1 A PREGAÇÃO DOS FRADES MENORES EM PORTUGAL: UM ESFORÇO DE TRANSFORMAÇÃO DA VIDA COTIDIANA DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE MEADOS DE DUZENTOS Teresinha Duarte A partir das contribuições metodológicas da história do quotidiano, entendida como as práticas que se repetem, a presente comunicação indaga pela influência exercida pelos frades Menores, no dia a dia da sociedade portuguesa, de meados do século XIII. Naquele momento, os frades Menores já contavam dez conventos no reino de Portugal, a saber: Guimarães, Alenquer, Coimbra, Lisboa, Leiria, Porto, Guarda, Covilhã, Santarém e Estremoz. Ademais, vivia-se um processo de evolução, de uma fraternidade de penitentes e pregadores ambulantes para uma ordem religiosa de pregadores profissionais. ***** A pregação de São Francisco de Assis era uma pregação popular, como convite à conversão e à penitência. Na Regra Bulada, mandou aos seus irmãos que quisessem se dedicar à pregação que tivessem uma “linguagem ponderada e piedosa (Sl. 11,7 e 17,31), para utilidade e edificação do povo”, ao qual deviam anunciar “os vícios e as virtudes, o castigo e a glória” (Regra Bulada 9, 3-4) Assim, foi a pregação dos primeiros frades: uma pregação penitencial, com exortação moral. Mas, com a transformação da fraternidade primitiva em uma ordem religiosa, a pregação também passou por transformações e foi se tornando num ofício dos frades. Juntamente com o processo da evolução da Fraternidade em ordem religiosa, a pregação franciscana evoluiu de uma simples exortação moral, como um convite à penitência e à conversão, para se tornar uma “predicazione ordinária”(Rusquoni, 1980:265) , como o afirma Roberto Rusquoni. Isso estava diretamente relacionado com o processo de clericalização que ia crescendo, no interior da fraternidade, bem como a resposta aos apelos do papa Gregório IX, que ia facultando e exigindo dos frades Menores, um ministério semelhante àquele abraçado pela Ordem dos Pregadores ou Dominicanos. O esquema de pregação que foi se delineando, no seio da Ordem, não perdeu, totalmente, o parentesco com o esquema de pregação do Fundador e da primeira geração, como convite à conversão, no qual se anunciavam os vícios e as virtudes. Mas, com a atuação dos teólogos, sobretudo a partir de Santo Antônio, aqueles que exerciam a pregação foram se especializando, naquele ofício, e foram assumindo a compreensão de penitência, conforme o prescrito no IV Lateranense, ou seja, como a confissão sacramental. 2 De acordo com o 21ª Constituição do IV Concílio de Latrão, os fiéis deveriam ser orientados a se aproximar da confissão sacramental, ao menos uma vez por ano, pela Páscoa. Para isso, as pregações deveriam levar os ouvintes a aceitar uma nova prática na sua vivência religiosa: a confissão auricular. O momento da confissão era, sem dúvida, um momento em que o fiel se aproximava da Igreja, e esta, através do sacerdote, esquadrinhava a sua consciência, para purificá-lo do pecado e também da heterodoxia e das heresias. Nesses moldes, a pregação franciscana, como o considera Zelina Zafarana (1980:212-213), adquiriu um paralelismo com aquela da Igreja primitiva: enquanto aquela estava voltada para o anúncio da fé e do batismo, a minorítica, convidava à penitência, ou seja, à confissão sacramental, uma espécie de segundo batismo. Contudo, prevaleceu, na Ordem, também, sobretudo entre os seus pregadores populares, uma pregação homilética. Esta pregação homilética se caracterizou por ser um comentário às leituras litúrgicas do dia, prescindindo tanto da eleição de um tema, quanto do aparato escolástico, para priorizar a explicação do texto bíblico. Essa prática era, de certa forma, um movimento de concessão de conhecimento do Evangelho a um público inculto e intolerante à metodologia de um pregador douto e letrado. Um pregador popular franciscano, normalmente, ia contrapondo o texto evangélico aos costumes morais dos ouvintes, falando-lhes dos “vícios e das virtudes, das penas e das glórias” (Zafarana, 1980 -232-233). Da necessidade de abandonar os primeiros e da urgência em cultivar as segundas; das penas destinadas à prática dos vícios, assim como as glórias que aguardam aqueles que praticam as virtudes. Para tornar a pregação mais viva, assim, como numa cena teatral, o pregador fazia largo uso dos exempla. Mas, quando se pergunta pela vida quotidiana da sociedade portuguesa de meados de duzentos, pelos vícios e pecados combatidos, nas pregações dos minoritas, depara-se com uma dificuldade, porque não se tem notícia de nenhum sermão escrito por qualquer um dos frades Menores, em Portugal, no período. Todavia, sabendo que a pregação deles estava voltada para uma correção das sociedades nas quais estavam inseridos, dediquei-me a descobrir os vícios e os pecados da sociedade portuguesa naquelas décadas de 1230 e 1240. Tarefa um tanto espinhosa, entretanto, não a ponto de ser impossível obter qualquer pista que leve ao conhecimento dos tais vícios e pecados, os quais devem ter ocupado a pregação dos Franciscanos, em Portugal, fosse para condená-los ou para remediá-los com as virtudes que com eles se antagonizavam. 3 Em primeiro lugar, é preciso deixar claro que as décadas de 1230 e 1240 coincidiram com o reinado do rei D. Sancho II, um período bastante conturbado da história portuguesa. Para isto procurei cotejar um conjunto de leis estatuídas pelo sucessor de D. Sancho II, o seu irmão, D. Afonso – Conde de Bolonha e corregedor do reino de Portugal – no ano de 1248, em que o mesmo procurava corrigir uma série de maus costumes que vigoraram no reinado de D. Sancho II, e que levaram o reino a uma situação de anarquia. Os abusos condenados por D. Afonso foram basicamente os seguintes: ir à casa dos fidalgos e lhes fazer mal; “cortar vinha”; “derRibar casa”; “en assunada filhar boy ou uaca”, “filhar porco”, “filhar carneiro”,“filhar galinha ou capon ou cabrito ou ansser ou leyton”, “filhar capa çerame ou pele ou algûa uestidura ou cobertura”; matar lavrador que não fosse “lanceiro”; matar o inimigo e lhe roubar os pertences; e as violências contra os mosteiros (Livro das Leis e Posturas, 1971: 20-21). Por todas estas coisas, o reinado de D. Sancho II foi tido, por muitos, como um mal reinado, no qual prevaleceu a anarquia política e toda espécie de desmandos, porque o rei não impunha a sua autoridade e não controlava a turbulência e a desordem, deixando prevalecer a violência, faltando com o dever real que era justamente zelar pela justiça. Por conta de todas estas situações, D. Sancho II foi deposto pelo papa Inocêncio IV, através da bula Inter alia desiderabilia, em 24 de Julho de 1245, começando, então, a guerra civil que se estendeu até o final do ano de 1247, quando D. Sancho II se exilou no reino de Castela, ou melhor, até janeiro do ano seguinte, com a sua morte, em Toledo. Mas, quem praticava aquelas violências? E quem seriam as vítimas? Uma discussão com os estudiosos daquele período histórico poderia clarear estas questões, bem como mostrar as circunstâncias que levaram a tal nível de abusos. Atualmente, na historiografia portuguesa, Leontina Ventura (1992:399-470) e José Mattoso (1992:57-75), são os historiadores que têm estudado o período mencionado. Por isso, no momento discutirei, brevemente, os resultados de seus estudos. Para Ventura, a anarquia que é atribuída ao reinado de D. Sancho II, é o resultado de uma crise política que tomou conta do reino desde o começo do reinado de D. Afonso II, em 1211, na qual se entrecruzaram duas guerras, a primeira aquela “entre o Rei e os senhores” e a segunda foi a “guerra entre os senhores” (Ventura, 1992:424). O soberano português imbuído do dever de fazer justiça a seus súditos, acabou por encabeçar uma política de contenção dos abusos dos poderosos, isto é, daqueles que estavam encarregados de administrar a justiça em seu nome, assim, acabou por privar a nobreza de seus poderes senhoriais, comprometendo as suas bases. D. Afonso II foi um rei que acumulou um poder que ultrapassava o poder dos nobres. 4 Com a sua morte precoce, e sendo o herdeiro de menor idade, a nobreza detendo a tutoria do mesmo, tratou de defender seus privilégios e alargar a sua posição, sendo os anos de 1223 a 1227 bastante turbulentos, com lutas inter-nobiliárquicas. De 1227 a 1235, D. Sancho II conseguiu ter algum controle do reino. Na reunião de Cúria de março de 1235, o partido senhorial começou a se recuperar e os anos de 1238-1239 marcaram o início da agudização dos conflitos internos. Os nobres aproveitaram da fraqueza do poder real e se puseram a expandir as suas possessões, às custas das propriedades reais, das propriedades de outros senhores, das propriedades de vassalos de outros nobres, das propriedades de vilões e até das propriedades de camponeses. Para José Mattoso, a crise que tomou conta da maior parte do reinado de D. Sancho II foi “uma crise social agravada pela crise política” (Mattoso, 1992: 61). Sendo que a crise política vinha se dando desde o reinado de D. Afonso II, mas se intensificou com as lutas dentro da nobreza, nos anos de 1223 a 1226; com os conflitos eclesiásticos no decorrer da década de 1230; um crescimento de conflitos esporádicos a partir de 1237. Depois, agudizou, em 1245, em decorrência da declaração, feita pelo papa Inocêncio IV, da nulidade do casamento de D. Sancho II com D. Mécia de Haro, a pedido do Conde de Bolonha, com a deposição do Rei e o começo da guerra civil. Acerca do que o autor chama de “factos sociais”, ele próprio considera um entrecruzamento das “lutas entre o rei e os bispos, entre os bispos e burgueses, entre nobres e igrejas ou mosteiros, dos nobres entre si, dos nobres contra vilãos dos concelhos e finalmente os actos de banditismo” (Mattoso, 1992: 65). Contudo, admite que os conflitos ocorridos entre o rei e os bispos foram esporádicos e os conflitos de bispos com burgueses tinham caráter localizado. Os conflitos mais graves advieram da “marginalização dos filhos segundos e os poucos recursos dos pequenos nobres”, o que agravou “a sua propensão para a violência” (Mattoso, 1992: 67), alimentando a crise política. Já, os conflitos oriundos dos “abusos e violências cometidos por nobres contra vilãos em senhorias e tenências” ocorreram em “regiões periféricas da zona senhorial por excelência (...) na Beira Alta, Traz-os-Montes e Alto Minho” (Mattoso, 1992: 68). Por último, menciona o banditismo que envolveu pessoas de todas as categorias sociais. Era “gente fora da lei. Eram os homens sem terra e sem senhor” (Mattoso, 1992: 71). Assim, entendo que as práticas violentas corrigidas por Dom Afonso, Conde de Bolonha, eram todas aquelas violências perpetradas pelos nobres, uns contra os outros ou contra os mosteiros e até mesmo contra a população em geral. As vítimas eram outros membros da própria nobreza – os dependentes de senhores adversários, como os seus vassalos – os camponeses que trabalhavam as suas terras, os aldeões; despovoando, por conta disso, casais, campos e vilas. Vítimas também foram 5 os mosteiros e as mulheres – leigas e religiosas – vítimas de abuso sexual. Em suma: as vítimas das violências eram os fracos. Embora, a violência fosse uma condição natural da Idade Média, aquelas eram as violências próprias daquela circunstância ímpar vivida, no reino português, em que os praticantes da violência eram os membros da nobreza, mas que a culpa foi atribuída ao rei, porque este foi incapaz de conter a desordem, sendo-lhe imputado, por isso, a negligência no regime da justiça. Para os pregadores, já imbuídos de um linguajar teológico, todos aqueles comportamentos poderiam ser traduzidos para o universo da moral como sendo os pecados cometidos contra a justiça, como a avareza, a inveja, a rapina e outros como o estupro, a provocação de intrigas, culminando com a vingança privada. Mas também, é preciso não se esquecer que, naqueles anos de 1230/1248, os Franciscanos, em Portugal, já estavam instalados nos arrabaldes de muitas cidades, como em Coimbra, Lisboa, Covilhã, Guarda, Santarém, Estremoz ... Ali, podiam acompanhar o bulício das atividades que se desenvolviam no interior daquelas vilas e cidades. Com certeza, estariam acompanhando os comportamentos de comerciantes e executores de todos os outros ofícios. Não é difícil adivinhar os comportamentos cotidianos que imperavam, nas cidades em que habitavam, bem como os desvios morais que aquela gente cometia, ou seja, os seus pecados, como: a ganância pelo lucro, a avareza, a usura e a fraude, entre outros. E entre a gente miúda, composta por uma população de migrantes, votados à marginalidade, com certeza, vissem também, outras práticas desonestas como o furto, a prostituição e até a inveja. A todos estes pecados os pregadores estariam sempre de sentinela, para os corrigir. Portanto, estariam de sentinela denunciando todas aquelas violências e pecados, quer fossem aqueles abusos cometidos pela nobreza, como também, aqueles outros, cometidos pelos habitantes das cidades. Acredito que se possa considerar que também as mulheres estariam recebendo especial atenção, na pregação dos frades Menores. Uma vez que a pregação era feita em praça pública, elas faziam parte daquele público, e além da misoginia, outros fatores poderiam concorrer para a sua marginalização, naquela sociedade. Mas, quais seriam os vícios e os pecados das mulheres? Sabendo-se que a virtude das mulheres era a castidade, então, tudo o que ferisse àquela virtude incorreria ou, ao menos, predisporia ao pecado. Desta forma, é de acreditar que os frades encorajassem o público feminino “na prática assídua da oração, na recusa de ornamentos do corpo, na compostura dos gestos, no uso parco da palavra, na sobriedade da alimentação”(Casagrande, s/d.:113) Pois se entendia que as virtudes que 6 acompanhavam a castidade e a cautela eram: a oração, a sobriedade, a modéstia, e a dedicação ao trabalho e à caridade. Às mulheres, em geral, eram propostos modelos de virtudes que valorizavam a excelência do interior em oposição ao exterior, afastando-as da vida pública para colocá-las no interior das casas e dos conventos. Daí acreditar que o conteúdo da pregação condenasse a curiosidade, a tagarelice, a vaidade, a desobediência a pais e maridos, e os comportamentos sexuais proibidos, como a sedução, a luxúria, a fornicação, o adultério, relações incestuosas, práticas anticoncepcionais, o aborto e o infanticídio. Um outro pecado que as mulheres eram consideradas culpadas era o concubinato com padres, pois elas foram vistas, desde a Reforma Gregoriana, como as responsáveis pelas transgressões sexuais do clero, especialmente o secular. A lista dos pecados femininos poderia se alongar muito, ainda... Então, a pregação versava sobre a necessidade de que fossem cautelosas, pois mulheres que ficassem andando fora de casa e dos mosteiros poderia atrair o perigo para si – pondo em risco a própria castidade – e para suas famílias e a sociedade – provocando nos homens um desejo imoderado de luxúria, donde resultava muitas violências, discórdias e desordens sociais. Ainda mais que o rapto de mulheres, embora condenado, ainda não tinha sido abandonado (Cf. Almeida, s/d: 184). Havia uma outra categoria de mulheres que era merecedora de especial cuidado dos pastores e pregadores: eram as prostitutas. A prostituição foi considerada, em boa parte da Idade Média, como um mal necessário, devido a “a necessidade de canalizar as energias sexuais masculinas para estas mulheres a fim de evitar que aquelas se dirigissem antes para as mulheres honestas, virgens, viúvas ou casadas” (Pilosu, 1995:76). Assim, o meretrício de uma cidade, colocado em lugar à parte, contribuiria para proteger a ordem social, na medida em que contribuísse para evitar as violências oriundas das paixões carnais. Mas, com Roberto d’Arbrissel, no século XII, e depois, no século seguinte, começava um esforço de alguns segmentos da Igreja, para a conversão e recuperação daquelas mulheres, inclusive com o culto à santa Maria Madalena. A santa foi colocada como modelo para as mulheres pecadoras, ou seja, para as prostitutas, para que, se convertessem e seguissem o seu exemplo. Os pregadores dos séculos XIII e XIV, Franciscanos e Dominicanos, não estiveram alheios àquele esforço de conversão das prostitutas e nem ao culto de santa Maria Madalena. Inclusive, tal culto parece ter sido mais relevante naqueles locais aonde predominou as influências do “ambiente penitencial e sobretudo franciscano” (Pilosu, 1995:134). 7 Entre os vícios e pecados que faziam parte da vida quotidiana da sociedade portuguesa do período estavam sobretudo: a avareza, a ira, a luxúria e a inveja, contudo, como se sabe, uma forte característica da pregação dos Franciscanos é a sua positividade.Então, com certeza, estariam convidando a população à prática de virtudes, como: a justiça, a fraternidade e a caridade ou o amor ao próximo. E àqueles que sofriam os reveses da pobreza, estariam convidando-os à resignarem-se à sua sorte. Desta forma, mais do que condenando as práticas pecaminosas, estariam procurando remediar todos os males com as virtudes. Acima de tudo, estariam incitando todos a plasmar uma vida social norteada pela paz. É possível que, em Portugal, como alhures, homens e mulheres, sobretudo leigos, depois de ouvir a pregação dos frades, com o costumeiro apelo à penitência, viessem a se congregar em fraternidades de penitentes, através da Ordem Terceira. Fraternidades de penitentes, em muitos lugares da Europa, já haviam aparecido antes mesmo do aparecimento de Francisco de Assis, contudo, ganharam novo alento com o movimento desencadeado por ele, e, muitas vieram a adotar um estilo franciscano e uma familiaridade com os frades. Em Portugal, com toda certeza, nos anos de 1230 e 1240, já existiam fraternidades da Ordem Terceira. ********* Assim, pode se afirmar que houve uma contribuição significativa dos Franciscanos, especialmente dos frades Menores, em relação ao processo civilizatório português. Essas contribuições, acredito, tendo penetrado lentamente no cotidiano, ajudaram a plasmar um nível de convivência social, especialmente a partir do respeito à justiça e do cultivo da paz, vistos como virtudes que foram animadas pelos pregadores franciscanos, ao mesmo tempo, que denunciavam todos comportamentos que colocavam em risco essas mesmas virtudes. Assim, acredito que os Franciscanos contribuíram para estar ajudando a formar uma sociedade mais civilizada, mais fraterna, mais justa e mais pacífica. Ressalto, porém, que os Franciscanos não foram os únicos que contribuíram para esse processo. Há que lembrar que desde 1211, D. Afonso II, por meio das cortes realizadas naquele ano, já manifestou uma preocupação em controlar os desmandos da sociedade, através do processo legislativo. Além disso, contribuíram significativamente para a civilização do País, outras ordens religiosas, especialmente as mendicantes, como a dos Trinitários e a dos Dominicanos. Trinitários, Franciscanos e Dominicanos: todos adentraram o País, durante o reinado de D. Afonso II (1211-1223), e ali se instalaram, com os favores da monarquia. 8 Acredito, inclusive, que a grande ascendência, especialmente dos Franciscanos – os quais se constituíram, aqui, no meu objeto de estudo – sobre a família real portuguesa, deve-se a esse interesse comum, que era a transformação dos hábitos da população. D. Afonso II e seus sucessores tiveram como estratégias para alcançar aquele objetivo, o uso do processo legislativo, enquanto os frades usaram os recursos religiosos que dispunham, como a sua vivência pessoal, embasada na pobreza; no seu comportamento simples e pacífico; na pregação ortodoxa; nas organizações de confrarias de terciários, onde os franciscanos seculares agiam como “fermento na massa” (cf. Mt 13, 33) da sociedade, contribuindo para a criação de uma cultura de paz, de respeito aos direitos recíprocos e de caridade com os mais pobres e marginalizados. Em uma sociedade, que, mesmo violenta, era religiosa, os recursos usados pelos Franciscanos foram eficazes. Prova disso é a sua aceitação pelas populações, que não apenas lhes acudiam com as esmolas, mas também lhes doavam terrenos, ajudavam-lhes na construção de conventos e igrejas. Grangearam respeito, também, por parte dos reis portugueses e dos papas, em um processo crescente, ao longo da Baixa Idade Média. Bibliografia Fontes REGRA Bulada. In. São Francisco de Assis. Escritos e biografias de São Francisco de Assis. Crônicas e outros testemunhos do primeiro século franciscano. 3. Ed. Petrópolis. Vozes:CEFEPAL. 1993. pp. 131-139 “Sabelecimento em como as casas dos filhos dalgo deuem seer guardadas e degredo como pectem por cada cousa que tomarem” In. LIVRO das Leis e Posturas. , transcrição paleográfica de Maria Teresa C. Rodrigues, Universidade de Lisboa. Faculdade de Direito. Lisboa. 1971. pp. 20-21. Referências Bibliográficas ALMEIDA, Fortunato de. História da Igreja em Portugal. Volume I. Nova edição, preparada e dirigida por Damião Peres. Porto. Portugalense Editora. S.A.R.L. s/d. CASAGRANDE, Carla “A mulher sob custódia”. In. Christiane KLAPISCH-ZUBER (direção). História das Mulheres. A Idade Média. Trad. Ana Losa RAMALHO e outros. Porto. Afrontamento. s/d. pp. 99141 9 MATTOSO, José. “A crise de 1245”. In. Portugal Medieval. novas interpretações. 2. ed. Lousã. Imprensa Nacional: Casa da Moeda. 1992. pp. 57-75. PILOSU, Mario. “A vitória sobre a tentação na Idade Média: exempla e vida dos santos”. In. A Mulher, a luxúria e a Igreja na Idade Média. Trad. Maria Dolores Figueira. Lisboa. Estampa. 1995. RUSQUONI, Roberto. “I Francescani e la Confessione”. In. Franciscanismo e vita religiosa del laici nel’200”. Atti dell’VIII Convegno Internazionale. Assis. 1980. Perugia: Assisi 1981. pp. 251-251-309. VENTURA, Leontina. A nobreza de corte de Afonso III. Coimbra. Faculdade de Letras. 1992. Vol. I. ZAFARANA, Zelina “La predicazione francescana”. In. Franciscanismo e vita religiosa del laici ’200”. Atti dell’VIII Convegno Internazionale. Assis. 1980. Perugia: Assisi 1981. pp. 204-250