Defeitos cristalinos 1 DEFEITOS OU IMPERFEIÇÕES CRISTALINAS Defeitos ou imperfeições pontuais Defeitos ou imperfeições de linha Defeitos ou imperfeições de superfície DEFEITOS CRISTALINOS Todos os materiais apresentam um grande número de defeitos e imperfeições em suas estruturas cristalinas. NÃO EXISTEM ESTRUTURAS CRISTALINAS PERFEITAS. Diversas propriedades dos materiais metálicos são profundamente afetadas pela presença de defeitos cristalinos e freqüentemente determinadas características são intencionalmente alteradas pela introdução de quantidades controladas de defeitos. Exemplos: Processos de cementação e nitretação de aços, Dopagem de semicondutores, Endurecimento de metais e ligas por encruamento (deformação a frio), Refino do tamanho de grão, Etc. As imperfeições Imperfeições Imperfeições Imperfeições ou de de de defeitos cristalinos são classificados em três classes: ponto linha superfície Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 2 IMPERFEIÇÕES DE PONTO (defeitos pontuais) LACUNAS O defeito pontual mais simples é a lacuna (do inglês: vacancy), ou seja a ausência de um átomo em uma posição atômica originalmente ocupada por um átomo. As lacunas constituem O ÚNICO tipo de defeito que está em equilíbrio com o cristal. Assim o n° de lacunas para uma dada quantidade de material é função da temperatura de acordo com a equação: Qv Nv = N . exp − k.T onde: N é o n° de átomos T é a temperatura absoluta (K) k é a constante de Boltzmann (1,38 10-23 J/átomo K ou 8,62 10-5 eV/átomo K) Qv é a energia de ativação (J ou eV) Para grande parte dos metais, a fração de lacunas (Nv/N) logo abaixo da temperatura de fusão é da ordem de 10-4 (0,01%) Exemplo: 1 m3 de Cobre possui 8 1028 átomos e a 1000°C apresenta Nv = 2.2 1025 AUTO-INTERSTICIAL É um átomo do cristal posicionado em uma sítio intersticial, que em circunstâncias normais estaria vago. Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 3 IMPUREZAS NÃO existe metal 100% puro! Átomos estranhos (impurezas ou elementos de liga) sempre estarão dispersos na estrutura cristalina. Na realidade, utilizando-se as técnicas atuais de refino, é muito difícil e caro refinar metais com níveis de pureza superiores a 99,9999% (“quatro noves”) Nesta pureza ainda estão presentes cerca de 1022 - 1023 átomos por m3 de impurezas. Estas impurezas são classificadas em duas classes: SUBSTITUCIONAIS - Na qual os átomos de soluto estão alocados em posições atômicas originalmente pertencentes ao átomo de solvente INTERSTICIAIS - Na qual os átomos de soluto estão posicionados nos interstícios das células cristalinas do solvente. SOLUÇÕES SÓLIDAS A solução sólida é obtida com a adição intencional de outros elementos (elementos de liga) no metal solvente. Esta adição deve manter a estrutura cristalina e evitar a precipitação de outra fase. Do mesmo modo que os defeitos, as soluções sólidas também são classificadas em substitucionais e intersticiais Exemplos: Solução sólida substitucional: Prata 925 - constitui uma solução sólida substitucional com 7,5% de cobre na prata. Solução sólida intersticial: Aços extra-doce - nestes aços, os átomos de C ficam alocados nos interstícios das células cristalinas. Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 4 INTRODUÇÃO HISTÓRICA AO CONCEITO DE DISCORDÂNCIA • Deformação plástica ou permanente de um cristal perfeito (isento de defeitos cristalinos) pode ocorrer pelo deslocamento de planos de átomos em relação aos planos paralelos adjacentes. • 1921 - Griffith postula que a presença de fissuras microscópicas seriam responsáveis pela baixa resistência dos sólidos. • 1926 - Cristais reais começam a deformar-se plasticamente em tensões entre 1/1000 e 1/10000 da tensão teórica calculada por Frenkel. • 1934 - E. Orowan, M. Poloanyi e G. I. Taylor propuseram, de modo independente, a existência de um defeito cristalino linear denominado discordância que poderia justificar a discrepância entre a tensão calculada e a medida nos sólidos cristalinos. • 1949 - Heidenreich observou, pela primeira vez, discordâncias em um MET CLASSIFICAÇÃO DAS DISCORDÂNCIAS discordância em cunha discordância em hélice e discordância mista Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 5 IMPERFEIÇÕES DE LINHA - DISCORDÂNCIAS Uma discordância é um defeito cristalino linear no qual diversos átomos estão desalinhados e conseqüentemente provocam uma distorção na estrutura cristalina Toda a teoria de deformação e endurecimento de metais é fundamentada na movimentação de discordâncias. DISCORDÂNCIA EM CUNHA: Características principais: Pode ser entendida como um plano extra de átomos no reticulado que provoca uma imperfeição linear Vetor de Burgues (b) representa a magnitude e a direção da distorção do reticulado A magnitude desta distorção normalmente tem a ordem de uma distância interatômica. Na discordância em cunha o vetor de Burgues é perpendicular a linha de discordância (plano extra) Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 6 DISCORDÂNCIA EM HÉLICE: A discordância em hélice pode ser imaginada como sendo o resultado da aplicação de uma tensão de cisalhamento. O vetor de Burgues é paralelo a linha de discordância A-B. Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 7 DISCORDÂNCIAS MISTAS: Na verdade os materiais metálicos só apresentarão discordâncias mistas, entretanto como estas discordâncias são complexas, é mais fácil estuda-las como misturas de discordâncias de discordâncias em cunha e hélice. Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 8 OBSERVAÇÃO DE DISCORDÂNCIAS MET - MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE TRANSMISSÃO ATAQUE QUÍMICO ("ETCH PITS") Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 9 IMPERFEIÇÕES DE SUPERFÍCIE Os defeitos superficiais são defeitos bidimensionais ou compreendem regiões do material com diferentes estruturas diferentes orientações cristalográficas. Estes defeitos incluem: superfícies externas, contornos de fase. contornos de grão, contornos de macla e defeitos de empilhamento. interfaciais que cristalinas e/ou SUPERFÍCIES EXTERNAS: Átomos da superfície apresentam ligações químicas insatisfeitas e em virtude disto, estão em um estado de energia mais elevado que os átomos do núcleo (com menor n° de coordenação) As ligações insatisfeitas dos átomos da superfície dão origem a uma energia de superfície ou energia interfacial (J/m2) A redução desta energia adicional (tudo tende a menor energia) é obtida pela redução da área superficial. No caso de gotas de líquido, estas tendem a assumir a forma esférica (maior volume com a menor área exposta) CONTORNOS DE FASE: Os contornos de fase são as fronteiras que separam fases com estruturas cristalinas e composições distintas. Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 10 CONTORNOS DE GRÃO: São superfícies que separam dois grãos ou cristais com diferentes orientações. Como são possíveis diferentes orientações entre cristais adjacentes existem contornos de grão “mais” ou “menos” ajustados: quando a desorientação é pequena (até 10°) o contorno de grão recebe a denominação de contorno de baixo-ângulo e a região que está separada SUB-GRÃO. nos casos onde a desorientação é superior a ~10° temos os contornos de grão propriamente ditos. De maneira similar aos contornos de superfície, o n° de coordenação nos contornos de grão é baixo e assim também existe uma energia de contornos de grão similar a energia interfacial. As conseqüências práticas da existência de uma energia interfacial associada aos contornos de grão são: os contornos de grão são regiões mais reativas quimicamente; os contornos de grão tendem a reduzir sua área quando em temperaturas elevadas, aumentando o tamanho médio do grão e impurezas tendem a segregar em contornos de grão (diminuem a energia do contorno). Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 11 CONTORNOS DE MACLA Podemos considerar as maclas como um tipo especial de contorno de grão no qual existe uma simetria especular, ou seja, os átomos de um lado do contorno estão localizados em uma posição que é a posição refletida do outro lado. A região de material entre os contornos é chamada de macla. As maclas são resultantes de deslocamentos atômicos produzidos por tensões de cisalhamento (maclas de deformação) ou durante tratamento térmico (maclas de recozimento) A formação de maclas (maclação) ocorre em planos cristalográficos definidos e direções cristalográficas específicas, que são dependes da estrutura cristalina. Maclas de recozimento ocorrem em metais com estrutura CFC Maclas de deformação ou mecânicas são observáveis em metais CCC e HC Observação dos contornos de macla em microscópio: Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos MOVIMENTAÇÃO DE ESCORREGAMENTO DISCORDÂNCIAS E SISTEMAS 12 DE DEFORMAÇÃO ELÁSTICA: Está diretamente relacionada com a energia de ligação entre os átomos. Removida a tensão, a deformação desaparece (comportamento de uma mola). A deformação é inversamente proporcional à tensão: E = S (Módulo de Young) e DEFORMAÇÃO PLÁSTICA: É permanente, ou seja, cessada a tensão teremos deformação residual ou plástica. A resistência e dureza são medidas da “resistência” do material à deformação. Em escala microscópica, a deformação plástica corresponde ao movimento total de um grande n° de átomos em resposta a uma tensão. No materiais cristalinos a deformação plástica envolve o movimento de um grande número de discordâncias. Em escala atômica, as ligações entre os átomos da estrutura cristalina são rompidas e reformadas durante a movimentação das discordâncias. ¾ DISCORDÂNCIA EM CUNHA: Existe distorção localizada ao longo do plano extra de átomos que define a linha da discordância. Esta distorção é medida pelo vetor de Burgers, que no caso da discordância em cunha é perpendicular à linha da discordância. ¾ DISCORDÂNCIA EM HÉLICE: Pode ser imaginada como o resultado de uma distorção por cisalhamento. O vetor de Burgers é paralelo à linha da discordância.De fato, as discordâncias observadas em materiais cristalinos são mais complexas e podem ser divididas em componentes vetoriais (e estas tratadas como discordâncias em cunha ou hélice). Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 13 MOVIMENTAÇÃO DAS DISCORDÂNCIAS A movimentação de uma discordância em cunha é similar a movimentação de uma lagarta: ANTES E APÓS o movimento de uma discordância através de uma região particular do cristal, o arranjo atômico desta região é “perfeito” e ordenado (obviamente ele irá apresentar lacunas e impurezas). Na passagem de uma discordância qualquer, o cristal sofre distorção, ou seja, o arranjo cristalino é deformado. (lembrar do plano extra da ⊥ em cunha ) Finalmente, o plano extra (discordância) pode emergir na superfície do cristal e formar um degrau. Com a passagem de um n° grande de discordâncias, este degrau pode ser visível em um microscópio óptico. Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 14 O processo no qual deformação plástica é produzida pela movimentação de discordâncias é denominado escorregamento. Assim o plano de átomos pelo qual uma discordância se movimenta é conhecido como plano de escorregamento. Na discordância em cunha: o movimento da linha de discordância é paralelo à direção da tensão de cisalhamento. Na discordância em hélice: o movimento da linha de discordância é perpendicular a tensão de cisalhamento. DENSIDADE DE DISCORDÂNCIAS Todos os materiais cristalinos apresentam discordâncias introduzidas por: solidificação, deformação plásticas ou resultantes de tensões térmicas produzidas por resfriamento rápido. A quantidade (n° de discordâncias) é expresso como o comprimento total de discordâncias por unidade de volume (ou n° de discordâncias que interceptam uma área aleatória no cristal) Unidade de densidade de discordância : Milimetros de discordâncias milimetro3de material Metais recozidos e cuidadosamente preparados: 103 mm-2 Metais altamente deformados: entre 109 e 1010 mm-2 (1000 km em 1 mm3) (1 mm3 de Cu apresenta 8.493.1019 átomos) Metais deformados e submetidos a tratamento térmico: 105 106 mm-2 Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 15 SISTEMAS DE ESCORREGAMENTO A movimentação das discordâncias não é fácil em todos os planos e direções de um cristal, ou seja existem planos e direções nos quais a tensão necessária para mover a discordância é mais baixa. Nestes planos (planos de escorregamento) e direções (direções de escorregamento) o movimento é preferencial. A combinação entre o plano e a direção de escorregamento define um sistema de escorregamento. Os sistemas de escorregamento são dependentes da estrutura cristalina (CFC, CCC e HC) Para uma dada estrutura cristalina os planos de escorregamento são aqueles que possuem a maior densidade de átomos (planos de máxima densidade planar de átomos) As direções de escorregamento correspondem aquelas em que os átomos estão mais próximos. Exemplo: reticulado CFC apresenta 12 sistemas de escorregamento família de planos {111} e família de direções <11 0> Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 16 INTERAÇÕES ENTRE DISCORDÂNCIAS Algumas características das discordâncias são importantes com relação as propriedades mecânicas dos materiais. Entre elas, destacam-se as interações entre os campos de tensão associados às discordâncias. Estes campos afetam a mobilidade e a habilidade de multiplicação das discordâncias Interações entre discordâncias: Marcelo F. Moreira Defeitos cristalinos 17 Lista de exercícios – defeitos cristalinos 1- Calcular a fração de lacunas (Nv/N) para o cobre na temperatura ambiente (293 K) e na temperatura de 1350 K. Assuma uma energia de ativação de 0,9 eV/átomo para as duas temperaturas. Dados: A temperatura de fusão do cobre puro é 1356 K. k = 8,62 x 10-5 eV/átomo. K 2- A presença de impurezas ou a adição de elementos de liga diminui o número de lacunas em um material metálico? Justifique sua resposta. 3- Qual a importância da existência de discordâncias nos materiais metálicos? Quais as implicações no comportamento mecânico? 4- Por que a resistência dos cristais reais é muito menor (1/1000 a 1/10000) do que a resistência calculada pela tensão teórica cisalhante máxima (cálculo de Frenkel 1926)? 5- O que são e qual a finalidade dos "wiskers"? 6- Por que o aumento do teor de C em um aço aumenta sua resistência (limite de escoamento e resistência)? 7- Sabendo-se que a deformação de cristais ocorre pelo escorregamento de planos de alta densidade e que as estruturas CFC e HC possuem o mesmo FEA. Por que os metais HC são tipicamente mais frágeis que os CFC ? 8- Quais são os defeitos cristalinos planares (de superfície) e como estes podem interagir com as discordâncias? Marcelo F. Moreira