A MISSÃO HOJE Túmulos de duas pessoas fulminadas por descargas eléctricas em Damesfontein, sepultadas junto a um curso de água Usos e costumes da África do Sul Minerais trazem riqueza e desgraça texto e foto Carlos Domingos A África do Sul tem um subsolo muito rico e variado em minerais, tais como ferro, ouro, amianto, crómio, chumbo, níquel e muitos outros. O país exporta 56 espécies de minerais e pedras preciosas, causa do seu desenvolvimento industrial e económico. A partir do início do século XIX, a corrida aos diamantes e ao ouro, na zona de Kimberly e Bloemfontein, estimulou a exportação em grandes quantidades, fazendo da África do Sul uma potência industrial. Ao mesmo tempo, a actividade mineira de exploração do subsolo provocou um acumular da riqueza nas mãos de poucos, sobretudo de companhias, como a De Beers e o cartel dos diamantes. Ouro mais fundo A maioria das jazidas de metais encontra-se em Bushveld Complex, uma zona de forma oval situada no antigo Transvaal, agora chamado Mpumalanga. Outra zona rica é a bacia de Witwatersrand, que se estende desde o sul de Mpumalanga em direcção ao norte do Estado Livre do Orange (Orange Free State). Movimentos e formações geológicas nesta área remontam a cerca de 2.800 milhões de anos, dizem os entendidos. A importância do ouro, o produto mais famoso, tem vindo a decair. Depois de 200 anos de exploração, os filões estão a esgotar-se. É necessário escavar cada vez mais profundamente. Algumas minas, em Bushveld Complex, já atingiram dois quilómetros de profundidade. Na zona do KwaZulu-Natal, onde os subsolos estão impregnados de água, tal profundidade não seria possível, ou tornaria as operações muito caras. Em 1982, a indústria aurífera produziu 662,636 toneladas de ouro, representando quase 61 por cento do total de vendas de minerais, no valor de 14,4 mil milhões de randes. Em 2005, a produção desceu para 294,8 toneladas. Fogo do céu e da terra Além das desigualdades sociais, a exploração mineira tem outras consequências. Na zona de Damesfontein, por exemplo, onde o subsolo é rico em FÁTIMA MISSIONÁRIA 11 Edição LIII | Dezembro de 2007 minerais, são muito frequentes, durante o Verão, na época das chuvas, trovoa das seguidas de descargas eléctricas. Estas produzem-se habitualmente nos metais, como os postes dos cabos eléctricos, dos telefones ou torres. Nos descampados, muitas vezes, são as vacas dos agricultores da região a pagarem as favas, sendo atingidas pelos raios. Os habitantes locais, supersticiosos como são, assim que ouvem os primeiros trovões, acendem imediatamente uma vela e queimam uma espécie de incenso para “afugentar” a trovoada. Não usam a lenha da madeira das árvores atingidas por raios. Dizem que não é bom misturar o “fogo do céu” com “o nosso fogo”. Para se precaverem do perigo, já nos tempos antigos erguiam um tubo metálico perto da construção mais alta do “kraal”, para funcionar como pára-raios. O “kraal” é uma palavra popular que designa o conjunto de habitações tradicionais de uma família – incluindo a área reservada ao gado. Tem origem no português: “curral”. Mais significativo e impressionante nestes “usos e costumes” é o hábito de sepultar uma pessoa que tenha sido fulminada por um raio. Não poderá ser sepultada no cemitério habitual, mas junto a um curso de água. Sequiosa, porque demasiado “aquecida” pela descarga, poderá repousar eternamente junto das águas para beber e se refrescar de vez em quando. A MISSÃO HOJE Um bispo que não queria ser padre Adriano Langa, novo pastor de Inhambane Adriano Langa iniciou o seu trabalho de pastor da diocese de Inhambane, Moçambique, no começo do ano, a 28 de Janeiro. A diocese viveu então momentos de grande alegria. Dois meses antes, DA Qual é o lema do seu episcopado e a sua prioridade? AL O lema do meu episcopado é o Visita do bispo Adriano Langa ao centro Catequético do Guiua, Inhambane, ladeado pelo missionário da Consolata, Sandro Faedi a 29 de Novembro, celebrara o seu jubileu sacerdotal rodeado pelos representantes de todas as missões da diocese, reunidos no Centro Pastoral do Guiúa para a Assembleia Diocesana de Pastoral texto Diamantino Antunes foto Arlei Pivetta posta que me foi feita de entrar no seminário. Ingressei então na Escola de Artes e Ofícios de Moamba, onde aprendi a profissão de alfaiate. Sentindo-me atraído pela figura de São Francisco de Assis, iniciei a vida religiosa como irmão leigo na Ordem Franciscana. Depois da primeira pro fissão religiosa fui enviado para o seminário de Maputo para tomar conta da logística e da alfaiataria, e estudar à noite. Depois da indepen Diocese de Inhambane Padroeira Nossa Senhora da Conceição Data da criação 3 de Agosto de 1962 Bispos D. Ernesto Gonçalves da Costa (1962-1975); D. Alberto Setele (1976-2006); D. Adriano Langa (2007…) População 1.444.000 Católicos 269.841 Catecúmenos 11.500 Paróquias-Missões 22 Sacerdotes 41 Irmãos 3 Irmãs 76 Diáconos 4 FÁTIMA MISSIONÁRIA 12 Edição LIII | Dezembro de 2007 M OÇ AM BI QU E N ascido em 1946, em Macu pulane, distrito de Majacaze (Xai-Xai), Adriano Langa tem desenvolvido a sua acção pastoral em três vertentes: a pastoral directa, a pastoral através da reflexão e da escrita, e o trabalho de animação dos irmãos. Apaixonado pela inculturação, como o mais conse quente caminho para o enraizamento da vida cristã na cultura, é autor de numerosos escritos sobre este tema. No seu primeiro ano de episcopado, Adriano Langa, sexto filho de uma família de 11 irmãos, continuou a sua vocação inicial: irmão mais velho, cheio de compreensão, prudência e inteligência, escuta e orienta os seus colaboradores missionários e leigos. Diamantino Antunes: A sua história vocacional é muito interessante e única. Como é que de irmão leigo chegou a padre e depois a bispo? Adriano Langa Recordo que, termi nada a quarta classe, recusei a pro liar de Maputo. Aceitei o novo serviço que a Igreja me pedia com a mesma disponibilidade com que aceitei ser diácono e sacerdote. Recebi a ordena ção episcopal em cerimónia presidida pelo cardeal arcebispo de Maputo, Alexandre dos Santos. Conhecíamo-nos bem, pois eu trabalhara com ele quando era irmão leigo, primeiro na missão de Quissico e, em seguida, no seminário de Chimoio. Colaborei com o cardeal, exercendo o cargo de vigá rio-geral até à minha nomeação como bispo coadjutor de Inhambane. Diocese de Inhambane dência, fui para o Centro Catequético do Guiúa, Inhambane, como respon sável da administração e para cola borar na formação dos catequistas. Os meus colegas comentavam que para padre só me faltava ser ordenado sacer dote. Em 1976, o padre Fernando Ribeiro, em nome dos frades franciscanos, apre sentou-me a proposta de ser diácono permanente. Surpreendido, respondi-lhe literalmente: “Não preciso disso!”. O diá logo continuou e acabei por lhe dizer: “Se achais que deve ser assim, aceito”. Ainda estava a pensar na data da ordenação diaconal, quando o mesmo sacerdote voltou à carga, para me pro por o caminho do sacerdócio. Atónito, disse-lhe: “Já não estou a entender o que quereis”. Seguiu-se um longo diá logo. No final repeti a mesma resposta: “Se vós achais que deve ser assim...”. Fui enviado para Portugal, para estudar teologia na Universidade Católica de Lisboa, onde estive de 1977 a 1980. Segui para Bruxelas, na Bélgica, onde em 1982 me licenciei em Teologia Pastoral Catequética. DA Como foram os primeiros anos de ministério sacerdotal? AL Fui ordenado sacerdote na catedral Maputo de Xai-Xai, em 21 de Novembro de 1982. Em seguida fui nomeado pároco O lema do meu episcopado é o mesmo do meu sacerdócio: «Que a vossa Palavra e o vosso povo sejam o meu alimento e a minha razão de ser» de Homoíne num contexto muito difícil por causa da guerra que assolava a região. Ao mesmo tempo, exerci o cargo de director do Secretariado Diocesano da Pastoral, tendo percorrido toda a diocese em cursos de formação catequética. Em 1987 fui para o Maputo como director do secretariado-geral da Con ferência Episcopal de Moçambique. Acompanhei o trabalho dos bispos de Moçambique no processo de paz e na visita do Papa João Paulo II a Moçambique. Em 1990 fui eleito supe rior dos Franciscanos de Moçambique e, em seguida, fui escolhido para fazer parte do governo-geral da Ordem Franciscana. Para tal fui para Roma. DA Estava em Roma, quando lhe chega o pedido de João Paulo II para a nova missão de bispo. Como reagiu desta vez perante tal proposta? AL A 24 de Novembro de 1997, o Papa João Paulo II nomeou-me bispo auxi FÁTIMA MISSIONÁRIA 13 Edição LIII | Dezembro de 2007 mesmo do meu sacerdócio: «Que a vossa Palavra e o vosso povo sejam o meu alimento e a minha razão de ser». Resumido em poucas palavras: «Por Deus e pelo seu povo». Sob este lema assumi a minha nova missão. Comecei por visitar cada uma das missões, escutando, vendo, tomando nota dos programas e problemas; e encorajando os missionários e as comunidades. A minha prioridade é animar a diocese e executar o plano pastoral que ela própria escolheu. Pode sintetizar-se na seguinte frase: “Alicerçados em Cristo para uma vida em plenitude”. Trata-se de anunciar Jesus Cristo com novo ardor missionário para suscitar uma adesão pessoal a Ele, através de uma catequese renovada, indo ao encontro dos que estão afastados da Igreja ou que nunca receberam o primeiro anúncio. DA Conhece bem a sua diocese? AL É verdade. Esta é a terceira vez e a terceira forma da minha presen ça na diocese. A primeira foi, de 76 a 77, como simples irmão leigo. A segunda forma de presença foi de 83 a 87, como sacerdote, cuja actividade se desenvolveu nas missões de Homoíne, Panda, Pembe, Maxixe e Môngue e no Secretariado de Acção Pastoral (SAP) como director. Passados 18 anos, eis que o Senhor marca uma nova caminhada comigo em Inhambane. Assumo o meu ministério com temor e tremor. Estou ciente da minha pequenez, mas estou confiante na misericórdia de Deus.