Efetivação dos direitos sociais dos
trabalhadores mediante a aplicação
do pacto sociolaboral do Mercosul
Cadernos de
Pós-Graduação
em Direito Político
e Econômico
Caio Augusto Limongi Gasparini
Aluno do Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em
Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie
RESUMO
Neste ensaio será analisado o meio pelo qual os direitos sociais dos
trabalhadores são efetivados, especificamente mediante a aplicação do Pacto Sociolaboral do Mercosul. Para isso, preliminarmente, verificar-se-á o que sejam os direitos sociais e os direitos sociais
dos trabalhadores, para em seguida identificar-se o relacionamento
do Mercosul com o tema e, finalmente, enfrentar-se precisamente
o tema proposto.
Palavras-chave: Direitos sociais. Efetivação, Mercosul. Pacto
Sociolaboral.
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CAUSAS HISTÓRICAS DOS DIREITOS SOCIAIS
A menção corriqueira aos direitos humanos inspira uma visão romântica sobre
o assunto, ilustrada, principalmente, por um vago ideal de amor ao próximo. A análise
histórica do seu desenvolvimento, porém, revela que a consagração dos chamados
direitos fundamentais deve-se a razões muito mais mundanas.
De fato, as declarações de direitos, cujo expoente máximo é a Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, constituem providências tomadas
pelas classes economicamente emergentes, com a finalidade de restringir os privilégios
estabelecidos pelo regime absolutista. As declarações de direitos, portanto, foram
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meios de realização dos ideais burgueses, tendo-se já afirmado que o individualismo
constitui a “consolidação das raízes do sistema capitalista que está em formação e
florescimento” (MASCARO, 2003, p. 37).
E tanto é assim que, no curso do processo histórico, o individualismo sustentou a afirmação dos direitos políticos e civis, acarretando nova crise de relacionamento
entre o Estado e os próprios indivíduos, em razão dos conflitos que gerou entre os que
dispunham de meios para usufruírem sua individualidade e os que não tinham tais condições. A conseqüência histórica foi a Revolução Industrial.
resposta estatal para esta situação veio brevemente, já na Constituição Francesa de 1848, considerada a primeira declaração dos direitos sociais ou direitos fundamentais de segunda geração.
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QUE SÃO DIREITOS SOCIAIS?
No esforço para entender-se o que sejam os direitos sociais, é preciso, em
primeiro lugar, ressaltar que nem sempre o que se chama por este nome corresponde
ao que se designa Direito Social – apesar de, não raramente, empregar-se uma denominação pela outra. Essa questão, porém, será resolvida mais adiante.
Sobre o conceito de direitos sociais, é possível identificar na doutrina duas
orientações: a primeira esclarece que se trata de direitos que o indivíduo possui em
face do Estado e que lhes legitimam a cobrar-lhe o fornecimento de condições adequadas para seu desenvolvimento como ser humano. Caupers (1985, p. 23) acrescenta que se cuida de “direitos de crédito a prestações do Estado e de outras entidades públicas ou privadas (direito à saúde, à segurança social, à proteção no desemprego involuntário, à instrução)”; a outra orientação qualifica a anterior, acrescentando
a essa relação creditícia a qualidade de hipossuficiência do credor. Neste sentido,
Alexandre de Moraes (2003, p. 43) refere que os direitos sociais “caracterizam-se
como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida aos
hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social”. Considerando o direito
trabalhista como uma modalidade dos direitos sociais, Amauri Mascaro Nascimento
(1998, p. 43) comenta o seguinte: “O homem é compreendido com um ser integrante
do social. A sociedade é vista como devedora de obrigações para com o homem. O
direito em questão teria como finalidade a proteção dos hipossuficientes”.
Essa última concepção, mais completa e que enfatiza a proteção devida pelo
Estado aos hipossuficientes, está afinada com as concepções ideológicas que determinaram a consagração dos direitos sociais. Não obstante, não parece ser o
posicionamento correto.
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Defende-se a desvinculação do conceito de direitos sociais da condição de
hipossuficiente porque não apenas estes, mas também os detentores dos meios de
produção, assim como a camada social que se designa como “classe média”, também
têm direito às condições razoáveis, se não necessárias, para o seu desenvolvimento
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como seres humanos. Também eles têm direito à previdência social, ao acesso ao
trabalho, à moradia, à saúde e todos os demais direitos de caráter social, que serão
apresentados mais adiante. Afinal de contas, como também será sustentado em outra
oportunidade, os direitos sociais não excluem os direitos individuais, antes servem de
meio de sua integral realização – e ricos, pobres e os que não são nem ricos nem
pobres são sujeitos de direito, titulares de todos os direitos subjetivos que o Estado
Democrático de Direito assegura.
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Assim, sugere-se o seguinte conceito de direitos sociais: direitos subjetivos
que têm os indivíduos de reclamarem do Estado a realização de providências efetivas
que lhes criem o ambiente adequado ao desenvolvimento de sua condição humana.
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ROL DOS DIREITOS SOCIAIS
A fim de possibilitar a indicação de quais sejam os direitos sociais, é muito útil
aproveitarem-se as ponderações de Robert Alexy (2001, p. 430-482), que refinam o
entendimento de que os direitos sociais são direitos a prestações, da seguinte maneira:
Los derechos a prestaciones (en sentido amplio) pueden ser divididos en 3 grupos: (1)
derechos a protección, (2) derechos a organización y procedimientos y (3) derechos a
prestaciones en sentido estricto. [...] Por derechos a protección habrán de entenderse
aquí los derechos del titular de derecho fundamental frente al Estado para que éste lo
proteja de intervenciones de terceros. [...] Derechos procedimientales pueden ser tanto derechos al establecimiento de determinadas normas procedimientales cuanto
derechos a una determinada ‘interpretación y aplicación concreta’ de normas
procedimientales. [...] Los derechos a prestaciones en sentido estricto son derechos
del individuo frente al Estado a algo que - se el individuo poseyera medios financieros
suficientes y si encontrase en el mercado una oferta suficiente - podría obtenerlo
también de particulares. Cuando se habla de derechos sociales fundamentales, por
ejemplo, del derecho a la previsión, al trabajo, la vivienda y la educación, se hace
primariamente referencia a derechos a prestaciones en sentido estricto.
Esse parece haver sido o raciocínio desenvolvido pelo constituinte brasileiro
de 1988, já que a Constituição promulgada neste ano oferece, em seu artigo 6o, um rol
de direitos sociais que contempla os direitos à educação, à saúde, ao trabalho, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância e à assistência aos
desamparados. Por meio da Emenda Constitucional no 26, de 14 de fevereiro de
2000, ainda se acrescentou o direito social à moradia.
Mas a Constituição não se limita a declarar os direitos sociais, como direitos a
prestações em sentido estrito, havendo a previsão dos direitos à proteção e de natureza procedimental. No mesmo capítulo que contém o artigo 6o – Capítulo II (“dos
Direitos Sociais”) do Título II (“dos Direitos e Garantias Fundamentais”) – já se apresenta amplo rol de direitos trabalhistas mínimos (art. 7o), que é complementado por
disposições próximas (arts. 9o a 11), e se traçam os princípios do sindicalismo (art.
8o). Mais adiante, expressa-se em relação às políticas de Saúde (arts. 196 a 200),
Previdência Social (arts. 201 e 202), Educação (arts. 205 a 214) e Família e Infância
(art. 226 e 227).
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REGIME JURÍDICO DOS DIREITOS SOCIAIS
Entretanto, a concepção apresentada não quer dizer, por exemplo, que ao
direito dos indivíduos à saúde corresponda ao Estado o dever de realizar tal e qual
prestação que lhe assegure ter saúde. Apesar de identificarem-se os direitos sociais
como direitos a prestações, a doutrina dos direitos fundamentais não faz decorrer
disso o estabelecimento exato dessas prestações. Como Canotilho (1998, p. 479)
observou, “não se estabelece a correspectividade estrita entre direitos fundamentais e
deveres fundamentais”. Vale aqui, o “princípio da assinalagmaticidade” ou da “assimetria”
entre direitos e deveres fundamentais.
Por causa desse ponto de vista é que se asseguram direitos sociais ao indivíduo, constituídos de prestações que o Estado deverá realizar em seu favor, mas, não
obstante, admite-se que o Estado desincumba-se dessas prestações por meio do estabelecimento de políticas destinadas à sua realização – ainda que não haja realização
efetiva. Daí já se haver afirmado que “trata-se mais de uma manifestação de dever-ser
do que propriamente de algo que seja, na plenitude” (CHIARELLI, 1989, p. 11).
Assim estabelecidos os direitos sociais, não segue a conclusão de que haja
conflitos entre eles e os direitos individuais, nem mesmo a de que estes se encontrariam
superados, apesar se considerarem direitos de primeira geração enquanto aqueles
outros chamam direitos de segunda geração.
A sucessão histórica que lhes atribuiu essas designações acaba até mesmo por
explicar porque os direitos individuais não são prejudicados pelos direitos sociais. No
momento da afirmação dos direitos individuais, garantiu-se que o Estado furtar-se-ia
de intervir na esfera de cada sujeito, a fim de que os direitos à vida e à liberdade, dos
quais todos os demais decorrem, pudessem ser exercidos sem peias. No momento
seguinte, da afirmação dos direitos sociais, notou-se que era preciso não apenas liberar o exercício desses direitos, mas, mais ainda, criar um cenário apropriado para esse
exercício, criar o ambiente em que ele pudesse se desenvolver. Assim, é possível asseverar que “estes últimos buscam assegurar as condições para o pleno exercício dos
primeiros, eliminando ou atenuando os impedimentos ao pleno uso das capacidades
humanas”, de maneira que os direitos sociais “tornam reais direitos formais”, tal como
refere Celso Lafer assevera (1998, p. 127). Isso porque nos nossos dias, em pleno
desenvolvimento econômico, o Estado que se limitasse a respeitar os clássicos direitos
de liberdade sucumbiria inexoravelmente, dando lugar a um Estado autoritário assente
nas oligarquias possidentes ou nas massas sobre-exploradas e, inevitavelmente, revoltadas (CAUPERS, 1985, p. 53).
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O PROBLEMA DA EFICÁCIA DOS DIREITOS SOCIAIS
Estando estabelecidos e com a finalidade de promover a realização dos direitos individuais, resta avaliar o modo pelo qual os direitos sociais adquirem eficácia, o
que, de forma nenhuma, poderá ser admitido como verdadeiro pela mera consagração
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legislativa dos direitos sociais. Esse é o ponto mais importante da teoria dos direitos
sociais, conforme a orientação colhida nas seguintes palavras de Norberto Bobbio
(1992, p. 25):
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O problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais
amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é a sua
natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das
solenes declarações, eles sejam continuamente violados.
Mas tanto quanto importante, o pormenor é problemático. Afinal, de acordo
com a advertência de Celso Lafer (1988, p. 129), “os direitos econômicos-sociais e
culturais, pelas suas características de ‘objetivos’ a serem realizados progressivamente por uma coletividade, através da ação estatal, são menos suscetíveis de aplicação
imediata”.
Por causa disso mesmo, o expediente da auto-aplicabilidade, atribuído aos
direitos individuais, encontra-se prejudicado no campo dos direitos sociais. Ou seja:
diferentemente do que ocorre com a ameaça à vida, à propriedade, à intimidade, à
propriedade, que encontra rápida resposta por meio da garantia do acesso ao judiciário, cuja prontidão é potencializada se se trata de hipótese de manejo dos chamados
remédios constitucionais, à ameaça aos direitos à saúde, à educação, ao trabalho, à
previdência, não corresponde nenhum remédio específico.
Obviamente que há casos em que o pleito judicial remedia algum inconveniente, como casos em que se determina ao Poder Público fornecer medicamento à pessoa doente que depende de seus socorros para sobreviver. Mas isso, nem de longe,
significa realização do direito social à saúde, que se concretizaria com um sistema
público de saúde que prevenisse e tratasse doenças. Em outras palavras, em casos
assim se obtém o objeto de uma prestação, mas não se obtém a prestação em si, e isso
se confirma pela apuração de que enquanto aquele que teve o descortínio de contratar
advogado sobrevive pelo período em que o remédio fornecido fizer efeito, todos os
demais indivíduos em situação semelhante padecem do mal que lhes acomete.
A solução para um impasse desse tipo, hipoteticamente, é simples, pois a
questão se resume, em última análise, numa forma de redistribuição. Mas é justamente
por isso que o tema torna-se delicado - afinal, a forma pela qual o Estado realiza a
prestação devida aos indivíduos é custeada por sua arrecadação. Na fala de Robert
Alexy (2001, p. 493), “en el cumplimiento de los derechos fundamentales sociales,
el Estado puede distribuir sólo aquello que, bajo la forma de tasas e impuestos,
saca de otros”. E completa o autor:
Como en ella, entre otros casos, se trata de problema de redistribución, su “explosividad
política” es obvia. En ningún otro ámbito es tan clara la conexión entre el resultado
jurídico y las valoraciones prácticas y políticas; en ningún otro ámbito se discute tan
tenazmente (ALEXY, 2001, p. 427).
Aí a questão acaba por resumir-se numa escolha de critérios: Arrecadar e
aplicar em favor de quem não participou da arrecadação, ou justamente em favor dos
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participantes? É óbvio que a impressão é a de que o problema acaba por se transformar numa questão política, já tendo sido afirmado que “a questão social, antes de
tudo, não é uma questão de ordem jurídica, que possa encontrar solução nas leis”
(CEQUEIRA, 1961, p. 86).
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DIREITOS SOCIAIS DOS TRABALHADORES
O trabalho se circunscreve no elenco dos direitos sociais, não apenas pela
expressa opção da Constituição Federal, como também por toda a doutrina a respeito
do tema, que, em seus exemplos, a ele sempre se refere. Por isso, é viável aprofundar
o estudo a respeito dos direitos sociais dos trabalhadores, com enfoque no seu tratamento específico, uma vez que se trata de uma das formas de garantir a essência
humana do indivíduo.
Os direitos sociais dos trabalhadores são os direitos sociais envolvidos no
desenvolvimento da dialética dos meios de produção. São um plus em face dos tradicionais direitos sociais, pois “há direitos comuns às pessoas e ao trabalhador, e outros
específicos do trabalhador” (NASCIMENTO, 1998, p. 291).
Costuma-se afirmar, por outro lado, que não são, porém, a mesma coisa que
direitos trabalhistas, pois sua gênese está, justamente, na verificação de que
a exposição da vida, da saúde e da integridade física do trabalhador a riscos maiores do
que os suportáveis, ou exigíveis em suas funções, demonstrou a importância dos direitos humanos do trabalhador e a ineficácia das soluções desses problemas quando tratados na esfera contratual, e não na ordem dos direitos humanos (CRUZ, 2001, p. 7).
Portanto, “não são garantias contratuais ou legais, mas podem expressar-se
também dessa forma” (NASCIMENTO, 1998, p. 286).
Não parece fazer sentido esse tipo de apreciação do problema. De fato, é muito
mais razoável entender que os direitos sociais dos trabalhadores são o fundamento dos
direitos trabalhistas, ao passo que estes são os meios de efetivação daqueles.
Não é difícil propor um conceito de direito social dos trabalhadores: São os
direitos que lhe são reconhecidos em face do Estado, destinado a assegurar-lhes o
desenvolvimento humano enquanto participantes do processo de produção. É a mera
adaptação do conceito anteriormente formulado ao âmbito da discussão. E como se
realizam esses direitos? Por meio dos direitos trabalhistas, de cunho contratual.
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Apura-se, ademais, que os direitos sociais dos trabalhadores e os direitos
contratuais trabalhistas não são entidades diferentes, mas aspectos diversos de uma
mesma realidade, qual seja, a proteção jurídica do trabalhador, correspondendo àqueles
à proteção jurídico-político-filosófica, e estes, à proteção jurídico-legislativa. A observação do sistema jurídico parece, ademais, assegurar a correição deste ponto de
vista, uma vez que num plano declara direitos sociais e em outro, inferior, cria as normas sobre as relações jurídicas trabalhistas, em vista dos valores que aqueles consagram.
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REGIME JURÍDICO DOS DIREITOS SOCIAIS DOS
TRABALHADORES NO MERCOSUL: O PACTO
SOCIOLABORAL DO MERCOSUL
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A sistematização jurídica dos direitos sociais dos trabalhadores, como não
poderia deixar de ser, também foi tragada pelo processo de internacionalização das
normas jurídicas, a que se tem assistido por conta do fenômeno da globalização.
É certo que, os primeiros documentos a esse respeito são as convenções
sobre os direitos humanos do trabalhador da Organização Internacional do Trabalho OIT, órgão da Organização das Nações Unidas - ONU. Estes diplomas, porém, não
tinham outra função senão a de veicular recomendações aos diversos países do globo,
não possuindo nenhuma eficácia vinculativa.
A positivação internacional dos direitos sociais dos trabalhadores surgiu, então, como uma necessidade decorrente da formação dos blocos regionais, como o
Mercosul. Como já se afirmou, “la liberalización del comercio actualiza el debate
sobre la necesidad de promover normas mínimas de trabajo” (CACCIAMALI,
2002, p. 91), o que, de forma nenhuma, é uma tarefa fácil, pois a discussão do sistema
de valores do Direito do Trabalho gera várias respostas, influenciada por fatores ideológicos, corporativistas, econômicos, políticos e sociais, de maneira que, num mesmo
momento, pode servir de tutela ou de opressão ao trabalhador.
Tão delicada é a questão que, na origem, o Mercado Comum do Cone Sul Mercosul, preferiu dela não tratar. Como noticia Ari Possidônio Beltran (2002, p.
165), “de início, não houve preocupação com o aspecto social e as relações de trabalho”. De fato, o ato constitutivo do Mercosul, o Tratado de Assunção, celebrado em
1991, só previu normas orgânicas e econômicas, ignorando as questões sociais e trabalhistas. A justificativa interpretativa foi evitar a livre circulação de trabalhadores.
Após algumas iniciativas, o órgão do Mercosul denominado Grupo Mercado
Comum - GMC, assumiu a análise social da integração, e determinou ao subgrupo SGT
10, que se aprofundasse na discussão do tema. Esse órgão sugeriu um sistema de relações laborais do Mercosul, absorvendo princípios afirmados pela OIT e criando órgão
tripartite de fiscalização. Diferentemente do que se pretendia realizar anterioremente,
previa-se sua implantação gradativa. As linhas gerais do instrumento desse ideal foram
traçadas em 1997, em reunião sobre a dimensão social do Mercosul, e culminou na
assinatura, em 1998, no Rio de Janeiro, da Declaração Sociolaboral do Mercosul, entendida como a “proclamación solemne de los derechos sociales fundamentales
reconocidos como tales en el MERCOSUR” (URIARTE, 2002, p. 11).
Obviamente que não se estabelece, por meio da Declaração, uma unificação
do Direito do Trabalho - o que, de resto, já se sabe impossível - mas sua mera
harmonização, o que permite “mantener ciertos diferenciais, eliminar otros y atenuar algunos. Como indica la aspersión, lo que se busca a través de ella es obtener
un cierto grado de desaparición de las diferencias muy agudas”
(RODRIGUEZ,1995, p. 22). Mas, mesmo assim, em comparação com os instrumen-
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tos similares existentes em outros blocos, como União Européia, NAFTA e Pacto
Andino, a Declaração Sociolaboral do Mercosul revela-se bem sucedida, pois, de
maneira geral, ela é mais abrangente que qualquer outra, pautando-se mais proximamente das Convenções da OIT e tratando de vários temas que os demais não resolveram.
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SOBRE A EFETIVIDADE DOS DIREITOS SOCIAIS DO
TRABALHADOR MEDIANTE A APLICAÇÃO DA
DECLARAÇÃO SOCIOLABORAL DO MERCOSUL
Apesar de o compromisso haver sido estabelecido com a elaboração da Declaração Sociolaboral do Mercosul, é evidente que o respeito aos direitos sociais dos
trabalhadores ainda não é real.
Não é possível negar que há empresas que se preocupam com a condição de
seus empregados, os que se demonstra com a verificação de diversas atividades, “desde
cuidados médicos estabelecidos pela legislação de saúde e segurança até atividades
voluntárias dos empregados e empregadores nas áreas de lazer, motivação, entre inúmeras outras” (FRANÇA, 2003, p. 22). A opinião especializada é a de que “os investimentos em qualidade de vida no trabalho são inevitáveis” (FRANÇA, 2003, p. 41),
pois, “no Brasil, o tema tem despertado o interesse de empresários e administradores
pela contribuição que pode oferecer para a satisfação do empregado e a produtividade empresarial” (FRANÇA, 2003, p. 32).
Não obstante, o cumprimento voluntário dos programas de direitos sociais só
surge se a relação custo-benefício envolvida é favorável ao empreendedor, razão por
que, num ambiente, como o brasileiro, em que predominam a economia informal, a atividade microempresária e a da empresa de pequeno porte, as normas jurídicas analisadas
não passam mesmo de uma declaração, de uma afirmação, com nenhuma ou com pouca
repercussão prática. Como afirma Maria Cristina Cacciamali (2002, p. 93):
El ambiente económico contemporáneo, por otro lado, configura un tipo de mercado
de trabajo que se caracteriza por el aumento de la inseguridad laboral, subjetiva e y
objetiva. Esa inseguridad deriva tanto del menor ritmo de crecimiento económico, y
consecuentemente de la caída en la generación de empleos, como de los cambios
institucionales realizados con relación a las necesidades de mayor competitividad en
los mercados de productos y flexibilidad laboral en los mercados de trabajo.
A organização das economias nacionais em blocos supranacionais é um fator
de agravamento desse quadro que, por si, já é de extrema seriedade. A análise de
Maria Cristina Cacciamali (2002, p. 109) prossegue:
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La liberalización del comercio y la creciente internalización de las economias, de
acuerdo a lo que se ha expuesto en este trabajo, imponen en la mayor parte de los
países latinoamericanos un cuadro macroeconómico que conduce a profundas
modificaciones en la actuación de los sindicatos, la definición de las relaciones y
contratos de trabajo, el sistema de seguridad social público y las condiciones concre-
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tas bajo las cuales se realiza el trabajo. Estas condiciones reducen las posibilidades
de introducir e implementar los derechos fundamentales en el trabajo, en la medida
que se elevan los costos.
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É nesse contexto que se insere a discussão da efetividade da Declaração
Sociolaboral do Mercosul e, de um modo geral, dos direitos sociais dos trabalhadores.
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REPERCUSSÃO JURÍDICA EFETIVA DA DECLARAÇÃO
SOCIOLABORAL DO MERCOSUL – SUA ABSORÇÃO
PELO ORDENAMENTO BRASILEIRO
A primeira indagação, de natureza puramente técnico-jurídica, diz respeito à
absorção da Declaração Sociolaboral do Mercosul na ordem jurídica brasileira, sobre
o que se discute no âmbito do antigo debate sobre o monismo ou o dualismo do
Direito Internacional perante o ordenamento.
Não parece que sequer deva ser esta a ótica a dirigir o exame do caso, pois
não é interessante saber se as normas internacionais sobrepõem ou são sobrepostas
pelas normas nacionais. Basta saber se elas são aplicáveis ou não, pois, na hipótese
versada, não existe conflito a ser dirimido.
Para a questão, o § 2o do artigo 5o da Constituição Federal dá solução bastante, ao determinar que os direitos fundamentais reconhecidos em instrumentos outros que não a própria Lei Maior têm aplicabilidade imediata, caracterizando-se exceção à sistemática estabelecida para a internação do documento de Direito Internacional por meio de ação conjunta dos poderes Executivo e Legislativo.
A explicação de Flávia Piovesan (1997, p. 103, 110) a respeito esclarece a
questão de uma vez por todas:
O direito brasileiro faz opção por um sistema misto, no qual aos tratados internacionais
de proteção dos direitos humanos – por força do art. 5º, parágrafo 2º - aplica-se a sistemática de incorporação automática, enquanto que para os demais tratados para os demais
tratados internacionais aplica-se a sistemática de incorporação legislativa, na medida em
que se tem exigido a intermediação de um ato legislativo para tornar o tratado obrigatório
na ordem interna. [...] Ora, se as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais demandam aplicação imediata e se, por sua vez, os tratados internacionais de direitos
humanos tem por objeto justamente a definição de direitos e garantias, conclui-se que
estas normas merecem aplicação imediata.
A doutrina especializada, por sua vez, já cuidou de demonstrar que essa forma de internação é plenamente aplicável à Declaração Sociolaboral do Mercosul,
conforme se apura do escólio de Rezende (2002, p. 89-90).
Assim sendo, Por causa da clara solução que a própria Constituição encontra
para o problema, está evidente que óbices não existem à aplicabilidade da Declaração
Sociolaboral do Mercosul. Por isso, tudo que nela está consagrado – que compreende direitos individuais como à promoção da igualdade, eliminação do trabalho forçado
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e de organizar e dirigir econômica e tecnicamente a empresa, em conformidade com as
legislações e as práticas nacionais; direitos coletivos como o de diálogo social; e, principalmente, direitos contidos na rubrica “outros direitos”, como de fomento do emprego, de proteção dos desempregados, de formação profissional e desenvolvimento de
recursos humanos, à saúde e segurança no trabalho e à inspeção do trabalho – não
deveria soar como algo distante da realidade.
E infelizmente é assim que se apresentam suas disposições – insista-se, principalmente as contidas no capítulo “outros direitos”. Não existe reflexo da declaração
formal no calor da vida social brasileira.
Isso se deve, principalmente, à falta de caráter vinculativo da Declaração, o
que se verifica da leitura de seu artigo 20.
É evidente que, com o interesse que se revela pela aplicação da Declaração
Sociolaboral, a integração do Cone Sul passará bem ao largo da efetivação dos direitos sociais dos trabalhadores.
Desde a raiz verifica-se a despreocupação em prover o documento de qualquer relevância pragmática, uma vez que não se estabelecem meios adequados para
assegurar seu cumprimento. Diz-se que suas disposições são princípios, e isso, ao
contrário do que pretende a ciência jurídica – que os reconhece como normas de
plena eficácia – é a deixa para, sob o pretexto de que se cuida de meras normas
programáticas, relegá-los ao plano do discurso vago e distante da realidade. Prevê-se
a criação de um órgão de acompanhamento, que nada mais faz além de recomendar,
acrescentando que suas recomendações não têm outra função se não a de advertir, ou
– para utilizar um termo mais brando e, por isso mesmo, mais apropriado – avisar que
a Declaração não vem sendo seguida.
Restam ao pacto, apenas, aquelas funções indicadas por Flávia Piovesan (1997,
p. 121): “em síntese, o Direito Internacional dos Direitos Humanos pode reforçar a
imperatividade dos direitos constitucionalmente garantidos [...] ou ainda estender o
elenco dos direitos constitucionalmente garantidos”.
Em última análise, e em face disso mesmo, verifica-se que a Declaração
Sociolaboral do Mercosul simplesmente reafirma o que está estabelecido no
ordenamento brasileiro - o que permite que o foco da abordagem seja ampliado, para
alcançar, novamente, a questão da aplicabilidade dos direitos sociais em geral.
Assim, o problema da efetividade da Declaração Sociolaboral do Mercosul, e
de uma forma geral, dos direitos sociais, reduz-se a um problema político, concentrado na disposição do administrador público em implementar ações que lhe confiram
existência no mundo prático, o que nem sempre é interessante, pois
El logro del progreso social implica, además de la adhesión de los países a los derechos
fundamentales en el trabajo, su cumplimiento, lo que conduce al aumento de los costos
del trabajo y reubicación o incremento del gasto público para elevar la eficacia de la
fiscalización (CACCIAMALI, 2002, p. 104).
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Estabelece-se, então, um jogo de forças, por meio do qual se disputa a atenção do gestor público. E, nesse embate, os órgãos de representação dos trabalhadores não obtêm o atendimento alçando pelos famigerados lobbies dos concentradores
dos meios de produção.
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O meio em que se efetivam os direitos sociais, portanto, é político e, como já
se disse, “o mais que a Constituição pode fazer é procurar garantir tal empenhamento”
(CAUPERS, 1985, p. 52).
A experiência das instituições jurídicas revela que essa visão do problema,
que o encarcera no trânsito das relações políticas, é a agasalhada nestas terras. Então,
em vez de determinar a promoção de tais ou quais direitos sociais, o Judiciário entende-se impossibilitado de ensejar a realização prática deles, sob o argumento de que,
assim procedendo, adentraria ao que se convencionou denominar mérito administrativo e, enfim, criaria ingerência entre os poderes constituídos. O Legislativo, por sua
vez, vê-se engessado em suas iniciativas de criação de programas específicos, sob o
mesmo argumento.
Essa verificação enseja um novo debate, visando à análise mais aprofundada
do modelo da separação dos poderes estabelecidos na Constituição brasileira. O que
se pode vislumbrar desde logo, ainda que de forma superficial e que mais serve à
instigação dessa discussão, é que há tal ingerência se se determinam medidas para o
atendimento de circunstâncias específicas no âmbito dos direitos sociais. Mas que isso
não sucede, de outro lado, se se determinasse ao administrador a implementação de
uma efetiva política de realização dos direitos sociais, sob pena de responsabilidade.
Tal conclusão, porém, decorreria de profundo reexame de temas como probidade
administrativa, controle do ato administrativo e princípio da separação dos poderes,
pautado pela seguinte concepção, apresentada recentemente e de maneira corajosa
por Flávia Piovesan (2003, p. 35-36):
Há de ser definitivamente afastada a equivocada noção de que uma classe de direitos (a
dos direitos civis e políticos) merece inteiro reconhecimento e respeito, enquanto outra
classe de direitos (a dos direitos sociais, econômicos e cultuais), ao revés, não merece
qualquer observância.
Worker’s social rights effectiveness by the application of
Mercosul’s social-labourist agreement
ABSTRACT
In this assay, the way the works’ social rights are made effective is
analyzed, especially through the application of the Mercosul’s Social-Labourist Agreement. Because of this, in first place, it will be
checked what are social rights and workers’ social rights, then it
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Pós-Graduação
em Direito Político
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will be analyzed how Mercosul deal with the argument, and finally,
resolve the question offered.
Keywords: Social rights. Effectiveness. Mercosul. Social-Labourist
Agreement.
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Efetivação dos direitos sociais dos trabalhadores