IV REUNIÃO DE MINISTROS DE AGRICULTURA E DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO DO BRICS - BRASÍLIA, 13 03 15 DISCURSO DA SECRETÁRIA EXECUTIVA DO MDA - SRA. MARIA FERNANDA RAMOS COELHO 1. Excelentíssimos Senhoras e Senhores Ministros e Vice-Ministros de Agricultura e Desenvolvimento Agrário do BRICS, 2. É com grande satisfação que, em nome do Ministro do Desenvolvimento Agrário do Brasil, Patrus Ananias, lhes dou as boas-vindas a Brasília, nesta 4a Reunião de Ministros de Agricultura e Desenvolvimento Agrário do BRICS. O fato dos temas da agricultura e do desenvolvimento rural e agrário serem uma das poucas áreas setoriais nas quais o BRICS se reúne em nível ministerial diz muito sobre o grau de prioridade que os nossos governos têm atribuído ao tema. De fato, vale recordar que na primeira Cúpula deste agrupamento em Ecaterimburgo em 2009, os mandatários dos nossos países assinaram a “Declaração Conjunta sobre Segurança Alimentar Mundial”. Nesta declaração, a primeira recomendação elencada pelos Chefes de Estado e Governo para fazer face à magnitude da crise dos preços dos alimentos que havia eclodido em 2007/2008, foi inequívoca: “disponibilizar recursos e assistência adicionais [...] principalmente para a agricultura familiar, que é a principal fonte de produção alimentar”. Na cúpula presidencial seguinte, realizada em Brasília em 2010, os Chefes de Estado e Governo se comprometeram em elaborar uma estratégia de segurança alimentar comum. Tal compromisso foi então assumido pelos Ministros de Agricultura e Desenvolvimento Agrário, que aprovaram, por ocasião de sua 2a Reunião em Chengdu, em 2011, o “Plano de Ação 2012-2016 para a Cooperação Agrícola dos Países BRICS”, cujo segundo eixo de responsabilidade do Brasil, em colaboração com os 4 demais países, é precisamente a formulação e execução de tal estratégia. 3. A “Estratégia Geral para Assegurar o Acesso a Alimentação para as Populações Mais Vulneráveis”, cujo documento será entregue pelo Brasil até o fim de 2016, será delineada a partir de uma visão que incorpora estratégias nacionais e 1 regionais dos 5 países e de suas respectivas regiões assim como a atuação dos BRICS em nível mundial, tanto pela cooperação conjunta entre os nossos países e os demais países em desenvolvimento, quanto pela nossa coordenação em diversos fóruns internacionais. 4. No caso brasileiro, a Estratégia Fome Zero, priorizada no mais alto nível pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva a partir de 2003, e lançada pelo então Ministro José Graziano da Silva, hoje Diretor-Geral da FAO, contou com a participação ativa da sociedade civil por meio do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), e forte dimensão intersetorial com a coordenação de ações em nível ministerial pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. A Presidenta Dilma Rousseff continuou os esforços iniciados pelo seu antecessor a partir do Programa Brasil sem Miséria lançado em 2011. Os objetivos de ambos os programas, respectivamente a erradicação da fome e da pobreza extrema, foram atingidos. Assim a “Prevalência da Subalimentação” caiu de 10,7% (2000-2002) a 1,7% (2014) da população brasileira, retirando o Brasil do “mapa da fome” da FAO. Da mesma forma, nos últimos 11 anos, 36 milhões de brasileiros e brasileiras saíram da situação de extrema pobreza, e 42 milhões ascenderam à classe média. Em ambas as estratégias, o Ministério do Desenvolvimento Agrário desempenhou papel central: o fortalecimento da agricultura familiar foi um dos 4 pilares da Estratégia Fome Zero e o MDA foi o principal ministério responsável pela políticas de erradicação da pobreza extrema nas áreas rurais. 5. Assim, a articulação de uma rede de políticas públicas de acesso à terra, financiamento, formação e capacitação, seguros, garantias de preço, acesso a mercados, promoção da autonomia econômica das mulheres rurais, políticas específicas para a juventude e para os povos e comunidades tradicionais, todas formuladas e implementadas com a participação social ativa de organizações de agricultores familiares em diálogo com representantes governamentais, gerou resultados significativos, essenciais para o êxito das estratégias mencionadas: consequentemente nos últimos 10 anos a renda da 2 agricultura familiar aumentou 52% e a classe média rural passou de um quinto para a metade da população rural brasileira. 6. O compromisso com a erradicação da fome e da pobreza no mais alto nível político se reflete também na região latino-americana e caribenha, região do mundo que logrou os maiores avanços neste quesito. Assim, cumpriu o Objetivo de Desenvolvimento do Milênio 1 - diminuindo a proporção de subnutridos por mais da metade, de 14,4% a 5,1%; bem como a meta mais ambiciosa da Cúpula Mundial da Alimentação (1996) de redução pela metade do número absoluto de pessoas subnutridas - de 60,3 milhões a 29,5 milhões - no mesmo período. O compromisso político dos 33 Chefes de Estado e Governo com a erradicação da fome na região foi reafirmado, com a aprovação há dois meses atrás, na 3a Cúpula da Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC), do Plano para a Segurança Alimentar, Nutrição e Erradicação da Fome da CELAC 2025, que se delineia em 4 pilares, sendo o apoio à agricultura familiar uma de suas peças-chave. 7. Nesse sentido, o seminário sobre Políticas Públicas de Segurança Alimentar e Nutricional e para o Fortalecimento da Agricultura Familiar, realizado ante-ontem, que relatou experiências dos países e respectivas regiões do BRICS, representa um passo importante na formulação da estratégia de Segurança Alimentar que nos foi mandatada pelos nossos Chefes de Estado e Governo há 5 anos atrás em Brasília. De fato, os informes que serão redigidos pelos 5 países como resultado do seminário servirão como insumo fundamental para a elaboração da “Estratégia Geral”. 8. Conforme também previsto pelo Plano de Ação 2012-2016, pretendemos intensificar o intercâmbio de experiências a partir de iniciativas de cooperação conjunta, em particular sobre os programas de compras públicas de alimentos produzidos pelos agricultores familiares, que têm desempenhado papel 3 fundamental tanto para a segurança alimentar e nutricional, quanto para proporcionar acesso a mercados locais e geração de renda aos agricultores. Por exemplo no Brasil, estima-se que o impacto das transferências nãomonetárias de alimentos, tais como aquelas providenciadas pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar a 42 milhões de estudantes, foram responsáveis por cerca de um terço da redução da insegurança alimentar que retirou o Brasil do mapa da fome. 9. Os Chefes de Estado e Governo dos BRICS têm reiterado a necessidade dos BRICS contribuírem para a segurança alimentar tanto dos próprios 5 países quanto dos demais países em desenvolvimento. É por isto que o segundo Eixo do Plano de Ação 2012-2016, relacionado à Segurança Alimentar, e coordenado pelo Brasil, prevê a criação de um Grupo dos BRICS na FAO, que já se reuniu 4 vezes em Roma. Em particular, há cinco temas em que poderíamos intercambiar impressões para potencializarmos a nossa contribuição para a segurança alimentar mundial a partir deste e outros fóruns multilaterais. 10. Em primeiro lugar, é imprescindível dar seguimento às atividades do Ano Internacional da Agricultura Familiar das Nações Unidas (AIAF 2014), primeiro ano internacional da ONU resultante de campanha lançada por organizações da sociedade civil, articuladas em 60 países dos 5 continentes com o apoio de vários governos, inclusive o Brasil. Dentre os avanços propiciados pela comemoração do Ano, destaca-se a criação de Comitês Nacionais do AIAF - plataformas reunindo atores da sociedade civil e dos governos para formular políticas públicas para a agricultura familiar - em 50 países. Além disto, a FAO está incorporando o apoio à agricultura familiar de forma transversal no seu plano de trabalho a partir de mandato dado pelo Comitê de Agricultura (COAG) na sua última sessão em setembro do ano passado. 11. Um segundo tema de grande relevância para o Grupo dos BRICS na FAO é a implementação das Diretrizes Voluntárias sobre a Governança Fundiária 4 Responsável da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais. Este documento constitui um marco histórico, por ser o principal documento internacional normativo sobre questões fundiárias consensuado por todos os países membros das Nações Unidas, recém aprovado pelo Comitê de Segurança Alimentar Mundial em 2012. Trata-se de instrumento valioso para a elaboração de marcos legais, programas e políticas que possam assegurar uma governança fundiária segura e justa para todas partes. O Brasil tem desempenhado um papel-chave nas questões fundiárias, tanto dentro do país quanto na esfera internacional. No âmbito doméstico, a Reforma Agrária assentou 950.000 famílias numa área total de 88 milhões de hectares - o que corresponde a um décimo da área total do país - nos últimos 20 anos. No âmbito internacional, sediamos em parceria com a FAO a Conferência Internacional para a Reforma Agrária e o Desenvolvimento Rural (CIRADR), em 2006. A conferência constituiu uma etapa fundamental para o reposicionamento do tema na esfera internacional, sendo o seu principal desdobramento a aprovação das Diretrizes Voluntárias em 2012, cuja implementação já está em curso em várias regiões do mundo. 12. O terceiro campo em que devemos aprofundar a nossa coordenação internacional, é o processo de negociação atualmente em curso, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), um dos principais desdobramentos da Rio+20, que deverão ser aprovados em setembro deste ano e irão definir a agenda global do desenvolvimento para os próximos 15 anos. No texto atual, a importância estratégica da segurança alimentar, sustentabiliade da agricultura, e do papel fundamental da agricultura familair, estão bem refletidos na Meta 2, referente à erradicação da fome e à promoção da agricultura sustentável, e em particular na submeta 2.3, de “Dobrar a produtividade agrícola dos produtores de alimentos em pequena escala [...] inclusive por meio de acesso seguro e equânime à terra e outros recursos e insumos produtivos”. Devemos ainda assim redobrar esforços para que as metas, indicadores e meios de implementação a serem aprovados, reflitam devidamente a contribuição crucial da agricultura familiar para o desenvolvimento sustentável. 5 13. Consideramos também de grande importância podermos nos coordenar sobre as negociações em curso relativas ao Projeto de Declaração sobre os Direitos dos camponeses e outras pessoas que trabalham em zonas rurais” atualmente em discussão no Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU. Além da importância intrínseca do tema, vale lembrar que os 5 países do BRICS votaram favoravelmente para a renovação do mandato do GT que trata do tema durante a 26ª Sessão do CDH realizada em junho do ano passado. 14. Por fim, nos parece essencial intercambiarmos informações sobre a questão dos Estoques Públicos para a Segurança Alimentar, um dos temas centrais atualmente em discussão no âmbito da Organização Mundial do Comércio, tendo em vista a importância das nossas políticas nacionais de abastecimento, que incluem programas de compras públicas de alimentos da agricultura familiar - um elemento fundamental da estratégia Fome Zero, que tirou o Brasil do mapa da fome. 15. Excelentíssimos Senhoras e Senhores Ministros e Vice-Ministros, 16. Há hoje mais de 500 milhões de estabelecimentos da agricultura familiar no mundo, incluindo “pequenos e médios agricultores, camponeses, povos indígenas, comunidades tradicionais, pescadores, pequenos pecuaristas, coletores” dentre outros, que se estima serem compostos de cerca de 2,6 bilhões de pessoas - mais de um terço da população mundial. Apesar da grande maioria destes estarem em apenas um quarto das terras agrícolas, a FAO estima que a agricultura familiar é responsável por mais de 80% do valor dos alimentos consumidos em escala mundial. Ainda assim, 75% das pessoas subnutridas no mundo vivem em áreas rurais. Este paradoxo se deve em parte ao fato deste setor ter um potencial inexplorado de produção, tendo em vista que dentre aqueles que têm menos de 10 hectares, “apenas 2% são tecnificados, e mais de 70% têm apenas a força de seus músculos como ferramenta”. Daí a necessidade de se criar políticas públicas específicas para a agricultura familiar, que 6 permitam ganhos de produtividade com sustentabilidade - distribuindo renda, propiciando maior segurança alimentar e nutricional para as populações ruais e urbanas, e possibilitando um manejo sustentável dos recursos naturais e da agrobiodiversidade. Para garantir a consecução destes vários objetivos de forma simultânea, no longo prazo e com escala, é imprescindível a participação ativa e permanente dos movimentos sociais, em colaboração com instâncias governamentais da esfera local à nacional, na formulação, implementaçao, monitoramento e avaliação desta rede de políticas públicas. 17. Nesse contexto, os países do BRICS, que concentram 25% da população rural, (e mais de 40% da população total) do mundo, que foram responsáveis por quase metade do crescimento econômico mundial na primeira década do século XXI, e que retiraram neste processo centenas de milhões de pessoas da situação de pobreza e de insegurança alimentar, têm um papel central a desempenhar. As nossas políticas são de grande relevância para os países em desenvolvimento, pois têm gerado efeitos econômicos e sociais virtuosos que têm contribuído para a redução dos dois fenômenos interligados que são a fome e a pobreza. Ainda assim, devem ser redobrados os esforços para que a trajetória atual se mantenha e acelere, e, ecoando o Diretor Geral da FAO, José Graziano da Silva, a atual geração seja a primeira a vivenciar o cumprimento do objetivo sem precedentes, mas hoje atingível, de erradicar a fome no mundo. 7