Alagoas tem um dos melhores grupos de dança e música cigana do país
Escrito por Jhade Mattos
Sáb, 21 de Junho de 2008 13:40
O Leshjae une beleza, sedução e ritmo em seus grandes espetáculos com cerca de 15
integrantes...
Apesar de todo o preconceito social sofrido pelos os ciganos, todos reconhecem a magia, a
alegria da música e dança desse povo tão peculiar. E é justamente disso que nos fala Ruiter
Djurdjevjch, líder do grupo de dança e de música Leshjae. Encante-se você também com o
trabalho deles!
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Como surgiu o grupo Leshjae?
Em meados de 2007 quando cheguei a Maceió para casar com minha prima, e vindo do eixo
Rio–São Paulo, onde o movimento artístico cigano é forte, senti uma necessidade de fazer um
trabalho mais específico, voltado única e exclusivamente para a arte cigana. Em uma conversa
com meu Tio, pai de minha esposa, eu pude perceber que não só na minha família a cultura
estava morrendo, mas em outras famílias ciganas também, os jovens só querem saber de
forró e música enlatada americana ou baiana. Foi quando conhecemos uma gadji que
praticava a dança “cigana” a mais de 10 anos no estilo espanhol (flamenco), e resolvemos
juntos a criar um grupo onde pudéssemos mostrar com música e dança, toda a trajetória
artística do povo cigano, desde a índia, passando pelo Egito, leste europeu, península ibérica
e finalmente o Brasil, onde a dança não possui muita influência folclórica, apesar de que o
folclore brasileiro tem muita influência cigana e não só africana.
Quais as principais atividades do grupo?
Além de nossas apresentações, ministramos aulas no estilo rommané com folclores variados
de diversos países, workshops de ritmos e história e nos engajamos em apoiar trabalhos
sérios a favor do povo cigano, no Brasil e no mundo todo, independente de qual “clã” ele
pertence.
Qual o principal objetivo do grupo?
Costumo dizer que poderei me juntar aos meus antepassados em paz quando nesta vida
ouvir meu filho dizer em alto e bom som, a qualquer pessoa, que é um orgulho ter nascido
cigano, e as pessoas não o julgarem por isso, acredito que muito está mudado desde a época
de meus avós, mas também acredito que muito ainda deve ser feito, tentamos diminuir essa
diferença através da arte romani, que é sem sombra de dúvida, nossa maior magia.
Quem são os integrantes? Todos são de Alagoas?
O grupo é formado por mim, Carioca, (vocal, violão base, cajon e derbake e sou bailarino
sempre que posso além de compositor), sou designer por profissão e cuido também da “cara”
do leshjae; Anne Kellen, minha esposa é alagoana, coreógrafa, bailarina e produtora cultural
do grupo; Bella, alagoana, bailaora flamenca e violão base; Vania Barros, alagoana,
compositora e bailarina; Fabio ”Pepe”, alagoano, violão solo, arranjo, flauta, escaleta; Kleber
“Sano”, violão base, flauta transversa, Nejde “Mel”, sergipana, que trouxe suas filhas Jngrid
“morena” e Jvana Caroline, como bailarinas; ainda temos Neide “Hanna” e sua filha Geysa,
ambas de Alagoas, e bailarinas; Eliane Ferro, alagoana, bailarina; Lizianne, alagoana; e Leyla
Samira, alagoana, completa nosso corpo de baile.
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Como são as apresentações do Leshjae? O que os diferencia?
O nosso show essencialmente é ao vivo com composições do grupo e complementamos a
apresentação com músicas da comunidade cigana do mundo inteiro, e como nosso público em
sua maioria é de não ciganos, temos composições em português também, pois um dos
objetivos do Leshjae é o de estreitar laços, e temos a convicção de que a música deve atingir
não só os ouvidos, mas ressoar dentro dos corações e permitir que nossa música esteja com
as pessoas mesmo longe de nós, é um grande orgulho para o grupo ver alguém cantarolando
“rosas vermelhas”, por exemplo. Outro diferencial é que, pelo fato de termos dentro do grupo,
ciganos, com acesso a outros ciganos ao redor do mundo, é o que nos permite montar as
coreografias sem perder a essência de cada folclore apresentado. Ou seja, assistir a uma
apresentação do Leshjae, é viajar pelo mundo sem sair do lugar. Nossa maior preocupação é
para com a fidelidade das tradições ciganas, sem fantasias.
De que forma o trabalho do Leshjae acontece em Alagoas?
Bem, como não existem trabalhos como o nosso aqui, e nós não somos uma “escola” (apesar
de termos bailarinas que ministram aulas para escolas de dança) nós conseguimos colocar o
Leshjae no circuito das danças de arte do estado, onde participamos de diversos eventos
culturais, mostras e apresentações privadas (festas, restaurantes, eventos sociais). E
pretendemos lançar um CD de músicas para divulgar nosso trabalho, esse lançamento está
previsto para o fim deste ano, em uma grande festa organizada por nós.
O que significa o nome “Leshjae”?
O nome Leshjae apareceu de uma conversa entre mim, minha esposa, Bella e a Sra. Nelma
Jatobá, dona do estúdio Gitanos (espaço onde ensaiamos em Maceió). O nome Leshjae na
verdade nos escolheu, pois havia feito uma lista de nomes e queríamos um nome que nos
protege-se, que cuidasse de nós, foi aí que fora da lista surgiu na minha cabeça, Guardião,
Protetor, em romanes, LESHJAE. E este nome vem nos protegendo, só o nome Leshjae
sussurrado por mim em nossa música homônima, já representa nossa essência.
Vocês têm descendência cigana? De qual clã?
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Bem, eu e minha esposa, somos primos legítimos, descendentes de Lovaris, de origem
húngaro/russa.
Como é a vida cigana em Alagoas? Em que condições os ciganos vivem aí?
Dentro da capital, Maceió, os ciganos são sedentários, vivem em casas, e levam uma vida
aculturada, em alguns municípios formam ruas inteiras, trabalham, estudam e também fazem
trabalhos artísticos, como os primos de Penedo, que participaram do Prêmio João de Torres
deste ano. No interior do Estado, existem grupos que vivem nômades no sertão, como os
tarabataras, que a última notícia que chegou até a mim, foi que eles estavam em Carneiros, é
uma vida duríssima, pois além de ciganos, são sertanejos que convivem com toda a
dificuldade do sertão nordestino. Saúde sempre para seu Francisco e família!
Como é a relação dos ciganos com os gajdos em Alagoas? Qual a experiência do
grupo?
Apesar de ser um Estado pequeno, por mais incrível que pareça, os alagoanos ignoram a
existência de ciganos no Estado, sempre que nos apresentamos somos recebidos com
surpresa, e perguntam sempre se somos de fora e de onde viemos. Mas, fora do “glamour”
das apresentações, existe sim o preconceito para com o povo, às vezes direto, não velado, um
exemplo é que certa vez, fui comprar água com meu pai e meu tio, e a dona do
estabelecimento disse que não poderia me vender nada, pois ela não servia a servos de Caim
e que eu me retirasse do estabelecimento dela pois estava a prejudicando demais, em outro
caso fui acusado de roubar uma gadji que gritou no supermercado: “tu é cigano não é? Todos
sabem que ciganos são ladrões!”, preciso dizer que isso me machuca até hoje, mas que ao
mesmo tempo me dá forças para tentar mudar este panorama aqui em Alagoas, enquanto eu
aqui estiver.
Como vocês vêem a Cultura Cigana no Nordeste?
Infelizmente aqui no nordeste, a Cultura Cigana vem morrendo, já não se vê mais as
mulheres fazendo Draba na rua, com tanta freqüência, alguns são evangélicos, outros mantém
pequenos negócios no interior dos estados e outros se sedentarizaram de tal forma que não
se dizem mais ciganos. Com muito esforço para montar as apresentações, investir em
equipamentos de som e figurino para as bailarinas, queremos recuperar a cultura cigana aqui
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no nordeste e fazê-la ser respeitada como qualquer outra cultura, neste país multicultural que
é o Brasil.
De que forma vocês participaram do Internacional Gypsy Fest? Quando e onde
aconteceu o Festival?
O festival aconteceu em Trebisov, na Rep. da Eslovaquia em julho de 2010, um festival
grandioso, que reuniu vários expoentes da música cigana mundial. Esma Redzipova, Katiusha
Kosubek, Romanza, Karavan família, entre muitos outros. Tive a honra de ser convidado pela
Embaixada Cigana do Brasil a fazer parte da comitiva, e lá fizemos um show magnífico, para
uma platéia formada por 90% roms, onde fomos o único grupo em que a platéia pediu bis.
Qual a importância desta participação para o Leshjae?
Lá, tive a oportunidade de conhecer outra realidade e trocar idéias com outros roms de outros
países, e vi um lugar onde não existe diferença entre clãs, eles fazem parte todos de uma
mesma família, o que me colocou a beira da utopia que gostaria de ver no Brasil. O único
porém é que o preconceito e o descaso é incrivelmente maior e mais impactante do que aqui
no Brasil. Uma das notícias que me deixou perplexo assim que cheguei a Trebisov foi a
história de uma menina cigana, que foi atacada em casa por vândalos e eles queimaram 90%
de seu corpo com querozene, só pelo fato de a mãe tê-la matriculado em uma escola local.
Isso é o que acontece com cada vez mais freqüência na Europa oriental. E essa experiência
toda eu trouxe para o Leshjae para que o nosso grupo vivesse também esta realidade e
fugisse um pouco do glamour da dança cigana no Brasil. Representamos um povo vivo e
sofrido, que ainda tem o preconceito como grande barreira social.
Como surgiu esta oportunidade?
No fim de 2009 fui convidado junto com a minha esposa para ser membro benemérito da
Embaixada Cigana do Brasil, convite feito pelo prof. Nicolas Ramanush, convite que
prontamente aceitei, por já conhecer o trabalho sério e verdadeiro que eles vinham
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desenvolvendo em São Paulo. E em 2010 surgiu o convite para a embaixada representar o
Brasil neste festival e convidaram-me para fazer parte da comitiva.
Além deste festival internacional, onde mais o Leshjae se apresentou?
Em tantos lugares, vamos por partes. Nos apresentamos no Rio de Janeiro, no Espaço
Aldebaran, casa de nossa querida prima Wlavira Turckzneck, fomos também a Brasília no V
Encontrar, na asa sul, estivemos em João Pessoa na festa da granja Jardim Alforria, uma
grande festa particular, participamos da 7º e 8º Mostra Alagoana de danças que saiu em
caravana pelas cidades de Viçosa, Arapiraca e Penedo, além é claro de Maceió, onde
tivemos a oportunidade de nos apresentar no maior teatro da cidade para um público de 1.500
pessoas, que nos aplaudiram de pé. No final de 2010 ministramos uma oficina na
Universidade Federal de Alagoas, para o curso de licenciatura em dança e fomos representar
os ciganos de alagoas no 2º Seminário Alagoano da Diversidade de Sujeitos e Igualdade de
Direitos no SUS, a convite da Sra. Ana Maria Costa, representante do ministério da saúde em
Brasília e de autoridades do SUS em Alagoas. E no último final de semana participamos do dia
nacional do voluntariado, no qual fomos convidados pela fundação Bradesco a realizar uma
apresentação para a comunidade carente.
Quais as próximas apresentações do Leshjae?
Já fomos convidados para a 9º Mostra de danças de Alagoas, e outros convites em que
estamos estudando as datas, mas de antemão dizemos que este ano será um grande ano
para a comunidade no país inteiro. Estamos programando o lançamento de nosso CD.
Veja a magia e todo o encanto cigano do Leshjae: Clique aqui
Por Jhade Mattos
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