O Nível de Inserção no Espaço Organizacional e as Percepções dos Indivíduos Sobre a
Relação com a Empresa
Autoria: Flavio Yukio Abbud Ynoue, José Roberto Gomes da Silva
Resumo: Relevantes mudanças organizacionais vêm ocorrendo nas últimas décadas, trazendo
diversas conseqüências para a estruturação do trabalho e para o modo de engajamento dos
indivíduos nas organizações. Uma dessas conseqüências é o estabelecimento de novas formas
de configuração do espaço organizacional. Este artigo analisa as percepções dos trabalhadores
que atuam em diferentes níveis de presença - ou ausência - no espaço físico de uma
organização, acerca das influências que esse aspecto exerce sobre a sua relação com a
empresa. Realizou-se estudo de caso em uma empresa multinacional instalada no Rio de
Janeiro, na qual co-existem três tipos diferentes de localização física de empregados: (a)
indivíduos que trabalham em tempo integral no escritório da empresa; (b) indivíduos que
atuam nas instalações dos clientes, no sistema de outsourcing; (c) indivíduos que trabalham
no sistema home-office. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas envolvendo
funcionários dos três grupos. O referencial teórico aborda as características do contexto de
mudanças nas organizações e os efeitos da flexibilização do trabalho, especialmente no que se
refere às consequências para os indivíduos, em termos de suas relações na empresa. Os
resultados apontam que determinadas expectativas dos indivíduos, além de outros elementos
que influenciam a formação dos contratos psicológicos, se diferenciam de acordo com o grau
de presença física no espaço organizacional. Por outro lado, aspectos como a identificação dos
indivíduos com a organização não se mostraram tão afetados por essa dimensão espacial.
Introdução
Cresce a necessidade de adaptação das organizações e dos indivíduos às flexibilizações
das relações de trabalho ocorridas nos últimos anos. O avanço tecnológico e a globalização
dos negócios, entre outros aspectos, têm contribuído para a criação de um novo sentido de
espaço e tempo para a realização do trabalho (SILVA; WETZEL, 2007). As pessoas podem
trabalhar não mais restritas a uma jornada específica de horas. Grupos localizados em
diferentes lugrares, com horários deslocados, podem ser integrados em um mesmo projeto.
Nesse contexto, o espaço físico organizacional passou a ter nova forma de caracterização e a
presença cotidiana no espaço físico da empresa não é mais um requisito para muitos
empregados. Cresce o número de empresas que oferecem aos empregados programas do tipo
home-office, ou teletrabalho, ou que os deslocam para atuar dentro das estruturas de clientes.
Segundo Sparrow (2000), tais mudanças podem trazer tanto vantagens quanto
desvantagens para as pessoas e para as organizações. Autores como Bastos e Borges-Andrade
(2002) e Silva e Vergara (2002) alertam, porém, para a influência dessas mudanças sobre a
visão dos indivíduos acerca de suas relações com as empresas, exigindo adaptação dos dois
lados dessas relações. Além disso, Sparrow (2000) observa que, nas últimas décadas, muitas
empresas desenvolveram formas de alocação alternativa de funcionários, levantando a
bandeira de flexibilidade, mas, segundo o autor (p.215), “não atentaram para a necessidade
de rever positivamente as condições requeridas de um novo contrato psicológico”.
O presente estudo focaliza uma multinacional do setor de Tecnologia da Informação-TI
cuja sede brasileira está instalada na cidade do Rio de Janeiro que oferece programas de
flexibilidade quanto à alocação física dos funcionários. Esses programas fazem parte de uma
iniciativa global de adaptação às novas demandas coorporativas. Trata-se de uma empresa
instalada no Brasil há mais de 90 anos com bases em diversas cidades do país. Atualmente,
conta com mais de dez mil funcionários no país e mais de 400 mil no mundo. Basicamente,
oferta produtos e serviços ligados a TI, incluindo consultorias e serviços financeiros.
No presente, mais de 40% dos seus funcionários trabalham fora dos escritórios
tradicionais. Grande parte dos funcionários está alocada nas instalações dos clientes, fazendo
telecomutação ou trabalhando de casa. Através desta flexibilidade, a empresa busca um
aumento do tempo gasto com os clientes, reduzindo as idas e vindas constantes, além da
economia de custos. Busca-se também permitir que os indivíduos tenham mais opções e assim
consigam melhor equilibrar os aspectos da vida pessoal e profissional. Assim, a empresa
acredita que pode conseguir maior retenção de talentos, e melhorar sua produtividade.
Existem hoje basicamente três tipos de categorias que caracterizam o tipo de alocação
de cada funcionário na empresa: (i) Cliente - funcionário designado a trabalhar nas instalações
de clientes; (ii) Trabalho em Casa (home-office) – funcionário cuja maior parte das tarefas é
executada a partir de seu domicílio; (iii) Escritório Tradicional - funcionário que executa
maior parte de seu trabalho num espaço físico determinado em alguma localidade da empresa.
O objetivo do estudo é o de identificar as percepções de indivíduos desses três grupos de
funcionários, acerca da influência que este nível de presença – ou ausência – no espaço da
organização exerce sobre suas relações de trabalho na empresa.
Após esta introdução, apresenta-se, a seguir, uma revisão de literatura sobre as
transformações organizacionais nas últimas décadas, a flexibilização do espaço e os reflexos
para as pessoas. Compõe-se também um referencial teórico para analisar as percepções dos
indivíduos sobre as relações de trabalho no atual contexto, envolvendo conceitos como
contrato psicológico, comprometimento e identificação organizacional. Descreve-se então a
metodologia do estudo, compreendendo entrevistas semi-estruturadas com indivíduos dos três
grupos de funcionários da empresa. São finalmente apresentados os resultados referentes às
principais categorias de análise decorrentes do estudo e, por último, as considerações finais.
Transformações organizacionais e a flexibilização do espaço
Bastos e Borges-Andrade (2002) verificam que as empresas enfrentam hoje grande
pressão para se adaptarem ao processo global de reestruturação produtiva, exigindo-lhes a
capacidade de criar novas formas de organização do trabalho e novos estilos de relações
sociais internas, diferentes do “modelo tradicional e burocrático” (p.32). Dellagnelo e
Machado-da-Silva (2000) observam que uma das características mais marcantes desses novos
modelos de organização é a busca por flexibilidade, visando à melhoria da tomada de decisão,
do compartilhamento de informação e da aprendizagem organizacional. Tais autores destacam
também que essa flexibilização tem se apoiado, em grande parte, no emprego da tecnologia e
em iniciativas de gestão como os programas de reestruturação, just in time e qualidade total.
Dewett e Jones (2001) e Sheng et al. (2005) também enfatizam o papel que as novas
tecnologias, sobretudo as de informação, vêm ocupando na busca pela criação de vantagem
competitiva das empresas, criando condições para a melhoria de eficiência e qualidade e para
o incremento da flexibilidade e da capacidade de inovação. Sparrow (2000), lembra, por sua
vez, que uma das maiores influências da TI nas empresas tem sido a possibilidade de integrar,
nas equipes de trabalho, uma mão-de-obra flexível e geograficamente dispersa.
Segundo Bradley e Woodling (2000), uma das conseqüências desse processo tem sido a
produção de uma nova visão do tempo e do espaço nas organizações. De acordo com Vergara
e Vieira (2005, p. 106), “nas organizações globais, características da atualidade, o tempoespaço é variável que apressa o tempo e diminui os espaços”.
Apesar do reconhecimento de que tempo e espaço não são duas dimensões plenamente
dissociáveis (MASSEY, 1994), optou-se, neste estudo, pelo foco mais específico na questão
do espaço, corroborando as reflexões de Giddens (1984) e Lefebvre (1991), autores que
argumentam que essa dimensão tem sido negligenciada na análise sociológica em geral – e na
análise organizacional, em particular – quando comparada com a noção de tempo.
Yeung (2005, p.220) descreve o conceito de espaço organizacional como “um tipo de
configuração espacial ou área constituída de relações contínuas entre organizações e dentro
das próprias organizações”, não se restringindo, portanto, a uma característica física.
Nenonem (2004), por sua vez, diferencia o espaço organizacional entre o ‘físico’, o ‘social’ e
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o ‘virtual’. O espaço físico englobaria os atributos concretos que estão ao redor dos indivíduos
no dia-a-dia. Já o espaço social se refere ao ambiente interativo, sendo esse impactado pelo
espaço físico porém não restrito a ele. Finalmente, há o espaço virtual oriundo do
desenvolvimento da tecnologia da informação (vídeo conferências, Internet, Intranet, etc.).
Vergara e Vieira (2005) ressaltam que a noção de espaço e suas formas representativas
mudaram acentuadamente, nas sucessivas teorias no campo dos estudos organizacionais que
surgiram ao longo do século XX. Motta e Vasconcelos (2002) lembram que na Teoria Clássica da
Administração, o espaço organizacional era fisicamente bem definido e a preocupação era a de
maximizar a capacidade e eficiência da produção. Gibson (2003) observa, porém, que, no atual
contexto, as alternativas de organização do espaço físico representam um dos mais importantes tipos
de flexibilidade adotados pelas empresas. A autora distigue três tipos principais de flexibilização das
relações de trabalho: dos contratos (ex: contratos temporários; subcontratações); de horários (ex:
trabalho em meio-período; esquemas de compensação de horas); de local (ex: trabalho de casa, nas
estruturas de clientes, em escritórios satélites e outros ambientes fora da empresa).
Um tipo de configuração que tem recebido especial atenção na literatura que trata da
flexibilização do espaço organizacional é a do teletrabalho (APGAR, 1998; HILL et al.,
1998; MANN; HOLDSWORTH, 2000; ROBERTSON, 2000; SULLIVAN, 2003;
TREMBLAY, 2002). Autores como Apgar (1998), Mann e Holdsworth (2000), Robertson
(2000) e Sullivan (2003) utilizam definições mais genéricas para o teletrabalho, como o tipo
de trabalho realizado de modo remoto, fora dos escritórios tradicionais das empresas,
utilizando-se da tecnologia de informação e de comunicação. Outros autores, como Nilles
(1997) e Tremblay (2002) diferenciam, porém, as situações que hoje podem ser classificadas
como teletrabalho e que envolvem arranjos espaciais distintos, tais como: (a) quando os
indivíduos trabalham de suas residências; (b) quando trabalham em espaços externos ao
escritório central da organização, como, por exemplo, telecentros ou escritórios-satélites; (c)
quando trabalham em regime de mobilidade, ou seja, não têm um lugar fixo para realizar suas
atividades (como alguns representantes de vendas e técnicos). Tremblay (2002) também
aponta diferenças quanto à parcela de tempo dedicada à atuação remota, havendo os que o
fazem em tempo integral, em tempo parcial ou até mesmo de modo casual.
Segundo Gibson (2003), a flexibilização do espaço organizacional serviria, por um lado,
para atender às necessidades de redução de custos e de mudanças estratégicas nos processos
das empresas; mas serviria também para elevar a motivação nos funcionários de nível mais
operacional, fornecendo-lhes melhores meios de equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.
Particularmente no que se refere à adoção do trabalho remoto, Tremblay (2002) observa que
as principais motivações das empresas estariam relacionadas com o aumento de produtividade
e da qualidade do trabalho, além da redução dos espaços de escritórios e, conseqüentemente
dos custos. A autora ainda ressalta que a adoção desse tipo de flexibilidade atende também a
algumas expectativas da sociedade, reduzindo, por exemplo, o número de pessoas que se
deslocam diariamente para as empresas e, portanto, o fluxo caótico de veículos e a poluição
nas grandes cidades. Robertson (2000) também comenta que algumas formas flexíveis de
localização espacial dos empregados tendem a aproximá-los dos clientes, fazendo com que
eles dediquem mais tempo a essa relação. Além disso, segundo esse autor, do ponto de vista
das empresas, um dos objetivos principais de tais mudanças seria o de ajudá-las a criar um
contexto de trabalho mais dinâmico, flexível, desafiador, comunicativo e agradável.
Reflexos para as pessoas e para as relações de trabalho
Diferentes autores têm ponderado, no entanto, que as mudanças no espaço não
influenciam somente a forma de realização dos objetivos organizacionais: elas trazem também
conseqüências importantes – e nem sempre positivas - para os indivíduos.
Apgar (1998) considera que, ao permitirem que os indivíduos escolham o espaço mais
adequado para realização do trabalho, as empresas conseguem atrair e reter pessoas talentosas
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e mais motivadas. Por outro lado, Robertson (2000) argumenta que um dos grandes desafios
da gestão de pessoas no atual contexto é justamente o de atrair e reter funcionários experientes
capazes de realizar o trabalho remoto com qualidade. Felstead et al. (2003) chamam a
atenção também para as dificuldades que as organizações enfrentam para controlar o trabalho
dos indivíduos que atuam nesses tipos de configuração. Gibson (2003) e Homem e Dellagnelo
(2006) alertam, ainda, para a necessidade de adaptação cultural da organização e de adaptação
psicológica dos indivíduos que essas novas configurações requerem. Lindahl (2004) observa
que as relações entre os indivíduos e a organização são impactadas por características
ambientais como a forma de apropriação do espaço e o sentido de privacidade; e essas são
afetadas pelas mudanças na configuração espacial. Vergara e Vieira (2005) também apontam
possíveis custos que as novas formas de flexibilização do trabalho trazem para os indivíduos:
São mudanças que afetam as formas organizacionais, tornando-se, a partir dos
novos modelos, mais ágeis, eficientes e otimizadas em custos. Podem também se
tornar cruéis, imprimindo sobre os indivíduos formas de controle menos visíveis e,
portanto, de grande caráter manipulador e coercitivo (p.113).
Nenonen (2004) cita outra possível conseqüência negativa relacionada às novas formas
de organização espacial do trabalho. Segundo o autor, o trabalho virtual pode, por exemplo,
ser visto pelos indivíduos como uma ameaça de isolamento social.
No que se refere aos possíveis benefícios de algumas conifigurações flexíveis – como o
teletrabalho - para os indivíduos, Apgar (1998) menciona como um dos mais importantes o
maior controle do próprio tempo e a maior possibilidade de dedicação à vida pessoal. Esse
benefício seria maior ainda para aqueles que têm filhos em idade de serem cuidados (MANN;
HOLDSWORTH, 2000), principalmente as mulheres (TREMBLAY, 2002). Segundo
Robertson (2000) a flexibilidade tende a tornar as pessoas mais motivadas e mais produtivas.
Apesar de confirmarem esses benefícios em suas pesquisas, Hill et al. (1998) questionam,
porém, o custo pessoal que podem ser a eles associados, já que os exercícios de autocontrole e
de equilíbrio do trabalho com outras demandas da vida não são tão simples.
Em seu estudo, Mann e Holdsworth (2000) também confirmaram alguns benefícios que
constumam ser associados ao teletrabalho, entre os quais a liberação do estresse do
deslocamento e das interrupções que ocorrem no ambiente do escritório. Mas verificaram
igualmente impactos negativos para os teletrabalhadores. Algumas das principais queixas que
os entrevistados de tal estudo revelaram foram: sentimento de isolamento social; síndrome de
“presenteísmo” (trabalhar mesmo quando doente); falta de apoio organizacional; falta de
prospecção de carreira; dificuldade de estabelecer limites entre vida pessoal e profissional.
Em outro estudo com teletrabalhadores, Tremblay (2002) constatou que a maioria de
seus entrevistados citou como voluntária a decisão de migrar para esse tipo de configuração,
apesar de ser também incentivada pelas organizações. De forma geral, mostravam-se
satisfeitos com a escolha, mas mencionaram também as dificuldades do processo de
adaptação, principalmente no que se refere à convivência do espaço da casa e do trabalho.
Ainda assim, algumas das principais dificuldades que enfrentavam não eram necessariamente
associadas à condição de teletrabalhadores. Um exemplo disso, diz a autora, é a questão do
estresse, uma característica presente nas relações de trabalho em geral, no atual contexto, em
função das demandas intensas por prazo e qualidade. E, apesar das dificuldades, os benefícios
da mudança se mostravam compensadores, quando comparados com os da vida no escritório.
Um quadro de referência para analisar das relações de trabalho no contexto flexível
Autores como Furnham (2000), Mumford (1995) e Sparrow (2000) argumentam que não
se pode analisar a lógica das atuais relações de trabalho, no contexto flexível, utilizando-se as
mesmas premissas e conceitos tradicionalmente adotados para se discutir o emprego formal
de longo prazo e jornada contínua nos escritórios. No presente estudo, para analisar as
percepções dos três diferentes grupos de indivíduos acerca das suas relações com a empresa
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em questão, foram escolhidos, então, alguns conceitos apontados por esses autores como mais
adequados para se captar o nível de subjetividade de tais percepções. Entre eles, destacam-se
as noções de contrato psicológico, carreira, comprometimento e identificação organizacional.
Mumford (1995) e Rousseau (1995) observam que, no atual contexto, as relações de
trabalho tendem a se definir mais por elementos subjetivos, não-escritos e informais do que
pelo estabelecimento de um contrato formal, o qual, em muitos casos, sequer existe. O
conceito de contrato psicológico seria, então, mais apropriado para analisar esses elementos
mais subjetivos. Handy (1993) define contrato psicológico como um conjunto de expectativas
mantidas por ambos os lados da relação de trabalho. Rousseau (1995), por sua vez, o associa
mais exclusivamente à visão do indivíduo sobre sua relação com a empresa, em termos das
obrigações que ele percebe como recíprocas. McDonald e Makin (2000) ressaltam que essas
expectativas tendem a se alterar à medida que evolui a relação do indivíduo com a empresa.
Na literatura sobre o tema, tem sido comum a classificação dos contratos psicológicos
entre dois tipos: os transacionais e os relacionais (ROUSSEAU, 1995). Os contratos
psicológicos transacionais tendem a ter caráter mais instrumental, baseado na visão de trocas
específicas e quantificáveis (WETZEL, 2001), envolvendo, em geral, maior expectativa de
recompensa monetária (ROUSSEAU, 1995). McDonald e Makin (2000) observam que, nesse
caso, o foco tende a ser de curto prazo e a lealdade à organização tende a ser reduzida. Os
contratos fundamentados em uma visão mais relacional, por sua vez, tendem a focalizar mais
os fatores emocionais que regem a ligação entre os indivíduos e as organizações, envolvendo
maior senso de lealdade, comprometimento e dedicação (MAGUIRE, 2002), além de terem
perspectiva de mais longo prazo (COYLE-SHAPIRO; KESSLER, 2000). McDonald e Makin
(2000) sugerem que a composição de um contrato psicológico mais transacional ou relacional
pode estar associada, entre outros fatores, à natureza do próprio contrato formal do indivíduo
com a organização. Assim, supõe-se, por exemplo, que um trabalhador temporário desenvolva
um foco mais transacional do que relacional, se comparado a um empregado regular. Os
autores lembram, porém, que elementos transacionais e relacionais tendem a estar, ambos,
sempre presentes nos contratos psicológicos dos indivíduos, em proporções distintas.
A natureza dinâmica do contrato psicológico pode levar o indivíduo a frustrar suas
expectativas ou até mesmo a desenvolver um sentimento de ruptura (McDONALD; MAKIN,
2000). Roehling (1997) destaca alguns tipos de conseqüências quando o indivíduo
desenvolve a percepção de violação do contrato psicológico: sentimentos de ressentimento e
frustração; redução da motivação, da satisfação e do comprometimento com o trabalho.
Wetzel (2001) verifica que, com as mudanças organizacionais típicas do atual contexto,
cresce a necessidade de as empresas renegociarem os termos dos contratos psicológicos
vigentes. Mas Coyle-Shapiro e Kessler (2000) observam que as empresas enfrentam grande
desafio para negociar e gerenciar essa transição, uma vez que são incapazes de manter as
bases dos antigos acordos com os funcionários. Um exemplo dificuldade se refere à carreira.
No passado não tão distante, as carreiras tendiam a ser traçadas em única organização que se
responsabilizava por cuidar da vida profissional dos indivíduos. Chandler e Kram (2005)
observam que, hoje, as carreiras estão mais entregues ao gerenciamento do próprio indivíduo.
Já as empresas passaram a ser as supostas mediadoras nesse processo, fornecendo meios e
suporte para o desenvolvimento de seus funcionários (BARNETT; BRADLEY, 2007).
De acordo com Maguire (2002), entre outras conseqüências, esse processo tem
resultado no crescimento de uma perspectiva mais individualista e na redução do sentido de
lealdade às organizações. Borges et al. (2004) também ponderam que as dificuldades
motivacionais, as culturas organizacionais mais frágeis e a ausência de perspectivas de
carreira, impactam o comprometimento dos indivíduos com as empresas.
Grande parte da literatura mais recente que trata do comprometimento organizacional se
baseia no modelo de Meyer e Allen (1991), autores que identificam três tipos principais de
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fatores que compõem o comprometimento: os afetivos, os normativos e os de continuação. O
comprometimento afetivo é relacionado ao grau de identificação do indivíduo com a
organização. Já o comprometimento de continuação envolve o nível de necessidade do
indivíduo para continuar trabalhando nela. O comprometimento normativo, indica o quanto as
normas sociais influenciam na decisão dos indivíduos em se comprometerem com a empresa.
McDonald e Makin (2000, p.86) sintetizam essas vertentes do comprometimento: “as pessoas
trabalham para uma empresa específica porque elas querem (afetivo), elas precisam (de
continuação) ou pelo fato de elas acharem que devem fazer parte da empresa (normativo)”.
Bastos e Borges-Andrade (2002) observam que o comprometimento com a organização,
sobretudo o afetivo, tende a ser reduzido no atual contexto; e os indivíduos tendem a reforçar
mais o comprometimento com os próprios objetivos. Entre outros aspectos, eleva-se, por
exemplo, a importância atribuída à qualidade de vida (OLIVEIRA; LIMONGI-FRANÇA,
2005; PAIVA; COUTO, 2008). Nesse contexto, Rousseau (1995) pondera, as relações de
trabalho tendem a ter um foco mais transacional, em detrimento dos aspectos relacionais. Isso
traz conseqüências também para a identificação dos indivíduos com as organizações
(MAGUIRE, 2002; SILVA; VERGARA, 2002).
A Teoria da Identidade Social associa o processo de identificação à semelhança ou
atração percebida pela pessoa com relação aos objetos de seu contexto social (TAJFEL,
1982). Quando esse objeto é a própria organização, a identidade organizacional torna-se uma
referência importante para o indivíduo (GIOIA et al., 2000). Para Machado (2005), a
identidade organizacional é constituída “pelo conjunto de representações que seus
integrantes formulam” (p.2) sobre a organização. Albert e Whetten (1985) afirmam que a
identidade organizacional é composta de três aspectos baseados nas crenças compartilhadas
entre os funcionários. Os autores acreditam que existe um fator central que representa a
essência da empresa, um fator distintivo que diferencia a empresa das demais (missão,
cultura, ideologia, valores) e um fator duradouro que apresenta as influências da continuidade
temporal na sobrevivência da empresa. Autores como Gioia et al (2000) e Silva e Vergara
(2002) observam que as formas de configurações do trabalho e as ações corporativas de
gestão das pessoas são fortemente influenciadoras tanto das identidades dos indivíduos
quando da maneira como eles percebem a identidade da organização e se identificam com ela.
Metodologia
Esta pesquisa utilizou o método de estudo de caso (YIN, 1994), buscando a percepção
de três grupos de funcionários que se alocam fisicamente de forma distinta, acerca de sua
relação de trabalho com a empresa focalizada. Trata-se de pesquisa de natureza qualitativa e
de caráter exploratório (GIL, 2006). A coleta de dados ocorreu por meio de 15 entrevistas,
sendo cinco com funcionários localizados nas instalações de clientes (G1), cinco com
funcionários home-office (G2) e cinco com funcionários do escritório tradicional (G3). Todos
são funcionários regulares da empresa, no regime CLT.
Um dos autores deste estudo é funcionário da empresa em questão. Assim, os
entrevistados dos grupos G1 (Clientes) e G3 (Escritório) foram selecionados a partir da rede
de contatos desse pesquisador. Entre os entrevistados que trabalham nas instalações de
clientes (G1): dois estão alocados na sede de uma grande rede de televisão e prestam serviços
de consultoria; um é técnico e trabalha fisicamente em uma empresa ligada à indústria do
Petróleo; dois estão alocados em uma empresa de saúde prestando serviços especializados. Na
seleção dos entrevistados do escritório corporativo (G3), escolheram-se pessoas de áreas
diferentes da empresa. Para a seleção dos entrevistados home-office (G2) solicitou-se ajuda do
setor de recursos humanos. Na seleção de todos os entrevistados utilizou-se como critério o
tempo mínimo de três anos como funcionários da empresa, sendo que há indivíduos com até
22 anos de casa. Procurou-se também um equilíbrio de gênero, tendo sido escolhidos para o
estudo sete homens e oito mulheres. O Quadro 1 apresenta o perfil geral dos entrevistados.
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Quadro 1 – Perfil dos entrevistados
Entrevistado
E1
E2
E3
E4
E5
E6
E7
E8
E9
E10
E11
E12
E13
E14
E15
Perfil
Mulher. Formação técnica em Processamento de Dados com pós-graduação em
Finanças. Trabalha há 22 anos na organização, sempre alocada no escritório tradicional
Mulher. Trabalha há 4 anos na empresa, sendo todos de forma regular no espaço físico
da empresa. Formação acadêmica em Economia e Nutrição
Homem. Há quase três anos trabalha como home-office. Contudo somam-se 17 anos de
funcionário regular da empresa. Engenheiro com MBA em Administração Financeira
Mulher. Formação acadêmica em Publicidade com Pós-graduação lato sensu em
Marketing. Há dez anos na empresa e com três anos e meio no esquema home-office
Mulher. Há 17 anos funcionária da empresa. Dedicada integralmente a um cliente há
oito anos. Formada em Fonoaudiologia
Mulher. Com graduação em Economia e Mestre em Administração, está há dez anos na
empresa. Sempre trabalhou nas instalações tradicionais
Homem. Há três anos é funcionário da empresa e durante todo o tempo esteve alocado
nas instalações de um cliente. Formado em Administração de empresas
Mulher. Formação em Desenho Industrial com MBA em Gestão de Negócios. Trabalha
na empresa há dez anos e há cinco trabalha como home-office
Homem. Há dez anos como funcionário regular da empresa, está há quase dois anos
trabalhando de casa. Formação em técnico em Gestão de Ambientes com Software Livre
Mulher. Analista de Sistemas com Pós-graduação. Trabalha há quase 16 anos na
Empresa e há dois anos e dez meses no esquema home-office
Homem. Formado em Economia. Trabalha há seis anos na empresa e sempre se
manteve fisicamente alocado nas instalações tradicionais da empresa
Homem. Há sete anos como funcionário regular da empresa, de dedica há quase quatro
anos a um cliente. Formado em Engenharia
Homem. Há quatro anos na empresa e sempre alocado nas instalações tradicionais.
Formado em Administração de Empresas
Mulher. Formação em Matemática e Informática. Trabalha há 11 anos para a empresa e
há seis está dedicada a um cliente
Homem. Há oito anos na empresa, está há três anos alocado nas instalações físicas de
um cliente. Formação em Informática com ênfase em análise de sistemas
Grupo
G3
G3
G2
G2
G1
G3
G1
G2
G2
G2
G3
G1
G3
G1
G1
As entrevistas tiveram duração média de 30 minutos e foram realizadas nos primeiros
meses de 2008. Com a autorização dos funcionários, assegurado o seu anonimato, todas foram
gravadas e transcritas. O roteiro de entrevistas foi dividido em dois blocos. O primeiro bloco
continha um elenco de questões que buscavam captar as percepções do indivíduo sobre a sua
relação com a empresa, envolvendo: as expectativas pessoais; as expectativas da empresa; o
comprometimento com os valores e objetivos da empresa. O segundo bloco de perguntas
buscava captar a visão comparativa do indivíduo sobre as realidades dos três grupos, em
termos: das diferenças de identificação com a empresa; do comprometimento de cada grupo;
das oportunidades de carreira; dos benefícios ou dificuldades decorrentes da flexibilização.
Os conteúdos transcritos foram categorizados com base em temas oriundos do
referencial teórico e em outros que emergiram nas entrevistas. Para cada categoria de análise,
gerou-se arquivo texto específico em que os correspondentes fragmentos de fala dos
entrevistados eram adicionados. Ao final do processo, o conjunto de fragmentos em cada
categoria foi analisado separadamente. As principais categorias de análise, em torno das quais
são apresentados os resultados a seguir, são: influências sobre os contratos psicológicos;
influências sobre o comprometimento; influências sobre a identidade e a identificação com a
organização; influências sobre a carreira; influências sobre a qualidade de vida.
Influências sobre o contrato psicológico
Procurou-se analisar se os indivíduos percebem alguma influência do nível de inserção
ou de distância do espaço físico da organização sobre os elementos que compõem seus
contratos psicológicos com a empresa (ROUSSEAU, 1995). A maioria citou tanto aspectos
relacionais quanto transacionais, em suas expectativas na relação com a empresa,
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corroborando a visão de McDonald e Makin (2000) de que os contratos psicológicos podem
focalizar os dois tipos de aspectos, embora eles tendam a ter pesos diferentes. No caso
estudado, percebem-se diferenças na visão revelada pelos indivíduos dos três grupos.
Para aqueles que trabalham de casa (G2), a própria flexibilidade se mostra um elemento
importante de seu contrato psicológico. Além disso, aspectos mais relacionais do contrato,
como realizar-se e obter e reconhecimento, parecem também ter peso maior para eles. É o
caso de E10, analista de sistemas há 16 anos na organização e há quase três trabalhando de
casa: “Eu costumo dizer ao meu chefe que trabalho pelo prazer de contribuir e fazer a
diferença. (...) Ver esta contribuição reconhecida é o que mais me motiva (E10,G2).
Por outro lado, aspectos mais transacionais, como os monetários (salário, prêmios)
mostraram-se mais relevantes para os que trabalham na estrutura tradicional do escritório
(G3). E6 expõe essa preferência de forma mais enfática: “O que compensa meu trabalho é
salário; puro e simples; (...) é claro que existem outros benefícios bem importantes, mas de
uma forma geral sou partidária da frase - ‘prefiro sempre a minha parte em dinheiro’”
(E6,G3). Outros, como E11, expõem tal preferência de forma mais indireta:
Espero o reconhecimento dos meus líderes, dos meus liderados e dos meus pares, e
que isto se transforme em compensações financeiras. (...) Também procuro
estabelecer um nível de confiança suficiente com os meus superiores para tentar, em
breve, trabalhar de casa (E11,G3).
Conforme essa fala sugere, uma possível explicação para a diferença de ênfase nos
aspectos transacionais e relacionais parece estar associada à idéia de que, para se chegar ao
ponto de trabalhar em casa, sem que isso represente ameaça para o indivíduo na empresa, é
preciso que ele já tenha desenvolvido com ela uma perspectiva mais relacional, de maior
confiança. Mas, para isso, pesam outros fatores como o tempo de trabalho na empresa.
Aqueles que trabalham nas instalações dos clientes demonstraram maior equilíbrio entre
os aspectos transacionais e relacionais do contrato psicológico. Alguns disseram, por
exemplo, que esperam que a recompensa monetária, mais transacional, seja acompanhada do
reconhecimento profissional, um aspecto mais relacional. É o caso de E15, empregado que
trabalha há três anos na estrutura de um cliente: “A compensação de trabalhar para a minha
empresa é o reconhecimento que pode ser dado, seja ele material (aumentos, promoção ou
prêmios) ou o reconhecimento dado ao trabalho, com boas práticas de elogios” (E15,G1).
Observaram-se, ainda, as expectativas que os entrevistados acreditam que a empresa
deposita sobre eles, o que, segundo Rousseau (1995) é também um componente da formação
do contrato psicológico. Nesse aspecto, há maior coincidência na visão das pessoas dos três
grupos. A maioria menciona como principais atributos requeridos dos funcionários:
dedicação, confiança, integridade e comprometimento. Um exemplo é o de E3, que há dois
anos trabalha de casa, porém já vivenciou por mais de dez anos o cotidiano da escritório. Ele
citou diversas vantagens de que passou a usufruir com a mudança, tais como praticar
exercícios, levar e buscar os filhos no colégio, e dispor de tempo para resolver problemas de
casa. Porém crê que a empresa também espera benefícios recíprocos: “eu entendo que a
empresa espere de mim comprometimento, adequação aos seus valores e excelência na
execução das tarefas” (E3,G2). E2, que sempre trabalhou no escritório, também vê essa
demanda da companhia: “Acredito que querem que eu tenha comprometimento com os
objetivos da organização (...), além de alto desempenho e capacidade de inovação” (E2,G3).
Talvez essa percepção mais homogênea acerca das demandas da empresa se deva, em
parte, a um esforço de comunicação corporativa. Vários entrevistados citam a existência de
uma sofisticada estratégia de comunicação interna e de políticas de recursos humanos capazes
de transmitir os valores e objetivos da empresa, mesmo para aqueles que trabalham de casa ou
nas instalações de clientes. Ainda assim, a dispersão espacial não teria trazido algum tipo de
prejuízo para a comunicação na empresa? Alguns funcionários mais antigos falaram de forma
8
saudosa de uma época em que não havia tanta distância entre as expectativas dos indivíduos e
dos gestores. Com 22 anos na organização, E1 relembra, por exemplo, esse passado:
Quando eu entrei na companhia, não existia o estresse que tem hoje. As pessoas,
digo, os gerentes e os funcionários, se respeitavam mais e se entendiam melhor. (...)
A empresa mudou e a gente precisou se adaptar às mudanças (E1,G3).
Para alguns indivíduos, como E11, funcionário do escritório (G3), o fato de a empresa
oferecer alternativas flexíveis de trabalho é um sínal de que ela mantém o valor de respeito ao
ser humano, apesar da maior pressão exigida dos funcionários:
Eu tenho sentimentos de orgulho em trabalhar em uma grande empresa, que busca
a implementação de programas de crescimento na carreira profissional e respeito
ao ser humano (...). Porém, sei que há diversos problemas causados pelo
descontrole na pressão por resultados. (E11,G3).
Mas alguns entrevistados deixam claro que, para eles, essa flexibilização do local de
atuação não se deve a uma atitude de benevolência da empresa, mas sim aos interesses do
negócio. A principal argumentação é a de que a flexibilidade tornou-se requisito de
sobrevivência de todas as empresas. A fala de E1 ilustra esse tipo de argumento:
Nós entramos em uma era de empresas globalmente integradas em que o local físico
do funcionário não é relevante para uma grande parte das atividades (...). Ao
contrário, é importante termos, por exemplo, funcionários trabalhando de casa em
uma região onde não existe fisicamente um escritório ou filial (E1,G3).
Os resultados apresentados nessa categoria sugerem que existe algum tipo de influência
da distância física do espaço do escritório sobre a maneira como os indivíduos lidam com os
elementos de seu contrato psicológico, especialmente no que se refere à maior ênfase sobre os
aspectos transacionais ou relacionais desse contrato. Mas não é possível afirmar que essa seja
uma dimensão que tenha peso predominante sobre os contratos psicológicos. Outros
elementos que configuram os contornos da relação de trabalho, tais como as expectativas da
empresa, o nível de pressão e o reconhecimento podem ter também peso significativo.
Influências sobre o comprometimento
Embora as bases de formação e manutenção do contrato psicológico guardem elementos
comuns aos antecedentes do comprometimento organizacional, considerou-se relevante
dedicar um item específico de análise sobre esse aspecto. Conforme abordado no item
anterior, a maioria dos entrevistados acredita que o forte comprometimento é uma das maiores
expectativas da empresa sobre os funcionários. Quase todos se declararam comprometidos
com a empresa, mas consideram que esse comprometimento ocorre mais por conta das suas
próprias personalidades e do fato de os valores da organização serem compatíveis com os seus
valores pessoais do que pela forma como são alocados fisicamente. É o caso de E6,
funcionária do escritório (G3) que revela uma perspectiva mais normativa, ligada a um senso
de dever moral (MCDONALD; MAKIN, 2000) no seu comprometimento:
Comprometimento está muito mais ligado a caráter e perfil do que ao local onde a
pessoa trabalha. (...) Eu me sinto comprometida com o meu trabalho. Tenho que
fazer meu trabalho obrigatoriamente em linha com o objetivo da empresa. Do
contrario eu não serei bem avaliada. (...) Quanto a valores, (...) se a empresa onde
eu trabalhasse tivesse valores diferentes dos quais eu acredito eu e não me sentiria
confortável e provavelmente não ficaria muito tempo (E6,G3).
A entrevistada E1 afirma mais claramente que não é preciso estar presente no dia-a-dia
da empresa para ser comprometido: “digamos que o comprometimento é ‘virtual’... meu
comprometimento não é afetado quando trabalho de casa ou ‘on site’” (E1,G3). Essa mesma
opinião é expressa por entrevistados dos outros dois grupos, tais como E4(G2) e E5(G1).
Todavia, alguns indivíduos que hoje atuam no espaço físico de um terceiro (cliente),
consideram que as bases do comprometimento não são uniformes entre os grupos. Para E15,
9
analista de sistemas alocado em um cliente há três anos, a cultura e os valores do cliente
podem interferir no grau de comprometimento do funcionário com a empresa:
Manter o comprometimento de um funcionário que é alocado dentro de um cliente
se torna perigoso, tendo em vista que o funcionário receberá cultura e contato
direto da empresa à qual está alocado e em muitas das vezes poderá ‘vestir a
camisa’ do cliente e perder o contato com sua empresa (E15,G1).
Assim, observa-se que não há consenso sobre a influência ou não da distância física
sobre o comprometimento dos indivíduos. Embora predominem opiniões que negam essa
correlação, alguns indivíduos citam que ela pode ocorrer. De qualquer forma, alguns
acreditam que a vivência no dia-a-dia da empresa pode ajudar a criar as bases que sustentam o
comprometimento. Nesse sentido, observa E3, empregado home-office, passar um período
inicial no escritório da empresa pode ajudar a estabelecer maior comprometimento com ela:
Acredito que funcionários experientes (...) que tenham assimilado bem os valores da
empresa possam migrar para os outros grupos e ainda assim manterem tais valores
e níveis de comprometimento, sem problemas. (...) Contudo, para funcionários que
tenham começado na empresa já diretamente como home-office ou nas instalações
de clientes, creio que esta tarefa seja bem mais difícil (E3,G2).
Quanto ao tipo de comprometimento (MEYER; ALLEN, 1991) predominantemente
manifestado nos discursos dos entrevistados, observa-se que a ênfase maior tende a ser sobre
elementos de caráter normativo, principalmente associados ao cumprimento de objetivos e ao
alinhamento com os valores da empresa. Isso não significa, porém, que os componentes
afetivos e de continuação não estejam presentes. Mas ver-se-á no próximo item que as
mudanças que vêm ocorrendo na empresa e, conseqüentemente, nas relações que ela
desenvolve com os funcionários, parecem vir enfraquecendo o comprometimento afetivo,
mais associado à identificação com a organização. Isso reforça as observações de CoyleShapiro e Kessler (2000) e Maguire (2002), para quem o comprometimento aliado à lealdade
de longo prazo não tende a ser uma característica forte nas atuais relações de trabalho.
Influências sobre a identidade e a identificação com a organização
Nessa categoria, procurou-se verificar se os entrevistados consideram que o seu grau de
inserção ou distanciamento do espaço físico da empresa influencia suas identidades e sua
identificação com a organização. A maioria afirmou que se sente identificada e acredita que
possui o perfil desejado pela companhia. E3, que faz uso da flexibilidade de trabalhar de casa,
sente-se identificado com o perfil que a empresa deseja, pois crê que tem certas qualidades
hoje requeridas: “Sinto-me bem encaixado na função que desempenho atualmente, onde
posso contribuir fazendo uso das características que acredito que possuo: organizado,
disciplinado, objetivo e focado nas necessidades dos meus clientes internos” (E3,G2). As
características tidas pela maioria como desejadas pela empresa também são sintetizadas por
E7, funcionário que atua nas instalações de um cliente (G1): “sinto que tenho o perfil que a
empresa precisa - sou jovem, dinâmico, tenho espírito inovador e sou focado no cliente”.
Por sua vez, E1, funcionária localizada no escritório, observa que mais do que ter um
perfil específico, é preciso saber acompanhar a dinâmica das mudanças organizacionais, para
melhor se adaptar ao perfil que a empresa venha a requisitar: “Me sinto super identificada!
(...) A minha principal característica é a adaptabilidade. (...) Funcionários só permanecem
por longo tempo nesta companhia se se adaptam às mudanças” (E1,G3).
De qualquer forma, alguns empregados mais antigos, independente do grau de presença
física na organização, disseram que embora no passado também fossem identificados com a
empresa, se sentiam mais integrados. Para E10, que hoje trabalha em home-office, a redução
desse sentimento de integração não se deu pelo fato de ter optado por trabalhar de casa, mas
sim, às mudanças pelas quais a empresa passou nos últimos anos:
Me sinto identificada com a minha empresa, porém já me senti mais encaixada (...).
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Atualmente percebo que a pressão é tanta que alguns valores mudaram ao longo
dos anos (...). Mas não associo isso ao fato de estar fisicamente fora do espaço da
empresa, mas sim às enormes mudanças (...) nestes 16 anos (E10,G2).
Também alguns indivíduos deslocados para as instalações dos clientes, como E5,
disseram que se sentem menos integrados com a empresa:
Quando trabalhava dentro da empresa, me sentia totalmente como parte integrante
da empresa (...). Há três anos trabalhando no site do cliente, sinto que perdi parte
desse vínculo. Uso máquina da empresa, ferramentas da empresa, todo meu
trabalho continua sendo para a empresa, mas tudo de um modo diferente (E5,G1).
Vários entrevistados consideram que os indivíduos que trabalham no escritório têm
mais facilidade de se identificar com a empresa. Alguns deles argumentam que a proximidade
física dos gestores no escritório pode fortalecer as bases dessa identificação. E10, que trabalha
em casa (G2), acredita que a presença no dia-a-dia da empresa permite participação mais ativa
dos indivíduos, criando maiores oportunidades de identificação:
Muitas informações relevantes são disseminadas nos corredores e no cafezinho.
Acho que o contato freqüente com colegas possibilita ampliar a visão sobre os
acontecimentos na empresa e possivelmente a formar esta identidade (E10,G2).
O entrevistado E7 chega a criar uma suposta escala de níveis de identificação ou de
participação na formação da identidade organizacional, em função da forma de localização:
Creio que o pessoal ‘regular’ pesará mais na construção de uma identidade
organizacional. O meu grupo em segundo lugar, porque mesmo trabalhando no site
do cliente existem relações interpessoais entre os funcionários da empresa. Já os
home-offices eu colocaria em terceiro lugar, pois creio que o trabalho isolado em
casa pode influenciar negativamente a construção de uma identidade (E7,G1).
Na opinião de E1, existe ainda um longo caminho para que os relacionamentos mais
virtuais sejam vistos como naturais nas empresas em geral:
Eu acho que é mais fácil construir a identidade organizacional vivenciando o dia-adia da empresa (...), pois o contato virtual necessário para os outros dois grupos
ainda não foi incorporado à rotina das pessoas. As barreiras tecnológicas já estão
sendo resolvidas. Entretanto necessita de uma mudança comportamental (E1,G3).
Esses resultados parecem sugerir que a maior inserção no espaço físico da empresa pode
facilitar a identificação do indivíduo com ela, apesar de a maioria dos entrevistados da
pesquisa afirmar que se sente identificada, independente da forma como está alocada.
Influências sobre as carreiras
Nos três grupos, observou-se que as percepções dos indivíduos sobre suas carreiras
podem ser também impactadas pela localização física. Predomina a crença de que há mais
oportunidades de carreira para os que trabalham no escritório, por viverem o dia-a-dia da
empresa, e possuirem maior visibilidade. Mas há aqueles como E7 - alocado nas instalações
de um cliente - que também vêem oportunidades para as pessoas em sua condição:
O pessoal do prédio tem mais chances de crescimento dentro dos padrões da
empresa que os outros, apenas por estarem mais próximo das pessoas que decidem.
(...) Já o pessoal que fica alocado nos clientes pode ter mais oportunidades no que
diz respeito à substituição de recursos mais seniors, digo, preenchendo buracos,
uma vez que o relacionamento com o cliente pode ser mais importante que o próprio
desenvolvimento técnico e profissional (E7,G1).
Vários entrevistados compartilham, porém, a opinião de que para os que trabalham no
regime home-office as oportunidades de carreira tendem a ser menores, em função do
isolamento, da falta de visibilidade e da menor participação em programas de
desenvolvimento, entre outras razões. Para E8, isso, de certo modo, até mesmo atenua o
benefício de se trabalhar em casa: “as pessoas precisam ser vistas para serem lembradas; (...)
11
encaro o home-office como um benefício para a minha vida pessoal mas acredito que não é o
melhor para a carreira” (E8,G2). Outros que atuam nesse regime, como E3, acreditam,
porém, que o benefício percebido depende do que é considerado prioritário pelo indivíduo:
Eu penso que o grupo dos ‘regulares’ possuirá, em longo prazo, mais oportunidades
de carreira. (...) Acredito que a minha está sendo bem administrada, pois o que eu
busco como objetivo principal é o ‘work-life balance’ (...). Neste ponto da minha
vida, isto é mais importante do que perseguir uma aceleração de carreira (E3,G2).
Porém, apesar de ver diferenças nas oportunidades de carreira entre os três grupos, E1
pondera que, para ela, isso não representa desigualdade no tratamento recebido da empresa, já
que se trata de uma escolha e “qualquer escolha tem limitações inerentes” (E1,G3).
De qualquer forma, os entrevistados com mais tempo na empresa mencionam a visão de
que as oportunidades de carreira são hoje mais reduzidas para todos. Alguns chegam a se
referir à visão da empresa do passado como paternalista, quando ela se responsabilizava por
cuidar da carreira dos indivíduos. Na empresa atual, percebe-se uma estrutura hierárquica
reduzida e menor ênfase na estabilidade. Isso é visto como uma tendência do mercado de
trabalho, não restrita à empresa em questão. A funcionária home-office E10 exemplifica esse
pensamento: “Cada vez mais, temos que correr mais atrás das nossas necessidades (...).
Costumávamos dizer que a nossa carreira estava na mão dos gerentes; hoje, não é mais bem
assim” (E10,G2). Porém, ela reconhece que, para quem fica longe do ambiente corporativo,
as chances são menores: “Acho que é um benefício trabalhar de casa sim, mas por outro lado
há um preço que se paga por isso; a carreira, na minha opinião, é uma parte deste preço”.
Influência sobre a qualidade de vida
Alguns entrevistados consideram que a flexibilidade de atuar fora dos padrões
tradicionais do escritório em tempo integral é positiva tanto para os que dela usufruem quanto
para a empresa, corroborando a visão de autores como Gibson (2003) e Tremblay (2002).
E3, funcionária que há mais de dois anos trabalha de casa comenta, por exemplo, que
passou a ter mais qualidade de vida, sem prejuízo do seu desempenho: “Meu trabalho atual e
minha vida pessoal se complementam, ao invés, simplesmente, de uma interferir na outra
negativamente” (E3,G2). Uma das razões mais citadas pelos que atuam em home-office para
esse sentimento de maior qualidade de vida é a possibilidade de dedicarem mais tempo à
família. A entrevistada E8 exemplifica esse sentimento: “eu [...] gastaria pelo menos duas
horas por dia me deslocando; [...] posso usar essas duas horas para ficar perto dos meus
dois filhos” (E8,G2). Para algumas pessoas como E10, esse benefício é ainda mais visível:
Minha filha mais velha é excepcional. Ela sempre apresentou muitas complicações
de saúde. Entretanto depois que comecei a trabalhar como home-office, o estado
dela equilibrou de uma forma tão significativa que não posso nem pensar em mudar
isso. Ser home-office é praticamente uma necessidade pra mim (E10,G2).
Alguns entrevistados dos outros dois grupos questionam, porém, essa vantagem.
Corroborando a visão de Hill et al. (1998) eles acreditam que a mistura dos ambientes
profissional e familiar pode trazer também dificuldades. E2 explicita mais claramente essa
crença: “eu acho que a presença da família atrapalharia o meu desempenho no trabalho”
(E2, G3). A entrevistada E5, alocada na estrutura de um cliente (G1) é da mesma opinião:
“não conseguiria ficar como home-office sem deixar que a rotina de minha casa interferisse
no meu trabalho. Eu seria muito mais minha família que o trabalho” (E5,G1).
Mas E10 (G2), argumenta que o distúrbio causado pela família não é maior do que
aquele que ocorre no escritório da empresa. Além disso, alega que separou a área da casa
dedicada ao trabalho, preservando sua concentração: “Eventualmente um filho entra e me
interrompe, mas isso não é mais freqüente do que um colega passar na sua mesa para dizer
‘olá’ toda hora” (E10,G2). Outros que trabalham de casa comentaram sobre a importância de
impor limites entre os dois mundos: “a hora do trabalho tem que ser do trabalho e não pode
12
ser divida com os filhos; isso tem que estar claro para a família” (E8,G2). Além disso, apesar
das dificuldades inerentes à influência entre trabalho e família, E4 avalia que o saldo final
dessa flexibilidade tende a ser positivo: “Não tem preço poder almoçar com a família, (...) ou
estar cedo em casa e ter tempo para cuidar de você mesma e da família!” (E4,G2).
Na opinião de alguns entrevistados, pessoas com maturidade, capacidade de foco e
comprometimento possuem maiores chances de equilibrar os impactos da família no dia-a-dia
do trabalho, sem afetar o desempenho. Para E12, que atua nas instalações de um cliente (G1),
alguns aspectos são importantes, na escolha dos indivíduos que podem trabalhar de casa:
Não é todo mundo que pode trabalhar de casa. Eu vejo que muitas vezes já é
complicado trabalhar no cliente, pois já ficamos longe dos gerentes e sem contato
com os outros funcionários da empresa. (...) Sem dúvida, é preciso ter credibilidade
e comprometimento (...). Concentração também é fundamental (E12,G1).
Outro benefício percebido por alguns é o de poder definir quando e onde trabalhar.
Alguns que trabalham de casa citam, por exemplo, a possibilidade de trabalhar à noite ou
estender a hora de almoço. Outros alocados em clientes, citam que gostam de trabalhar pelo
menos um dia da semana no escritório da empresa. Para os que não precisam ir ao escritório
diariamente, há o benefício de não se exporem ao desgaste do deslocamento. E2, funcionária
do escritório (G3), fala do impacto negativo que isso traz para ela: “Hoje eu gasto duas horas
em locomoção e (...) isso impacta significativamente na minha vida pessoal” (E2,G3). Mas
E15 dá a entender que o benefício de evitar esse estresse não é exclusivo dos que trabalham
de casa: “trabalho em um cliente perto da minha residência e me desloco somente nove
quilômetros por percurso e gasto menos de vinte minutos por dia com locomoção” (E15,G1).
O nível de estresse com o trabalho não necessariamente está associado ao tipo de
localização do indivíduo. E10, funcionária home-office, acredita, por exemplo, que o estresse
é inerente ao ambiente atual de negócios: “atualmente existe a tendência de se exigir mais das
pessoas, mais resultado, mais performance” (E10,G2). O entrevistado E12, alocado na
instalação de um cliente (G1), compartilha essa opinião e acrescenta: “Estresse é a palavra e
o sentimento do momento (...); na realidade, as empresas cobram isto de cada um de nós dedicação integral (...); e como não podemos perder nossos empregos, nos submetemos a
isto” (E12,G1). De qualquer forma, os relatos dos cinco entrevistados do regime home-office
sugerem que eles sentem menos esse efeito, talvez por equilibrarem as demandas da empresa
e da família e terem aprendido a lidar com as implicações para a carreira. E4 exemplifica esse
sentimento: “Eu não troco de grupo. Estou muito satisfeita como home-office (...). Depois de
algum tempo, as pessoas se acostumam com o fato de você trabalhar de casa” (E4,G2).
Considerações finais
Esse estudo focalizou o caso de uma empresa que oferece aos funcionários diferentes
alternativas de localização física, correspondendo a uma das formas atuais de flexibilização
das relações de trabalho abordadas por Gibson (2003). Levaram-se em conta três grupos
dintintos de funcionários: os que trabalham nas instalações de clientes (G1); os que trabalham
no regime home-office (G2); os que atuam no escritório da empresa (G3). O objetivo foi o de
identificar as percepções de indivíduos desses três grupos, acerca da influência que este nível
de presença – ou ausência – no espaço da organização exerce sobre suas relações de trabalho.
Os resultados sugerem algumas reflexões importantes. A primeira delas, mais
diretamente relacionada com o objetivo central do estudo, é a de que há diferenças relevantes
na forma como as pessoas de cada um desses grupos entendem a sua relação com a empresa,
assim como na maneira como vêem a realidade dos demais grupos. A Figura 1 ilustra alguns
dos principais resultados obtidos nessa avaliação. Cabe ressaltar tratar-se, porém, apenas de
uma forma de representação visual dos resultados. Ou seja, as formas geométricas utilizadas
em cada dimensão da figura, para representar as percepções dos três grupos, não pretendem
estabelecer um “nivelamento diferencial” quantitativo e contínuo das suas percepções.
13
Figura 5 – Ilustração dos Resultados
Escritório (G3)
Cliente (G1)
Home-office (G2)
(a) Benefícios para a carreira
(b) Nível de comprometimento
auto-análise
crença
(c) Grau de flexibilidade / equilíbrio entre a vida pessoal e profissional
(d) Grau de identificação com a organização
auto-análise
crença
(e) Aspectos relacionais do contrato psicológico
(f) Aspectos transacionais do contrato psicológico
(g) Nível de estresse
Há concordância entre os entrevistados de que o distanciamento do espaço físico da
empresa enfraquece as oportunidades de carreira corporativa (a), beneficiando os que são
localizados no escritório e reduzindo mais as chances dos que atuam em home-office. Quanto
ao nível de comprometimento com a empresa (b), apesar de a maioria dos entrevistados ter
manifestado a crença de que ele independe do tipo de localização, alguns que atuam nas
estruturas de clientes se consideraram mais sujeitos a terem que “dividir” o comprometimento
entre os objetivos de sua empregadora e da empresa para a qual prestam serviço. Entre os três
grupos, o que atua em home-office é o que mais percebe a possibilidade de equilíbrio entre
vida pessoal e profissional (c), enquanto os funcionários do escritório foram os que
apresentaram mais queixas quanto à dificuldade de fazê-lo. Todos se consideram
identificados com a empresa e com o perfil que acreditam que ela deseja (d). Mas vários
entrevistados crêem que os que atuam em home-office (em maior grau) e os que atuam nas
estruturas de clientes (em menor grau) tendem a ter dificuldade de construir essa
identificação. Os funcionários home-office foram os que mais destacaram elementos
relacionais, ao falarem de seu contrato psicológico (e), enquanto os funcionários do escritório
foram os que mais ressaltaram aspectos transacionais desse contrato (f). O funcionários
localizados nas instalações de clientes foram os que mais mesclaram os dois tipos de
elementos do contrato psicológico em seu discurso. Finalmente, o nível de estresse (g) é visto
como “a tônica do atual contexto” pelos funcionários do escritório e aqueles localizados nas
instalações de clientes, algo que parece ser menos sentido pelos que trabalham de casa.
Outra reflexão importante é a de que as falas de alguns entrevistados mais antigos na
organização sugerem que certas dificuldades por eles relatadas não são decorrentes
propriamente de sua localização, mas sim da existência de mudanças mais amplas na forma
como hoje ocorre a relação de trabalho. A lógica da empresa do passado, comprometida com
a carreira dos indivíduos – e, por isso, até mesmo classificada como “paternalista” por alguns
– parece ter dado lugar a um discurso focalizado nos resultados, na qualidade e produtividade.
Por fim, desperta a atenção a reflexão trazida pelo entregistado E1 (G3), de que, apesar
de ser a flexibilidade de espaço uma realidade concreta tanto na empresa estudada quanto em
outras grandes companhias atuais, há, ainda, um longo caminho de aprendizado a ser
construído pelos gestores e pelos próprios empregados. Como diz o entrevistado, “as
barreiras tecnológicas já estão sendo resolvidas”, mas não necessariamente têm resultado em
“uma mudança comportamental” (E1, G3).
14
Este estudo não teve a intenção de esgotar o assunto da flexibilização do espaço
organizacional, mas sim trazer nova luz para as discussões sobre essa dimensão que,
conforme observam Giddens (1984) e Lefebvre (1991), ainda tem sido pouco considerada na
análise sociológica e, mais particularmente, nos estudos organizacionais. Futuros estudos
podem analisar a realidade de empresas que ofereçam essa diversidade de alternativas ou
outras formas de localização física dos funcionários. Estes resultados também podem ser
comparados com outras realidades que combinem a flexibilidade de local com outras formas
de flexibilização da relação de trabalho, como a do tipo de contrato (GIBSON, 2003).
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O Nível de Inserção no Espaço Organizacional e as