COMUNICAÇÃO MATEMÁTICA: CONTRIBUTOS DO PFCM NA REFLEXÃO DAS PRÁTICAS DE PROFESSORES Filipe Sousa IEC – UM (e-mail: [email protected]) Valter Cebolo IEC – UM (e-mail: [email protected]) Berta Alves IEC – UM (e-mail: [email protected]) Ema Mamede IEC – UM (e-mail: [email protected]) RESUMO A reflexão sobre as práticas dos professores constitui um dos aspectos que mais define e enriquece o Programa de Formação Contínua em Matemática para Professores do 2º Ciclo do Ensino Básico, (PFCM). A consciencialização da importância do desenvolvimento nos alunos da comunicação matemática enquanto capacidade transversal materializa-se nos relatos e reflexões escritas que integram os portefólios produzidos pelos professores. Neste contexto, serão aqui analisadas algumas limitações/constrangimentos revelados na promoção da comunicação matemática em de sala de aula. São também abordados outros aspectos essenciais directamente relacionados com esta capacidade, de salientar, a selecção cuidada das tarefas, a valorização das produções dos alunos, o incentivo à explicação de estratégias de resolução e à argumentação sobre os processos, a organização e gestão do trabalho a desenvolver nos diversos momentos da aula, e as formas intervenção do professor. Introdução O PFCM tem como finalidade última a melhoria das aprendizagens dos alunos na área da Matemática e o desenvolvimento de uma atitude positiva face a esta área do saber. O PFCM funcionou em grupo, sendo que cada grupo era constituído por cerca de 10 professores. Uma parte da formação reportou-se a sessões conjuntas que se realizam quinzenalmente, nas quais se pretendia o desenvolvimento de propostas curriculares a experimentar na aula e o aprofundamento do conhecimento matemático necessário para a sua concretização. Nestas sessões conjuntas, os professores foram desafiados a questionar-se sobre a importância do seu papel na motivação e gestão da comunicação matemática na sala de aula. Os professores tiveram ainda o acompanhamento do formador em algumas aulas durante o seu horário lectivo normal, para a concretização e análise das experiências, que contribuíram para um aprofundamento no processo de reflexão individual e conjunta das práticas, criando desta forma dinâmicas de trabalho colaborativo. A cultura de reflexão promovida neste Programa terá sido um dos aspectos que mais o define e enriquece, tendo-se mostrado essencial para a consciencialização e discussão dos professores de muitas questões actuais associadas ao processo ensino e aprendizagem da Matemática. Neste processo, destaca-se a tomada de consciência da importância da comunicação matemática e a forma como esta é geralmente promovida na sala de aula. Sendo esta uma questão que sempre interessou e preocupou os formadores que integram a equipa de formação da Universidade do Minho, foi constantemente discutida nas sessões de formação, levando a que os professores se questionassem acerca da importância do seu papel na motivação e gestão da comunicação na sala de aula. É nossa intenção partilhar aqui alguns testemunhos, que espelham algumas dificuldades existentes na promoção de uma cultura de comunicação matemática na sala de aula, tendo consciência de que serão apenas reflexo do início de um possível processo de mudança por parte do professor. A comunicação matemática O recente Programa de Matemática do Ensino Básico (2007) também destaca a comunicação matemática como uma importante capacidade transversal a toda a aprendizagem da Matemática, juntamente com a Resolução de Problemas e o Raciocínio Matemático, realçando que “os alunos devem ser capazes de comunicar as suas ideias e interpretar as ideias dos outros, organizando e clarificando o seu pensamento matemático.” (DGIDC, 2007, p. 5). Ou seja, os alunos devem ser capazes de interpretar enunciados apresentados de forma oral ou escrita, expressar ideias usando uma linguagem matemática precisa, descrever e explicar estratégias e processos utilizados nas suas produções, argumentar e discutir argumentações apresentadas por outros (DGIDC, 2007). Também o National Council of Teachers of Mathematics (2007), NCTM, enfatiza o papel da comunicação como parte essencial da educação matemática, distinguindo a importância de organizar e consolidar o pensamento matemático através da comunicação, comunicar o pensamento matemático de forma coerente e clara entre colegas, professores e outros; analisar e avaliar as estratégias e o pensamento matemático usados por outros e usar a linguagem da matemática para expressar ideias matemáticas com precisão. Embora seja mais usual a comunicação oral na aula de matemática, o NCTM (2007) destaca igualmente a importância da comunicação escrita como forma de “ajudar os alunos a consolidar o seu pensamento, uma vez que os obriga a reflectir sobre o seu trabalho e a clarificar as suas ideias acerca das noções desenvolvidas na aula.” (p. 67). Em Portugal, também o novo Programa enfatiza que a comunicação oral tem lugar tanto em situações de discussão como no trabalho em pequenos grupos, e os registos escritos podem surgir da elaboração de relatórios associados à realização de tarefas (DGIDC, 2007). A existência de orientações curriculares no sentido de promover a comunicação oral e escrita dos alunos, pode suscitar alguns problemas de implementação ao professor, durante a aula de Matemática. Saber quando e como pode esta comunicação ser promovida, saber que tarefas favorecem o desenvolvimento da comunicação matemática na aula são apenas alguns dos aspectos que podem constituir constrangimentos ao professor. Um outro aspecto igualmente relevante e que pode constituir um obstáculo ao professor prende-se com uma precoce e prematura imposição da linguagem matemática formal. Pois “os alunos precisam de desenvolver um apreço pela necessidade de definições exactas e pelo poder comunicativo dos termos matemáticos convencionais, comunicando, primeiramente, através das suas próprias palavras” (NCTM, 2007, p. 70), tendo em atenção que “rigor da linguagem, assim como o formalismo, devem corresponder a uma necessidade sentida e não a uma imposição arbitrária.” (DEB, 2001, p. 70). Considera-se assim que o desenvolvimento da capacidade de comunicação dos alunos deverá ser considerado um importante objectivo curricular, pelo que é essencial que se criem momentos de comunicação adequados, sendo determinante o papel desempenhado pelo professor. A este respeito o NCTM (2007) refere que o professor deve procurar que os seus alunos explicitem os seus raciocínios com clareza, que analisem e reajam aos raciocínios dos colegas. Estas indicações vão de encontro a uma das ideias fundamentais que Fernandes (2007) preconiza para uma mudança da realidade pedagógico-didáctica presente nas salas de aula, que é a alteração do paradigma da transmissão pelo paradigma da interacção. Ou seja, deixar de desenvolver o currículo com base no discurso do professor e a passividade dos alunos, passando a privilegiar a comunicação entre o professor e os seus alunos e entre os próprios alunos. Na aula de Matemática, o professor é o grande impulsionador e promotor da comunicação matemática, proporcionando momentos de discussão entre os distintos intervenientes. A este respeito, Orton (2004) refere que as discussões professor-aluno e entre aluno-aluno exigem cautela, na medida em que a formação de conceitos na cabeça dos alunos depende em muito do uso apropriado da linguagem. A promoção da comunicação matemática depende em muito do papel assumido pelo professor. Neste contexto, cabe ao professor: a) comunicar com rigor e clareza; b) dar tempo suficiente para o aluno raciocinar; c) ouvir as ideias dos outros; d) colocar em discussão essas ideias e validá-las colectivamente; e e) dar a devida relevância às conclusões a tirar. No entanto, é manifesto que o professor tem concepções e crenças que por vezes não permitem a promoção da comunicação matemática em sala de aula. A sua postura é de tal forma tradicionalista que não dá lugar à comunicação oral e escrita. Estas concepções e crenças redutoras, impossibilitam os alunos de desenvolverem a comunicação matemática, pois se o próprio professor não consente o desenvolvimento desta capacidade, o aluno não tem sequer a oportunidade de a poder praticar. De acordo com Wood, Cobb e Yackel (1991), os momentos em sala de aula que fomentam a colaboração entre pares, bem como a discussão alargada a toda a turma, possibilitam aos alunos o envolvimento num tipo de discurso em que os seus significados pessoais ficam sujeitos ao questionamento dos colegas, havendo um espaço de negociação dos diferentes significados individuais até se chegar a um consenso. De acordo com Veia (1996), a actuação do professor durante a discussão pode ajudar a incutir nos alunos o respeito por saber ouvir os outros, estabelecendo com eles regras de funcionamento, dispensando tempo suficiente para ouvir as suas ideias e encorajando-os a pensar em questões a colocar quando ouvem os seus colegas. Para que tal seja possível, cabe ao professor ser capaz de efectuar uma selecção adequada das tarefas a propor aos seus alunos, bem como o ser capaz de gerir os distintos momentos da aula de Matemática. A selecção das tarefas Uma escolha criteriosa das tarefas matemáticas que o professor propõe na sala de aula é um aspecto essencial para a relevância da discussão que pode gerar. As actividades centradas na resolução de problemas e de investigação constituem potenciais oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento da comunicação matemática na medida em que possibilitam a criação de uma atmosfera em que o professor e os alunos assumem uma atitude de questionadores (Martinho & Ponte, 2005; Wood, Cobb & Yackel, 1991). Mas para além da influência exercida pela natureza das tarefas que o professor propõe, há também que ter em atenção a forma como a sua exploração é organizada. Por exemplo, Serrazina et al. (2008) apontam que embora uma determinada tarefa seja bastante rica do ponto de vista matemático, a possibilidade de colher todos os frutos dessa tarefa pode ser amputada se não houver tempo suficiente para exploração, se não houver lugar para discussão, argumentação e apurar conclusões. A gestão dos momentos da aula A gestão dos momentos de discussão da aula é da responsabilidade do professor. Esta envolve uma complexa rede de decisões que o professor deve tomar ao longo da aula, consiguindo gerir o tempo de forma a permitir que os alunos consigam definir os seus próprios processos de resolução, formular e testar as suas conjecturas (Serrazina et al., 2008). Também a organização das intervenções dos alunos requer um destaque especial para que os processos de discussão possam ter lugar. A este respeito Lo e Wheatley (1994) salientam a importância de se estabelecerem normas sociais para a discussão em sala de aula em que os alunos tentam comunicar os seus significados matemáticos. Além destes aspectos, Orton (2004) distingue o envolvimento activo dos alunos para que uma discussão seja proveitosa para todos. Se assim não for, as potenciais vantagens de uma discussão em grupo podem ser desperdiçadas. O professor deverá também ser capaz de iniciar e conduzir o discurso na sala de aula e incentivar os alunos a apresentar e explicar as suas produções, fomentando sempre a procura de justificações para tais resultados. É frequente que os alunos demonstrem algumas dificuldades em verbalizar as suas justificações, pelo que o professor deverá colocar questões que ajudem o aluno a clarificar o seu raciocínio. Pois, é importante que a validação desse raciocínio surja desta discussão (Serrazina et al., 2008), em vez do certo ou errado sentenciado pelo professor. Nesse sentido, e de acordo com Martinho e Ponte (2005), é crucial ter em conta a descentralização da autoridade, pelo que o professor deverá solicitar aos alunos, sempre que oportuno, justificações das suas produções de modo que estes possam também assumir o poder de decidir o que está certo ou errado. Lo e Wheatley (1994) consideram desadequado que o professor, no exercício da sua autoridade em sala de aula, interrompa discussões afincadas entre os alunos durante a resolução de um problema, sem os ajudar a interpretar a situação em discussão ou a expressar uma opinião. Sendo a promoção da comunicação em sala de aula um processo complexo, procura-se aqui identificar dificuldades com que os professores se deparam nas práticas de sala de aula. A comunicação matemática e o PFCM A consciencialização da importância do desenvolvimento nos alunos da comunicação matemática enquanto capacidade transversal, assim como a sua utilização em termos de orientação metodológica, a redefinição dos papéis dos diferentes actores na aula de matemática, incluindo as dificuldades e constrangimentos que lhe estão subjacentes, materializam-se nos relatos e reflexões escritas que integram os portefólios produzidos individualmente por cerca de 150 professores do 2.º Ciclo do Ensino Básico, que trabalharam ao longo de um ano com três dos autores deste trabalho. Estes portefólios funcionam como um olhar crítico dos professores sobre as suas práticas lectivas. Neles estão visíveis as tentativas de alteração das suas práticas em contexto de sala de aula, tendo em vista uma melhoria do desenvolvimento da comunicação, expondo assim dificuldades e constrangimentos com que os professores se debateram durante a implementação das aulas de Matemática. Resultados Uma análise de conteúdo dos portefólios dos formandos, no que respeita à comunicação matemática em sala de aula, possibilitou sistematizar alguns obstáculos que os professores enfrentam na implementação das suas aulas procurando desenvolver a comunicação matemática. Destes obstáculos destacam-se a escolha de tarefas, a valorização das produções dos alunos, o incentivo à explicação de processos de resolução e a forma de intervenção. a) A escolha das tarefas Os professores assumem e reconhecem que o tipo de tarefas seleccionado condiciona a Comunicação Matemática e apontam como tarefas promotoras desta capacidade transversal a resolução de problemas e as actividades de investigação. Exemplo disso é o testemunho da Eva, que a seguir se apresenta: “Apercebi-me de como a discussão proporcionada pela resolução de problemas, em pequenos ou grandes grupos, é uma forma muito importante de estimular a reflexão dos alunos. Pelo que este tipo de experiências de aprendizagem têm de fazer parte, cada vez mais, da prática lectiva pois proporciona uma melhoria nas aprendizagens tanto a nível de raciocínio como na comunicação, em relação à resolução de exercícios (…)” (Eva) b) Valorização das produções dos alunos É importante que os professores valorizem as produções dos alunos tendo em conta alguns aspectos a promover em sala de aula, tais como: 1) conhecer e entender as produções dos alunos; 2) dar oportunidade à partilha de resoluções e argumentação sobre processos de resolução entre os alunos e alunos-professor; e 3) valorizar processos e não apenas produtos. Relativamente ao primeiro ponto, verifica-se que um desconhecimento das produções dos alunos coloca em causa o trabalho de discussão e partilha de resoluções, estratégias e processos por eles desenvolvidos. O testemunho da Fátima é disso exemplo. “A dificuldade em dedicar mais atenção às várias etapas da actividade de investigação pelo que não consegui conhecer convenientemente o trabalho realizado pelos alunos de forma a saber valorizá-los, pois só após a aula vi os seus registos.“ (Fátima) Foi ainda apontado com alguma frequência o facto de o professor conhecer as produções dos alunos, mas não conseguir entendê-las de forma a possibilitar uma exploração mais rica da tarefa, como se pode verificar na resolução do problema “Um rectângulo tem de perímetro 90m. A medida do comprimento é o dobro da medida da largura. Qual será a medida do comprimento?”. Um dos alunos solicita ao professor que verifique a sua resolução. O professor não consegue compreender de imediato o raciocínio desenvolvido e rejeita esta produção do aluno, que estando correcta revela uma reacção prematura por parte do professor. Figura 1 – resolução apresentada por um aluno. O aluno parece ter o raciocínio seguinte: noventa metros é a medida do perímetro do rectângulo. A medida de dois lados consecutivos será metade do perímetro (daí o aluno efectuar a divisão de 90 por dois). Como a medida de comprimento do lado maior é o dobro da medida de comprimento do lado menor, significa que o lado menor será 1/3 da medida do semi-perímetro (45 metros). O aluno divide 45 por 3 obtendo a medida do lado menor (15 metros). Consequentemente, o aluno conclui que o lado maior mede 30 metros por ser o dobro da medida do menor. Relativamente ao segundo ponto, podemos ver pelas Figuras 2, 3 e 4 um bom exemplo de partilha de resoluções e estratégias entre alunos e alunos-professor. Na Figura 2, o aluno expõe no quadro a sua estratégia de resolução. Os colegas intervêm e além de apresentarem as suas estratégias, discutem e argumentam relativamente às estratégias adoptadas e aos resultados obtidos (Figuras 3 e 4). O professor orienta a discussão promovendo a Comunicação Matemática (Figura 4). Figura 2 – Um aluno apresenta a sua estratégia de resolução Figura 3 – Um colega intervém e inicia-se a discussão Figura 4 – Outros alunos entram na discussão. O professor orienta. Numa outra situação de ensino-aprendizagem, um outro professor reconhece que orientar/dirigir demasiadamente os alunos, limita a variedade de estratégias e a riqueza das discussões entre alunos. A este respeito, o professor Bernardo testemunha que: “Outro dos problemas surgiu na altura da apresentação e discussão dos resultados, na medida em que eu os direccionei demasiado para as minhas investigações feitas antes da aula (…) numa actividade de investigação o professor deve apenas orientar os alunos nas suas descobertas e não influenciá-los de acordo com as suas previsões.” (Bernardo) Relativamente ao terceiro aspecto, a Figura 5 evidencia uma prática pedagógica no sentido de haver uma valorização dos processos e não apenas dos produtos. Figura 5 – Alunos em discussão Os alunos apresentam as diversas estratégias de resolução em acetato, discutindo os diversos raciocínios desenvolvidos. O professor promove este tipo de abordagem, para que os alunos compreendam todo o processo de resolução e não apenas o produto final. c) Incentivo à explicação de processos de resolução A Comunicação Matemática pode ser promovida em sala de aula através das explicações das resoluções dos alunos para a turma oralmente ou através de produções escritas. Durante a discussão o professor deverá não só fomentar a exploração das produções correctas, como também utilizar o erro para alterar e consolidar aspectos conceptuais ou processuais. “Ao longo da aula tive dificuldade na gestão do diálogo com os alunos pois, devido à minha ansiedade, não dei tempo necessário para que os alunos pudessem dialogar mais uns com os outros sobre o seu trabalho. Quando um aluno acertava eu respondia imediatamente que estava correcto, cortando a discussão, o que procurei colmatar nas aulas seguintes.” (Ana) d) Forma de intervenção No decorrer da aula, alguns professores questionaram-se sobre: Como e quando intervir? Em que medida devo intervir? De que forma posso intervir? “…ao longo da aula houve situações de constrangimento, como sejam: as decisões acerca do que dizer e não dizer, do que perguntar e não perguntar, de quais aspectos da discussão matemática devia estimular, quais os que devia deixar cair, sobre quando devia orientar o debate entre os alunos ou devia apenas fomentá-lo.” (Carmo) Durante as resoluções, o professor deve intervir de forma a não condicionar o raciocínio nem o espírito crítico do aluno. Contudo, o exercício desta prática ainda constitui uma grande dificuldade para muitos professores. Nas reflexões analisadas, outros pontos fracos foram detectados, nomeadamente o professor se centrar-se mais em explicar e nunca abandonar esta postura em detrimento do fazer entender. Isto parece traduzir uma visão tradicionalista do ensino da Matemática, em que o professor assume uma postura directiva, centrada na transmissão de conhecimentos, sendo escassos ou até omissos os momentos em que é atribuída ao aluno a oportunidade de descobrir, estabelecer relações e construir o seu conhecimento assegurando a compreensão de conceitos. Quando confrontados com este aspecto, a maioria dos professores reconhece a importância de atribuir aos alunos um papel mais activo na construção do seu saber, sendo-lhes, contudo, difícil sair do seu papel de explicador controlador, dando lugar de destaque ao aluno descobridor. Parece assim existir um conflito entre o que se faz e o que se sabe que se deve fazer. “Fui talvez mais directiva do que o desejado, pois em alguns grupos expliquei a determinados alunos a forma de chegar ao resultado, devido às dúvidas colocadas, em vez de lhes dar apenas pistas para eles próprios descobrirem a solução.” (Gabriela) “Vi o tempo a fugir, mostrei as figuras que faltavam descobrir e passei à correcção da ficha, em vez de permitir a discussão e analisar os erros, pois ainda estou agarrada a trabalhar e fazer muito (…)” (Helena) Conclusão A valorização da comunicação na sala de aula terá de passar obrigatoriamente por uma alteração das concepções dos professores relativamente ao seu papel na sala de aula, procurando uma maior valorização e atenção às produções matemáticas realizadas pelos alunos, uma maior abertura a momentos de interacção entre alunos-professor e alunosalunos, criação de expectativas positivas em relação àquilo que o aluno é capaz de fazer. Nos professores são notórios alguns aspectos que podem condicionar a comunicação matemática na sala de aula nomeadamente: o conflito entre perspectiva tradicionalista e de interacção; o conhecimento matemático e curricular do professor como condicionante da comunicação matemática do aluno; embora haja consciência da importância da comunicação matemática na sala de aula, a alteração das práticas é pouco significativa; gerir a comunicação matemática na aula é difícil. Parece ser evidente que o trabalho de reflexão conjunta desenvolvido no âmbito do PFCM, ao longo do ano lectivo, sobre comunicação matemática na sala de aula sensibilizou e consciencializou os professores para a sua importância, pois muitos professores ressaltam a importância deste aspecto na sua reflexão crítica documentado nos seus portefólios individuais. Para tal, contribuíram em muito, os princípios subjacentes a este programa e a sua forte componente de práticas de reflexão conjunta baseadas no contexto e realidade em que os professores se inserem. Referências Bibliográficas DEB (2001). Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais. Lisboa: Ministério da Educação. Direcção Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular (2007). Programa de Matemática do Ensino Básico. Lisboa: Ministério da Educação. Fernandes, D. (2007). Um Imperativo Ético. Educação e Matemática, 94, 1. Lo, J. & Wheatley, G. (1994). Learning opportunities and negotiating social norms in mathematics class discussion. Educational Studies in Mathematics, 27, 145-164. Martinho, M. H., & Ponte, J. P. (2005). Comunicação na sala de aula de Matemática: Práticas e reflexão de uma professora de Matemática. In J. Brocardo, F. Mendes, & A. M. Boavida (Eds.), Actas do XVI Seminário de Investigação em Educação Matemática (pp. 273-293). Setúbal: APM. 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