DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS EM DOSE UNITÁRIA - OPINIÃO DA EQUIPE DE ENFERMAGEM SOBRE AS MUDANÇAS NO PROCESSO DE TRABALHO FARHAT,Eleide Margarethe1 SANTOS, Danielle Teixeira2 TOMCZAK, Maria Isabel3 AMARAL, Ionice Maria4 As mudanças fazem parte do nosso cotidiano; o homem vive em ambientes dinâmicos, e em cada período, passa por transformações que contribuem para novas maneiras de pensar e agir, a partir das inovações tecnológicas, modelos de produção que atendam as necessidades sociais, culturais e econômicas do seu tempo. Segundo Chiavenato (1996), a vida das pessoas e das organizações é regrada e determinada por determinados paradigmas. O autor considera paradigma como um conjunto de regras que definem a fronteira entre o certo e o que é errado, entre o que é verdadeiro e o que é falso, entre o que se deve ou não fazer. Um paradigma então, estabelece um corredor de pensamento, no qual este fica bitolado ao que existe dentro das faixas e dos limites permitidos. Ele funciona como um modelo, como um padrão esperado que defina o comportamento e a ação das pessoas. Observando o cenário da prática de enfermagem, é possível identificar mudanças nas funções ou atribuições realizadas no processo de trabalho cotidiano. Estas têm sido agrupadas em funções assistenciais, de ensino, pesquisa e gerenciamento. Entre as funções assistenciais, encontra-se a administração de medicamentos. Embora no passado, fosse comum que apenas os profissionais de enfermagem 1 Enfermeira, Mestre em Avaliação e Inovação Tecnológica, docente do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; Grupo de Pesquisa Gestão e Atenção Primária em Saúde - Rua Uruguai, Centro, Itajaí SC. (47) 3361-0628. [email protected] 2 Acadêmicas do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI 3 Acadêmicas do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI 4 Professora Mestre em Avaliação e Inovação Tecnológica, docente do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Itajaí preparassem e administrassem os medicamentos de acordo com a prescrição médica, hoje em algumas instituições de saúde hospitalar, são os profissionais farmacêuticos que preparam e a enfermagem administra os medicamentos dispensados em doses unitárias. Garrinson (1979) considera dose unitária, uma quantidade ordenada de medicamentos, com forma e dosagens prontas para serem ministradas ao paciente, de acordo com a prescrição médica, num certo período de tempo Esta mudança de paradigma no processo de trabalho dos profissionais de enfermagem e farmácia tem gerado polêmica entre as categorias, as instituições de saúde e os Conselhos Federais que regulamentam a prática profissional. Ocorre que as instituições de saúde hospitalar, preocupadas com a sobrevivência, e em acompanhar o avanço tecnológico, estão procurando desenvolver processos de trabalho inovadores, que garantam o controle dos medicamentos por profissionais qualificados, sem o desperdício de manter estoques desnecessários em cada unidade, onde anteriormente os mesmos eram processados e administrados. A legislação (código de ética dos profissionais de enfermagem), não define claramente a sua posição frente à dose unitária; na Resolução nº 240, artigo 47, diz que “Administrar medicamento sem certificar-se da natureza das drogas que o compõe oferece existência de risco para o cliente”. (COREN, 2001). De outra forma, o Conselho Federal de Farmácia na Resolução nº300/97, art. 3º, anexo IV, aprova como atividades de assistência farmacêutica, na farmácia hospitalar o que segue: “....d) reconstituição de medicamentos, preparo de misturas intravenosas e nutrição parenteral; e) fracionamento de doses; g) produção de medicamentos...”, deixando claro, a competência dos farmacêuticos para atuação na farmácia hospitalar” (CFF, 1997). Os profissionais se definem pelas atividades que executam e cada atividade pode ser decomposta num processo inteiro, com seu objeto, os instrumentos necessários à sua realização (teóricas e materiais) e seus produtos. Essas atividades apresentam processos de trabalho das profissões de saúde que, por princípio estariam direcionadas ao alcance de finalidades mais gerais, ampliadas, como por exemplo, a promoção, prevenção e recuperação da saúde do ser humano. O processo de trabalho na saúde evoluiu de forma, que, de cuidados simplificados, passamos a trabalhar com instrumentos muito complexos, produtos de muitos outros trabalhos, havendo a necessidade de diversificação e especialização da força de trabalho para a realização desses trabalhos. Para dar conta de tal evolução, foram sendo necessárias outras profissões que manejassem processos específicos a fim de atingir, de forma compartilhada um produto, no caso, um serviço. O serviço de saúde seria então, a articulação de vários processos de trabalho, com suas respectivas finalidades, visando uma finalidade maior (KIRCHHOF, 1995). Neste sentido, a administração de medicamentos nos serviços de Saúde também é um processo de trabalho compartilhado entre vários profissionais de saúde, não devendo ser compreendido simplesmente como uma ação mecânica ou técnica, que finaliza a prescrição de medicamentos. Segundo Silva e Cassiani( 2004), no que diz respeito à enfermagem esta deve ater-se não somente aos procedimentos técnicos e básicos inerentes à profissão, mas identificar os caminhos percorridos pelo medicamento desde o momento que o médico o prescreve até a sua administração ao paciente e analisar criticamente o sistema de medicação, refletindo sobre suas possíveis falhas e causas. Na opinião de Cassiani (2000), os erros de medicação podem ocorrer em qualquer etapa do sistema, acarretando injúrias ao cliente devido aos efeitos adversos da medicação. Em relação à freqüência dos erros, em cada um dos processos, um estudo apontou que 39% dos erros ocorreram no processo de prescrição de medicamentos, 12% na transcrição, 11% no processo de dispensação e 38% no de preparo e administração de medicamentos (MIASSO et al 2008). O aumento da incidência de erros de medicação nos hospitais e principalmente subnotificação, são preocupações de todos da área, e intervenções devem ser empreendidas para minimizar essa situação (ZANETTI; CASSIANI, 2000). O Instituto de Medicina Americano indicou que 44.000 a 98.000 americanos morrem a cada ano por erros na medicação e estima-se que em cada dez clientes admitidos no hospital, um está em risco para erro potencial ou efetivo na medicação (GANDHI et al, 2000). Várias estratégias têm sido tomadas para a prevenção e interceptação do erro, como a padronização dos processos, uso da prescrição eletrônica, ação multidisciplinar e a educação dos profissionais (SOUZA et al, 2000). Neste sentido, o Sistema de Dispensação de Medicação em Dose Unitária (SDMDU), vem sendo adotado em muitas instituições hospitalares com a proposta de otimizar o trabalho dos profissionais e reduzir custos. Neste modelo, o farmacêutico hospitalar é responsável pelas etapas de diluição, preparo e identificação dos medicamentos, cabendo ao enfermeiro conferi-las com a prescrição assim que cheguem à unidade, para posterior dispensação. Questiona-se a partir dessas considerações, a forma como o enfermeiro e sua equipe estão inseridos neste contexto de mudança e implantação do sistema de distribuição de medicamento por dose unitária. Se por um lado as modificações que asseguram o benefício ao paciente, são bemvindas, por outro lado elas também merecem reflexões e proposições que assegurem este fazer com qualidade. Assim, este estudo exploratório, com análise quantitativa, teve como objetivo conhecer a opinião da equipe de enfermagem sobre a mudança no processo de trabalho a partir da dispensação dos medicamentos em dose unitária em um hospital privado que visa implementar este sistema. Utilizou-se um questionário semi-estruturado com questões abertas e fechadas, embasado em Farhat, Bento e Koch, 2006. Os resultados foram apresentados através de estatística simples, e obedeceramse aos princípios éticos exigidos na Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos. A pesquisa demonstrou que a temática proposta gerou polêmica, causando opiniões divergentes especialmente no que tange ao fracionamento do processo de trabalho e a responsabilidade em caso de incorrer erro quanto à dosagem (um profissional prepara e o outro administra). No que se refere às facilidades que o SDMDU poderá trazer para a equipe de Enfermagem, identificou-se a contribuição positiva no sentido de reduzir etapas no processo de trabalho, ocasionando uma melhoria na qualidade da assistência.Quanto as fragilidades, vale destacar que grande parte dos entrevistados ainda sente-se inseguro ao administrar medicamentos manipulados por outro profissional, pois desconhecem o que pode estar sendo administrado e não estão acostumados a dividir essa responsabilidade com outro profissional devidamente habilitado,o farmacêutico. As legislações vigentes em cada órgão de classe, enfermagem e farmácia, não determinam especificamente a atitude tomada frente ao acontecimento de falhas e erros nesse sistema, onde há participação multiprofissional em todas as etapas do processo. Também ficou claro que a maioria reconhece a importância da instituição adotar o SDMDU, pois esse pode gerar economia, redução de custos e contribuição para a diminuição dos erros relacionados à administração de medicamentos. Questionam, porém, o alto custo como um problema para sua implementação, o qual envolve equipamentos, infra-estrutura e número de funcionários adequados e capacitados. Existe ainda o temor de que ampliando os investimentos materiais e humanos na farmácia, repercuta em diminuição dos trabalhadores de enfermagem, o que fatalmente influenciaria na humanização e qualidade da assistência prestada por estes profissionais. Conclui-se recomendando a necessidade de compreender-se que mudar paradigmas, processos de trabalho culturalmente arraigados, implica em desenvolvê-los de forma incremental, iniciando-se pela sensibilização e incentivo ao uso de tecnologias adequadas aos ambientes dinâmicos que caracterizam as instituições de saúde atuais. Finalmente, é cabível que haja uma reavaliação por parte dos conselhos profissionais visando conhecer como estão sendo desenvolvidos os diversos processos de medicação, e a partir das fragilidades e potencialidades, rever e adequar as suas legislações, a fim de proporcionar mais segurança aos pacientes e também aos trabalhadores mediante as suas competências. Palavras-chaves: Processo de trabalho, Administração de medicamentos, Dose unitária. Área Temática: Instrumento e inovação tecnológica no trabalho da enfermagem.