Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Exatas (ICEx) Mini–Curso: Introdução às propriedades físicas e estruturais do grafeno e dos nanotubos de carbono Dias 18 e 20 de Outubro de 2011 – 09:00 às 11:00 Prof. Dr. Alexandre Fontes da Fonseca – Depto. de Física do ICEx–UFF Sumário 1 Materiais feitos de Carbono 3 1.1 História . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 1.2 Química do carbono: hibridização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 1.3 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 2 Grafenos 13 2.1 Estrutura e geometria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 2.2 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 3 Nanotubos de Carbono 3.1 3.2 16 Estrutura e geometria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 3.1.1 ~h . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vetor quiral: C 16 3.1.2 Vetor translacional: T~ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 4 Propriedades Gerais de Grafenos e Nanotubos de Carbono 21 4.1 Propriedades Mecânicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 4.2 Propriedades Eletrônicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 4.3 Propriedades Térmicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 4.4 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 Referências 27 2 1 Materiais feitos de Carbono 1.1 História Conhecido desde épocas pré-históricas, o carbono é o quarto elemento químico mais abundante no Universo. Por causa da sua grande habilidade em formar ligações com ele mesmo e outros elementos, mais de 10 milhões de compostos diferentes já foram identificados [1]. Mais conhecido em suas formas simples como o carvão, o grafite e o diamante, compostos de carbono formam a base da vida orgânica em nosso planeta, além de se combinar com alguns metais para produzir carbetos metálicos, entre os quais o aço é um dos mais comuns e utilizados. No século 19 e por ocasião da segunda guerra mundial, houve uma busca pelo desenvolvimento de novos materiais com propriedades especiais. Um desses materiais, feito de carbono, é a chamada fibra de carbono, produzida pela primeira vez por Thomas A. Edison [2] com a finalidade de compor filamentos para lâmpadas incandescentes. Mas o desenvolvimento de filamentos de Tungstênio amainou o interesse nas fibras de carbono até os anos 50, quando o interesse retorna devido à pesquisa espacial e à busca das indústrias de aviação por novos materiais mais leves e resistentes. Isso levou ao desenvolvimento de novos processos de produção de fibras de carbono baseados no fenômeno de pirólise1 de materiais ricos em carbono como, por exemplo, polímeros. Um dos exemplos mais comuns é o polímero conhecido como poliacrilonitrila, também conhecido pela sigla “PAN”. A figura 1 a seguir mostra um exemplo de fibra de carbono. Na década de 70, novos métodos levaram à produção de fibras de carbono menores, mais homogêneas e com propriedades mecânicas melhores. Mas, um grande salto na pesquisa de novos materiais feitos de carbono só ocorreu na década de 80, mais precisamente em 1985, quando Harry Kroto, da University of Sussex, Inglaterra, divulgou os resultados de suas pesquisas sobre a síntese de cadeias de carbono em condições análogas às que se encontram nas proximidades de estrelas. Com a ajuda de Richard Smalley, da Rice Univer1 A pirólise é uma reação de análise ou decomposição de uma estrutura molecular por meio do calor em ambiente contendo pouco ou nenhum oxigênio. 3 Figura 1: Esquerda: Imagem de microscópio eletrônico de varredura de fibras de carbono TORAYCA T 300 [3]. Um centímetro da figura equivale a 10µm. Direita: Fibras de carbono em escala macroscópica. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Carbon_fiber-2.jpg sity (Houston-EUA), eles usaram técnicas de vaporização a laser no grafite e observaram, dentre os produtos da reação, uma nova estrutura chamada C60 [4]. Como podemos ver na figura 2, essa nova estrutura, constituída apenas por átomos de carbono, possui geometria análoga à de uma bola de futebol (antes da criação da Jabulani, é claro) com 20 anéis hexagonais e 12 anéis pentagonais. A descoberta dessa estrutura se tornou o marco de uma nova era na ciência do carbono [5]. Outras estruturas fechadas compostas por 70, 80, etc. átomos de carbono também foram sintetizadas formando todas elas uma família dos chamados fulerenos em homenagem ao inventor da estrutura conhecida como cúpula geodésica (figura 2, direita), Richard Buckminster Fuller. Figura 2: Esquerda: Estrutura atômica do C60 . Direita: Exemplo de cúpula geodésica. As linhas amarelas destacam os hexágonos e pentágonos da estrutura. Fonte: http://pt. wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Half-IcosaFreq4DomeSide.jpg. Em 1991, o pesquisador japonês Sumio Iijima descobriu maneiras de se produzir um tipo diferente de estrutura de carbono que ficou conhecida como nanotubo de carbono [6] (figura 3). Os nanotubos de carbono (NTCs) representam o limite microscópico para as fibras de carbono pois possuem espessura igual ao tamanho de um único átomo de carbono. 4 Na verdade, de acordo com a Profa. do MIT, Mildred Dresselhaus [7], uma das maiores especialistas em propriedades físicas do carbono, estruturas de carbono de espessura atômica já haviam sido sintetizadas desde 1976 por Oberlin e colaboradores [8]. Porém, apesar do Iijima não ter sido o primeiro a sintetizar um NTC, foi através do seu trabalho que os nanotubos ganharam mais visibilidade e interesse para aplicações tecnológicas. Em vista das diversas combinações geométricas que os átomos de carbono de um nanotubo podem assumir, eles são classificados de acordo com uma medida de sua quiralidade, isto é, de uma propriedade de simetria relacionada a uma projeção de si mesma num espelho: um objeto ou sistema é dito quiral se não é possível sobrepor sua imagem no espelho sobre si mesmo. Adiante, veremos como quantificar a quiralidade de um nanotubo em termos de dois parâmetros n e m, como nos exemplos dados na figura 3. Figura 3: Exemplos de nanotubos de carbono de diferentes quiralidades e as respectivas seções transversais. O respectivo par de parâmetros (n, m) está apresentado acima de cada um dos exemplos. As estruturas quirais são aquelas cuja seção transversal dá a sensação de que o tubo está torcido. O primeiro e a último nanotubos são aquirais. O primeiro (à esquerda) e o último (à direita) nanotubos de carbono são aquirais, isto é, formam a mesma estrutura perante a reflexão por um plano de simetria. Esses dois nanotubos possuem um par de parâmetros especiais (n, 0) e (n, n) e por causa da forma como os átomos de carbono se localizam em suas extremidades, eles são chamados de zigzag(“zigue-zague”) e armchair (“braço de cadeira”), respectivamente. Esses nomes foram 5 dados por causa da semelhança dessa forma dos átomos da extremidade com os significados dos respectivos nomes. Na verdade, os nanotubos descobertos por Iijima eram do tipo multicamadas, como ilustrado na figura 4. Só mais tarde, nanotubos simples, de uma única camada, foram sintetizados. Os nanotubos multicamadas nada mais são do que tubos de diferentes diâmetros inseridos uns nos outros. Figura 4: Exemplos de nanotubos de múltiplas camadas. Figura reproduzida do artigo da referência [6]. Os nanotubos de carbono levaram os cientistas a imaginarem possíveis aplicações em vista do tamanho (da ordem de nanômetros, isto é, um bilionésimo do metro), propriedades relacionadas com a estrutura (rigidez, flexibilidade, resistência, etc.) e propriedades eletrônicas (metálicas e semicondutoras) [5, 9, 10]. Nos últimos 10 anos, os cientistas tem procurado maneiras de aplicar essa descoberta no desenvolvimento de materiais com propriedades especiais. Exemplos são novos dispositivos eletrônicos em escala nanométrica, fibras super-duras, super capacitores, e até mesmo siste6 mas mais complexos como músculos artificiais formados por nanotubos de carbono [11–16]. Outro tipo de aplicação é misturar os nanotubos de carbono com outros materiais para formar novos tipos de materiais. Por causa de diversos fatores como tamanho pequeno, baixa densidade, razão de aspecto elevada e propriedades mecânicas superiores, os nanotubos de carbono são considerados os candidatos ideais para reforçar materiais compósitos [9, 17–20]. Um exemplo da versatilidade dos nanotubos de carbono é o desenvolvimento de um “nanorádio” onde o nanotubo sozinho, por causa das suas propriedades especiais, faz o papel de antena, sintonizador e amplificador [21]. Por essas e outras razões, os nanotubos de carbono formam um tema de estudo importante e atual em vista do seu potencial em áreas tão diversas como Nanoengenharia e Biologia. Mas, foi só recentemente que a unidade básica fundamental que forma as estruturas do grafite, das fibras de carbono e, nanotubos e fulerenos, foi sintetizada e produzida: o chamado grafeno. Figura 5: Estruturas grafíticas baseadas no grafeno: fulereno, nanotubo e grafite. Figura reproduzida de [22]. Qualquer uma das nanoestruturas de carbono pode ser construída a partir do grafeno conforme se pode ver na figura 5. 7 1.2 Química do carbono: hibridização A capacidade que os átomos de carbono possuem de se combinarem de diversas maneiras entre si e com outros átomos para formar vários tipos de moléculas decorre de uma característica muito importante que ocorre com alguns átomos que é capacidade de formar orbitais híbridos. A hibridização é um processo pelo qual orbitais subatômicos se combinam para formação de novos orbitais de menor energia total. Um orbital nada mais é que uma região espacial onde um elétron com um dado valor de energia, tem maior probabilidade de ser encontrado. Apesar da explicação desses conceitos decorrer da Mecânica Quântica, que está além do escopo deste mini-curso, este assunto, em seus rudimentos, é familiar aos estudantes do colegial quando, em Química, estudam os orbitais atômicos e níveis de energia representados pelas letras s, p, d e f. A figura 6 apresenta ilustrações da forma espacial dos orbitais mais simples, s e p. Figura 6: Forma dos orbitais s e p. Fonte: http://www.mhhe.com/physsci/chemistry/ essentialchemistry/flash/hybrv18.swf. Como vemos na figura 6, o orbital (ou camada) s possui apenas uma única configuração espacial com simetria esférica. O orbital (ou camada) p dá origem a três configurações chamadas px, py e pz por causa das três possibilidades de alinhamento das configurações com os três eixos espaciais, o que não ocorre com o orbital s. Como o átomo de carbono possui 6 elétrons, no seu estado natural, eles ocupam os níveis de energia 1s, 2s e 2p de acordo com o diagrama da figura 7a. Note que apenas os dois últimos elétrons não estão emparelhados, isto é, não estão relacionados com um elétron com spin inverso, como ocorre com os 4 primeiros (o spin está representado por uma 8 seta para cima ou para baixo). Nesse caso, o carbono deveria formar ligações químicas de modo fácil com elementos que pudessem suprir em dois elétrons não-emparelhados. Porém, sabe-se experimentalmente, que moléculas como CH2 (metileno) são instáveis o que se constata através do fato de serem muito reativas e rapidamente formarem outro composto. Diferentemente, a molécula de metano, CH4 é bem mais estável. Somente o conceito de processo de hibridização permite explicar esse fato. Para entender a hibridização, considere o diagrama da figura 7b. Um dos elétrons que estava emparelhado com outro no subnível 2s ganha energia e pula para o subnível vazio 2pz. Mas, como um sistema, em geral, tende para estados de menor energia, descobriu-se que o conjunto de 4 estados ou subníveis híbridos do tipo sp3 , representado pelo diagrama da figura 7c, cada um contendo um elétron não-emparelhado, tem menor energia do que o conjunto de estados representados pela figura 7b. Os quatro orbitais das figura 5 se combinam para formar outros 4 orbitais sp3 ilustrado na figura 8 adiante. Figura 7: Diagrama de níveis de energia dos orbitais subatômicos do átomo de carbono: (a) no seu estado natural; (b) num estado excitado ou ativado; e (c) com os 4 orbitais híbridos. Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Hibridiza%C3%A7%C3%A3o. Figura 8: Esquerda: quatro orbitais sp3 oriundos do processo de hibridização do orbital 2s com os três subníveis do orbital 2p. Fonte: http://www.mhhe.com/physsci/chemistry/ essentialchemistry/flash/hybrv18.swf. Direita: estrutura da molécula de metano, CH4 . Na molécula do metano, os elétrons dos orbitais sp3 do átomo de carbono reagem com 9 os elétrons de cada átomo de hidrogênio levando à formação de 4 ligações covalentes do tipo sigma: “σ”, conforme a ilustração da figura 8 à direita. A ligação σ é a ligações química covalente mais forte de todas. O que leva o sistema eletrônico do átomo de carbono a formar os estados híbridos está intimamente ligado à minimização da energia total dos elétrons, na presença de outros átomos em sua vizinhança. É isso que ocorre com o metano. Isso, na verdade, faz com que nem sempre os orbitais 2s e 2p do átomo de carbono se combinem apenas de modo a formar 4 novos orbitais sp3 . Existem outras formas de hibridização que obedecendo à regra de formar estados de menor energia, decorrem da quantidade de átomos presentes na vizinhança do átomo de carbono. Dessa forma, podemos ter processos de hibridização que leve à formação de orbitais do tipo sp2 ou sp, cada um deles permitindo a formação de ligações químicas do tipo σ, mas também levando a formação de outro tipo de ligação química: a chamada ligação tipo π. A figura 9 mostra que orbitais se combinam para a formação dos novos orbitais sp2 e sp. Figura 9: Acima: processo de hibridização dos orbitais 2s, 2px e 2py levando à formação de três orbitais sp2 co-planares, que formam um ângulo de 120 graus entre si. Abaixo: processo de hibridização dos orbitais 2s e 2px levando à formação de dois orbitais sp colineares, que formam um ângulo de 180 graus entre si. Fonte: http://www.mhhe.com/ physsci/chemistry/essentialchemistry/flash/hybrv18.swf. Os orbitais 2py e 2pz que permanecem inalterados nos processos de hibridização sp2 e 10 sp podem formar ligação química com orbitais equivalentes de outros átomos como, por exemplo, na molécula do etileno (ou eteno), C2 H4 e acetileno (ou etino), C2 H2 . Pelo número de átomos presentes na vizinhança de um átomo de carbono podemos determinar o tipo de hibridização ocorrida com os seus orbitais subatômicos e o número de ligações químicas do tipo σ e tipo π. A tabela a seguir apresenta uma relação entre essas quantidades: Hibridização sp3 sp2 sp N. de vizinhos do Carbono 4 3 2 N. de ligações σ 4 3 2 N. de ligações π 0 1 2 Tabela 1: Número de ligações do tipo σ e do tipo π em relação à hibridização e ao número de vizinhos do átomo de carbono. 1.3 Exercícios 1.1) O que foi que mais despertou interesse na pesquisa de fibras de carbono? Pesquisa e descubra que tipo de aplicações existem hoje para a fibra de carbono. 1.2) Desenhe a estrutura atômica e determine a hibridização e o número de ligações do tipo σ e do tipo π de cada uma das seguintes moléculas: acetileno, poliacetileno, diamante e metano. 1.3) A energia de uma molécula é a somatória dos diversos tipos de energias de interação entre os átomos que a compõem. A energia de uma ligação química depende do tipo e dos átomos que a formam. Sabemos que as ligações do tipo σ são mais fortes e, portanto, contém mais energia do que ligações do tipo π. Suponha que Eσ e Eπ sejam as energias correspondentes às ligações do tipo σ e do tipo π, respectivamente. Com base no estudo até aqui, elabore um algoritmo computacional simples que permita calcular a energia total das ligações de um átomo de carbono por ligação, isto é, dividido pelo número de ligações, para os átomos de carbono de cada tipo de molécula do exercício número 1.2. 1.4) Sejam as energias de ligação química e as distâncias de equilíbrio de alguns átomos de acordo com a tabela abaixo. Adiante, com base nos dados da tabela, dê o que se pede: Ligação H−H H−O C−H C−C C=C C≡C C−O Comprimento da Ligação [Angstrons] 0.74 0.96 1.09 1.54 1.34 1.20 1.43 Energia da Ligação [kJ/mol] 436 366 413 348 614 839 360 Tabela 2: Distância de equilíbrio (em Angstrons) e energia (em kJ/mol) da ligação química de vários átomos. Os símbolos “−”, “=” e ”≡” representam ligações simples, duplas e triplas, respectivamente. 11 a) Estime os valores para Eσ e Eπ de ligações entre átomos de carbono. O resultado é consistente com o fato da ligação tipo σ ser mais forte? b) Calcule a energia total devido às ligações covalentes de cada molécula do exercício 1.2 por átomo, isto é, dividida pelo número total de átomos, e escreva as moléculas em ordem decrescente de energia total por átomo. c) Determine o comprimento das ligações de cada molécula do exercício 1.2. 12 2 Grafenos 2.1 Estrutura e geometria O grafeno é um cristal atômico bidimensional formado por átomos de carbono localizados nos vértices de uma rede hexagonal (figura 10). Figura 10: Estrutura cristalina do grafeno: átomos de carbono localizados numa rede em formato de favos de mel. Figura reproduzida da Referência [26]. Apesar das tentativas de se estudar este material datarem de 1859 [23], foi só a poucos anos atrás que o grafeno começou a ser ativamente investigado científicamente, após Novoselev e Geim [24, 25] terem conseguido, pela primeira vez, isolar folhas individuais de grafeno [26]. Novosolev e Geim [24,25] usaram um método relativamente simples para extrair folhas de grafeno da estrutura do grafite. Eles usaram fitas adesivas para remover algumas camadas de grafite, e depois usaram um substrato para reduzir ainda mais o número de camadas de grafite até obter uma única camada que é, então, o grafeno. A figura 11, reproduzida da Referência [26] ilustra o processo utilizado por eles. Previsões teóricas anteriores afirmavam que era impossível a existência de cristais bidimensionais grandes a temperaturas finitas, e o fato da existência do grafeno mostra que a teoria não levou em conta a possibilidade da rede cristalina vibrar e se deformar na direção perpendicular ao plano do cristal [28–30]. A estrutura hexagonal pode ser matematicamente construída a partir de uma rede triangular e um célula unitária composta de dois dois átomos A e B, representados em cores azul e amarelo, respectivamente, conforme a figura 12). A posição de todos os átomos de cor amarela podem ser obtidos a partir da posição de 13 Figura 11: Método de obtenção de camadas finas de grafite utilizando uma fita adesiva, método esse que ficou conhecido como método “Scotch-tape”. Linha superior: a fita adesiva é usada para remover algumas camadas de grafite do material macroscópico. Embaixo e à esquerda: a fita com as camadas de grafite é pressionada sobre um substrato de um material perviamente escolhido. Embaixo e à direita: algumas camadas de grafite permanecem aderidas ao substrato, após retirada da fita de sobre o mesmo. Figura reproduzida da Referência [26]. Figura 12: Rede cristalina hexagonal (na forma de favos de mel) feita de duas redes triangulares, uma a partir do átomo A (azul) e outra a partir do átomo B (amarelo). a1 e a2 são os vetores da rede triangular e δi , i = 1, 2, 3 são os vetores que apontam para os átomos que são os primeiros vizinhos de um átomo da rede. Figura reproduzida da Referência [27]. um dos átomos de uma célula unitária somados a vetores múltiplos dos vetores ~a1 e ~a2 , enquanto que o mesmo se pode obter para os átomos de cor azul. Os vetores ~a1 e ~a2 são dados por: ~a1 = √ dCC dCC √ (3, 3) , e ~a2 = (3, − 3) , 2 2 onde dCC ∼ 1.42Å é a distância entre os átomos de carbono no grafeno. 14 (1) Percebe-se que a estrutura hexagonal formada pelos átomos de carbono implica que a ligação química entre eles é aquela formada pela hibridização sp2 dos orbitais s e p. Três elétrons de valência do átomo de carbono fazem parte das três ligações do tipo sp2 e o elétron restante, que ocupa o orbital pz, por exemplo, forma ligações chamadas de π–π que são mais fracas do que as outras. Este elétron do orbital p que se localiza em orbital perpendicular ao plano do grafeno, é responsável pela maior parte das propriedades eletrônicas do mesmo. E, em função da célula unitária do grafeno possuir dois átomos, a estrutura eletrônica forma duas subbandas: uma π e uma π*, que constituem as bandas de valência e condução do grafeno, respectivamente. 2.2 Exercícios 2.1) Desenhe a estrutura atômica e determine a hibridização e o número de ligações do tipo σ e do tipo π do grafeno. 2.2) Usando a tabela da lista de exercícios do capítulo anterior, calcule a energia total do grafeno por átomo, isto é, dividida pelo número total de átomos. 2.3 Descubra, pesquisando na internet, como duas ou mais folhas de grafeno se alinham, uma sobra a outra, para formar o grafite. Os átomos de carbono se alinham ao longo da direção perpendicular ao plano do grafeno? 15 3 Nanotubos de Carbono 3.1 Estrutura e geometria Conforme vimos no capítulo anterior, os nanotubos de carbono (NTCs) são estruturas cilíndricas formadas por folhas de grafeno enroladas em torno do eixo de simetria cilíndrica do nanotubo. Eles foram sintetizados em tamanhos diversos, com diâmetros variando de 0.7 nm a 10.0 nm [2]. Um ponto interessante e de grande importância para algumas propriedades físicas dos NTCs é como os anéis formados por 6 átomos de carbono (daqui em diante chamaremos esses anéis simplesmente de hexágonos) se orientam com relação ao eixo do NTC. A figura 3 fornece 5 exemplos de nanotubos com orientações diversas dos seus hexágonos. Isso nos leva a imaginar que podem existir tantos tipos de nanotubos quanto de estruturas com orientações diferentes dos seus hexágonos. E, mesmo assim, todos eles terão em comum o fato de terem simetria cilíndrica. Os nanotubos podem ser quirais ou aquirais. Um nanotubo aquiral é aquele cuja imagem no espelho produz a mesma estrutura original. Este é o caso dos nanotubos batizados de zigzag e armchair (ver figura 3). Nanotubos quirais exibem simetria espiral e não podem ter sua imagem no espelho superposta sobre a original. Podemos perceber a simetria espiral observando o nanotubo de uma perspectiva transversal, como na parte inferior dos NTCs da figura 3, onde vemos que os NTCs zigzag e armchair não possuem simetria espiral. A seguir, apresentamos as definições fundamentais para a geometria e estrutura dos nanotubos de carbono de acordo com a obra da Referência [2]. 3.1.1 ~h Vetor quiral: C Considere um pedaço de grafeno, isto é, uma estrutura hexagonal planar (estrutura tipo favos de mel) como ilustrada nas figuras 10 e 13. A estrutura de um NTC pode ser ~ h que corresponde a um segmento de reta cuja origem está especificada por um vetor C centrada em um átomo de carbono e sua extremidade se localiza na posição de outro átomo de carbono da estrutura hexagonal planar (segmento OA na figura 9). O vetor T~ , 16 ~ h e perpendicular a este, define um eixo definido a partir do mesmo ponto de origem de C de rotação em torno do qual a célula unitária do correspondente NTC pode ser construída ~ h e T~ (área formada enrolando-se o pedaço de grafeno de área delimitada pelos vetores C pela ligação dos pontos OBB 0 AO na figura 13) em torno deste eixo. Sejam ~a1 e ~a2 os vetores que definem a rede hexagonal planar. Qualquer ponto da rede, onde um átomo de carbono se localiza, pode ser escrito em termos de uma combinação linear destes dois vetores. Em termos de ~a1 e ~a2 , o vetor quiral é dado por: ~ h = n~a1 + m~a2 ≡ (n, m) , C (2) onde n e m são números inteiros que devem satisfazer a relação: 0 ≤ |m| ≤ n. Figura 13: Estrutura do grafeno destacando os principais componentes geométricos relacionados com a estrutura de um NTC. No exemplo acima, o segmento OA que define o ~ h , liga a origem ao ponto n = 4 e m = 2. Ver texto para detalhes. Fonte: livro da vetor C Referência [2]. Nanotubos zigzag e armchair correspondem aos casos em que m = 0 e m = n, respectivamente. No caso de NTCs quirais (n, m) apenas os nanotubos que satisfazem 0 < |m| < n existem por razões de simetria hexagonal. 17 O diâmetro, dt de um NTC (n, m) se relaciona de modo simples com o comprimento ~ h: do vetor C ~ h| a√ 2 |C = n + nm + m2 , π π dt = onde a = dCC √ (3) 3 = 2.49Å, onde dCC é a distância entre os átomos de carbono que nos NTCs é aproximadamente 1.44Å. Note, também, que ~a1 .~a1 = ~a2 .~a2 = a2 e ~a1 .~a2 = a2 /2 . (4) ~ h e ~a1 , cujos Na figura 9, θ é o ângulo quiral definido como o ângulo entre os vetores C valores variam de 0 ≤ |θ| ≤ 30o devido à simetria hexagonal. Podemos obter o valor de θ ~ h e ~a1 : a partir do produto escalar entre os vetores C cos θ = ~ h .~a1 2n + m C = √ . 2 ~ h ||~a1 | 2 n + nm + m2 |C (5) Em particular, NTCs zigzag e armchair correspondem a θ = 0 e θ = 30o , respectivamente. 3.1.2 Vetor translacional: T~ O vetor translacional T~ representa o tamanho da célula unitária do nanotubo ao longo ~ h na da direção do seu eixo. O vetor T~ é paralelo ao eixo e perpendicular ao vetor quiral C rede hexagonal planar da figura 9. Podemos escrever o vetor T~ de modo análogo ao vetor ~ h , isto é, em termos dos vetores ~a1 e ~a2 da seguinte forma: C T~ = t1~a1 + t2~a2 ≡ (t1 , t2 ) , (6) ~ h e sua onde t1 e t2 são números inteiros. O vetor T~ tem a mesma origem do vetor C extremidade corresponde ao primeiro ponto da rede hexagonal ao longo da direção de T~ . ~ h serem ortogonais, isto é, C ~ h .T~ = 0, e as Eqs. (2), (4) e (6), Usando o fato de T~ e C obtemos as seguintes expressões para t1 e t2 . t1 = 2n + m 2m + n , t2 = − , dR dR 18 (7) onde dR é o máximo divisor comum (MDC) de (2m + n) e (2n + m). Se d é simplesmente o MDC de n e m, dR pode ser escrito como: ( dR = d se n − m não é múltiplo de 3d , (8) 3d se n − m é múltiplo de 3d . O comprimento do vetor T~ é dado por: T = |T~ | = ~ h| √ |C . 3 dR (9) Para calcular o número de hexágonos contidos em uma célula unitária do NTC, basta dividir a área compreendida pelos pontos OBB 0 AO (ver figura 9), definida pelos vetores ~ h e T~ , pela área de um hexágono que é definida pelos vetores ~a1 e ~a2 : C N= ~ h × T~ | ~ h |2 |C 2(m2 + nm + n2 ) 2|C = = 2 , |~a1 × ~a2 | dR a dR onde usamos o fato de que ~a1 × ~a1 = ~a2 × ~a2 = 0 e |~a1 × ~a2 | = √ (10) 3a2 /2. Se numa rede hexagonal temos dois átomos de carbono para cada hexágano, cada célula unitária de um NTC terá 2N átomos de carbono. 3.2 Exercícios √ 3.1) Usando as Eqs. (4), sabendo que a = dCC 3 = 2.49Å, e que os ângulos numa rede hexagonal de lado constante são fixos (descubra os ângulos), determine os vetores ~a1 e ~a2 de acordo com a figura 9. 3.2) Calcule o diâmetro dos seguintes nanotubos: (4, 0), (4, 2), (7, 4), (5, 5), (9, 9), (10, 10),(10, 0) e (13, 9). 3.3) Calcule o comprimento da célula unitária ao longo da direção do eixo do tubo, para os nanotubos do exercício 3.2. 3.4) Calcule o ângulo θ e quantos átomos possui a célula unitária de cada nanotubo do exercício 2.2. 3.5) Determine pelo menos três nanotubos diferentes, isto é, de quiralidades diferentes, mas que possuem diâmetros aproximadamente iguais a 1nm (1nm = 10Å). 19 3.6 Usando as Equações (2), (4), (6) e (7), demonstre a Equação (9). 3.7) Nanotubos de multicamadas são formados por nanotubos simples uns dentro dos outros. No caso de nanotubos de duas camadas, existe uma regra de formação que relaciona a quiralidade (isto é, par (n, m)) do nanotubo externo com a do nanotubo interno. Essa regra estabelece que a distância entre as camadas seja de, aproximadamente, 3.34Å. Usando as equações para o diâmetro de um nanotube e determine que nanotubo externo você escolheria para formar um nanotudo de duas camadas com os seguintes nanotubos internos: (4, 0), (5, 0), (6, 0), (5, 5), (6, 6) e (7, 7). Use o mesmo tipo de quiralidade do tubo interno para o tubo externo. A partir dos resultados, proponha duas regras de formação de nanotubos de duas camadas, uma para NTCs do tipo zigzag e outra para os do tipo armchair. Essa regra foi demonstrada por cálculos de primeiros princípios (quânticos) por Shan e Cho [31]. 20 4 Propriedades Gerais de Grafenos e Nanotubos de Carbono O interesse atual na pesquisa de nanoestruturas, em especial grafenos e NTCs, é enorme e é motivada pela busca de materiais em escala macroscópica cujas propriedades reflitam aquelas das nanoestruturas que os compõem. Embora isso dependa de muitos fatores, uma das limitações a esse desenvolvimento decorre dos métodos atuais de crescimento e produção dessas estruturas em escala nanométrica, que não são capazes de evitar a formação de defeitos estruturais, a presença de misturas com outros compostos como metais e subprodutos de carbono e, como no caso dos NTCs, o crescimento misturado de nanotubos de diversas quiralidades. Por essa razão, há muitos esforços no sentido de produzir e sintetizar nanoestruturas com mais qualidade, bem como pesquisar as suas propriedades em situações diversas. Portanto, é importante conhecermos as propriedades gerais dos NTCs já conhecidas. Para maior clareza, dividiremos este capítulo em propriedades mecânicas, eletrônicas e térmicas. Alguns exemplos de aplicações dessas propriedades especiais serão dados em cada subcapítulo. 4.1 Propriedades Mecânicas Dentre os materiais conhecidos tanto na natureza quanto os artificiais, grafenos e NTCs estão entre os mais fortes, resistentes e flexíveis. Simulações atomísticas mostram que o módulo de Young (definido adiante) dessas nanoestruturas é da ordem de 1 TPa (1 TPa= 1012 Pa). Para se ter uma idéia, o módulo de Young do aço é 210 GPa (1GPa= 109 Pa) e do Kevlar (fibra sintética da DuPont usada em coletes a prova balas), é da ordem de 112 GPa [32]. Outro parâmetro importante é a chamada tensão de resistência máxima que é o valor máximo de tensão que o material suporte antes de se deformar ou romper. Enquanto o aço e o Kevlar possuem valores da ordem de 400 MPa e 3000 MPa, respectivamente, (1 MPA= 103 PA) a tensão de resistência máxima de grafenos é da ordem de 130000 MPA e 21 de NTCs varia de 11000 MPa a 63000 MPa de acordo com o tipo, quiralidade e número de camadas. Percebe-se daí que grafenos e NTCs são estruturas bem fortes e resistentes. O módulo de Young, E, também conhecido como módulo de elasticidade, é um parâmetro relacionado à rigidez mecânica do material. Ele é definido como a razão entre a tensão σ = F/A e a deformação relativa = ∆L/L0 : E= F/A F L0 σ = = , ∆L/L0 A∆L (11) onde L0 é o comprimento inicial do material e F é a força aplicada perpendicularmente à uma seção transversal de área A. ∆L = L − L0 é a variação do comprimento do material em função da aplicação da força. Como se pode notar, as unidades de σ e do módulo de Young são as mesmas de pressão: N/m2 = Pa. Sabendo que o módulo de Young dos NTCs não varia com a quiralidade, a Eq. (11) acima permite que possamos estimar a constante de Hooke axial dos NTCs em função do seu diâmetro dt , e portanto, em função dos parâmetros n e m, através da Eq. (3): ka = πEh Eha √ 2 EA n + nm + m2 , = dt = L0 L0 L0 (12) √ onde, lembrando, a = dCC 3 = 2.49Å. h é uma medida da espessura do nanotubo, considerada como sendo a espessura atômica do grafeno, h = 3.34Å [20]. Uma outra propriedade mecânica importante é a capacidade de flexão dos NTCs. O parâmetro elástico nesse caso é a chamada rigidez à flexão, K, dada por [33]: 3 d3t a3 C 2 2 2 K = πC = n + nm + m , 8 8π 2 (13) onde C é um coeficiente de rigidez planar do grafeno, cujo valor estimado vale [33] C = 345J/m2 . Note que a rigidez à flexão depende da quiralidade do NTC. É possível estimar uma constante de Hooke, kf , relacionada à flexão do nanotubo, usando a seguinte expressão [34]: kf = 3 3K 3a3 C 2 2 2 = n + nm + m , 3 3 L0 8π 2 L0 22 (14) onde L0 é o comprimento do nanotubo e a segunda igualdade decorre da utilização da Eq. (13). Note que a constante de Hooke relacionada à deformação axial, ka , dada pela Eq. (12) é diferente da constante de hooke devido à flexão do NTC. No caso de nanotubos de várias camadas, ou nanotubos de multicamadas, a gente pode simplesmente somar as constantes de hooke de cada camada, como se tivéssemos uma associação em paralelo de molas. O mesmo vale para o parâmetro K. Apenas o módulo de Young não é aditivo e tem o mesmo valor para diferentes NTCs. Além do coeficiente de rigidez planar do grafeno, C, este possui um coeficiente de rigidez à flexão, dado por D ∼ 0.238 nN-nm [35]. Por causa de fatores como tamanho pequeno, baixa densidade, razão de aspecto elevada (isto é, a razão comprimento pelo diâmetro) e propriedades mecânicas superiores, os nanotubos de carbono são considerados os candidatos ideais para reforçar materiais compósitos [9, 17–20]. Um compósito é um material formado pela mistura de dois ou mais materiais diferentes. Em experimentos de mistura de nanotubos com outros materiais, utiliza-se a chamada regra das misturas para estimar-se as propriedades mecânicas do compósito: PC = PP VP + P Reforço V Reforço , (15) onde PC é alguma propriedade do compósito (módulo de Young, por exemplo), PP e VP são a propriedade e a fração volumétrica, respectivamente, do polímero ou material com o qual, por exemplo, os NTCs são misturados, e P Reforço e V Reforço são a propriedade e a fração volumétrica, respectivamente, do material usado como reforço no compósito (NTCs no nosso caso). Note que a fração volumétrica total é igual à 1 ou 100%, por isso não aparece na expressão acima. 4.2 Propriedades Eletrônicas Os materiais podem ser classificados como condutores (metálicos), semimetais, semicondutores e isolantes. Os materiais metálicos são bons condutores de eletricidade enquanto os semicondutores só conduzem eletricidade se determinado valor de diferença de potencial 23 é aplicado em suas extremidades. O isolante é um material que oferece enorme resistência à passagem de corrente elétrica. Um semicondutor é um material cuja condutividade elétrica é intermediária entre o condutor e o isolante. Os materiais ditos semimetais são condutores de cargas com propriedades diferentes dos metais. Enquanto a utilidade de materiais metálicos e isolantes são diretamente relacionadas às suas condutividades elétricas, os semicondutores tem a utilidade de servirem em componentes eletrônicos capazes de controlar a corrente elétrica em circuitos amplificadores. Também são capazes de retificar a condução elétrica, isto é, só permitir a passagem de corrente elétrica num sentido. Na medida em que a tecnologia permite que os componentes eletrônicos se tornem cada vez menores, a pesquisa sobre as propriedades eletrônicas de nanoestruturas se torna de grande importância. De todas as características especiais de grafenos e nanotubos de carbono, a que mais atraiu a atenção de pesquisadores em geral, são as propriedades eletrônicas dos mesmos. O grafeno, em particular, é considerado um material semimetal pois sua banda de valência “toca” a banda de condução, permitindo que o material tenha propriedades condutaras, mas difere de metais comuns por não possuir elétrons livres na banda de condução. Já os NTCs, por causa da dependência da estrutura eletrônica dos mesmos com sua a quiralidade, podem ser classificados como metálicos (ou condutores) e semicondutores. A condição para um NTC (n, m) ser metálico é que: n − m = 3q , q inteiro . (16) Por exemplo, todos os NTCs armchair (m = n) são metálicos, enquanto que apenas os NTCs zigzag n = 3q, para algum q inteiro, são metálicos. Em geral, nanotubos multicamadas são metálicos, o que não significa que não se pode encontrar algum semicondutor na medida em que os tubos possuem quiralidade adequada [2]. Conforme mencionado no cap. 1, em vista das propriedades mecânicas e eletrônicas 24 especiais dos nanotubos, Zettl e colaboradores [21] inventaram o nanorádio onde um único nanotubo de carbono age como antena, sintonizador e amplificador de corrente. 4.3 Propriedades Térmicas As propriedades térmicas de um material dependem das propriedades eletrônicas quando o material é bom condutor e das vibrações da rede cristalina quando o material é semicondutor ou isolante. A condutividade térmica, k é uma propriedade dos mateirais relacionada à condução de calor. Basicamente ela é definida como sendo a quantidade de calor Q transmitida através de um material de espessura t, numa direção normal à sua superfície de área A, devido a uma variação de temperatura ∆T : A Q = k ∆T . t (17) A condutividade térmica da Prata é 429 W/(m.K), do diamante vale de 900 a 2000 W/(m.K), do grafeno vale ∼ 5000 W/(m.K) e de um nanotubo de carbono vale ∼ 3500W/(m.K). Além de bons condutores de calor, eles são bons condutores térmicos. Uma recente motivação no estudo das propriedades térmicas de NTCs e grafenos envolve a busca por materiais chamados termoelétricos [36], em que uma diferença de potencial eletrico é produzida entre dois pontos de um material sujeito a um gradiente de temperatura. Para avaliar se um material é bom para aplicações termoelétricas, foi definido o parametro chamado figura de mérito: ZT = (S 2 σ/k)T , (18) onde σ é a condutância elétrica do material, T e a temperatura, k é a condutividade térmica, e S é o chamado coeficiente de Seebeck definido como a razão ∆V /∆T , e que depende das propriedades eletrônicas do material. Pesquisas recentes com nanoestruturas buscam demonstrar uma maneira de reduzir sua condutividade térmica sem prejudicar as propriedades eletrônicas do material, de modo a maximizar ZT [37]. Um exemplo recente, é o estudo da condutividade térmica de grafenos formados por isótopos de carbono, onde 25 ela se reduziu de até 80% do seu valor normal [38]. Um fenômeno curioso observado com o grafeno diz respeito ao seu coeficiente de expansão térmica. Experimentos recentes demonstraram que ao aquecer e esfriar amostras de grafeno presas a dois substratos, ocorrem a formação de ondulações conforme a figura 14. Figura 14: Imagens de microscopia eletrônica de varredura de folhas de grafeno antes (esquerda) e depois (direita) de serem aquecidas. Fonte: artigo da Referência [39]. O resultado só pode ser explicado pelo fato do grafeno encolher com o aumento da temperatura e vice-versa. Isso significa que ele possui um coeficiente de expansão térmica negativo. 4.4 Exercícios 4.1) Sabendo que o módulo de Young dos NTCs vale E = 1TPa e que ele não depende da quiralidade, determine a constante de Hooke axial, ka , o coeficiente de rigidez à flexão, K, e a constante de Hooke de flexão, kf , dos seguintes nanotubos: (4, 0), (5, 2), (6, 0), (5, 5), (6, 3), (7, 5), (18, 11), (37, 22), (50, 0). Considere o comprimento dos nanotubos L0 = 10nm. 4.2) Determine qual dos dois parâmetros é maior: a constante de Hooke axial, ka , ou a de flexão, kf ? 4.3) O parâmetro chamado comprimento de persistência é definido como: l ≡ (K/kb T ), onde kb = 1.38 × 10−23 JK−1 é a constante de Boltzmann e T é a temperatura em Kelvin. Ele é uma 26 medida do quão rígido é um filamento sob ação de flutuações térmicas. Determine uma expressão para o comprimento de persistência em função da quiralidade de um NTC, isto é, em função dos parâmetros n e m, e calcule o mesmo para os nanotubos do exercício 4.1. Suponha que você tenha um nanotubo de três camadas formado pelos seguintes tubos: (5, 5)@(10, 10)@(15, 15) (o símbolo “@” significa “dentro de”). Calcule a comprimento de persistência desse nanotubo de três camadas. 4.4) O módulo de Young do polietileno é Ep = 200MPa. Determine, usando a regra das misturas, o módulo de Young de um material compósito contendo, 0.1%, 1% e 10% de NTCs. Determine que fração volumétrica de NTCs devemos ter para que o compósito tenha E = 1GPa. 4.5) Dos nanotubos do exercício 4.1, diga quais são metálicos e quais são semicondutores. 4.6) Um bom material termoelétrico é aquele que consegue combinar alta condutividade elétrica com baixa condutividade térmica. Use o valor da condutividade térmica do grafeno, k = 5000 W/(m.K) e determine de quanto ela tem que diminuir para que a figura de mérito associada ao mesmo triplique de valor. No caso mencionado no texto, em que a condutividade térmica do grafeno reduziu-se de 80% do valor inicial, de quanto aumenta a figura de mérito, ZT ? Considere que na redução da condutividade térmica do grafeno, nenhuma das suas outras propriedades se altera. 4.7) Na teoria elástica clássica para folhas, o coeficiente de flexão é dado por D = Eh3 , onde E é o módulo de Young da estrutura, e h a sua espessura. Com base nos dados presentes no texto, determine o valor do módulo de Young do grafeno se a sua espessura for h = 0.34nm. 4.8) Estudos teóricos baseados em simulações quânticas demonstram que a distância entre os átomos de carbono numa molécula de grafeno aumenta com a temperatura. Se a distância aumenta, como você explica que a estrutura como um todo possui coeficiente de expansão térmica negativo, isto é, que o comprimento total da estrutura diminui? Referências [1] http://en.wikipedia.org/wiki/Carbon [2] R. Saito, G. Dresselhaus e M. S. Dresselhaus, Physical Properties of Carbon Nanotubes (Imperial College Press, London, 2005). [3] M. Fischer e R. Schmid, Colloid & Polymer Sci 264, 387 (1986). [4] H. W. Kroto, J. R. Heath, S. C. O’Brien, R. F. Curl e R. E. Smalley, Nature 318, 162 (1985). [5] R. Mota, “Nanotubos de carbono: história, propriedades, dopagens, nanocones, aplicações e desafios”, em Escola Brasileira de Estrutura Eletrônica, organizadores: H. F. Santos, P. Z. Coura, S. O. Dantas e P. M. V. Barone (Editora Livraria da Física, São Paulo, 2003). [6] S. Iijima, Nature 354, 56 (1991). [7] P. S. Weiss e M. Dresselhaus, A Conversation with Prof. Mildred Dresselhaus: A Career in Carbon Nanomaterials, ACSNano 3, 2434 (2009). [8] A. Oberlin, M. Endo e T. 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