FE1305
Características e perspectivas
de mercados emergentes
Paulo Vicente dos Santos Alves e Aldemir Drummond
A partir dos anos 1990, quando o mundo entrou definitivamente na era da globalização, diversos paradigmas
foram alterados para fazer frente à nova realidade econômica, política e social que tomou conta do planeta.
Entre eles, um novo conceito passou a interessar diretamente a diversos públicos, em especial empresários do
setor privado e autoridades da esfera pública – o de mercados emergentes.
O termo já fazia parte do vocabulário dos negócios desde os anos 1980, em substituição à preconceituosa
expressão “países subdesenvolvidos” dos anos 1970. Diante das rápidas e inéditas mudanças do mundo global,
o termo foi revisitado por especialistas e passou a ser motivo de análises e reflexões em todo o mundo.
Nesse contexto, mais recentemente, a Fundação Dom Cabral (FDC) decidiu criar este estudo devido a essa
crescente importância dos mercados emergentes no ambiente de negócios. Também no Brasil, muitos clientes
da instituição vêm demonstrando grande interesse em saber mais sobre esses mercados – e, especialmente,
como eles se comportam e como se desenvolveram no futuro de médio e longo prazos.
Vale ressaltar que essa importância é ainda maior na medida em que o Brasil é um dos principais mercados
emergentes. O estudo, cuja síntese é o tema desta edição do FDC Executive, oferece um análise panorâmica
e consistente desses mercados e apresenta considerações interessantes sobre as perspectivas de futuro de
algumas importantes nações que compõem tais mercados.
Este estudo foi realizado pelo Núcleo de Estratégia e Economias Emergentes da Fundação Dom Cabral e tem
como desafio, portanto, oferecer uma ferramenta de planejamento estratégico para companhias operando em
mercados emergentes.
Os desafios dessa análise
E
ste texto tem três objetivos – desafios – centrais:
•• Analisar o que constitui um Mercado emergente e
como eles se classificam.
•• Fazer uma análise focada nos mercados emergentes
mais importantes. Eles foram estudados em termos
de geografia, economia, barreiras ao crescimento
e política.
•• Fazer uma previsão sólida e de longo prazo para
os mercados emergentes mais importantes em
relação à sua lógica interna de expansão e em
relação ao mundo.
Como se classificam os mercados
emergentes
O crescimento dos mercados emergentes levou a
muitas classificações e denominações do que eles se
constituem. Há também certa confusão entre mercados
muito grandes, como Índia e China, e muito pequenos,
como Peru e Chile.
O surgimento de termos como BRICs, E-7 e G-20
se refere a grupos específicos de nações que são
consideradas grandes economias ou economias com
grande potencial futuro. A entrada de grande quantidade
de consumidores nas classes médias e com acesso a
produtos e serviços de massa tornou-se, em particular,
um importante indicador de crescimento desses
mercados para os próximo anos.
Entretanto, tais classificações são muito imperfeitas e
não rigorosas do ponto de vista metodológico. Podese argumentar, por exemplo, que as nações do grupo
do BRICs têm poucas características em comum.
Recentemente, a África do Sul foi considerada como
parte dos BRICS. Acreditamos, porém, que México,
Turquia e Indonésia têm mais relevância para serem
incluídos, o que ocorre quando se referem ao E-7.
Desta forma, nossa pergunta inicial é: o que constitui
um mercado emergente e que subtipos deles existem?
Para nós, a classificação que busca resposta para essa
questão deve ter como metodologia central a análise de
conglomerado. Esse método tem sido usado na biologia
para diferenciar a morfologia de espécies e classificar a
diferença entre e dentro de espécies.
Para preparar nossa análise, escolhemos três amostras
de estados-nação para comparação, envolvendo,
respectivamente, 70%, 80% e 90% da economia mundial.
Isso inclui, respectivamente, 14, 24 e 45 países em cada
amostra, escolhidos segundo os dados da Tabela 1. Para
visualizar a tabela1, acesse o link http://www.fdc.org.
br/hotsites/mail/fe1305_tabela1.pdf. Ela lista os dados
principais para cada um dos 45 países escolhidos. Essas
variáveis foram empregadas sob diversas combinações
utilizando a análise de conglomerados.
A decisão lógica ao analisar mercados é a de priorizar
os mercados maiores e aqueles onde a população e a
renda per capita são maiores. Entretanto, para comparar
dois mercados, é preciso utilizar o Poder de Compra
Equiparado (PPP em inglês: Purchasing Power Parity),
ou o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Nosso principal desafio foi comparar o PIB em suas
duas componentes principais (de população e per
capita) e, na sequência, levar em conta também a taxa
de fertilidade do país. Desta forma, foi possível analisar
quais mercados são emergentes ou desenvolvidos no
momento atual – e também numa perspectiva de futuro.
As 14 maiores economias que
representam 70% do PIB mundial
Esse grupo inclui os seguintes países: EUA, China,
Japão, Índia, Alemanha, Rússia, Reino Unido, Brasil,
França, Itália, México, Coreia do Sul, Espanha e
Canadá. Dessa forma, ele engloba tanto o G-8 quanto
os BRICs. Esse conjunto é composto, portanto, por
quatro conglomerados ou clusters, a saber: o cluster
1 é composto somente do EUA como potência
hegemônica mundial; o cluster 2 inclui os demais países
desenvolvidos; o cluster 3 engloba jovens nações
emergentes, e o cluster 4, os velhos gigantes da Ásia.
Características e perspectivas de mercados emergentes
Os clusters 3 e 4 revelam os BRIMCs (Brasil, Rússia,
Índia, México e China) como sendo os emergentes
desse grupo.
As 24 maiores economias que
comandam 80% do PIB Mundial
Esse grupo inclui Argentina, Austrália, Brasil, Canadá,
China, França, Alemanha, Índia, Indonésia, Irá, Itália,
Japão, México, Holanda, Polônia, Rússia, Arábia
Saudita, Coreia do Sul, Espanha, Taiwan, Tailândia,
Turquia, Reino Unido e EUA. Por sua vez, ele pode ser
dividido em oito conglomerados ou clusters.
O cluster 1 inclui somente os EUA, a maior potência
hegemônica. Já o cluster 2 inclui somente a Arábia
Saudita, um país que tem particularidades únicas. O
cluster 3 inclui França, Alemanha, Japão, Taiwan e Reino
Unido, ou seja, todos países desenvolvidos. Por sua vez,
o cluster 4 inclui a China, Índia e Indonésia, ou seja, os
gigantes da Ásia.
O cluster 5 tem Austrália, Canadá e Holanda, ou seja,
pequenos países em termos de população, mas muito
desenvolvidos. O cluster 6 conta com e Polônia a Rússia,
que são países relativamente jovens do leste europeu.
O cluster 7 tem Itália, Espanha e Coreia do Sul. Este
é, provavelmente, um cluster temporário, uma vez que
Itália e Espanha passam por uma crise e a Coreia vem
se desenvolvendo rapidamente. Por fim, o cluster 8 inclui
Argentina, Brasil, Irã, México, Tailândia e Turquia, que
perfazem um grupo de países emergentes.
Fica claro que os países emergentes estão nos clusters
4, 6 e 8. A Arábia Saudita está na fronteira, podendo,
ou não, ser considerada um país emergente. Os
países desses clusters têm sido denominados E-11.
O cruzamento dessa classificação com as taxas de
fertilidade resultaram na Tabela 2. Para visualizar a
tabela 2, acesse o link http://www.fdc.org.br/hotsites/
mail/fe1305_tabela2.pdf . É possível, ainda, classificar
os países de acordo com o perfil etário da população:
jovem, estável ou velha. Há uma exceção, chamada de
casos especiais, formada pelo grupo da Índia, China e
Taiwan.
Podemos aferir que os mercados mais interessantes,
sob o ponto de vista do investimento de longo prazo, são
formados pelo grupo dos países jovens (Y-7).
Comparação de mercados
selecionados
O estudo original realizou uma série de comparações
entre mercados selecionados, visando identificar o
2
conjunto de nações que possam merecer atenção
especial por parte de investidores. Foram realizados
vários cortes nas análises, como diferenças territoriais,
potencial de mercados consumidores (B2C),
perspectivas de mercados corporativos (B2B) e
barreiras ao crescimento.
Nela, percebe-se que os ciclos preveem um século que
pode ser dividido em quatro atos:
Por questão de espaço, não vamos apresentar aqui o
detalhamento dessa parte do estudo, destacando que
ele aponta o grupo dos BRIMCs (Brasil, Rússia, Índia,
México e China) como o mais promissor e atraente na
perspectiva dos mercados emergentes.
Ato 4 – A nova hegemonia dos anos 2090
Ato I – A crise dos anos 2020
Ato 2 – A revolução tecnológica dos anos 2040
Ato 3 – As guerras mundiais dos anos 2070 e 2080
Tabela 3 – Projeção dos Ciclos Hegemônicos e de
Kondratieff
Vale destacar que as principais barreiras ao crescimento
desses países estão relacionadas, em maior ou menor
intensidade, principalmente com as seguintes questões:
geração de energia, infraestrutura de transporte,
educação, pesquisa e desenvolvimento (P&D) e
dependência de exportações.
Ciclo
Período
Subfase
Hegemonia
5o Ciclo
2012-2018
Exaustão
EUA/USA
5o Ciclo
2018-2030
Crise
EUAUSA
6o Ciclo
2030-2042
Recuperação
EUA/USA
No âmbito geral, ainda em relação aos gargalos,
podemos destacar que a melhor posição é a da Rússia,
seguida do Brasil, México, Índia e China, nessa ordem.
A Rússia tem a vantagem de ter a energia necessária
para seu crescimento. A China e a Índia têm desafios
maiores devido ao tamanho de suas populações, tanto
em termos de energia quanto de educação.
6o Ciclo
2042-2055
Expansão
EUA/USA
6o Ciclo
2055-2067
Exaustão
EUA/USA
6o Ciclo
2067-2080
Crise
Transição
7 Ciclo
2080-2092
Recuperação
Transição
7o Ciclo
2092-2104
Expansão
Nova
potência
México e Índia, por sua vez, por terem menores
extensões geográficas, apresentam desafios de
infraestrutura de transporte menos graves. O México
investe pouco em P&D, e a China tem o problema
de limitação da liberdade de pesquisa e excessiva
orientação do Estado nesse sentido. Por fim, Rússia
e México dependem mais de exportações de gás e
petróleo, respectivamente.
Projeções para o futuro
Na parte final do estudo, analisa-se como o
desenvolvimento dos BRIMCS deve se dar ao longo
das próximas décadas. Metodologicamente, essa análise
foi feita de duas maneiras. A primeira leva em conta um
cenário com base global montado a partir da teoria dos
ciclos hegemônicos e dos ciclos de Kondratieff.
A segunda foi realizada a partir de uma análise
pormenorizada de cada um dos países por meio de
tendências consolidadas, em que procuramos identificar
uma tendência ou característica predominante de cada
nação dos BRIMCS para a construção de cenários.
o
Fonte: ALVES, 2012.
É importante ressaltar que as previsões tornam-se
menos confiáveis à medida que se avança para o futuro
– e, portanto, menos certeza se tem sobre uma predição
baseada numa série histórica.
Podemos elencar cinco grandes causas para a crise
prevista para os anos 2020: fundos de aposentadoria
insustentáveis; alta nos preços de energia; aumento dos
preços de água e comida; gestão pública ineficiente e
ineficaz; e aumento dos gastos com segurança pública
e nacional.
Enquanto os três primeiros itens apontam para uma
inflação em aceleração no futuro, os dois últimos indicam
uma maior taxação tributária.
Quanto à possível revolução tecnológica que se seguirá
como reação às crises, podemos apontar três blocos de
potenciais tecnologias ao analisarmos as perspectivas
de investimentos em P&D:
1. Robótica e inteligência artificial
2. Genética, biotecnologia e medicina avançada
Os Ciclos Hegemônicos de Kondratieff
3. Energia verde e tecnologia espacial
A Tabela 3 mostra o quadro geral da projeção global.
FDC Executive
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Cenários das nações emergentes do
BRIMCS
Como dito, identificamos para as nações em foco
uma característica distinta que simboliza as principais
mudanças estruturais em processo em cada uma delas:
Brasil: a integração da América do Sul
A expansão demográfica e econômica do Brasil está
levando o país a se integrar com seus vizinhos da
América do Sul. Até o momento, essa integração tem
sido demográfica, lenta e pacífica.
Rússia: a nova região central
A Rússia vem se movimentando para o Leste desde o
século XIII. No século XX, contudo, a região ao longo
da ferrovia trans-siberiana vem se transformando num
novo centro agrícola e industrial.
Índia: o Marajá do Oceano Índico
A Índia é limitada em sua expansão demográfica e
econômica de maneira que a África representa a sua
região natural de expansão. Para isto, ela precisará
dominar as rotas de comércio do Oceano Índico.
México: a fusão com os Estados Unidos
Os EUA e o México entraram em confronto pela região
de fronteira no século XIX e hoje começam a se integrar
econômica e demograficamente. À medida que o tempo
avança, os dois países passam, na prática, a operar em
bloco para fins comerciais.
China: a Nova frota do tesouro
A China quase dominou o mundo no século XV e,
atualmente, volta a apresentar grande potencial de
crescimento, na medida em que expande seus negócios
para o resto do mundo, em particular para a África. A
construção de uma nova “frota do tesouro” é o tema
central da expansão chinesa.
É importante salientar que, após essa breve síntese
das perspectivas dessas nações, muitos conflitos
econômicos, demográficos e militares ainda devem
advir dessa expansão. Eles podem ocorrer entre elas
próprias, assim como com países vizinhos, também
numa nova corrida colonial na África ou mesmo com
países desenvolvidos.
Algumas conclusões relevantes
Como destacado inicialmente, nosso estudo foi dividido em três partes distintas:
•• análise classificatória de mercados emergentes;
•• análise aprofundada dos BRIMC; e
•• estudo de projeções e cenários.
Na primeira parte, concluímos que se podem fazer inúmeras classificações globais para tais tipos de análise.
Contudo, cortes de grupo representando 70%, 80% e 90% da economia mundial, acompanhados de análise de
conglomerados, revelam três grupos de países emergentes que contam, respectivamente, com cinco, doze e
vinte e sete países emergentes em cada uma das camadas.
Os emergentes da primeira camada são Brasil, Rússia, Índia, México e China (os BRIMC). Sob diversos aspectos,
Brasil, México e Rússia apresentam similaridades, enquanto China e Índia formam um segundo grupo com
semelhanças.
Existem cinco grandes barreiras ao crescimento desses países, que são energia, infraestrutura viária, educação,
pesquisa e desenvolvimento (P&D) e a dependência de mercados exportadores. O país com menores barreiras
é a Rússia, seguida de Brasil, México, Índia e China.
Finalmente, foi simulada uma projeção de futuro na qual se dividiu o século XXI em quatro atos, baseando-se nos
ciclos hegemônicos e de Kondratieff. Além disto, foram criados cenários específicos para cada um dos BRIMC,
de maneira a entender melhor as dificuldades, dilemas e desafios que cada uma dessas nações irá enfrentar
num futuro próximo.
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