Habitação tem prioridade e supera obras públicas
ERIKA NUNES
Hoje é o Dia Mundial da Habitação e as Nações Unidas apelam a um "planeamento urbano
urgente", cuja necessidade, em Portugal, também é consensual entre proprietários, inquilinos,
construtores e políticos.
Seria caso para perguntar: se todos estão de acordo no que é preciso fazer, por que é que o problema
ainda não está resolvido? E a resposta, unânime, reside na legislação em vigor. Por sinal, o regime
de arrendamento urbano foi actualizado, em 2006, pelo Governo de maioria socialista. E outra, a de
reabilitação urbana, foi lançada ainda este ano, já bem perto das eleições.
"A habitação foi deixada ao desleixo, nem há investimento público, nem privado", queixa-se Reis
Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas
(AICCOPN), lembrando a crise que grassa no sector, em que a média de licenciamentos para novas
construções anda nos "sete fogos por mês por concelho". A resposta para o problema será "a
reabilitação, que representa 28 mil milhões de euros e cujos benefícios são mais transversais que os
do TGV". Para tal, "o Estado tem de descer o IVA para 5% e criar linhas de crédito para a
reabilitação".
Os proprietários concordam: "Se o Estado dedicasse à reabilitação o mesmo que entregou aos
bancos com o crédito bonificado, já era bom. Mas que não seja para aquilo que nos parece que já
vem acontendo: apropriar-se dos centros históricos das cidades, dar emprego a engenheiros e
arquitectos e, depois, vender a preços que só são acessíveis a classes abastadas", alerta António
Frias Marques, presidente da Associação Nacional de Proprietários (ANP). Urgente, mesmo, para a
ANP, é a criação de uma Sociedade Pública de Aluguer, gerida pelo Estado, que assegura a
idoneidade dos inquilinos e também das habitações, criando uma Bolsa de Aluguer, garantindo o
recebimento das rendas através de um seguro colectivo. "Há um grau elevado de incumprimento e
não adianta recorrer a tribunais", lamenta António Frias Marques. Com uma percentagem elevada
de senhorios a receber rendas inferiores a 50€, a "reabilitação é impossível" e "há muitos senhorios
a viver uma pobreza envergonhada enquanto os inquilinos vão de férias para Cancun".
A Associação de Inquilinos Lisbonense teme que uma revisão da lei possa ter efeitos retroactivos,
mas também considera essencial que sejam "tomadas medidas efectivas no plano judicial" para
resolver os conflitos com origem no "incumprimento, tanto por parte dos proprietários, como por
parte dos arrendatários". E concorda, inclusive, que seja aliviada a carga fiscal sobre os
proprietários quando os mesmos procederem a obras de reabilitação e possuirem certificação dos
prédios.
Efectivamente, o PS reconhece tacitamente que é necessário rever o Novo Regime de Arrendamento
Urbano, tal como propôs ao eleitorado. "Seguro de renda, bolsas de habitação, formas expeditas de
resolução de conflitos no contrato de arrendamento e medidas de estímulo à reabilitação e à
utilização de devolutos para arrendamento" são outras propostas de José Sócrates, a par da
"continuidade de um programa de apoio financeiro aos particulares (PROREABILITA),
incentivando a reabilitação de iniciativa dos privados" e de um "ajustamento da legislação fiscal,
inovando em matéria de financiamento público da reabilitação urbana e de dinamização das
actividades económicas em áreas de reabilitação urbana".
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