tecidos
superficiais. Tem a desvantagem de não poder ser utilizada em janelas
acústicas estreitas. A sonda convexa representa um compromisso entre as
duas últimas sondas. Produz uma imagem semelhante à da sonda radial, mas
com maior resolução proximal.
Além do tipo de sonda, a imagem obtida depende da frequência do ultrasom emitido. A utilização de sondas com maior frequência permite a obtenção
de imagens com maior resolução mas com menor profundidade, enquanto que
a utilização de frequências mais baixas permite obtenção de imagens com
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maior profundidade mas com menor resolução. Assim, é o balanço entre a
resolução e a profundidade que dita a frequência seleccionada. Novos
transdutores permitem ajustar a frequência para obtenção da melhor imagem
em cada doente. Por exemplo, no exame abdominal de uma criança ou adulto
magro um transdutor com uma frequência de 5 MHz poderá permitir uma boa
resolução com capacidade de penetração suficiente contrariamente a doentes
obesos onde poderá se necessário frequências de 2 MHz para melhor
penetração à custa de perda de resolução.
Tabela 1
Aplicação
Vascular
US trans-esofágica
US trans-torácica
Abdómen
- criança/adulto magro
- adulto médio
- adulto obeso
Frequência (MHz)
10-12
7-8
2,5-3,5
5
3,5
1-2,5
Painel de Controlo
Ainda que com variações de modelo para modelo, várias funções do
painel de controlo são comuns.
Figura 2 – Exemplo de um painel de controlo de um ecógrafo. A) Teclado; B) Medições;
C) Mudar de sonda; D) Doppler; E) “Trackball”; F) Enter; G) Ganhos; H) Imprimir; I) “Freeze”;
J) Profundidade; K) Foco; L) Compensação dos ganhos.
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Funções do painel de controlo:
•
Teclado
Entre outras funções, o teclado permite-nos inserir de forma fácil e rápida
os dados do doente e anotações nas imagens que vão sendo adquiridas.
Figura 3 – Teclado com os botões de identificação e inserção de texto
•
Ganho
O ganho aumenta a amplitude do sinal de retorno, expresso no monitor
por aumento do brilho dos pixéis correspondentes. Aumentando o ganho
obtemos uma imagem mais brilhante na sua totalidade.
Figura 4 – A) Utilização de “excesso” de ganhos; B) Imagem demasiado escura resultante
de “défice” de ganhos; C) Local de controlo (G) no painel de controlo.
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•
Compensação dos ganhos dependente do tempo (time gain
compensation)
Esta opção é controlada por uma coluna
de patilhas verticais, permitindo o ajuste do
ganho mediante as diferentes profundidades
da imagem.
A profundidade da imagem é determinada
pelo tempo que o sinal demora a regressar ao
transdutor motivo pelo qual esta função se
designa
compensação
dos
ganhos
dependente do tempo. Assim, os ganhos nas
camadas mais superficiais pode ser ajustado
para áreas mais escuras, enquanto que
aumentando os ganhos das camadas mais
profundas permite torna-las mais nítidas no
monitor.
Figura 5 – Patilhas de controlo
da compensação dos ganhos
dependente do tempo
•
Foco
Cada sonda tem uma zona focal (profundidade na qual a resolução
lateral é a melhor) que corresponde à área mais estreita do feixe de ultrasons. Nas sondas electrónicas é possível fazer variar a posição desta
mesma zona focal. Esta função permite assim ajustar o foco do sinal para
áreas mais próximas de estruturas de interesse permitindo melhorar a
resolução nesse ponto, contudo a taxa de dispersão do sinal torna-se maior
fazendo com que estruturas mais profundas pareçam mais granuladas.
Figura 6 – A) Ponto focal muito alto (asterisco) tornando a área abaixo dele muito pouco
definida; B) Ponto focal bem definido mostrando assim a fronteira entre o fígado e o rim de
forma mais nítida.
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•
Profundidade
Tal como o foco, a profundidade do sinal de ultra-som geralmente é
controlada no painel de controlo. Aumentando a profundidade, as estruturas
mais profundas aparecem mais claras e definidas, contudo, irão surgir mais
pequenas.
Figura 7– Diferença da definição e resolução da imagem após ajuste da profundidade, com
melhoria da qualidade da imagem na foto B à custa de uma redução das suas dimensões.
•
Zoom
Esta opção permite aumentar uma determinada área da imagem
seleccionada para uma observação mais detalhada da mesma. Esta não
altera a resolução da imagem e, como tal, as estruturas poderão aparecer
mais granuladas. É especialmente útil para medições de imagens 2D.
Figura 8 – 1) Tecla do zoom; 2) Patilha da profundidade; 3) Patilha do foco.
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A compreensão dos princípios básicos da física dos ultra-sons e das
principais funções dos aparelhos é um pré-requisito para o desenvolvimento
adequado da capacidade de adquirir e interpretar correctamente imagens de
ultra-sonografia permitindo maximizar o potencial desta modalidade versátil.
Contudo, independentemente do quão sofisticado é o sistema utilizado, as
características de cada doente poderão dificultar a aquisição de boas janelas
de observação sendo essencial algumas manobras de optimização da imagem
(ex. mudanças de posição do doente) e a aquisição da habilidade no
manuseamento do transdutor exigindo prática e perseverância.
ARTEFACTOS ECOGRÁFICOS
Para evitar a interpretação errónea das imagens ultra-sonográficas é
importante entender alguns artefactos comuns. Um artefacto ocorre quando
uma estrutura vista numa imagem ultra-sonográfica não corresponde a uma
estrutura real no tecido que está a ser observado. Alguns pressupostos são
“construídos” num ecógrafo. Quando um destes pressupostos é violado é
gerado um artefacto. Os pressupostos são:
- A velocidade do ultra-som no tecido é sempre 1,540m/s.
- Quanto mais tempo levar o sinal a voltar ao transdutor mais
profundamente se encontra a estrutura.
- As ondas de ultra-som percorrem uma linha recta, do transdutor para a
estrutura observada e, de volta, para o transdutor.
Sendo anomalias que aparecem na imagem e que alteram ou iludem a
realidade podem induzir em erro, devendo ser bem conhecidas. Descrevem-se
as principais.
1. Sombra acústica posterior (cone de sombra)
A sombra acústica posterior ocorre quando um feixe de ultra-sons tem no
seu trajecto uma estrutura que é extremamente densa (i.e., com impedância
acústica muito elevada) tal como um cálculo, calcificação ou um osso.
Virtualmente, todo o sinal é reflectido ao transdutor formando-se uma zona
anecóica ou hipoecóica (negra) em localização posterior ao obstáculo.
Exemplos:
- As sombras das costelas obscurecendo a fossa hepatorrenal, pode
interferir com a detecção de fluido intra-abdominal na observação FAST
(focused assessment with songraphy in trauma). Pode-se obter uma janela
acústica alternativa angulando ou movendo o transdutor ligeiramente,
mitigando este artefacto.
- Imagens cardíacas devido a válvulas calcificadas ou próteses valvulares.
Uma janela trans-torácica diferente pode ser adequada para corrigir a sombra,
mas se as próteses valvulares são o tecido a ser observado, o ecocardiograma
trans-esofágico pode ser necessário.
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O sombreamento pode também ocorrer devido à refracção excessiva do
sinal de ultra-som. A refracção ocorre quando o ultra-som é deflectido de um
trajecto linear. Tipicamente, os artefactos de refracção resultam em
deslocamento do objecto observado na imagem ecográfica. Contudo, quando
um feixe de ultra-sons encontra uma superfície reflectora forte, com uma
superfície altamente irregular, a refracção ocorre em múltiplas direcções,
simultaneamente e, todo o sinal dos tecidos mais profundo é perdido.
2. Reforço acústico posterior
O reforço acústico posterior ocorre quando a atenuação do ultra-som é
menos intensa que o esperado (Fig. 9). Os tecidos mais profundos aparecem
muito brilhantes na imagem ultra-sonográfica. Como resultado, outras
estruturas podem aparecer relativamente escuras. Isto ocorre mais
frequentemente quando se observam estruturas preenchidas por fluido tais
como quistos ou órgãos preenchidos de fluidos. A imagem ecográfica mostra
uma estrutura anecóica e imediatamente atrás uma zona hiperecogénica.
Figura 9 – A imagem no painel superior demonstra a sombra acústica (entre as setas)
causada por uma costela. A imagem do painel inferior mostra o reforço posterior demonstrado
na pélvis.
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- O ultra-som que passa através de um fluido sofre relativamente pouca
atenuação, porque o líquido é um condutor muito eficiente. O ecógrafo assume
uma taxa constante de atenuação do sinal à medida que ele passa através dos
tecidos. As estruturas atrás do líquido aparecem mais brilhantes do que
deveriam.
- Um exemplo deste artefacto pode ser visto na observação pélvica da
bexiga, mostrando os tecidos posteriores um reforço ecogénco. A área
posterior à bexiga aparece muito brilhante enquanto que as estruturas
adjacentes aparecem relativamente escuras. Se este artefacto não for
reconhecido pode levar à falsa interpretação de que as estruturas mais escuras
(hipoecogénicas) adjacentes à bexiga sejam líquidas.
3. Reverberação
O artefacto de reverberação ocorre quando o feixe de ultra-sons circula
(vai e vem) entre duas estruturas muito reflectoras. Quando isto ocorre, o feixe
de ultra-sons percorre o mesmo caminho várias vezes. Dado que cada ida e
volta demora duas vezes mais tempo do que o percurso anterior, é interpretado
pelo ecógrafo como sendo duas vezes mais distante.
- Isto resulta numa série de falsos ecos, que aparecem como linhas
brilhantes sequenciais tais como degraus de uma escada.
- Exemplo: O feixe de ultra-sons, fortemente reflectido por um anel
traqueal para o transdutor e, reflectido novamente, pode criar uma série de
ecos falsos que parecem estar no lúmen traqueal (Fig. 10 a).
Figura 10 – a) Imagem ultra-sonográfica de um anel traqueal altamente reflectivo
criando artefacto de reverberação. b) Artefacto “cauda de cometa” na interface entre a pleura e
o pulmão por uma reverberação muito rápida entre o reflector (bolha de ar) e o transdutor. c)
artefacto imagem em espelho transição tóraco-abdominal mostrando uma imagem do fígado
sobreposta ao pulmão.
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A “cauda de cometa” é um subtipo de reverberação que aparece de uma
forma linear num trajecto curto. Também conhecido como anel invertido, é um
tipo de artefacto no qual o feixe de ultra-som vai e vem tão rapidamente que as
linhas brilhantes sequenciais geradas na imagem ultra-sonográfica parecem
fundir-se num feixe quase sólido (Fig 10 b). Isto ocorre quando o sinal de ultrasom atinge um reflector forte com uma superfície lisa, mais frequentemente
uma bolha de gás. O reflector comporta-se como um sino e a onda de ultrasom como um badalo “batendo / tocando” repetidamente. Tal como muitos
artefactos ecográficos, a cauda de cometa pode ser útil na interpretação da
informação clínica. Na observação ecográfica do tórax a presença deste
artefacto é indicativa da presença do pulmão, enquanto a sua ausência indica a
possibilidade de um pneumotórax.
4. Imagem em espelho
Os contornos de estruturas lisas e curvilíneas podem actuar como
reflectores de ultra-sons “espelho-like” ou especulares, como é o caso do
diafragma e da bexiga. Neste caso um feixe de ultra-som é reflectido múltiplas
vezes, em várias direcções, antes de finalmente regressar ao transdutor. Este
facto é interpretado pelo ecógrafo como se a estrutura alvo estivesse colocada
a maior distância do transductor, formada mais profundamente na imagem.
(Fig. 10 c).
Os pulmões preenchidos com ar são transmissores pobres de ultra-som,
fazendo com que não haja, virtualmente, sinais que voltem da área. Há,
contudo, sinais ainda a regressar do diafragma como ondas re-reflectidas.
Assim, o tecido "pulmonar" visto logo acima do diafragma não corresponde à
imagem de pulmão mas sim do fígado, em espelho.
Outros artefactos:
5. Anisotropia
6. Lobo acessório
7. Artefactos de Doppler
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