GERAL/POLÍCIA Bauru, quarta-feira, 6 de junho de 2012 - Página 5 Drama do crack: tubulações viram casa Dependentes químicos usam locais como moradia e esconderijo para manter vício; peças são responsabilidade do DAE Fotos: Douglas Reis Marcele Tonelli do DAE. “Na semana passada mesmo, atendemos um roubo a Há pouco mais de quatro um senhor de 70 anos e abormeses depositadas em plena damos o indivíduo por aqui”, região central de Bauru, tu- ressalta o capitão. bulações do Departamento de A PM estima que mais de Água e Esgoto (DAE) viraram 100 usuários de crack frequen‘casa’ para usuários tem o local em de crack. Seja noite Segundo o DAE, busca de abrigo ou dia, as grandes as peças de para manter o peças de concreto concreto são para vício. Do total, são utilizadas por de- a rede de esgoto mais de 80% zenas de dependen- e ainda ficarão teriam ficha crites como dormitório minal e outros, e até como esconde- no local até até carteira de rijo para a “fuga” de novembro trabalho assicrimes. nada. “Esses tubos facilitam a Entre os próprios usuários fuga dos pequenos crimes no o local acabou se tornando moCentro. Os bandidos descem tivo de uma “triste piada”, sendo pelo vão do viaduto 13 de Maio chamado de “Meu tubo, minha e correm para se esconder ali vida”, em referência ao projeto dentro”, aponta o comandante do governo federal para aquisido 1º Batalhão da Polícia Mili- ção de moradias populares. tar, capitão Jorge Luís Dias. De acordo com a PolíEntre o tubo e a ponte cia Militar (PM), o problema envolvendo o acúmulo de Na manhã de ontem, a reusuários de drogas embaixo portagem do Jornal da Cidade, do viaduto da rua 13 de Maio acompanhada pela PM, esteexiste há alguns anos, mas a ve nas imediações do viaduto intensificação ocorreu há cerca da rua 13 de Maio e na viela de quatro meses, após o local paralela à rua Tiradentes, às virar “depósito” das tubulações margens da avenida Nuno de Assis e do viaduto inacabado. Na ocasião, diversas pessoas dormiam dentro das tubulações e abaixo da alça da ponte. Entre elas havia uma mulher que afirmou estar grávida, mas não quis conversar. Alguns moradores foram arredios, outros receptivos. Um deles foi o bauruense Thiago (os sobrenomes serão preservados na reportagem), que tem 22 anos e há dois afirma morar debaixo do viaduto da 13 de Maio. Viciado em crack desde os 15 anos, ele conta ter abandonado o trabalho de pintor e ter saído de sua casa, na Vila Industrial, para entregar-se ao vício. Questionado quanto à sua família, o rapaz abaixa a cabeça e responde que sua mãe, por diversas vezes, tentou buscá-lo, mas sua dependência impediu o “retorno à vida”. “Eu até quero sair, mas ninguém me ajuda direito. Eles até já vieram aqui (Sebes), mas eu não fui, é difícil”, relata o rapaz, que afirma ter registros por roubo na polícia. Com um pequeno lençol cobrindo até a altura dos joe- Tubos de concreto nas imediações do viaduto da 13 de Maio: abandono e drama social lhos, ele confessa ter passado fome e até frio nas últimas noites, mas não desiste da estadia na ponte, “quando chega a noite, vou para o tubo dormir”. Encostada na coluna oposta ao local utilizado como ‘sala’ pelos moradores do viaduto, Thiago aponta uma cozinha improvisada. No chão, uma grelha com tijolos e um balcãozinho feito de pedras abrigava um saco com sal, recipientes com óleo e até mesmo moedas, indicando os resquícios da produção de alimentos por ali. Outro fato que chamou a atenção em meio ao chão de terra batida foi a presença de uma vassoura improvisada, indicando a limpeza no local. Outra moradora do local, Josiele, 24 anos, trabalhava como doméstica antes de ser derrotada pelo crack, há cinco meses. Assim como Thiago, a jovem também é bauruense e morava no Bauru 2000 com os três filhos, que hoje estão com uma tia. Apesar de mostrar-se firme com a escolha feita pela vida na rua, ela confessa ter medo. “Já me roubaram, tenho medo, mas acredito Nele”, afirma a mulher olhando para cima. ‘Eu tinha vergonha dos meus irmãos’ Homem fecha tubulação com cobertas e pedaços de madeira para dormir Rede de esgoto A respeito do depósito das tubulações nas imediações do viaduto da rua 13 de Maio e da viela paralela à rua Tiradentes, próximo ao viaduto inacabado, o Departamento de Água e Esgoto (DAE) informou que as peças de concreto serão retiradas do local até novembro. Por meio da assessoria de imprensa, a autarquia afirma ter conhecimento dos problemas que o depósito ao ar livre tem causado e alega que o material será utilizado para obras de interceptação da rede de esgoto, na região da Sorocabana até o Terminal Rodoviário, assim que a licitação para implantação for finalizada. Gilberto tem 57 anos e é servente de pedreiro. Sua história não é diferente das demais contadas pelos outros usuários de crack que “residem” nas imediações da avenida Nuno de Assis. Há cerca de três meses, ele adaptou uma das tubulações às margens do viaduto inacabado, na viela paralela à quadra 2 da rua Tiradentes, para “morar”. Sem oportunidades e dependente químico há mais de três décadas, ele improvisa para conter o vento, o frio e a chuva da porta de sua “casa”, protegida com edredom, lençóis e pedaços de madeira. Sobrevivendo com os trocados conquistados no recolhimento de recicláveis pela região central, Gilberto, que afirma não ter filhos, conta ter resolvido fugir para Bauru por se considerar má influencia para seus sobrinhos. “Eu tinha vergonha dos meus irmãos e preferi sair de lá para não ser um mau exemplo”. Na manhã de ontem, por volta das 9h, ele e sua companheira de 42 anos, que preferiu não se identificar, acordaram e se prepararam para a rotina da recolha de materiais recicláveis pela cidade, mas por conta da chuva, resolveram adiar a jornada e permanecer dentro do tubo. Sobre as dificuldades de viver ao relento, em condições precárias, Gilberto conta com simplicidade a forma como se acostumou a viver com a carência de condições básicas. “Para me alimentar, espero doações de restaurantes, para tomar banho uso um córrego próximo, e para lavar as roupas e ir ao banheiro, vou ao posto de combustível”, efantiza. Ele relata que seu único temor morando na rua é ser assaltado ou agredido. “Já me roubaram chocolate e outras comidas aqui, por isso, levo tudo comigo e só deixo a cama. De noite volto para dormir e aqui é tudo escuro”, completa o morador, que assim como Josilene, afirma nunca ter recebido nenhuma visita da prefeitura no local. Em março, o JC publicou uma reportagem abordando a falta de iluminação pública e a ocorrência de roubos e furtos naquela região, principalmente na viela paralela à rua Tiradentes. Na ocasião, o secretário de Obras do município, Eliseu Areco, afirmou que o problema sobre a iluminação seria resolvido entre os meses de agosto e setembro deste ano. (MT) ‘Creas terá atendimento 24h’, diz secretária Durante a visita aos “moradores das tubulações” na manhã de ontem, uma equipe da Secretaria do Bem-Estar Social (Sebes), junto a uma base móvel da Polícia Militar, chegou ao local para o recolhimento e registro dos usuários. A assistente social da Sebes Marilda Bencoletto explica que a operação “Enfrentamento ao crack”, realizada em parceira com a PM, ocorre há alguns meses nos locais de risco de Bauru. “De segunda a quinta-feira, das 6h às 9h, pas- samos nesses lugares recolhendo essas pessoas, mas a maioria não quer sair, acabam brigando e xingando a gente”, frisa Marilda sobre a dificuldade encontrada na resistência dos usuários de drogas ao atendimento. O maior ‘entrave’ apontado pelos moradores de rua em relação aos albergues e centros sociais de apoio na cidade, conforme ela, seriam os horários. “Eles não querem ter hora para chegar, comer e dormir. Às vezes abrimos exceções, mas não podemos fugir das regras sempre”, responde a assistente social. Os usuários recolhidos pela operação são encaminhados para o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Creas Pop) e depois para os albergues noturnos, ou para hotéis sociais. Sobre o atendimento e o ‘entrave’ nos horários colocados como empecilho pelos moradores de rua, a titular da Sebes, Darlene Têndolo, ressalta que nos próximos meses o Creas Pop, que atende somente até as 17h, receberá um reforço e terá equipe 24h para atender a população noturna. “Temos um fluxo cons- tante de pessoas que vão e voltam para as ruas. É um trabalho difícil e que requer o convencimento em querer mudar de vida, por isso iremos persistir e fortalecer ainda mais”, reforça. De acordo com a Sebes, 93 pessoas seriam atendidas constantemente pela operação “Enfrentamento ao crack” na cidade. Dessas, apenas 6 aceitaram o tratamento contra o vício, e outras 13 teriam retornado para suas cidades de origem. Sobre a negativa alegada por alguns usuários em relação ao recebimento de ajuda da prefeitura, a secretá- ria é enfática. “Nós atuamos firmemente todos os dias, eles falam isso por não quererem nossa ajuda e não serem adeptos às regras dos centros de acolhimento, ou então, por causa de conflitos familiares”, pontua. (MT) Serviço O Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Creas Pop) atende durante o dia na rua Cussy Junior, 13-75, Centro. Oferece: alimentação, vestuário, banho e orientação psicológica, entre outras atividades. Acusado pode responder por homicídio duplamente qualificado Malavolta Jr. O vigilante José Marcos Furtado, 31 anos, acusado de matar o pedreiro Nelson de Morais, 61 anos, a pedradas na noite do último sábado e que foi localizado pela equipe de Força Tática da Polícia Militar (PM) de Bauru na tarde de anteontem, poderá responder por homicídio duplamente qualificado. O delegado titular da Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Bauru, Kleber Granja, explica que as investigações da Polícia Civil já apuraram que a vítima foi agredida no momento em que dormia. “O caso não é de homicídio simples, é de homicídio duplamente qualificado. A vítima foi morta à traição. Ela estava dormindo quando foi apedrejada e o motivo foi fútil”. Furtado foi capturado pela equipe de Força Tática da PM na quadra 6 da rua Inconfidência, Centro, por volta das 17h10 da tarde de anteontem. Os policiais chegaram a ele por meio de denúncia de uma testemunha. Ao ser interpelado, o acusado confessou o crime e foi apresentado ao Plantão Policial de Bauru onde - somente ontem - a autoridade plantonista pediu a sua prisão temporária por cinco dias. O pedido foi acatado pela Justiça e Furtado foi encaminhado na tarde de ontem à Cadeia Pública de Pirajuí. O delegado da DIG, Cledson Luiz do Nascimento, que está presidindo o inquérito instaurado sobre o caso, já pediu a prisão temporária do acusado por mais 30 dias por homicídio duplamente qualificado. O acusado teria relatado aos policiais que a discussão entre ele a vítima começou em frente ao albergue, quando ambos iriam adentrar ao local. Por motivos ainda a serem esclarecidos, ele e Morais iniciaram uma discussão. Neste momento em que estariam embriagados, Furtado teria encontrado uma pedra no chão, a pegou e começou a desferir golpes em Morais. A vítima foi encontrada logo após o crime, por volta das 22h30 da noite de sábado, ainda com vida, caída a cerca de 30 metros da passarela do viaduto da linha férrea, próximo ao Terminal Rodoviário. (Bruna Dias) José Marcos Furtado foi levado ontem à Cadeia de Pirajuí