Eucaliptos atraem quase 90% dos investimentos
privados na floresta
Oito em cada dez hectares de floresta plantados sem recurso a fundos públicos tiveram como
destino os eucaliptos. A liberalização das plantações e replantações está a dar fôlego à
espécie que já domina a floresta nacional.
Oitenta por cento das novas plantações e 94% das replantações produzidas na floresta
portuguesa ao longo dos últimos 15 meses sem recurso a ajudas públicas tiveram os
eucaliptos como a árvore de eleição.
A espécie florestal que no espaço de meio século cresceu de uma área reduzida de 50 mil
hectares para se tornar na árvore dominante no país (ocupa 812 mil hectares) continua a sua
expansão imparável. E ao simplificar o processo de aprovação de novas plantações e ao
permitir a mudança de espécie nas rearborizações de espaços florestais, o novo regime
jurídico que entrou em vigor em Outubro de 2013 parece favorecer essa expansão: dos 11.019
hectares arborizados ou rearborizados com capitais privados nos 15 meses de vigência da
nova legislação, 10.046 receberam eucaliptos.
Só o facto de os apoios à florestação da Política Agrícola Comum se dirigirem prioritariamente
a espécies como o pinheiro manso ou o sobreiro evitam que a floresta nacional caminhe
irreversivelmente para a monocultura.
Apesar do curto prazo de aplicação do regime jurídico aplicável às acções de florestação e
reflorestação (RJAAR), parece hoje evidente que a liberalização das plantações em áreas até
10 hectares (a maioria esmagadora das explorações florestais nacionais está abaixo deste
limiar) está a acentuar a hegemonia do eucalipto e a decadência do pinhal. As razões para esta
dinâmica prendem-se com a maior rentabilidade do eucaliptal para os proprietários. O eucalipto
começa a gerar receitas após 10 anos da primeira plantação e a sua exploração (em talhadia)
permite que um mesmo povoamento dure ao longo de quatro ou cinco ciclos de corte (48 a 60
anos). Um pinhal demora 30 anos a produzir madeira capaz de ser utilizada na indústria do
mobiliário.
Muitos silvicultores defendem que a prioridade da fileira do eucalipto não é tanto aumentar a
área, mas reconverter povoamentos existentes. Os números do RJAAR indicam que esse
caminho está a ser seguido. Dos 7326 hectares rearborizados, a esmagadora maioria (79%)
corresponderam a replantações de áreas já ocupadas por eucaliptos. Mas pelo caminho, outras
espécies acabam por ser substituídas. Em particular o pinheiro-bravo, base de uma indústria
que representa 47% do valor acrescentado bruto da fileira florestal (812 milhões de euros em
2012). Neste processo de mudança, 1165 hectares deixaram de ser dedicados ao pinheiro
bravo para passarem a ser ocupados pela espécie que alimenta a cadeia da pasta e do papel.
Este sinal é apenas mais um sintoma do inexorável recuo do pinhal português, que no espaço
de 50 anos se reduziu de 1,2 milhões de hectares para cerca de metade. João Gonçalves, do
Centro Pinus, que agrega mais de dois terços da fileira industrial do pinho, considera que
“ainda é cedo” para se poder explicar as transferências de áreas de pinhal com a nova
legislação. Mas nota que “64% da área de crescimento do eucalipto se fez zonas de pinho e
não em zonas de mata ou incultos”. A transformação em curso, sublinha João Gonçalves, vai
agravar as dificuldades da indústria, que tem de importar todos os anos dois milhões de metros
cúbicos de madeira para laborar – 36% das necessidades das empresas do Centro Pinus.
Do lado da pasta e do papel, os indicadores da execução do RJAAR não suscitam motivos
para alarme. Armando Gois, director-geral da Celpa, a associação que agrega a indústria do
sector, nota que o crescimento das áreas de eucalipto feito com investimento privado tem de
ser balanceado com as áreas de outras espécies financiadas pelos fundos comunitários. Se
este exercício se fizer, nota, “a percentagem dos eucaliptos nas arborizações e rearborizações
desce para 44%” – o sobreiro surge com 31% do total e o pinheiro manso, cuja rentabilidade
explodiu com o aumento da procura mundial de pinhão, 12% (ver infografia). De resto, “é
provável que o ritmo de crescimento dos últimos tempos seja menor do que nos anos
anteriores”, admite Armando Góis.
Apesar do equilíbrio que os fundos estruturais vão introduzindo na diversidade florestal, o risco
de a expansão do eucalipto se perpetuar é elevado e o perigo de a área de pinho continuar a
regredir (por abandono, pelos ataques de pragas como o nemátodo, pelos incêndios ou pela
replantação com espécies mais rentáveis como o eucalipto) existe. João Soveral, um silvicultor
que passou pela vice-presidência do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas
(ICNF) e integra os corpos técnicos da CAP reconhece que a “natural” orientação dos
proprietários para os estímulos do mercado existe, mas afirma que “os instrumentos da política
florestal não permitem” o eventual cenário de uma monocultura de eucalipto.
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