ESTUDO COMPARATIVO DA PREVALÊNCIA DE SINTOMAS DEPRESSIVOS ENTRE ACADÊMICOS DE MEDICINA DE DUAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS PINA, João Felipe de Moura1 BARASUOL, Rubia Karine de Marco2 MOKVA, Anna Maria Dalzot 3 RESUMO Acadêmicos de medicina são constantemente expostos a situações de estresse, sendo por cobrança de si mesmos ou da sociedade e família, por competição entre colegas, muitas vezes, por estarem longe da família, por viverem sob pressão devido à alta carga horária em seus estudos, entre outros motivos que levam os indivíduos à vulnerabilidade de distúrbios emocionais, tendo a depressão como o principal exemplo. Este artigo tem como objetivo principal comparar e demonstrar os índices de distúrbios emocionais, como a depressão, em duas universidades: Universidade Estadual de Maringá (UEM) e Universidade Federal de Uberlândia (UFU). O estudo foi realizado utilizando-se um questionário padronizado autoaplicável, denominado Inventário para Depressão de Beck (IDB). Este inventário foi aplicado a 81% dos estudantes do curso de medicina da UFU e a 97,7% dos estudantes da UEM. Na UEM, levou-se em consideração a idade, o sexo e a religião, enquanto que na UFU levou-se em conta a idade, o sexo e o estado civil principalmente. Dados da UEM apontam a ocorrência de um aumento na gravidade da doença na passagem do primeiro para o segundo ano de faculdade e na passagem das matérias básicas para as matérias específicas ou clínicas, aumentando, ainda mais, no último ano de faculdade (sexto ano). Evidencia-se que a prevalência de sintomas depressivos em estudantes de medicina é muito maior que a encontrada na população em geral e, para que esses dados possam diminuir, deve se ter mais atenção na transição de etapas do curso e nas excessivas cargas horárias. PALAVRAS-CHAVE: Sintomas depressivos. Acadêmicos de medicina. Saúde mental. COMPARATIVE STUDY OF PREVALENCE DEPRESSIVE SYMPTOMS AMONG STUDENTS OF MEDICINE OF TWO BRAZILIAN UNIVERSITIES ABSTRACT Medical students are constantly exposed to stressful situations, and by charging themselves or society and family, peer competition, often by being away from the family because they live under pressure due to high hourly load in their studies, among other reasons that lead individuals to vulnerability to emotional disorders, with depression as the main example. This article aims to demonstrate and compare the rates of emotional disorders such as depression, in two universities: University of Maringá (UEM) and Federal University of Uberlândia (UFU). The study was conducted using a self-administered standardized questionnaire, called the Beck Depression Inventory (BDI). This inventory was administered to 81% of students of medicine and the UFU 97.7% of students at EMU. In EMU, we took into account age, sex and religion, while the UFU took into account age, sex and marital status mainly. EMU data indicate the occurrence of an increase in disease severity from the first to the second year of college and in the passage of the raw materials or the specific clinical matters, rising further, the final year of college (sixth year) . It is evident that the prevalence of depressive symptoms in medical students is much higher than that found in the general population and so these data might decrease, should get more attention in the transition stages of the course and the excessive workloads. KEY WORDS: Depressive symptoms. Medical students. Mental health. 1. INTRODUÇÃO De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), “A depressão deve se tornar a doença mais comum do mundo nos próximos 20 anos, acometendo mais pessoas do que o câncer e as doenças cardíacas”. Desse modo, o estudo realizado por duas universidades brasileiras em diferentes regiões, Universidade Estadual de Maringá (UEM) e 1,2 : Acadêmicos de Medicina da Faculdade Assis Gurgacz, [email protected], [email protected] 3 : Professora de metodologia graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina. Anais do 12º Encontro Científico Cultural Interinstitucional - 2014 ISSN 1980-7406 1 Universidade Federal de Uberlândia (UFU), trouxe em foco a depressão instalada no meio acadêmico e prevalente no curso de medicina. Sabe-se que as faculdades de medicina são ambientes hostis, caracterizados pela alta competição, elevada carga horária e volume de matéria a ser estudada. Além da grande cobrança imposta pela sociedade, pelos familiares e pelo próprio indivíduo, surgem as crises de adaptação, estresse e superação que o levam, por vezes, a episódios de depressão. Desse modo, este estudo visa a correlacionar os dados apresentados pelas duas análises, verificando a prevalência de transtornos depressivos nos diferentes sexos, faixas etárias e período de graduação, visto que, saber dos problemas que afetam os acadêmicos de medicina pode determinar mecanismos para melhorar a qualidade de vida desses estudantes, já que a condição patológica ou não desses indivíduos pode influenciar em sua formação e futura atuação profissional. 2. ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO Este projeto de pesquisa caracteriza-se como um estudo analítico, comparativo e descritivo, pelo viés da pesquisa qualitativa. Segundo Godoy (1995), o ambiente natural constitui-se em fonte direta de dados, e o pesquisador em instrumento fundamental, conduzindo a pesquisa a um caráter investigador, descritivo, analítico e, até mesmo, comparativo. O pesquisador, dessa forma, desenvolve conceitos e entendimentos a partir de padrões encontrados nos dados. Esta pesquisa, assim sendo, tem em vista apurar dados obtidos a partir de consulta de artigos e materiais disponibilizados pela internet e analisá-los a fim de compreender a qualidade psíquica de estudantes de medicina de duas cidades diferentes: Maringá-PR e Uberlândia-MG. No estudo realizado em Maringá-PR, no ano de 2001, o qual serviu como base para a pesquisa, foi aplicado um questionário padronizado a 126 estudantes de medicina da Universidade Estadual de Maringá (UEM), distribuídos nos seis anos do curso. Estes responderam ao instrumento de pesquisa num período de 3 semanas. Tal investigação utilizou como base o modelo epidemiológico individual observacional seccional, aplicando o Inventário para Depressão de Beck (IDB) como modelo de inquérito. Esse questionário padroniza valores para avaliar o humor depressivo em quatro categorias, subdividido pelo escore: 0-3 (nenhum ou mínimo); 4-7 (leve); 8-15 (moderado); 16 ou mais (grave). Cerca de 97,7% dos estudantes participaram e, antes de serem submetidos à avaliação, foram esclarecidos do que se tratava e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido permitindo a realização da pesquisa. Por sua vez, na análise realizada no primeiro semestre de 2004, pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), dos 494 acadêmicos matriculados no curso de medicina, 400 foram avaliados, gerando uma taxa de participação equivalente a 80,97% do universo dos estudantes matriculados na UFU. Do mesmo modo que o estudo aplicado na UEM, foi utilizado um questionário estruturado para informações gerais relativas ao estudante e o inventário de Beck – IDB. Esse projeto foi socializado em sala de aula e, mediante a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, aplicado a análise estatística. Em posse dos dados fornecidos pelas duas pesquisas, foi realizado um estudo analítico, comparativo e descritivo, tentando estabelecer uma correlação entre os dados encontrados. Verificou-se o nível de satisfação dos estudantes matriculados em seus respectivos anos de graduação e comparou-se com as expectativas impostas por cada um na realização do curso, práticas de hábitos prazerosos, sexo e faixa etária. Buscou-se encontrar uma causa para a elevada taxa de jovens em estado depressivo. 3. DESENVOLVIMENTO Anais do 12º Encontro Científico Cultural Interinstitucional – 2014 ISSN 1980-7406 2 No estudo realizado na Universidade Estadual de Maringá, dos 126 que faziam parte da amostra, 97,7% dos estudantes participaram, os outros simplesmente não se encontravam na instituição no momento da aplicação do Inventário para Depressão de Beck (IDB). Após os resultados, observou-se que, dentre os acadêmicos que apresentavam sintomas depressivos, os homens totalizaram 55,6%, e as mulheres 44,4%. A média da idade variou entre 19 e 25 anos. Nesse estudo, também foi considerado a religião, sendo católicos 69,8%; evangélicos ou protestantes 7,1%; espíritas 5,6%; seisho-no-iê e muçulmanos 0,8%; sem religião 1,6% e 14,3% não responderam tal questão. No entanto, as variáveis: religião, sexo e grau de depressão não apresentaram correlação significativa entre si, tampouco com as demais variáveis. Já nas variáveis idade e série, a análise de correlação mostrou um índice de 0,64 (p<0,05). É notável que a prevalência de sintomas depressivos foi de 49,2%, e, conforme o próprio estudo relata, é um número 4 vezes maior do que na população americana e 7 vezes maior que na brasileira. Outro dado considerável foi apontado na transição do primeiro para o segundo ano, período em que a prevalência dos sintomas depressivos cresce de 20% para 61,8%; e na transição para o terceiro ano, os casos graves aumentam de 4,8% para 19%. No último ano, a sintomatologia moderada atinge um pico de 61,12%. As únicas quedas foram vistas na prevalência do quarto e quinto ano, com 47,4% e 45,5%, respectivamente. Tais dados podem sugerir que, nos primeiros anos, correspondentes ao ciclo básico, o aluno não tem muito contato com pacientes, não correspondendo às expectativas que tinha antes de entrar na universidade e apresentando leves indícios de sintomas depressivos. A partir do terceiro ano da graduação, inicia-se uma nova fase com as disciplinas clínicas, as quais exigem uma alta carga horária e muito estudo, uma vez que são indispensáveis na prática do profissional, levando, muitas vezes, o mesmo ao estresse e sintomas de depressão. Ainda, ao se aproximar à tão sonhada formatura, o alto nível de grau moderado dos sintomas podem ser compreensíveis por uma mistura de sentimentos: indecisão quanto à especialidade e residência, insegurança se o conhecimento é suficiente, despedida de colegas que se tornaram amigos por anos, entre outros. Em Uberlândia, Minas Gerias, dos 494 alunos matriculados entre os doze períodos, 80,97% participaram, ou seja, um total de 400 alunos. 93 estavam ausentes no campus e um se recusou a participar. Como resultados, os dados apontaram uma maior tendência do sexo feminino em apresentar sintomas depressivos, representando 56%, o que corresponde a uma razão F/M de 1,27. A média de idade dos homens foi de 22 anos e dois meses e das mulheres foi de 21 anos e oito meses. Com relação ao estado civil, a predominância foi de solteiros -96%, casados, apenas 3,5%, desquitado e que não responderam 0,25%. A grande maioria ainda morava com os pais (57,25%), pensionato, hotéis e repúblicas 19,5%, familiares 13,25%, e sozinhos ou com cônjuge 7% e 2,75%, respectivamente. Do total, 0,25% não se encaixou em nenhuma opção. Quanto ao município de origem, 50% eram de Uberlândia; 33,25% de outras cidade do estado; 16,25% de outros cidades e 0,25% de outro país ou que não responderam. Quando se trata de atividades de lazer, 43,5% sempre as pratica, enquanto que 45% não a realizam e 11,5% o fazem raramente. Sobre tratamento psicológico, 72% nunca fizeram. Já o tratamento psiquiátrico, 93% relatam nunca ter feito também. Dos 24% que já tinham feito tratamento psicológico, 4% ainda estavam em tratamento, sendo desses quase todos do sexo feminino. O grau de satisfação com o curso também foi avaliado, sendo respondido como bom (54,75%); excelente (19,5%); razoável (20,75%); ruim (4,25%) e péssimo (0,25%). Apenas dois alunos não responderam, representando 0,5% do total. Em relação à pontuação do IDB, verificou-se uma frequência de 79% da população estudada que apresenta sintomas depressivos em geral. Destes, 29% apresentam grau leve; 31% grau moderado e apenas 19,25% grau grave. Anais do 12º Encontro Científico Cultural Interinstitucional – 2014 ISSN 1980-7406 3 Quanto aos períodos, observou-se que, à medida em que o estudante prossegue nos estudos, os sintomas depressivos tendem a se tornar mais aparentes. Isso é compreensível devido ao aumento da carga horária exigida. De acordo com o estudo, nas variáveis pontuação obtida no IDB e períodos cursados, foi encontrada correlação positiva significativa. Por outro lado, houve correlação negativa considerável entre a pontuação obtida no IDB e as seguintes variáveis: atividade de lazer, tratamentos psicológicos e psiquiátricos e grau de satisfação com o curso. Por mais que a comparação não possa ser tão fidedigna nos dois estudos, a prevalência de sintomas depressivos nos acadêmicos de medicina foi maior em comparação com outras populações, em conformidade com a literatura. No entanto, algumas diferenças foram observadas como a prevalência dos sintomas em homens em Maringá, e, em mulheres, em Uberlândia. Sobre o gênero, os estudos de referência de Rezende et al (2004) sugerem que na população mundial encontram-se mais sintomas depressivos em mulheres, visto estarem mais submetidas a diversas funções como cuidar da casa, filhos e jornada de trabalho. Apesar da faixa etária das populações dos estudos serem parecidas, a prevalência de jovens foi relativamente alta. Em ambos os artigos, notou-se que, ao passo que o acadêmico avança na graduação, aumentam os sintomas de depressão, o que sugere que os acadêmicos passam por situações cada vez mais difíceis e exigentes. As figuras 1 e 2 remetem ao estudo de Maringá, enquanto as tabelas 1 e 2 referem-se ao estudo de Uberlândia. É possível relacionar a figura 1 com a tabela 1 e notar alguma diferença quanto à porcentagem de discentes que apresentam diferentes níveis ou graus de sintomas depressivos. Já a figura 2 dialoga com a tabela 2, lembrando que o período de um ano dos acadêmicos da UEM corresponde a dois períodos na UFU. Mesmo assim, é possível inferir a similaridade de aparecimento de sintomas depressivos e variações na gravidade no decorrer do curso. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo foi realizado de modo transversal, e, portanto, não é possível avaliar os mesmos alunos em todas as séries como aconteceria em uma análise progressiva que acompanha os acadêmicos à medida que estes avançam na graduação, como acontece em estudos prospectivos epidemiológicos de Coorte, por exemplo. No entanto, os dados podem ser destacados como a alta prevalência em estudantes de medicina no comparativo com outras populações em geral. A grade curricular do curso de medicina no Brasil merece atenção, visto ser um fator que pode desencadear sintomas depressivos em seus alunos devido à alta exigência em período de tempo relativamente pequeno, principalmente, quando começam as matérias clínicas. Tanto as instituições, como o próprio Ministério da Educação, poderiam contemplar ações que pudessem diminuir tanto o número alto de prevalência como o grau em que aparecem os sintomas depressivos. 5. REFERÊNCIAS ABRÃO CB, et al. Prevalência de sintomas depressivos entre estudantes de medicina da Universidade Federal de Uberlândia. Rio de Janeiro: Revista brasileira de educação médica, 2008. GODOY, Arilda S. Introduçao à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. [S.l.]: Revista de Administraçao de empresas, 1995. Anais do 12º Encontro Científico Cultural Interinstitucional – 2014 ISSN 1980-7406 4 OLIVEIRA, Elisângela. Prevalência de sintomas depressivos em estudantes de Medicina da Universidade Federal da Bahia/ Elisângela Oliveira. Salvador: Oliveira, 2013. PORCU M, Fritzen VC, Helber C. Sintomas depressivos nos estudantes de Medicina da Universidade Estadual de Maringá. [S.l.]: Psquiatria na Prátic Anais do 12º Encontro Científico Cultural Interinstitucional – 2014 ISSN 1980-7406 5