As letras falam: afetividade e escrita em cursos de Educação a Distância Catley Santos LIMA1 (UCB) Michelle Jordão MACHADO2 (UCB) Resumo Todos os "mananciais" que abordam aspectos da Educação a Distância( EAD) deságuam em um mesmo "rio": o sucesso do processo de ensino e aprendizagem. Para compreendermos tal fenômeno em sua inteireza, fazse necessário aprofundar o estudo de dois fatores que permeiam a EAD: a afetividade e a interatividade. Este artigo ocupou-se de analisar o uso da linguagem utilizada em ambientes virtuais de aprendizagem, especialmente a proximidade existente entre a fala e a escrita.A pesquisa de abrangência qualitativa foi realizada por meio da análise das participações de estudantes e tutores em fóruns de discussão de três cursos a distância de pós-graduação, de entrevistas semi-estruturas e, por fim, da análise do material didático dos próprios cursos em questão. Conclui-se que quanto menos afetividade havia entre os participantes do processo educativo, mais formal era a linguagem utilizada entre eles.. Palavras-chave: Afetividade, Linguagem, interatividade – Educação a Distância Abstract All the "sources" which approach aspects of Distance Education (EAD) empty into the same "river": the success of teaching and learning. To understand this phenomenon in its entirety, it is necessary to deepen the study of two factors involved in distance education: the affection and interactivity. This article dealt with analyzing the use of the language used in virtual learning environments, especially the proximity between speech and writing. The qualitative research coverage was done by analyzing the participation of students and tutors on the bulletin boards of three distance education post graduation courses, semi-structures interviews and, finally, analysis of textbooks of their own courses concerned. It follows that the less affection existed between the participants of the educational process more formal language was used between them. Keywords: Language – Afecttion – Distance education - interactivity 1 2 Especialista em EAD – Universidade Católica de Brasília Doutoranda em Educação – Universidade Católica de Brasília Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -1- Introdução Nas últimas décadas, com a globalização e os avanços tecnológicos, os cursos a distância mediados por computadores têm crescido cada vez mais. Uma explicação plausível para o crescimento constante dessa modalidade de ensino é a necessidade de se globalizar a própria educação, disponibilizando-se meios que permitam que pessoas de faixas etárias e localidades diversas possam estar inseridas neste novo contexto educacional. A educação a distância permite que o aperfeiçoamento seja possível em todas as áreas, sejam elas acadêmicas, profissionais, ou por motivo de simples atualização. Segundo a Universidade Católica de Brasília (2009), esta modalidade permite a globalização dos processos educativos. Tendo em vista o considerável aumento de ofertas de cursos a distância, muitos estudos e pesquisas têm sido realizados a fim de considerar tantos aspectos que permeiam esta nova modalidade de educação. Seguindo esta tendência, será analisado, neste artigo, o uso das linguagens e da língua portuguesa nos ambientes virtuais de aprendizagem (AVAs), especialmente a proximidade existente entre a fala e a escrita, fator explicável pela necessidade constante de interação, além da dinamização própria de ambientes cibernéticos que explicaria o envolvimento afetivo dos envolvidos na EAD. A partir da observação de participações de alunos e tutores nos cursos de Aperfeiçoamento em Relações Étnico-Raciais, Especialização em Práticas de Letramento e Alfabetização e Especialização em Matemática da Universidade Federal de São João del-Rei3 e, até mesmo da observação de estratégias interativas desenvolvidas por tutores e estudantes por meio da escrita, notou-se que a linguagem utilizada nos cursos pelo processo de mediação pedagógica era muito próxima da língua falada, fator que causou estranheza pelo fato de os cursos de Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -2- EAD acontecerem em salas de aula virtuais no ensino superior, de onde se espera uma linguagem formal4, encontrada nas academias. O desenvolvimento deste artigo contempla, inicialmente, uma breve explanação sobre o papel do professor como mediador no desenvolvimento organizacional dos processos interativos, bem como algumas possibilidades dessa mediação com utilização de ferramentas síncronas e assíncronas utilizadas em cursos de EAD. Dimensiona, em seguida, a dialogia digital, tratando a escrita como possibilidade de aproximação afetiva entre os participantes do processo educativo virtual. Por fim, é apresentado o contexto da pesquisa e a discussão dos resultados e das conclusões obtidas com a mesma. O papel do professor no desenvolvimento organizacional dos processos interativos Os cursos de EAD apresentam uma equipe multidisciplinar e os professores assumem papéis diferenciados, que incluem desde a gestão administrativa de projetos dos cursos até a atuação como professor virtual. Authier (1998 apud CARVALHO,2007) retrata bem o papel do professor na EAD quando diz que os professores são produtores quando elaboram suas propostas de cursos, conselheiros quando acompanham os alunos, parceiros quando constroem com os especialistas em tecnologia abordagens inovadoras de aprendizagem. A figura do professor do curso a distância é muito diferente daquela que se tem nos cursos presenciais. De acordo com Machado e Aquino (2009), na EAD o mecanismo de interação virtual visa transpor a cômoda e rotineira prática instrucionista na perspectiva de outras formas de atuação pedagógica que estimulem a criatividade e valorizem o espírito empreendedor na busca de 1 É necessário esclarecer as denominações “formal” e “informal” neste artigo. Quando se considera uma linguagem em EAD informal refere-se ao fato de a mesma ser próxima à língua falada. Isso não significa que nos referidos cursos aceita-se uma linguagem descomprometida com fatores como coesão, coerência linguística. Trata-se de uma organização textual com características formais, mas que se aproxima da fala, visando uma maior afetividade na comunicação. Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -3- superação da transmissão de um conhecimento em forma de conteúdo pronto e elaborado. Preti (2010) defende o nascimento de um “novo educador” para os cursos de EAD. Segundo o autor, este novo educador deverá conhecer as características, necessidades e demandas do alunado, formar-se nas técnicas específicas do modelo a distância, desenvolver atitudes orientadoras e de respeito às necessidades dos estudantes, além de dar-se conta de que sua função é de formar alunos adultos para uma realidade cultural e técnica em constante transformação. Esse novo professor defendido por Preti, para desempenhar sua função de mediador do conhecimento, passa a trabalhar com ferramentas que priorizam aspectos como interação e interatividade, bem como a construção coletiva e colaborativa do conhecimento. A este respeito, a Universidade Católica de Brasília afirma que (...) as interações professor-aluno e aluno-aluno tendem a se dinamizar diante das múltiplas possibilidades de troca disponíveis. Uma vez rompidas as barreiras de espaço e de tempo, a interação pedagógica é dinamizada por meio da utilização de ferramentas de comunicação síncronas e assíncronas, permitindo um processo permanente de diálogo entre professor e aluno.” (UCB, 2009, UEA 1, aula 1, p. 13) É importante ressaltar aqui a diferença entre as ferramentas de comunicação síncronas e assíncronas supracitadas. As ferramentas de comunicação síncronas são aquelas que permitem a comunicação entre as pessoas em tempo real, ou seja, o emissor envia uma mensagem ao receptor e este a recebe quase que instantaneamente. Podemos citar como exemplos desse tipo de comunicação os chats e as vídeo-conferências. Já as ferramentas assíncronas dispensam a participação simultânea das pessoas, ou seja, o emissor envia uma mensagem ao receptor que poderá lê-la em outro momento e, então, respondê-la. São exemplos destas ferramentas os fóruns e os emails. O uso das ferramentas síncronas e assíncronas é essencial para que aconteça uma comunicação efetiva e eficaz. E é através da comunicação entre Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -4- alunos e professores que a aprendizagem acontece nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs). Souza (2006), ao definir a comunicação, afirma que a mesma pode ser vista como um processo em que os indivíduos, inseridos num contexto, trocam mensagens que geram determinadas consequências. A comunicação também pode ser vista como atividade social, em que pessoas pertencentes a uma determinada cultura, criam e trocam significados de acordo com as experiências que vivenciam. A comunicação tem vital importância para os seres humanos, por vários motivos, dentre eles para: trocar informações, entender e ser entendido, integração em grupos, satisfazer as necessidades, interagir. Outra atribuição essencial ao professor de EAD é evitar os possíveis problemas causados pela distância física. O professor (que a partir de agora passaremos a chamar também de tutor) tem a função de desempenhar um papel tutorial para que o aluno vença barreiras que possam surgir ao estudar sozinho. Nesse aspecto, o professor/tutor deve estar sempre presente, seja tirando dúvidas com relação ao conteúdo, seja orientando a utilização da sala de aula virtual e das ferramentas de aprendizagem. Dialogia digital e pragmática: a escrita como possibilidade de aproximação afetiva entre os participantes do processo educativo virtual Os estudiosos da linguagem costumam abordar o conceito da palavra Pragmática, que é comumente vista como a disciplina que se preocupa em estudar a língua em situação de uso, numa perspectiva que obrigatoriamente leva em conta o emissor (produtor do texto), seu receptor (o leitor/ouvinte) e o contexto em que ambos se inscrevem. De acordo com Cunha (2006), a perspectiva pragmática não tem por objeto de estudo o código pelo código, mas seu uso. Nessa perspectiva, o objetivo principal desta pesquisa está na observação do uso da língua/linguagem no contexto dos cursos de EAD, atentando para o fato de os emissores fazerem Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -5- escolhas léxico-gramaticais que propiciem um ambiente mais informal, estabelecendo, assim, maior afetividade entre os envolvidos na comunicação. Travaglia (1997), ao falar sobre as possíveis definições de linguagem, argumenta que a concepção mais aceita atualmente é a linguagem como forma de interação. De acordo com esta definição da linguagem, ao falar, o indivíduo realiza ações, atua sobre seu interlocutor e sobre o meio no qual está inserido. A linguagem torna-se forma de produção de sentidos entre os falantes. Os usuários da língua ou interlocutores interagem enquanto sujeitos que ocupam lugares sociais e ‘falam’ e ‘ouvem’ desses lugares de acordo com formações imaginárias (imagens) que a sociedade estabeleceu para tais lugares sociais. (TRAVAGLIA, 2007, p. 23) Ainda definindo a linguagem, a Universidade Católica de Brasília (2009), citando Vygotsky, afirma que a linguagem não só serve ao propósito de comunicação entre indivíduos, mas também simplifica e generaliza a experiência, ordenando as instâncias do mundo real em categorias conceituais cujo significado é compartilhado pelos usuários dessa linguagem. Desta forma, a comunicação entre os falantes de determinada língua só acontece a partir do momento em que há uma prévia construção coletiva de conceitos e significados. De acordo com Vygotsky( 1993), a interação social que potencializa o desenvolvimento do ser humano acontece através da colaboração entre pares. Assim, cada vez mais instituições e profissionais de EAD consideram a relevância da interação no processo de aprendizagem, pois as pessoas conseguem construir conhecimentos sem interação, mas quando essa lhes é proporcionada, os resultados são bem superiores, uma vez que haverá os conteúdos, a vivência com tutor e outros aprendizes e, a partir daí, novos conhecimentos e pensamentos serão desencadeados. Entende-se, pois, que os estudos modernos voltam-se para a dicotomia entre o cognitivo e o afetivo. A este respeito, Tijiboy et al (2009) afirmam que é Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -6- sabido, através dos estudos atuais, que a dimensão cognitiva na educação está profundamente relacionada com a dimensão afetiva. Ainda sobre a referida dicotomia, Vygotsky (1993;p36) diz que separar tais dimensões é como não ver o ser humano completo, alertando para as repercussões desse enfoque que considera equivocado: Quem separa desde o começo o pensamento do afeto fecha para sempre a possibilidade de explicar as causas do pensamento porque uma análise determinista pressupõe descobrir os motivos, a necessidade e interesses, os impulsos e tendências que regem o movimento do pensamento em um outro sentido. De igual modo, quem separa o pensamento do afeto nega de antemão a possibilidade de estudar a influência inversa do pensamento no plano afetivo. Sendo assim, a linguagem torna-se uma forma eficaz de se estabelecer interação, comunicação e, por consequência, afetividade e aprendizagem. Souza e Sousa (2007) afirmam que a linguagem exerce um papel fundamental nos cursos da educação online, pois os diálogos, as trocas, a interação nos fóruns de discussão, nos chats, são proporcionados pela escrita. Como, nesses cursos, as pessoas, geralmente, não têm a possibilidade de ver os gestos, os olhares, a expressão corporal dos colegas e professores, são as palavras e as imagens que transmitem os sentimentos. Devemos, então, estabelecer um paralelo entre a linguagem e a afetividade na educação online, a partir da percepção de que ambas são inseparáveis nos cursos de EAD, e de que o sucesso das mesmas leva ao consequente sucesso do processo ensino/aprendizagem. Neste sentido, Pesce (2004) vem trabalhando com o conceito de dialogia digital, cujo embasamento parte dos estudos de uma busca dos indicadores de dialogia e leitura crítica. A autora parte do conceito proposto por Bakhtin (1986, ), segundo o qual a dialogia ocorre quando a interação entre os sujeitos de fato serve à constituição mútua de ambos. Segundo a autora, nessa perspectiva, a dialogia constrói-se numa relação horizontal, de modo a negar a diretividade de um sujeito sobre o outro. Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -7- A autora ainda trabalha o conceito de formação do leitor crítico, sendo esse um ser que, por intermédio da linguagem, intervém no mundo, relacionando o texto lido com suas experiências e com textos anteriores, discutindo-os com seus pares e contextuando-os à própria realidade. Dessa forma, na dialogia digital não há a interação diretiva de um sujeito sobre o outro, mas a constituição mútua dos sujeitos em interação permanente. Assim, para alcançarmos uma interação digital dialógica, devemos situar os aprendizes como seres ativos e protagonistas do seu processo de formação, ou seja, como co-participantes do processo no qual estão envolvidos. Pesce aponta, também, outra preocupação da dialogia digital: viabilizar a construção de um grupo de aprendizagem colaborativa, que privilegie a troca de experiências entre os aprendizes, com vista a crescentes níveis de complexidade teórico-metodológica. Contudo, o mediador do processo não deve focar somente as intervenções conceituais e reflexivas, mas também as afetivas, por incitarem as manifestações pessoais dos aprendizes no ambiente digital. Contexto da pesquisa Esta pesquisa de caráter qualitativa realizou coleta de dados em ambiente virtual de aprendizagem, mais precisamente, na plataforma Moodle, em três cursos de EAD oferecidos pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), sendo eles: aperfeiçoamento em Relações Étnico-Raciais (duração de sete meses setembro de 2009 a abril de 2010), especialização em Práticas de Letramento e Alfabetização (duração de 18 meses – agosto de 2008 a dezembro de 2009), e especialização em Matemática (duração de 18 meses - janeiro de 2009 a julho de 2010). Para composição dos dados da pesquisa, foram consideradas as participações dos alunos em fóruns avaliativos, bem como participações dos tutores responsáveis pelas turmas, haja vista que nos cursos a distância da UFSJ os professores universitários são responsáveis apenas pela elaboração dos conteúdos Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -8- dispostos nos materiais didáticos, mas não mantêm contato com os alunos via plataforma. Além de analisar as participações em fóruns, também se sentiu a necessidade de buscar elementos da linguagem utilizada em alguns emails tanto dos tutores, quanto dos alunos. A caracterização de expressões de cunho informal, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com quatro estudantes do curso de Relações ÉtnicoRaciais, bem como com três tutores dos cursos da Universidade Federal de São João del-Rei e com a coordenadora de tutores do Núcleo de Educação a Distância da referida universidade. Outra fonte de dados para esta pesquisa foi o próprio material didático, tanto virtual quanto impresso, pois dele várias expressões foram passíveis de observação e análise. Discussão dos resultados Esta pesquisa procurou observar a aplicabilidade das teorias estudadas relacionadas ao uso da linguagem informal em cursos de EAD, bem como ao bom êxito da dialogia digital, propiciando aprendizagem e afetividade através da linguagem na Educação a Distância. Ao serem entrevistados, os tutores dos cursos analisados relataram a necessidade de usarem a linguagem informal por motivo aproximação/afetividade e motivação dos alunos, como podemos observar de a seguir: Como tutora, procurei sempre usar de uma linguagem informal, como se estivesse conversando com meus alunos pessoalmente. Sempre procurei me despedir com expressões do tipo “Grande abraço”, além de usar expressões que os convidassem a participar. Geralmente escrevia um “Vamos lá?” para tentar encorajá-los a participar e interagir mais. No início percebi que os alunos sentiam-se retraídos, muito formais, por assim dizer. Mas com o desenvolver dos fóruns os laços de amizade foram surgindo e, consequentemente, percebi o aumento das participações. A Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação -9- linguagem que funciona na EAD com certeza é aquela que aproxima os participantes. (TUTORA DO CURSO DE APERFEIÇOAMENTO EM RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS, junho de 2010). Nessa mesma perspectiva, observou-se que, apesar de o AVA tratar-se de um ambiente de cunho acadêmico, e de todas as participações serem escritas, fator que exigiria uma linguagem formal e culta, expressões que denotavam afinidade, afetividade, empatia e outros eram por muitas vezes repetidas, e que se criavam, ali, situações de proximidade, o que causou estranheza pelo fato de os participantes muitas vezes não se conhecerem pessoalmente. Fazendo uma análise da interação com afetividade, Tijiboy et al (2009) dimensionam que a afetividade faz parte do ser humano, sendo a base para o seu desenvolvimento. Assim, as reações emocionais influenciam nosso comportamento e o processo de ensino/aprendizagem, pois O fator afetivo está ligado à educação, uma vez que o conhecimento é permeado por relações com terceiros. O afeto é aprendido durante o desenvolvimento da pessoa e se manifesta por meio das emoções. Na educação pode-se despertar o desejo de conhecer através das emoções. Estas emoções podem ser educadas através de recursos e estratégias de conduta, cognitivas, emocionais e de relacionamento interpessoal. (TIJIBOY et al, 2009, p.4) Os trechos a seguir foram extraídos de participações em fóruns, tanto do curso de aperfeiçoamento em Relações Étnico-Raciais, quanto do curso de especialização em Práticas de Letramento e Alfabetização. Nos dois cursos foi possível observar que, quanto maior o passar do tempo, e maior o contato entre alunos e tutores, mais expressões de afinidade e afetividade apareceram nas colocações dos participantes dos cursos. Foi ainda observável que os alunos começaram a interagir mais a partir do momento em que se sentiram “à vontade” ao conversar com os colegas e o tutor, o que levou tanto tutores quanto estudantes a experimentar esse “desejo de conhecer através das emoções” citado pelas autoras supracitadas. Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação - 10 - O aumento de expressões informais de afetividade foi claramente observável principalmente nos cursos de especialização que tiveram maior duração (18 meses). O uso de cores e “smiles” também começam a se tornar freqüentes, aliados a expressões de afinidade como “amigo (a), queridos, colega, chuchu...”, além de expressões que exprimem sentimento, como apelidos ou o uso de verbos como “adorar”. Tijiboy et al (2009), a este respeito, afirmam que “o sentido cognitivo vem das experiências vividas com outras vivências impregnadas de significados e de subjetividade que conferem valor ao que foi apreendido”(p. 2). Olá pessoal! Este é o nosso primeiro Fórum Temático. Lembre-se de que este Fórum é avaliado, portanto todos precisam responder a questão principal. No entanto, é possível também interagir com a resposta dos outros alunos. A data limite para esse fórum é dia 19 de outubro, ok? (...) Um abraço a todos! (CURSO DE RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS, FÓRUM DE DISCUSSÃO, out. 2009 – início do curso) Olá queridos cursistas! Estou muito satisfeita com o caminhar deste fórum. As participações estão de altíssima qualidade! (...) Minha proposta é a seguinte: Vamos lá? Aguardo vocês! Grande abraço, xxxxxxx (CURSO DE RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS, FÓRUM DE DISCUSSÃO, jan. 2010 – perto do fim do curso) Oi xxxxxxxx tudo bem? quero te agradecer por clarear as ideias que apresentei, quando coloquei uma lista de atividades cotidianas eu não soube como mostrar a dinamicidade com que fazemos isto na sala de aula. (...) Enfim, foi muito bom ver as sugestões dos colegas até agora e a xxxx me ajudou a elaborar melhor as minhas respostas (...) Obrigada por esta oportunidade que todos estão aprendendo, um beijão! ESPECIALIZAÇÃO EM PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO, (FÓRUM DE DISCUSSÃO, out. 2009 – meio do curso) Chuchu!!! fico muito feliz que pude clarear suas idéias, Beijocas (ESPECIALIZAÇÃO EM PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO , FÓRUM DE DISCUSSÃO, out. 2009 – meio do curso) (...)a história vai longe! Eles já estão levantando preço de bebedouro, de quantos litros deve ser o galão etc. Vai “dar muito problema pras mangas Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação - 11 - ainda”! E, geeeeeeeeeeeeente, agora que eles estão se familiarizando com a sistematização matemática. Ai, chega, né xxxxxx! Nem sei se vocês lerão. Escrevi algumas “cositas”. A gente trabalha tanto, não é mesmo? Espero ter oferecido um poucochinho do meu mundo com meus pequeninos. É muita coisa. Deixo registrado um pedaço do meu coração para vocês. (ESPECIALIZAÇÃO EM PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO, FÓRUM DE DISCUSSÃO, set. 2009 – meio do curso) De acordo com Tijiboy et al (2009), deve-se levar em consideração que o conhecimento é a soma das experiências cognitivas e emocionais do indivíduo, e que essas experiências são registradas na memória, sendo ela (a memória) fundamental para a aprendizagem e o desenvolvimento. Prova disso é o comentário de uma estudante feito logo após a participação supracitada no mesmo fórum: Amiga xxxxxx, é por causa dessa animação, desse incentivo que você demonstrou com seus comentários que podemos ter esperança que nossos alunos serão muito melhores do que nós realmente. Isso se, como você disse, trabalharmos esse discernimento, essa analogia de vida com nossos alunos. Filosofar sempre, não é? Abraços. (ESPECIALIZAÇÃO EM PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO, FÓRUM DE DISCUSSÃO, set. 2009) Observamos também que, ao escrever o material didático, o professor, além de usar uma linguagem mais simples e de fácil compreensão, preocupou-se, também, em usar expressões que denotam encorajamento e aproximação, que fizeram do material muito mais que um simples “livro” a ser folheado, mas também um material dialógico, o que estabeleceu relações de proximidade e afetividade entre o mesmo e os alunos. De acordo com Cunha (2006), primar pela interatividade na elaboração do material didático é uma forma de minimizar as dificuldades enfrentadas pelos alunos na compreensão dos conteúdos, o que significa que os mesmos podem ser apresentados como se se estivesse conversando com o aluno-leitor (p. 7) Caro estudante, você estará refletindo sobre algo inerente a si mesmo. Minha aposta é a de que, ao final desse módulo, você não será mais o mesmo. Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação - 12 - Faça um bom proveito do material. Seja feliz! É o que recomenda o professor José Luiz (NEAD/UFSJ, Curso de Aperfeiçoamento em Relações Étnico-Raciais, out. 2009) Neste contexto, Cunha (2006) afirma que é preciso ter sensibilidade e experiência no exercício docente.. Segundo a autora, o ideal é que o professor conteudista esteja acostumado a ministrar o conteúdo sobre o qual está preparando o material a ser disponibilizado online, presencialmente, pois tal experiência certamente o auxiliará na detecção de pontos mais problemáticos com relação a possíveis dúvidas do futuro leitor. (p.8) Compreendemos, assim, que a afetividade é fundamental nos cursos a distância e que umas das grandes estratégias para que aconteça o sucesso dos mesmos é o uso de uma linguagem que aproxima os participantes deste processo. Como já fora dito, esta linguagem informal não deixa de ser comprometida com a língua portuguesa culta, mas é aproximada da oralidade, a fim de estabelecer maiores vínculos e, consequentemente, o sucesso da construção colaborativa do conhecimento. Por esta razão concordamos, ainda, com Freire (1996), quando diz que a prática educativa vivida com afetividade e alegria não prescinde da formação científica séria. Considerações finais A princípio o objetivo desta pesquisa era apenas analisar o uso da linguagem nos cursos de Educação a Distância. No entanto, foi interessante perceber que, ao longo da mesma, outros aspectos puderam ser estudados, como a afetividade que estava intimamente ligada ao cognitivo e a combinação de fatores que resultaria na dialogia digital. À medida que este trabalho se desenvolveu, novas descobertas surgiram, como, por exemplo, a relação de causa/consequência, que se daria da seguinte maneira: Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação - 13 - Figura 1. Relação de causa/consequência no processo de ensino e aprendizagem com utilização da linguagem informal em cursos de EAD Contudo, observando o comportamento linguístico tanto de professores/tutores quanto de estudantes, ficou claro que outro fator deveria ser integrado a esta pesquisa: o tempo de contato entre alunos e professores/tutores. Conforme visto no capítulo anterior, à medida que o tempo passava, os alunos iam se aproximando mais, criando, consequentemente, laços de afetividade, fator observável nas participações de fóruns e emails, em que expressões informais e próximas da oralidade começavam a surgir com o tempo. Assim, uma nova relação não só de causa/consequência, mas de proporção começou a ser estabelecida: Figura 2 – Relação de causa/proporção/consequência no processo de ensino e aprendizagem observando o fator tempo associado ao uso da linguagem em cursos de EAD Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação - 14 - Ficou claro, então, que quanto menos afetividade havia entre os participantes do processo educativo, mais formal era a linguagem utilizada entre eles. À medida que o tempo ia passando, aumentava-se o contato e, consequentemente, a afinidade e afetividade. A partir de então, os participantes sentiam-se mais à vontade para interagir com os colegas e tutores, utilizando de uma linguagem mais informal, voltada para a oralidade, como se estivessem lidando com colegas que se encontravam todos os dias nos corredores da universidade. Conclui-se com este trabalho e que muito ainda pode ser “descoberto”, haja vista a extensão de estudos que a Educação a Distância nos propicia. Aspectos como o tempo e sua utilização em favor do sucesso na aprendizagem podem ser Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação - 15 - ainda aprofundados, levando em consideração que esse fator está fortemente ligado aos estudos feitos nesta pesquisa. Referências Bibliográficas ALVES, J.R.M. A Educação a distância no Brasil: síntese histórica e perspectivas. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação, 1994. BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec,1986. 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