Valorização e resgate cultural, uma experiência no projeto Rondon: a importância das pessoas responsáveis pela perpetuação da cultura local da cidade de Palmeirina-PE Willian Nicolas Varella Graduado em Geografia, Universidade do Sagrado Coração, Bauru/SP E-mail:[email protected] Comunicação Oral Relato de Experiência Introdução Com objetivo de desenvolver processos sustentáveis para o fortalecimento da cidadania em regiões com indicadores de baixa condição socioeconômica, o Projeto Rondon é uma ação do Governo Federal, coordenada pelo Ministério da Defesa e realizada por universitários (PEREIRA, 2009). A história do Projeto Rondon é dividida em duas fases: A primeira edição do Projeto Rondon teve uma duração de 22 anos, de 1967 a 1989, cenário de um período marcante da história brasileira no qual predominou a ditadura militar. Na Nova República o Projeto Rondon foi encerrado. Somente em 2005 foi retomado, a pedido da União Nacional dos Estudantes (UNE) ao presidente Luís Inácio Lula da Silva (PEREIRA, 2009, p.02). Para os alunos participantes e as Instituições de Ensino Superior envolvidas, o Projeto Rondon é uma chance de transformar deficiências estruturais e organizacionais locais, contribuindo para a propagação da cultura dessas populações e, em paralelo, proporcionar a consolidação da formação de universitários participantes como cidadãos e agentes de transformação social. O presente trabalho buscou levantar as pessoas responsáveis pela perpetuação cultural local da cidade de Palmeirina – PE e a importância dos trabalhos voluntários realizados pelos mesmos. Sendo estes, os artesãos, as rezadeiras, os músicos, os cordelistas, os quais colaboram com a comunidade voluntariamente. A recomendação sobre a Salvaguarda da Cultura Tradicional e Popular aprovada pela UNESCO em 1989, define a cultura tradicional e popular como sendo o conjunto de criações que emanam de uma comunidade cultural fundada na tradição, expressas por um grupo ou por um indivíduo e que reconhecidamente respondem as expectativas da comunidade enquanto expressão de sua identidade cultural e social; as normas e valores se transmitem oralmente, por imitação ou de outras maneiras. Suas formas compreendem, entre outras, a língua, a literatura, a música, a dança, os jogos, a mitologia, os rituais, os costumes, o artesanato, a arquitetura e outras artes (IPHAN, 1998). Nesse sentido, objetiva-se aproximar, valorizar e resgatar o intercambio de conhecimento entre os jovens e os mais antigos da comunidade. Quando nos referimos as raízes culturais estamos nos referindo a sua origem, ou seja, a forma como foi construída a cultura de um povo, o que determina que alguns elementos ou algumas manifestações culturais sejam consideradas tipicamente desse povo (SILVA, 2012). Todas as classes sociais presentes na sociedade sofrem influência (diretamente ou indiretamente) cultural, principalmente pelo fato que a sociedade constrói a partir de seu comportamento redes de relações entre as pessoas que a compõem, independentemente de fazerem parte da “elite” ou da “massa”, contribuindo assim, para a formação da identidade cultural de alguma sociedade e não influencia somente as classes mais pobres (SILVA, 2012). Não tendo pretensão de aprofundar em questões sociológicas, o propósito buscou direcionar a questão do resgate da memória cultural da comunidade, sem intensão de escavar o passado, porém não se trata de um trabalho arqueológico, mas sim de se manter viva a história da construção ou da criação da cultura de um povo ou de uma região, contudo, uma ação de cidadania, na valorização e resgate cultural entende-se que só ultrapassando os muros delimitadores dos saberes conseguimos chegar mais próximo da realidade in loco. Com o propósito em mostrar os responsáveis pela perpetuação da cultura local da cidade de Palmeirina - PE através do resgate da memória de pessoas que integram essa comunidade, em um momento em que a “cultura” é cada vez mais homogênea devido ao processo de globalização e transculturação. Registrar, documentar e trabalhar nossa história e nossa cultura nas suas expressões autênticas mostra ser um trabalho de conservação da nossa identidade e do nosso patrimônio cultural, desde que tomadas precauções contra deformações que ponham em risco a integridade dessas tradições. Fazse necessário sempre a preservação do patrimônio cultural, defendendo as tradições contra a influência da cultura industrializada (IPHAN, 1998). Desenvolvimento Em um primeiro momento foi feito um levantamento dos artistas, artesãos, rezadeiras, músicos e cordelistas. Um verdadeiro intercâmbio de conhecimentos, no qual as pessoas tiveram a oportunidade de contar suas histórias, mostrar suas artes, valores e as demandas da comunidade. Prontamente o convite foi feito para participarem do projeto. Em um segundo momento foi realizado uma entrevista gravada em áudio e vídeo com essas pessoas, na qual foi relatado individualmente as suas atividades, as demandas sociais e a possível multiplicação destes saberes praticado por eles. A partir disso entendeu-se a necessidade de realizar uma apresentação em praça pública dos artistas e uma exposição dos trabalhos dos artesãos, visando e possibilitando um encontro de gerações e o reconhecimento da própria comunidade, com o intuito de valorizar, resgatar e registrar esse momento. Sendo assim, foi elaborado um cronograma previamente estipulado pela coordenação da IES USC, que dentro desse foram realizados os ensaios para a apresentação. Os ensaios foram realizados na quadra da Escola Estadual Alonso Bernardo da Silva, ocorrido durante o período de 23 de julho á 29 de julho de 2014, nos horários das 19h ás 21h30min. Participou dos ensaios o grupo Cultura Popular, os músicos (sanfoneiro, os percussionistas do triângulo, da zabumba e do pandeiro), duas cordelistas e os artesãos. No decorrer dos ensaios entendeu-se a necessidade de uma palestra conceituando de uma forma simples noções de cultura, tradição e costumes. Segundo Maia (2001, p.72): A busca pelo entendimento dos costumes requer o prévio esclarecimento de algumas noções teóricas .O vocábulo costume é repertório coloquial e diz respeito a usos costumeiros, portanto à cultura [...]. A noção de tradição também diz respeito à cultura e é posta ao lado ou em confronto com a ideia de costumes. Essas noções integram o campo conceitual das ciências humanas, e se fazem presentes na Geografia. No dia 31 de julho de 2014, a partir das 19h, foram realizadas na praça matriz as apresentações. Em um telão instalado no local foi mostrado aos moradores as entrevistas em áudio e vídeo com essas pessoas responsáveis pela perpetuação da cultura do lugar, que nelas foram citadas suas atividades, suas experiências e seus trabalhos. Logo, iniciaram-se as apresentações dos artistas locais, a qual começou com duas cordelistas declamando seus cordéis. Na sequência foi mostrado os trabalhos de artesanato, artigos em couro para montaria, cutelaria, pinturas, tecidos e bordados expostos no local e seus respectivos artistas. Dando continuidade, o grupo de nome Cultura Popular mostrou de forma musical e teatral o significado da cultura popular, o qual representou a peça Reino da Cultura Popular por meio de um figurino típico, com músicas e danças regionais retratando a figura do Boiadeiro, as Dançadeiras de Coco, as Heroínas de Tejucupapo, o Lampião, o Padre Cícero, Luiz Gonzaga e o Papa Figo. Ato continuo, o sanfoneiro e os percussionistas tocaram composições de Luiz Gonzaga e outros artistas nordestinos. Ao término, um grupo de jovens dançarinos exibiu a canção Imaginário Popular de Alcymar Monteiro. Tais apresentações também foram certificadas pelo Projeto Rondon. Resultados e discussão Ao decorrer dos ensaios percebeu-se grande dedicação dos envolvidos, pois frequentavam diariamente, inclusive os que haviam trabalhado o dia todo. Criou-se uma atmosfera de disseminação coletiva de seus valores e saberes, os quais foram instigados por meio da palestra sobre cultura, tradição e costumes. Houve grande mobilização da comunidade e autoridades, pois se tratava de um município com cerca de oito mil habitantes e a divulgação do Projeto Rondon ocorreu de uma forma ampla, pois, pequenas atitudes, como o convite informal realizado pelos rondonistas em uma feira livra local, teve grande repercussão. No ato da apresentação, notou-se o público reconhecendo os cidadãos da comunidade, dizendo seus nomes e parentescos, e a partir daí, os identificaram como os artistas locais, que até então passavam despercebidos pelos seus pares. Um exemplo notório foi o depoimento do sanfoneiro, que até a chegada do Projeto Rondon não se apresentava há cerca de vinte anos, e através da palestra o mesmo compreendeu a importância de se resgatar a cultura local e os artistas, assim motivado participou da apresentação, mostrando ser o artista que sempre foi. As participações foram certificadas pelo Projeto Rondon – Operação Guararapes, totalizando 378 certificados, entre ensaios, oficinas, a apresentação e colaboradores. Considerações Finais Através do trabalho desenvolvido com o Projeto Rondon, o grupo Cultura Popular conseguiu um espaço para desenvolver e mostrar o seu trabalho, o qual se encontrava sem apoio. O Projeto Rondon foi uma oportunidade única, mais que uma simples atividade extracurricular, tornou-se um verdadeiro trabalho de valorização da cidadania e da diversidade, na medida em que colocou em foco a cultura popular, que muitas vezes fica a margem das grandes produções culturais que costumam movimentar grandes somas de dinheiro e atrair as principais atenções da mídia. Um dos motivos que levaram à realização de tal ação voluntária foi uma reflexão sobre a história de uma região nordestina, que traz consigo expressão de arte e cultura, em que os adolescentes, jovens e adultos alcançados pelo projeto, passem a ser reconhecidos como sujeito de direitos e protagonistas de suas histórias. Palavras-Chave: Projeto Rondon ; valorização; resgate; cultural. Referências IPHAN, Atividades da Comissão e do Grupo de Trabalho criados pela Portaria IPHAN 37/98. Patrimônio Imaterial: Propostas, experiências e regulamentos internacionais sobre a proteção ao Patrimônio Cultural Imaterial. Ministério da Cultura, Brasília, 1998. MAIA, D. S. A Geografia e o Estudo dos Costumes e das Tradições. Revista Terra Livre. São Paulo, n.16, p. 71-98. 1º semestre/2001. PEREIRA, D. V. Um olhar sobre o Projeto Rondon e a dimensão ambiental. Dissertação de mestrado, Universidade de Brasília, Brasília, 2009. 87p. Disponível em: < http://www.radarciencia.org/doc/um-olhar-sobre-o-projetorondon-e-a-dimensao-ambiental/o2ScYJWwMF51ozVhLaVgAQZ0AD==/>. Acesso em 05 de mar. de 2015. SILVA, J. J. V. As Benzedeiras no município de Palmeirina – PE: Cultura Religiosa e Demandas Sociais. Universidade de Pernambuco (UPE), Monografia do Curso de Pós Graduação em Ensino de História. Garanhuns – PE, 2012.