18 MOVIMENTO DOS NÃO ALINHADOS: Desarmamento e autodeterminação nacional no contexto da Guerra Fria André Rothfeld Felipe Oliveira Dias Larissa Presotto Bertolo Pedro de Souza Melo1 1. INTRODUÇÃO Em setembro de 1961, 28 países2 do chamado Terceiro Mundo3 se reuniram em Belgrado, capital da então Iugoslávia, para discutir temas como o desarmamento, a integridade nacional e a bipolaridade ideológica do período (DECLARAÇÃO DE BELGRADO, 1961). Os interesses discutidos estavam, dado a conjuntura da Guerra Fria, totalmente permeados pelos ideais da busca de uma autonomia nacional de forma pacífica e não alinhada. De tal modo, o contexto de competição entre duas superpotências hegemônicas – Estados Unidos, capitalista e União Soviética, socialista – ressaltava, sobretudo, a dificuldade do Terceiro Mundo em obter um desenvolvimento de modo neutro (VIGEVANI, 1990). Outro obstáculo para os objetivos destes Estados estava em suprimir as consequências de suas recém-inserções no sistema das relações internacionais, dado a formação tardia da maioria destes países. Como exemplo dessas implicações, coloca-se o 1 Os autores agradecem a colaboração de Pio Penna Filho, Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília, a qual é atualmente professor. Seus auxílios por meio de comentários e sugestões foram de essencial importância à produção deste artigo. 2 Foram participantes desta: Afeganistão, Algéria, Burma (Myanmar), Camboja, Ceilão, Congo, Cuba, Chipre, Etiópia, Gana, Guiné, Índia, Indonésia, Iraque, Líbano, Mali, Marrocos, Nepal, Arábia Saudita, Somália, Sudão, Tunísia, República Árabe Unida (Atuais Egito e Síria), Iêmen e Iugoslávia; e observadores: Bolívia, Brasil e Equador (DECLARAÇÃO DE BELGRADO, 1961). 3 Conceito criado no contexto de Guerra Fria para abarcar países que estavam à margem do sistema global. 575 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 576 não reconhecimento desses países até mesmo nas assembleias da Organização das Nações Unidas (ONU), onde deveriam possuir maior voz (VIGEVANI, 1990). Deste modo, a consolidação de parte do Terceiro Mundo no Movimento dos Não Alinhados (MNA) contribuiu significativamente na forma em que estes passaram ¬a ser reconhecidos pelas nações mais desenvolvidas, aprimorando o reconhecimento de suas identidades nacionais e de seus direitos como Estados perante todo o meio internacional (KEOHANE, 1969). Com isto, serão discutidas neste artigo as principais questões que envolvem os países os quais passaram a compor o Movimento dos Não Alinhados, assim como a importância da consolidação destes em um bloco unificado para a conquista de seus objetivos. Essencial para a compreensão do movimento supracitado, que teve sua origem bastante ligada ao amplo processo de descolonização afro-asiática, está o funcionamento da ordem internacional pós-Segunda Guerra Mundial (1945), período o qual vigorou a chamada Guerra Fria. De tal maneira, será utilizada uma primeira seção para contextualizar a conjuntura do sistema internacional à época, sendo abordados temas como o mundo pós-1945; a bipolarização mundial entre os blocos socialista e capitalista; a apresentação dos blocos hegemônicos e o processo de descolonização supracitado. Uma segunda seção terá ainda a função de dar identidade aos países do Movimento dos Não Alinhados, tendo em vista suas grandes diversidades social, cultural, política, religiosa e econômica (MAGDOFF, 1978). Serão, sobretudo, analisadas neste tópico as características em comum dos membros do bloco – os objetivos compartilhados por estes, os seus passados em comum, entre outros fatos – e o tipo de relação destes com as superpotências do período. Para tanto, será considerada a conjuntura dos países pós-formação nacional, seus líderes, sua economia e política interna e suas ações em relação tanto às superpotências como aos demais países do globo. Outra grande importância dos Não Alinhados consistiu na forte militância do grupo contra a corrida armamentista promovida pelos blocos socialista e capitalista, sendo criticada principalmente a sua dimensão nuclear, iniciada com os bombardeios atômicos estadunidenses no Japão (BEST et al. 2004). Desejando aprofundar ainda mais neste tema e mostrar sua relação com o movimento será abordado em uma quarta seção os riscos dessa nova tecnologia nuclear, o reflexo dela na periferia do sistema internacional e o porquê da necessidade do desarmamento. Movimento dos Não Alinhados A quinta seção visará proporcionar um maior embasamento teórico a cerca dos ideais do Terceiro Mundo, como a neutralidade, o reconhecimento e a formação do movimento. Nela, será aprofundada a importância da independência e do não alinhamento para os países em questão, como a aliança em um bloco unido se adequaria aos objetivos destes e como estes países poderiam manter sua integridade nacional sem se alinhar a uma superpotência (VIGEVANI, 1990). Por fim, reforçando os argumentos aqui colocados, será utilizada uma sexta seção conclusiva, na qual serão relacionados os temas e assuntos presentes no artigo para esclarecer a situação dos países à época. Também será explicitada nesta seção a importância dos acontecimentos ocorridos na década de 1960 para a formação do sistema internacional vigente. 2. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA 2.1. Pós-Segunda Guerra Mundial A rendição incondicional do Japão, assinada a bordo do porta-aviões USS Missouri punha fim à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), encerrando um capítulo do século XX cujas consequências seriam determinantes na configuração da nova ordem mundial e de seus múltiplos aspectos, sobretudo políticos, econômicos e ideológicos (VIZENTINI, 2000). Em meio às incertezas e desorganizações causadas pela Segunda Guerra Mundial, a nova ordem se ocuparia em resgatar, na essência da extinta Liga das Nações4, o ideal de organismos supranacionais que articulassem os interesses entre os protagonistas mundiais. A criação das Nações Unidas, referendada na Conferência de São Francisco (1945), do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial em Bretton Woods são exemplos do esforço político em institucionalizar os canais de negociação e cooperação entre os países, embora a atuação dos incipientes organismos internacionais não convergisse com interesses comuns a todos os representados (LINHARES, 2000). As condições do pós-Segunda Guerra Mundial ilustravam a nova distribuição do poder nas relações internacionais, em virtu- 4 Agremiação de países estabelecida em 1919, no tratado de Versalhes, cuja principal prerrogativa consistia em mediar disputas internacionais (OXFORD DICTIONARY, 2007). A ausência de poder punitivo provaria a ineficiência da Liga frente às agressões internacionais perpetradas por alemães, japoneses e italianos no entre guerras, acarretando posteriormente a dissolução deste organismo internacional. 577 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 578 de dos diferentes graus e formas de envolvimento dos protagonistas naquele conflito5. Estados Unidos e União Soviética constituíam o primeiro escalão da nova ordem, ainda que a infraestrutura e os profundos efeitos da guerra sobre a demografia e a economia deste último país comprometessem o equilíbrio frente ao rival estadunidense (PAINTER, 1999). No âmbito militar, os Estados Unidos eram incontestes no aspecto estratégico (bases navais, aéreas e terrestres), operacional (potencial de empreender ofensivas) e tecnológico, cuja posse de arsenal nuclear seria exclusiva deste país até agosto de 1949, quando os soviéticos testariam, com sucesso, sua própria bomba atômica (VIZENTINI, 2000). Britânicos e franceses a¬inda mantinham parte de seus extensos impérios ultramarinos, herança do apogeu do imperialismo europeu do século XIX, ainda que a nova distribuição de poder privasse ambas as potências de possuí-los indefinidamente ou assumir maior protagonismo mundial, como a retirada britânica na guerra civil grega6 (VIZENTINI, 2000) revelaria. O desmonte colonial, no longo prazo, seria inevitável. A Alemanha foi ocupada e fragmentada, a exemplo de sua capital, Berlim, em quatro zonas, administradas por soviéticos, estadunidenses, franceses e ingleses, como previsto na Conferência de Potsdam7. O Japão remanescia devastado pelo bombardeio sistemático das forças dos Estados Unidos, durante o confronto, e por duas bombas nucleares, em Hiroshima e Nagasaki (PAINTER, 1999), além de se submeter à ocupação dos Estados Unidos e a uma nova constituição, limitando seu potencial militar à autodefesa. No Terceiro Mundo, eclodiam movimentos de libertação nacional em consequência de décadas de colonização e na emergência do conflito ideológico que marcaria a segunda metade do século XX. O enfraquecimento das potências europeias deixava um vácuo de poder, e a perspectiva de alinhamento dos países recém-emancipados constituía riscos e oportunidades às superpotências e seus aliados (VIZENTINI, 2000). 2.1.1 A bipolarização mundial O fim da guerra marcava novos contornos para a relação entre as superpotências. A ameaça do Fascismo, regime político de extrema-direita que se multiplicou, sobretudo, no continente europeu durante o período do entreguerras, saía de cena e o atrito entre liberais e socialistas que se evidenciara anteriormente retornava à agenda dos dirigentes políticos (HOBSBAWM, 2008). A proposta soviética, cujo meio de superar o sistema de acumulação de capital pressupunha a derrubada dos governos não socialistas era, de Movimento dos Não Alinhados fato, irreconciliável com o desenvolvimento de instituições que preservassem o mesmo sistema (HOBSBAWM, 2008). A instauração da ditadura do proletariado por intermédio de uma vanguarda partidária e a estatização e planificação econômica na região soviética não seriam ideias facilmente aceitas pelo Ocidente, amparado em tradições representativas (ainda que apenas teóricas, em muitos casos), na livre iniciativa e no livre mercado. Interesses diametralmente opostos e cálculos incertos norteariam os rumos da Guerra Fria. Amparada na desconfiança acerca das intenções do Ocidente e, sobretudo, na súbita incursão alemã no território russo em 19418 a principal preocupação de Stalin referia-se à integridade territorial da União Soviética, como as zonas de influência delimitadas em Yalta8 e a criação de Estados-tampão no oriente europeu sugeriam. Para os socialistas a revolução mundial estava em segundo plano (KENNEDY, 1989). A insurreição comunista na Grécia, as perspectivas de vitória eleitoral do Partido Comunista na Itália (HOBSBAWM, 2008) e o triunfo de Mao Tsé Tung e da guerrilha comunista sobre o Kuomintang na China continental fortaleciam a convicção estadunidense de um plano soviético com o propósito de desencadear a revolução mundial (KENNEDY, 1989). A ameaça comunista se manifestava, sobretudo, na política interna dos países. A partir do corrente entendimento acerca das ambições estratégicas e ideológicas de Stalin, a gestão Truman9 se engajaria em firme conten- 5 Embora as condições do pós-45 evidenciassem duas potências emergentes no novo panorama internacional, as assimetrias de poder, decorrentes do envolvimento na Segunda Guerra Mundial, eram evidentes (PAINTER, 1999), estando de um lado os Estados Unidos, com um rápido crescimento econômico, e de outro a União Soviética, com sua economia solapada pela guerra. 6 Com a expulsão dos invasores alemães na Segunda Guerra Mundial, a Grécia passou por uma guerra civil entre conservadores e guerrilhas comunistas. Visando evitar a expansão soviética na região houve aação direta dos Estados Unidos por meio da chamada Doutrina Truman, que preconizava a contenção da União Soviética a fim de desestabilizá-la internamente (PAINTER, 1999). 7 Realizado em 1945 na cidade alemã de Potsdam, o encontro entre representantes dos Estados Unidos, Grã-Bretanha e União Soviética estabeleceriam os princípios da ocupação do território alemão após a Segunda Guerra (OXFORD DICTIONARY, 2007). 8 Realizada em fevereiro de 1945, a conferência de Yalta daria prosseguimento ao entendimento entre os aliados em assuntos como a delimitação das fronteiras da União Soviética nos moldes de 1941 e o compromisso de Stalin com o estabelecimento de governos democráticos na Europa Oriental, exposta na declaração conjunta dos líderes então reunidos (KISSINGER, 1994). 9 Com a morte do presidente estadunidense Roosevelt, em abril de 1945, Truman assumiria a Casa Branca. À gestão Truman cabe uma nova postura adotada frente aos soviéticos – a célebre Doutrina da Contenção, descrita anteriormente (KISSINGER,1994). 579 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 580 ção dos soviéticos e da revolução comunista nos países fora da órbita de Moscou, como a Guerra da Coreia, em 1950, mostraria. Ilustrada pelo National Security Council Paper 68 (NSC-68), assinado por Truman, a politica externa dos Estados Unidos se empenharia em “promover o crescimento econômico, político e militar do mundo livre” (NSC-58, 1950)10. Fundamento da reconstrução da Europa, o programa de assistência econômica elaborado por Washington (Plano Marshall, 1947) visava à reestruturação das endividadas economias capitalistas europeias e a garantia do abastecimento de matérias primas e combustíveis, necessários para a retomada do crescimento no velho continente (VIZENTINI, 2000). O Plano Marshall teve sua oferta estendida ao Oriente europeu, que, cedendo às pressões de Moscou, rejeitou a oferta e solidificou a polarização europeia (PAINTER, 1999). Os temores de que a assistência econômica aproximasse os países da Europa Oriental da influência estadunidense implicariam o processo de “Stalinização” da região, disseminação de prescrições adotadas na União Soviética e expurgos políticos, que seriam veementemente criticados pela independente Iugoslávia socialista encabeçada por Tito11 (PAINTER, 1999). As clivagens entre ocidente e oriente europeu ganhavam dimensão militar em 1949 com a instituição da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), constituindo uma aliança dos países do Atlântico norte, encabeçada pelos Estados Unidos em resposta a uma possível invasão soviética. O Pacto de Varsóvia, unindo a órbita de Moscou em assistência mútua no caso de invasão, só seria instituído em 1955 em resposta ao rearmamento da Alemanha Ocidental e a posterior adesão desta à OTAN. O passado belicista da Alemanha despertava inquietação nos vizinhos, não obstante a divisão daquele país (VIZENTINI, 2000). A morte de Stálin, em 1953, e o início da administração de Kruschev marcariam a transição da desconfiança mútua para a busca da coexistência pacífica entre os dois sistemas distintos, embora acontecimentos como a crise de Suez, que será tratada adiante, e supressão da revolução húngara12, em 1956, ameaçassem a estabilidade mundial (PAINTER, 1999). O embate político-ideológico no continente europeu, que implicara planos de assistência econômica, pactos de defesa mútua e crises internacionais chegavam a um impasse, uma vez que quaisquer transgressões destes entendimentos levariam à guerra. Os anos seguintes transbordariam os conflitos do continente europeu rumo à periferia global, o Terceiro Mundo, cujas ondas de descolonização e tensões políticas dotavam de significância global conflitos locais ou regionais. Movimento dos Não Alinhados 2.2 A descolonização afro-asiática O surto de independências ocorrido no pós-guerra está intimamente ligado à conjuntura internacional da Guerra Fria. O esfacelamento progressivo dos impérios neocoloniais inaugurava a disputa entre as duas superpotências por zonas de influência no Terceiro Mundo. Se por um lado o prestígio dos soviéticos e dos teóricos socialistas (anti-imperialistas) era um convite à expansão da revolução e da influência comunista, a posição dos Estados Unidos, manifestada na Carta do Atlântico13, defendia o “direito de todos os povos de escolher a forma de governo sob a qual queiram viver” (BICALHO, 1991, p.39), divergindo, portanto, do status quo dos impérios neocoloniais. A importância da Segunda Guerra Mundial em si não deve ser menosprezada para explicar essa onda de descolonização. As consecutivas derrotas britânicas e a capitulação franco-holandesa nos anos 1939 e 1940, bem como a ofensiva japonesa no Pacífico, contrariavam o mito da superioridade do homem branco, ideia então em voga na época, e abriam espaço para a contestação da legitimidade racista das estruturas coloniais (LINHARES, 2000). Ademais, a demanda de efetivo militar para suprir os fronts da Segunda Guerra Mundial exigiu concessões políticas às colônias e a seus habitantes, como a extensão da cidadania francesa aos habitantes da Argélia ilustra (LINHARES, 2000). As ondas de libertação nacional na Ásia (1945-1954) e posteriormente na África pós-Conferência de Bandung (1955), compartilhavam forte viés nacionalista e se encontravam sujeitas ao mesmo contexto internacional. Devem ser devidamente percebidas, entretanto, a forma de atuação das potências colonizadoras em cada caso, a importância estratégica de cada colônia, além da composição política e a inspiração ideológica de cada 10 Disponível em: <http://history.state.gov/milestones/1945-1952/NSC68> último acesso em 23 de dezembro de 2012 às 21 horas. 11 Josip Broz Tito (1892-1980). Marechal e Estadista iugoslavo, foi uma importante figura política da esquerda. Tito é um dos expoentes do não alinhamento em razão de sua política externa desvinculada das diretrizes de Moscou (OXFORD DICTIONARY, 2007). 12 Em 1956, o líder do Partido Comunista Húngaro Nagy anunciou a retirada da Hungria do Pacto de Varsóvia e a neutralidade daquele país. Em resposta a este acontecimento, a União Soviética invadiu o país, realinhando-o a órbita de Moscou e substituindo Nagy pelo comunista pró-Kremlin Kádár. A repercussão deste episódio seria suavizada pela Crise de Suez, sua contemporânea (PAINTER, 1999). 13 Declaração conjunta de Estados Unidos e Grã-Bretanha, afirmando o apoio destes países aos princípios que fundamentariam a Organização das Nações Unidas. (Disponível em: http://www.un.org/en/aboutun/history/atlantic_charter.shtml). 581 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 582 movimento, condicionadas por históricos socioculturais heterogêneos (BICALHO, 1991). O incipiente nacionalismo indiano do Partido do Congresso, mobilizado no século XIX por uma elite ocidentalizada educada nas universidades londrinas, só seria massificado nas décadas de 1920 e 1930 em decorrência do agravamento da miséria nas cidades indianas, da crescente concentração fundiária, endividamento dos camponeses e da frustração das elites com o não cumprimento de promessas de maior autonomia colonial (BICALHO, 1991). Amparados na desobediência civil e na não violência, os nacionalistas desestabilizariam o domínio colonial britânico. O separatismo da Liga Muçulmana, dentro do movimento independentista, dividiria hindus e muçulmanos, provocando confrontos que causariam a morte de mais de 100.000 habitantes da então colônia (BICALHO, 1991) e a criação em 1947, mediante arbitragem britânica, de Índia e Paquistão. No sudeste asiático, a invasão japonesa, durante a Segunda Guerra que se estendeu das ilhas Guam e Wake, no Pacifico, à Birmânia (atual Myanmar) no continente asiático (ameaçando inclusive a Índia), interrompera a administração das potências coloniais. A tentativa francesa de retomar o controle da Indochina entraria em conflito com os interesses dos movimentos pró-independência na região. A derrota dos colonizadores seria selada em maio de 1954 em Dien Bien Phu14, após fracassada campanha do exército francês contra uma guerrilha que, a exemplo dos comunistas chineses, dominava o meio rural (BICALHO,1991). O processo de paz seria firmado no mesmo ano com acordos de Genebra15. A região passaria a ser vista por soviéticos e americanos como importante campo de batalha ideológica, como sugere a famosa frase do efeito dominó16, proferida pelo presidente estadunidense Eisenhower nos anos 50 (PAINTER, 1999). As Índias holandesas remanesceriam sob controle colonial por menos tempo. O temor de uma vitória comunista em um importante fornecedor de matérias primas (LINHARES, 2000) motivaria os americanos a pressionar os Países Baixos a concederem independência – anunciada pelos insurgentes em 17 de agosto de 1945 – aos nacionalistas anticomunistas. Em 1949, a Indonésia conquistava sua soberania. Na região do Magreb, o Islã e o conservadorismo social despenhariam papel importante na luta pela independência, onde os movimentos nacionais seriam marcadamente anticomunistas (ZOUBIR, 1995). Apesar da desconfiança francesa acerca da influência americana na região17, as independências dos protetorados do Marrocos e da Tunísia Movimento dos Não Alinhados seriam declaradas em março de 1956. A Argélia só conquistaria sua independência, em 1962, após longos confrontos entre a administração colonial e a guerrilha Front de Libération Nationale (FLN)(ZOUBIR,1995). As independências na África subsaariana compartilhariam instabilidade e ausência de coesão nacional, sobretudo em virtude das delimitações instituídas pelas potências europeias. O caso nigeriano, que engloba em um mesmo território nove grupos étnicos principais, 248 dialetos e três religiões predominantes, ilustra este raciocínio (BICALHO, 1991). Inspirados na descolonização asiática, os movimentos se diferenciariam significativamente. A Costa do Ouro (atual Gana) aplicaria o modelo indiano, baseado na desobediência civil e na não violência, para combater o domínio britânico, obtendo independência em março de 1957. Angola e Moçambique, por sua vez, entrariam na luta armada contra Lisboa (LINHARES, 2000). O Congo, após sua independência, sofreria, a exemplo do Sudão, uma longa guerra civil, disputada entre o centralizador Patrice Lumumba, apoiado pelos soviéticos e assassinado em 1961, e os separatistas (aliados dos Estados Unidos) da província de Katanga (BICALHO, 1991). A importância das matérias primas do continente para o mercado internacional (gêneros agrícolas, petróleo, cobre, diamantes, bauxita, manganês e borracha, entre outros) teria papel relevante a ponto de condicionar ou inviabilizar o envolvimento de estadunidenses e soviéticos na região. Influenciados pelas potências europeias por meio do sistema de mandatos e das fronteiras instituídas mediante acordo18, países 14 Vilarejo no noroeste do Vietnã do Norte, onde seria consolidada a derrota definitiva das forças coloniais francesas na Indochina (KISSINGER, 1994). 15 A conferência de Genebra estabeleceria, a partir do paralelo 17, a República Democrática do Vietnã (comunista) ao norte e a República do Vietnã ao sul, caracterizando tal demarcação como um “ arranjo administrativo para facilitar o reagrupamento de forças militares antes das eleições internacionalmente supervisionadas” (KSSINGER,1994), sendo os processos eleitorais ocorreriam dentro de dois anos. 16 A expressão efeito dominó lidava com a perspectiva de vitória da guerrilha comunista na República do Vietnã (do Sul) e o possível efeito cascata deste acontecimento nos países do sudeste asiático (Laos, Camboja, Tailândia, Birmânia e Malásia) e até mesmo no Japão (PAINTER, 1999). 17 A campanha dos Estados Unidos no norte da África durante a Segunda Guerra e o viés anticolonial deste país motivavam suspeitas na França quanto à convergência de interesses entre os dois países no tocante ao Magreb (ZOUBIR, 1995). 18 O sistema de mandatos remonta o fim da Primeira Guerra Mundial, onde as províncias do Império Otomano no Oriente Médio foram divididas entre França e Grã-Bretanha. 583 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 584 como Síria, Jordânia, Iraque e Líbano compartilhariam as tensões nacionalistas do mundo colonial. A instituição do Estado de Israel em território palestino, em 1948, e a guerra de independência deste país agravariam a instabilidade regional, reforçando o ideal da solidariedade árabe. O Egito, encabeçado pelo pan-arabista19 Gamal Abdel Nasser, atrairia a atenção dos Estados Unidos ao comprar armamentos de origem tchecoslovaca e soviética, com vistas a contrabalancear Israel e iniciar uma crise de proporções globais em torno da nacionalização do canal de Suez, em 1956 (PAINTER, 1999). O peso do respaldo político junto aos soviéticos provaria resistir à operação conjunta de israelenses, franceses e ingleses para derrubá-lo. Explorar o jogo político internacional a seu favor renderia a Nasser papel de destaque no Oriente Médio e no mundo subdesenvolvido, que lutava contra o domínio colonial. As emancipações das colônias, distintas entre si, não tardariam a estabelecer vínculos. Realizado na capital do Ceilão (Sri Lanka), Colombo, um encontro entre representantes de daquele país e de Birmânia, Índia, Indonésia e Paquistão seria o primeiro passo para empreender uma reunião multilateral entre os países recém-independentes, a ser realizada em Bandung, na Indonésia (MOSJOV, n.d.). 2.2.1 Conferência de Bandung A reunião de 29 países20 do Terceiro Mundo na cidade indonésia de Bandung trouxe uma nova perspectiva para a bipolarização ideológica mundial (MOSJOV, n.d.). Idealizada por eminentes figuras internacionais como o primeiro ministro indiano Jawaharlal Nehru, as linhas de Bandung, aludidas em seus 10 princípios21, se manifestariam na cooperação econômica e estreitamento de laços comerciais, mas, sobretudo na solidariedade conjunta aos processos de independência na Ásia e na África e acerca do ideal de neutralidade no cenário mundial, marcado pelos polos socialista e capitalista. De fato, a importância fundamental de Bandung reside na ideia comum a todos os países reunidos, referente à liberdade de ação no âmbito mundial, e não a uma aliança de caráter regional (MOSJOV, n.d.). Embora as perspectivas mais ortodoxas dentro do Kremlin condenassem a neutralidade de Bandung, a administração Kruschev encarava os fatos apresentados como canais de atuação para a diplomacia soviética, de modo que a aquisição de importantes aliados pró-Moscou seria uma questão de tempo (BROWN, 1966). Observado com receio por Washington, o Espírito de Bandung se pronunciaria a favor do socialismo, destacando sua neutralidade Movimento dos Não Alinhados frente às superpotências (LINHARES, 2000). Preocupação semelhante seria compartilhada pela Grã-Bretanha que, desde o final da Segunda Guerra, trabalhava em conjunto com os aliados estadunidenses o processo de transição para a independência de suas colônias, buscando afastá-las da esfera socialista (TARLING, 1992). Embora a institucionalização do não alinhamento fosse se consolidar apenas em Belgrado, a cooperação visando ao respeito à soberania e autodeterminação nacional firmaria a pretensão comum às nações não alinhadas de constituir uma terceira via, não entre dois polos, porém livre para atuar dentro de ambos, conforme suas necessidades e interesses nacionais (BROWN, 1966). 3. OS NÃO ALINHADOS O grupo de países reunido nos primeiros dias de setembro de 1961 possuía características tão heterogêneas que, não fosse pela conjuntura vigente, seria difícil cogitar qualquer interesse compartilhado entre estes (COHEN, 1973). Assim, torna-se vital para a compreensão dos objetivos deste diversificado Movimento o conhecimento dos atores que o compõe, assim como suas necessidades e seu histórico. Como característica comum entre estes países reside o fato de todos terem lidado, mesmo que de modos diferentes, com o imperialismo e com constantes intervenções externas nocivas à suas autonomias (HOBSBAWM, 2008). A formação nacional dos não alinhados foi igualmente conflituosa, envolvendo majoritariamente conflitos armados – principalmente no que tange aos seus processos de independência, refletindo assim o problemático processo de descolonização que passaram (PRENSA LATINA, 1981). A dificuldade de se obter o reconhecimento de sua soberania pe- 19 A ideologia fundamentada na união de todos os Estados Árabes (OXFORD DICTIONARY, 2007). 20 Estavam presentes em Bandung representantes de Ceilão (Sri Lanka), Birmânia (Myanmar), Índia, Indonésia, Paquistão, Afeganistão, Camboja, República Popular da China, Egito, Etiópia, Costa do Ouro (Gana), Irã, Iraque, Japão, Jordânia, Laos, Líbano, Libéria, Líbia, Nepal, Filipinas, Arábia Saudita, Sudão, Síria, Tailândia, Turquia, República Democrática do Vietnã (Vietnã do Norte), Vietnã (do Sul) e Iêmen (DECLARAÇÃO DE BANDUNG,1955). 21 Dentre os 10 princípios, cabe aqui ressaltar os seguintes: 2) respeito à soberania e integridade territorial de todas as nações; 3) reconhecimento da qualidade de todas as raças e nações, grandes ou pequenas; 7) constrangimento de atos e ameaças de agressão a partir do uso da força contra a integridade territorial ou a independência de um país (MOSJOV, n.d.). 585 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 586 rante o sistema internacional também era grande por problemas que envolviam tanto suas políticas internas – bastante conflituosas devido a disputas pelo poder e desestruturação social – quanto às relações destes com as grandes potências (MAGDOFF, 1978). Chesneaux, importante historiador francês, usa como explicação para estas desigualdades a problemática dos chamados “pontos de partida” neste grupo de países. Por terem suas estruturas sociais bastante alteradas devido ao sistema colonial – o qual substituía a economia original local por um sistema de produção em massa de artigos muitas vezes estranhos à sua cultura – esses países possuíam uma divisão desequilibrada tanto da terra quanto de conhecimentos de produção (CHESNEAUX, 1976). A problemática se refletia também no modo em que a sociedade era estruturada, visto que, para serem aceitos, os colonizadores apoiavam um grupo em particular da região em detrimento aos demais, havendo assim um monopólio da riqueza e do poder por parte de uma facção e a subjugação por parte de outras (CHESNEAUX, 1976). Este processo desestruturante gerou conflitos pelo poder com dimensões catastróficas, como o ocorrido em Ruanda22, país palco de um dos maiores genocídio já vistos, possuindo problemas sociais e políticos em decorrência desta até a atualidade (HUMAN RIGHTS WATCH, 2006). A política imperialista serviu então como obstáculo para diversos desses “pontos” por meio da exploração exaustiva dos recursos naturais e da desestruturação socioeconômica desses países (CHESNEAUX, 1976, p. 114). Como consequência, há nessas regiões um desenvolvimento socioeconômico aquém ao das demais potências, sendo uma grande parte do Terceiro Mundo subjugado a dependências e a crises sociais, políticas e econômicas (VIGEVANI, 1990). Assim, não importa o tipo de processo de independência dos países – seja ela obtida por meios diplomáticos, como o caso da Indonésia; conquistada pelo meio de conflitos armados, como Cuba; por revoluções pacíficas, como a Índia, ou até mesmo o caso da Iugoslávia, a qual não foi formalmente colonizada, mas que buscava uma maior autonomia –, a problemática do imperialismo permaneceu mesmo após seu fim formal, perpetuando a desigualdade e favorecendo as grandes potências principalmente na dimensão econômica (MAGDOFF, 1978). Esta relação entre as superpotências e o Terceiro Mundo observada no período, também chamada de neocolonialismo, representou as maiores denúncias do Movimento dos Países Não Alinhados, que criticavam veemente a subordinação que os antigos Impérios queriam Movimento dos Não Alinhados continuar impondo a eles (VIGEVANI, 1990). É então de fácil entendimento a necessidade de união entre os subalternos, dado aos problemas e necessidades em comum. Deste modo, houve uma profunda mudança no comportamento destes países, que abandonaram sua atitude passiva para reconquistar, sobretudo, sua autoconfiança, denegrida por séculos de racismo e aculturação (MAGDOFF, 1978). Esta transformação se deu principalmente por meio da militância ativa dos chefes de Estado, que denunciavam o neocolonialismo e suas implicações. Líderes como Nehru, Sukarno, Nasser, Gandhi, Tito, Mao Tsé-tung23, entre outros, ficaram famosos por propiciar novos rumos às políticas de seus países. Entretanto, apesar de estarem amplamente baseados no apoio popular, não se pode dizer que estes governos eram sempre democráticos: muitos desses24, para prosseguir com suas políticas, optavam por um regime autoritário, quase sempre de natureza militar (VIGEVANI, 1990). Reconhecem-se assim muitas das características que uniam esses países, fazendo-os muitas vezes ignorar suas diferenças culturais, políticas e religiosas em prol de um objetivo comum (PRENSA LATINA, 1981). Assim, para concretizar os objetivos da seção, urge a relação do Movimento, assim como de seus anseios com a conjuntura de Guerra Fria, vital para o entendimento dos escopos do MNA, dado ao processo posterior à formação nacional desses Estados. Para tanto, é necessário recordar dos constantes embates entre os blocos socialista e capitalista e de que, para os países recém-independentes havia, em um primeiro momento, apenas a escolha de se aliar a um dos blocos para receber deste ajuda militar e financeira. No entanto, tal opção era amplamente indesejada, visto que contrariaria profundamente a necessidade de afirmação da independência desses países, a qual seria invalidada caso fosse concretizada qualquer aliança com algum dos blocos (MAGDOFF, 1978). A conquista de autonomia política seguida por uma subordinação a qualquer um dos blocos – seja ele capitalista ou socialista – não fazia sentido para os futuros Não Alinhados, sendo então na- 22 O genocídio, ocorrido em 1994, levou mais de 800.000 pessoas à morte (HUMAN RIGHTS WATCH, 2006). 23 Índia, Indonésia, Egito, Índia, Iugoslávia e China, respectivamente. Egito, China, Iugoslávia, entre outros, tiveram governos autoritários os quais, apesar de incentivarem algumas políticas positivas, promoveram regimes de censura, perseguição e tortura. 24 587 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 588 tural uma aliança para ajuda e reconhecimento mútuo. A evasão de alianças com os blocos de poder não significa, entretanto, que estes Estados estavam vetados de qualquer relação com os Estados Unidos ou com a União Soviética. Pelo contrário, era desejada, para a obtenção de um desenvolvimento sócio econômico, a relação com ambas superpotências, de modo neutro, a conquistar sempre os objetivos desejados. O Egito é então pioneiro nesse tipo de relação, que visava utilizar ambos os blocos complementarmente para obter um desenvolvimento mais eficaz, neutro e não alinhado (VIGEVANI, 1990). Para ilustrar esse tipo de política pode-se citar o controverso caso da Questão de Suez, citada anteriormente. Mesmo que o Egito tenha conquistado sua independência da Inglaterra em 1922, este país remanesceu na esfera de influência da antiga metrópole até meados do século XX, havendo uma relação de carácter quase colonial entre os dois países – sendo o ápice desta a ainda permanência de tropas inglesas no Canal de Suez (VIGEVANI, 1990). Foi apenas com uma crescente onda nacionalista e antibritânica nos anos 50 que se tornou possível o fim do regime monárquico pró-ingleses para dar lugar a uma República, em uma transição marcada pela a ascensão de Nasser ao poder. Tal líder, em ação conjunta com o Movimento dos Oficiais Livres25, foi responsável por uma maior consolidação da independência de seu país, a qual teve como marca a nacionalização do Canal supracitado, evacuando as tropas inglesas do local. Visando ainda confirmar uma política independente e de não alinhamento, foi tornada pública a compra de armamentos soviéticos pelo Egito, causando, assim, uma comoção nos países do bloco capitalista (MAGDOFF, 1978). Por parte dos Estados Unidos, houve como reflexo uma reação imparcial, dado ao medo de uma maior aproximação do Egito tanto com outros países árabes como com a própria União Soviética (VIGEVANI, 1990). Entretanto, o comportamento de seus aliados não foi o mesmo, já que, utilizando como justificativa a invasão de Israel à região, houve uma intervenção imediata de tropas inglesas e francesas, as quais utilizavam o discurso de proteção para a permanência no local. O conflito teve fim apenas com um ultimato da ONU, o qual obteve apoio de diversas nações – inclusive a estadunidense, pelos motivos citados anteriormente – e que previa a retirada dos invasores assim como a constituição de uma força internacional encarregada do cessar fogo na região (PRENSA LATINA, 1981). Influenciada por esta política, a Índia passou a adotar ações semelhantes à egípcia, prezando sempre pelo relacionamento Movimento dos Não Alinhados com ambos os blocos (SCHWEINITZ, 1983). Deste modo, após seu processo de independência, o Estado indiano passou a ter uma economia baseada em Planos Quinquenais26, no molde soviético. Entretanto, para assegurar a sua política de neutralidade, as relações com o bloco capitalista continuaram sendo mantidas, de modo a incorporar elementos do capitalismo em uma economia mista, havendo assim investimentos nos setores público e privado (CHATTERJEE, 2004). Outra evidência deste tipo de política pode ser observada na agricultura do país, na qual, para se evitar ondas de fome – como a ocorrida com a Crise de Bengala (1943)27 –, o governo utilizou tanto organizações privadas como cooperativas públicas para seu desenvolvimento (SCHWEINITZ, 1983). A Iugoslávia praticou também políticas semelhantes de complementaridade entre os blocos de poder e se destacou principalmente por estar localizado no continente europeu, próximo tanto ao polo socialista como o capitalista. Após ter conquistado sua reintegração nacional, liderada principalmente pelo General Tito, o Estado adotou uma economia socialista, porém não necessariamente pró-União Soviética. Assim, a Iugoslávia alternou sua política externa de modo à sempre ter tanto seus interesses como a sua identidade nacional prevalecida, tendo ora praticado acordos com os Estados Unidos, ora se reaproximado de Moscou (HOFFMAN et al., 1962). Como exemplo, pode-se citar o inicial afastamento da Iugoslávia em relação à União Soviética devido ao carácter exploratório que a superpotência socialista queria impor ao regime de Tito. A fim de substituir este vácuo comercial, houve então uma aproximação iugoslava com os Estados Unidos, principalmente na forma econômica. Assim, a reaproximação com a União Soviética só foi possível a partir da aceitação desta da política não alinhada da Iugoslávia, a qual deveria ser livre para estabelecer acordos comerciais (HOFFMAN et al., 1962). Para finalizar, tem-se também o caso cubano, que contou com um forte movimento de guerrilha para consolidar seus interesses nacionais. Apesar de ter conquistado sua independência ainda no século XIX, o país ainda era alvo de uma forte intervenção externa, principalmente ao se considerar o descaso do Governo com a po- 25 Organização de carácter militar fundada por Nasser com o objetivo de derrubar o regime monárquico do Egito. 26 Instrumento de planejamento econômico o qual se estabeleciam metas com o prazo de cinco anos para o desenvolvimento da economia do país. 27 Intempéries climáticas levaram a uma inflação exorbitante dos preços do arroz, levando à morte mais de um milhão de indianos (BHATIA, 1985). 589 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 pulação local em contraponto com a preocupação excessiva deste com as empresas estrangeiras (HUBERMAN et al., 1960). Assim, visando findar tal situação, revolucionários como Che Guevara e Fidel Castro iniciaram um movimento armado que, em 1959, depôs o ditador pró-Estados Unidos Fulgêncio Batista e iniciou um governo planificado, repleto de reformas sociais e nacionalizações, privilegiando sempre uma política ideologicamente neutra, nos moldes do Egito e da Iugoslávia. Entretanto, a nacionalização de diversas empresas estadunidenses – principalmente petrolíferas – e a recusa de maiores negociações causou um enorme descontentamento no governo de Washington, que, como punição, promoveu um embargo econômico à ilha. Esta passagem culminou em um rompimento diplomático forçado de Cuba com o bloco capitalista, originando assim o seu rumo socialista pró-URSS (HUBERNAN et al., 1960). 590 4. A AMEAÇA NUCLEAR: A DISPUTA PELO PODER E O REFLEXO NA PERIFERIA Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a ascensão dos Estados Unidos e da União Soviética como potências econômicas e militares, a humanidade se viu mergulhada em uma nova guerra. Pois, como afirma o filósofo Thomas Hobbes, “a guerra consiste não só na batalha, ou no ato de lutar: mas num período de tempo em que a vontade de disputar pela batalha é suficientemente conhecida” (HOBBES, 1651, apud HOBSBAWM, 2008, p. 224). Ideologicamente opostos, EUA e URSS buscavam expandir suas áreas de influência sobre o resto do mundo, o qual estava sob constante ameaça de um conflito entre as potências. Várias gerações viveram à sombra de uma possível guerra nuclear global, que se acreditava poder iniciar a qualquer momento, uma vez que Estados Unidos e União Soviética seguiram a política armamentista, investindo cada vez mais na produção de armamentos, tanto convencionais como nucleares (HOBSBAWM, 2008). 4.1. O poder nuclear O uso de armas nucleares foi observado pela primeira vez no fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, no ataque contra as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. Há controvérsias sobre o primeiro uso da bomba, ao fim da Segunda Guerra, uma vez que partindo de um argumento norte-americano, esse seria o único jeito de encerrar o conflito, ao conter as forças japonesas; porém, também é possível analisar pelo ponto de vista de que o uso da bomba atômica serviu como um meio para os Estados Unidos se Movimento dos Não Alinhados proclamarem como maior potência militar do planeta. A primeira utilização de armas nucleares pode ser considerada, além de último ato militar da Segunda Guerra, a primeira grande operação da Guerra Fria, que introduziu um elemento de risco nas relações internacionais do pós-guerra (KARNAL et al, 2011). “A rivalidade americano-soviética sobre a questão das armas nucleares foi o que, acima de tudo, definiu a bipolaridade extrema da Guerra Fria” (BEST et al, 2004, p. 232, tradução nossa). No início da década de 1950, os poderes das duas potências não estavam em equilíbrio, e a balança estava claramente a favor dos Estados Unidos, uma vez que eles foram os pioneiros na produção de tecnologia nuclear. Os EUA estavam um passo à frente da URSS em questões militares, devido ao fato de possuírem tecnologia para construir bombas atômicas, e o presidente norte-americano à época, Eisenhower (1953-1961), investiu fortemente em armamentos nucleares e se baseou na noção de retaliação em massa, ou seja, a ideia de que os Estados Unidos estariam prontos para retaliar qualquer tipo de ataque soviético com armas nucleares (BEST et al., 2004). O investimento em armas nucleares pelo lado ocidental gerou o chamado dilema de segurança 28 de Herz. O termo se aplica também à corrida armamentista observada durante a Guerra Fria, e, dessa forma, após adquirir tecnologia nuclear, a União Soviética passou a se armar também, de modo que ambas as potências passaram a usar a ameaça nuclear como instrumento político (HOBSBAWM, 2008). O potencial de retaliação estadunidense só funcionou como forma de ameaça à União Soviética enquanto os EUA apresentavam superioridade bélica, mas com a entrada da URSS na corrida armamentista e o sucesso soviético na corrida espacial, a ameaça partia dos dois lados e o poder de destruição nuclear poderia levar a proporções devastadoras (BEST et al., 2004). 4.2. Reflexos na periferia Com os movimentos de descolonização da África e da Ásia e a Conferência de Bandung, as relações internacionais foram marcadas pela manifestação de um terceiro grupo de países, alheio aos dois blocos rivais durante a Guerra Fria. Os países recém-in- 28 Este termo está ligado ao fato de que os grupos ou os indivíduos, por estarem preocupados com sua segurança, esforçam-se para buscar mais poder a fim de se defender de possíveis ameaças de outros, iniciando assim um círculo vicioso de acúmulo de poder (HERZ, 1950). 591 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 dependentes buscavam uma alternativa de inserção internacional autônoma e independente (SARAIVA, 2001). Dificilmente os países descolonizados conseguiriam seguir os passos de desenvolvimento de suas antigas metrópoles, porém esse não era o interesse dos mesmos, e como afirma Frantz Fanon (1979, pp.26-27): A descolonização jamais passa despercebida porque atinge o ser, modifica fundamentalmente o ser, transforma espectadores sobrecarregados de inessencialidade em atores privilegiados, colhidos de modo quase grandioso pela roda-viva da história. Introduz no ser um ritmo próprio, transmitido por homens novos, uma nova linguagem, uma nova humanidade. A descolonização é, na verdade, criação de homens novos. Mas esta criação não recebe sua legitimidade de nenhum poder sobrenatural; a ‘coisa’ colonizada se faz no processo mesmo pelo qual se liberta. 592 O surgimento de novos Estados independentes era interessante aos Estados Unidos e à União Soviética, uma vez que as duas potências poderiam aumentar suas respectivas áreas de influência ao estreitar relações com os continentes africano e asiático. Na década de 1950, EUA e URSS proporcionaram ajuda, por meio de empréstimos e instalação de embaixadas e universidades na África. Tal ajuda, conciliada aos conflitos internos e às independências recentes, tornaram o continente um novo palco da Guerra Fria (SARAIVA, 2001). Entretanto, muitos dos países no continente africano e no continente asiático haviam conquistado a independência recentemente e não possuíam interesse em se aliar a nenhuma das potências, já que buscavam meios próprios de desenvolvimento, por meio de uma abordagem particular da política externa (ALLISON, 1988), já que se unir a um dos blocos predominantes poderia trazer novamente a dependência econômica em relação as grandes potências. E, embora o confronto entre as duas superpotências dominasse o cenário internacional, nem todos os conflitos relacionados ao Terceiro Mundo não estavam essencialmente ligados à Guerra Fria, e os Estados não comunistas, e também alguns comunistas, do Terceiro Mundo não possuíam qualquer intenção de se envolverem em um conflito global (HOBSBAWM, 2008). Dessa forma, apesar das tentativas provenientes dos EUA de globalizar a Guerra Fria e dos conflitos internos do Terceiro Mundo, as armas nucleares tinham pouca utilidade prática para exercer influência direta aos países periféricos à bipolarização mundial (BEST et al., 2004). O grupo dos Não Alinhados possuía Movimento dos Não Alinhados como objetivo promover um desenvolvimento estável e eliminar as fontes de conflitos regionais e globais, além de direcionar suas energias às tentativas de diminuir as tensões entre as grandes potências (ALLISON, 1988). 4.3. O desarmamento como necessidade mundial Além da luta contra o imperialismo e o colonialismo e do desejo de buscar um desenvolvimento autônomo e de se desvincular da influência dos EUA ou da URSS, o Movimento dos Países Não Alinhados tem, também, como objetivo a paz e o desarmamento. Assim como não era interessante participar de um conflito global, também era importante aos não alinhados que tal conflito não acontecesse, uma vez que uma guerra nuclear poderia causar proporções catastróficas que comprometeriam todo o planeta (JUDT, 2007). Os movimentos contra a corrida armamentista partiam não somente dos países não alinhados, mas surgiam igualmente dentro das sociedades civis de países pertencentes aos blocos. Para certos grupos, isso inspirava movimentos a favor de um desarmamento urgente. Na Inglaterra, em 1958, por exemplo, surgiu a Campanha Pelo Desarmamento Nuclear, liderada por grupos esquerdistas, a favor da não violência e contra o uso de armas nucleares. Tal campanha dirigia reivindicações ao próprio governo britânico (JUDT, 2007). A ameaça nuclear e a possibilidade constante de início de uma guerra produziram movimentos internacionais pela paz, dirigidos especificamente contra as armas nucleares, os quais se tornaram por vezes movimentos de massa pela Europa (HOBSBAWM, 2008), como o exemplo britânico citado. Assim como era de interesse a diversos grupos, e havia inspirado diversos movimentos a favor da paz, o desarmamento era também de grande interesse aos não alinhados, uma vez que os princípios de Bandung defendiam a luta pela paz por meio da cooperação e da solidariedade internacional, além da oposição à Guerra Fria (SANTOS et al, 2003). Além dos perigos presentes na corrida armamentista, o teste de armamentos nucleares foi mais um episódio que aumentou a atenção do Movimento dos Não Alinhados em relação ao desarmamento. Particularmente testes nucleares no Pacífico e no Saara obtiveram uma publicidade negativa por parte dos países que não desejavam se alinha, uma vez que os testes revelavam uma possibilidade de que as armas realmente fossem utilizadas, o que tornou o desarmamento um assunto ainda mais pertinente a ser tratado na conferência de Belgrado (ALLISON, 1988). 593 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 5. IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DE UM BLOCO “É necessário concentrar agora todos os esforços pacíficos e todas as forças do mundo (...) a fim de contribuir, mediante ações enérgicas, ao triunfo da paz”. Josip Broz Tito29 594 A consciência de que os problemas em voga na época da Guerra Fria abalariam toda a humanidade levou os países não alinhados a se unirem em prol de objetivos comuns como a paz, o fim das ameaças nucleares e o respeito à dignidade humana. A repercussão necessária para temas tão relevantes da agenda internacional demandava a formação de um bloco coeso e consciente. A aliança do Terceiro Mundo30 foi formada no contexto descrito em seções anteriores (HOBSBAWM, 2008). Existem estudos recorrentes acerca da necessária formação de blocos, uma vez que as relações internacionais são permeadas por alianças, ou seja, por ajustes instrumentais entre países e transitórios às mudanças internacionais (STEIN, 1993). 5.1. Integridade nacional e o seu reconhecimento A partir da década de 60, a comunidade internacional se deparou com o desenvolvimento e a ascensão do Terceiro Mundo a patamares regulares, mas expressivos. Os fóruns de discussões e de tomada de decisão foram ampliados – “(...) o Terceiro Mundo não é apenas uma área para ser estudada, mas um lugar a partir do qual se fala” (MIGNOLO, 1993, p. 123, tradução nossa). A Conferência de Belgrado foi um cenário de coesão entre os países em desenvolvimento pós-Conferência de Bandung e de ameaça de conflito entre as grandes potências. A Conferência consistiu no intercâmbio de opiniões de 25 países do Terceiro Mundo sobre a situação internacional, o não alinhamento e a coexistência pacífica entre os Estados apesar de suas diferenças políticas, econômicas, sociais e culturais (SUARÉZ, 1975). As relações entre os Estados são permeadas ora por cooperação e solidariedade, ora por conflito de interesses e disputas. Contudo, todas as nações desejam alcançar objetivos e é por meio de blocos que os estados complementam suas capacidades, sejam elas militares, financeiras ou políticas, além de amplificar os efeitos de suas ações (STEIN,1993). Isso porque, segundo Vigevani (1990), a lógica da cooperação e da ajuda internacional são questões essenciais para o desenvolvimento do Terceiro Mundo. Por esses motivos, a integração por meio de alianças foi opção de tantos Movimento dos Não Alinhados Estados para a concretização de interesses comuns (LISKA, 1968). Conceitos importantes das relações internacionais como autodeterminação dos povos, não intervenção, soberania, integridade nacional e integração constam nos ideais do Movimento dos Não Alinhados para questionar a polarização da ordem internacional e a política neocolonial das grandes potências (SUARÉZ, 1975). O princípio da autodeterminação é defendido pela Carta das Nações Unidas para o desenvolvimento de relações amistosas entre os Estados (ALEXANDER; FRIENDLANDER, 1980). O conceito ainda é permeado por critérios filosóficos e históricos do Direito Internacional Público – “a Declaração Universal dos Direitos do Homem, (...) vincula o princípio da autodeterminação dos povos aos direitos humanos, subordinando a validade da soberania à vontade do povo” (LITRENTO, 1964, p. 28). Em linhas gerais, o fundamento central da autodeterminação é defender a dignidade e os direitos humanos no que tange a participação livre e plena dos povos. A cada Estado é reconhecido o direito de decidir de forma autônoma na esfera interna, sem influências estrangeiras, ou seja, o Estado é soberano dentro de seu território31 – “A soberania nas Relações Internacionais entre os Estados significa independência. A independência em relação a uma parte do globo é o direito de exercer as funções estatais nessa região, excluindo todos os demais Estados” (HUBBER apud VARELLA, 2012, p. 263). Dentre os temas debatidos pela cúpula de Belgrado, a integridade nacional e os movimentos de independência estiveram no centro dos debates entre os países em desenvolvimento. O conceito de integridade nacional refere-se à inviolabilidade territorial, da população e também a não ingerência – intervenção – nas questões internas de um Estado soberano (KRASNER, 1999). O respeito mútuo à soberania, à integridade nacional, à não-agressão e à não-intervenção nos assuntos internos são princípios essenciais para a coexistência pacífica almejada nos discursos dos líderes presentes na Conferência de Belgrado (SUÁREZ, 1975). A Conferência, portanto, sinalizou a instalação de uma nova ordem 29 Ex-Presidente da Iuguslávia em discurso na Conferência de Belgrado, 1961. O termo foi cunhado na década de 50 para classificar países capitalistas em desenvolvimento e que fossem não alinhados e neutros. Enquanto que por Primeiro Mundo se compreendia os países desenvolvidos capitalistas e por Segundo Mundo os países desenvolvidos socialistas. 30 31 O conceito de soberania foi relativizado pelos Direitos Humanos e deixou de ser um “(...) poder absoluto e incondicional” (VARELLA, 2012, p. 265). 595 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 mundial, consciente e voltada para a prosperidade das nações (DECLARAÇÃO DE BELGRADO, 1961). Os Chefes de Estado e Governo dos países Não Alinhados desaprovavam as tendências de domínio e de ingerência no desenvolvimento interno de outros Estados ou nações (VIGEVANI, 1990). 5.2. Neutralidade e não alinhamento 596 O Movimento dos Não Alinhados optou pela neutralidade e por ações coletivas que dessem força à voz terceiro-mundista. Os estudos acerca do neutralismo político ganharam destaque no pós-Segunda Guerra, porém trata-se de um conceito fundamentado na cultura europeia do século XVI (BEST et al., 2004). A neutralidade tradicional de países europeus32 – principalmente os nórdicos – representa o jogo político dos mesmos para defender seus interesses e integridade nacional, enquanto que para países da Ásia, África e América Latina a neutralidade possui um significado simbólico de independência e redução das influências externas. No contexto da Guerra Fria, a política de neutralidade fora dos limites europeus tomou um rumo muito diferente. A ideia não era de proporcionar uma política amigável com as grandes potências a fim de garantir seus interesses e sua integridade nacional, e sim a iniciativa do não alinhamento e do questionamento da antiga ordem internacional (BEST et al., 2004). O conceito de não alinhamento é consolidado a partir da Conferência de 1961 entre os Chefes de Estado e de Governo dos Países Não-Alinhados devido ao aumento da força política do Terceiro Mundo (VIGEVANI, 1990). A conscientização do Terceiro Mundo acerca da realidade internacional e das consequências desastrosas da disputa ideológica entre as grandes potências foi essencial para a realização da Conferência. A neutralidade e o não alinhamento foram alternativas optadas pelos países participantes da conferência em Belgrado para se oporem às políticas neocoloniais e à polarização mundial, além de almejarem calcar forte participação internacional (VIGEVANI, 1990). Segundo Vigevani (1990), o conceito de neutralidade no domínio externo se expressa quando na existência de um conflito não há a intenção de tomar qualquer uma das partes. Por um lado, a neutralidade tradicional de países como a Finlândia, que adotou a prática da política externa neutra e voltada para a preservação da paz33. Por outro, nos países da Ásia, América Latina e África, o conceito de neutralidade adquiriu uma conotação mais expressiva: evitar uma nova forma de dependência e ganhar espaço para atuar de modo ativo nas relações internacionais (VIGEVANI, 1990). Movimento dos Não Alinhados Por sua vez, o conceito de não alinhamento foi utilizado no contexto da Guerra Fria para classificar os países neutros e sem filiação em relação ao grande paradigma do período – a polarização mundial entre blocos capitalista e socialista. Tais características deram voz a países recém-independentes, marginalizados e em ascensão nas relações internacionais. Os Estados não alinhados, portanto, sentiram-se no dever de expressar as suas preocupações em voz mais forte e coerente do que nunca, em um esforço para mobilizar a opinião pública mundial contra a perpetuação do imperialismo e deixar claro que os novos estados independentes tinham o direito de viver livres da intervenção estrangeira (BEST et al., 2004, p. 315, tradução nossa). É inevitável, portanto, vincular “neutralismo” e não alinhamento a consolidação do Terceiro Mundo como uma força política e ao rumo da Guerra Fria (VIGEVANI, 1990). A neutralidade não remete à ausência de posicionamento e sim, que o foco das políticas desses países se voltou para objetivos de desenvolvimento econômico e social, sem promover o alinhamento e um possível terceiro grande confronto (HOBSBAWM, 2008). Por esse aspecto, é importante ressaltar que os dois conceitos estão sujeitos a noções intersubjetivas34 como exemplifica George Liska: “As realidades do não alinhamento e do ‘neutralismo’ devem ser analisadas por uma perspectiva dupla, uma vez que elas possuem fluxo de respostas próprias e estritamente imbricadas a fatores externos e condições nacionais” (LISKA, 1968, p. 207, tradução nossa). A neutralidade política constituiu uma terceira via aos blocos capitalista e socialista. Pode-se dizer que abriu caminhos para um novo modo de agir politicamente ao defender a coexistência 32 Em contraponto com os Estados recém-independentes da Ásia e da África, que decidiram pela neutralidade como forma de reafirmar sua independência, alguns Estados europeus decidiram por esta política devido a tradições existentes desde o século XVI (BEST et al, 2004). 33 “Nós vemos a justificação da nossa política neutra na prevenção de qualquer coisa que gere mais conflitos internacionais, e nós trabalhamos para a reconciliação e união dos povos, além de visarmos a eliminar dissensões” (KEKKONEN, 1970, p.67, tradução nossa). 34 Noções intersubjetivas se referem às percepções influencias pelo arcabouço cultural e histórico de dois ou mais indivíduos. 597 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 pacífica, o respeito à dignidade humana e o fim do imperialismo, como será visto a seguir. 5.3. A terceira via 598 Em Belgrado foi estabelecida a diferença entre Terceiro Mundo e Não Alinhamento, pois o termo Terceiro Mundo é relacionado a condições econômicas e sociais de miséria enquanto os países não alinhados eram de diversas posições socioeconômicas no sistema internacional (VIGEVANI, 1990) – Suécia e Egito, por exemplo, possuíam realidades econômicas e sociais bem distintas, mas integravam o grupo dos não alinhados. Torna-se ainda mais evidente que o sentimento anticolonial é característica do Terceiro Mundo, o qual percebe o ambiente internacional permeado por relações de poder, hierarquia e segregação (VIGEVANI, 1990). A visão terceiro-mundista consiste em um novo caminho, ou seja, uma terceira via para as relações internacionais, afastando-se da dicotomia dos modelos soviético e liberal (HOBSBAWM, 2008). O conceito da terceira via foi consolidado com Anthony Giddens35 e caracterizou-se por representar um novo projeto de Estado e sociedade, para se opor à conjuntura de polarização na Guerra Fria. A terceira via propunha uma nova ordem internacional para o desenvolvimento, a paz e o respeito à dignidade humana. O modo de operacionalização básica consistia na informação, ou seja, em colocar os principais objetivos como temas recorrentes nas Nações Unidas (VIGEVANI, 1990). Os discursos das grandes potências argumentavam em resposta ao surgimento do bloco e a ameaça da ordem vigente até o momento. É possível relacionar tais discursos com a teoria neorrealista de Kenneth Waltz36. Em síntese, a tese central do autor consiste no poder relativo e na estrutura do sistema como aspectos centrais das análises das relações entre Estados. Em suma, tal teoria afirma que é prioridade dos Estados a segurança e a sobrevivência, os sistemas bipolares37 são mais estáveis e seguros e, portanto, a Guerra Fria foi um período de estabilidade e paz (JACKSON; SORENSEN, 2003). Na medida em que a retórica da Guerra Fria via capitalismo e socialismo, o mundo livre e o totalitarismo, como dois lados de um abismo intransponível, e rejeitava qualquer tentativa de estabelecer uma ponte, podia-se até dizer que, à parte a possibilidade de suicídio mútuo da guerra nuclear, ela assegurava a sobrevivência do adversário mais fraco (HOBSBAWM, 2008, p. 247). Movimento dos Não Alinhados O MNA se opunha a tal lógica, pois, durante o período da Guerra Fria, mesmo que o embate entre as grandes potências não tenha ocorrido, conflitos ideológicos foram travados nos países subalternos do sistema internacional. O termo subalterno se opõe a palavras como elite e grupos de poder, possui conotação política e intelectual e deriva da obra Cadernos do Cárcere, de Antonio Gramsci38 (SAID apud GUHA; SPIVAK, 1988). Observa-se que a maioria dos conflitos ocorreu entre 1945 e 1989 e apresentam influência da disputa entre Estados Unidos e URSS (HOBSBAWM, 2008). A comunidade internacional não se sentia segura e satisfeita com as repercussões das ameaças em que consistia a política expansionista dos dois oponentes: “(...) quando a grade de ferro da Guerra Fria se abateu sobre o globo, todos que tinham alguma liberdade de ação queriam evitar juntar-se a qualquer um dos dois sistemas de aliança, isto é, queriam manter-se fora da Terceira Guerra Mundial (...)” (HOBSBAWM, 2008, p. 350). É certo que o rumo da Guerra Fria sofreu influência do grupo de países subalternos, os quais adquiriam substantivo destaque com o Movimento dos Não-Alinhados. A repercussão do MNA está refletida no atual sistema internacional, a qual pode ser vista, por exemplo, pela multipolaridade, na formação de grupos como o G20 e na atuação mais frequente de países periféricos nos assuntos da agenda internacional. Nesse contexto de estabelecimento de uma nova ordem mundial e a busca pela terceira via de desenvolvimento, a relação Norte-Sul39 torna-se um eixo central das relações internacionais (VIGEVANI, 1990). Tanto o capitalismo quanto o socialismo possuíam diversas falhas em relação à realidade do Terceiro Mundo, as explicações e propostas não eram suficientes para abarcar a complexidade de 35 Sociólogo inglês centrado na reformulação da teoria social e renomado pela Teoria da Estruturação. 36 Kenneth Neal Waltz é um renomado teórico das Relações Internacionais e autor da obra Theory of International Politics. 37 De acordo com Waltz, os sistemas bipolares são mais estáveis porque existem apenas duas grandes potências envolvidas na tomada de decisão, sendo possível manter com maior facilidade vigilância sob o rival; os conflitos entre as potências são menos freqüentes, uma vez que ambas consideram os riscos de um conflito entre forças semelhantes; e a probabilidade de erros de cálculo político e estratégico é reduzida em relação aos sistemas multipolares (JACKSON; SORENSEN, 2003). 38 Filósofo italiano do início do século XX com interesse de pesquisa em política, história e sociologia. 39 A relação Norte-Sul, segundo Mignolo (1993), trata-se de uma relação dicotômica centro-periferia, a qual, por um lado, envolve dominação (Norte) e por outro, subalternidade (Sul). 599 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 sistemas tão diversos – “Na década de 1970, tornou-se evidente que nenhum nome ou rótulo individual podia cobrir adequadamente um conjunto de países cada vez mais divergentes” (HOBSBAWM, 2008, p. 352-353). O confronto ideológico não levava em consideração as diferenças históricas, políticas e culturais entre os países. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 600 Apesar de todas as diferenças apresentadas pelos países que faziam parte do Movimento dos Não Alinhados, e embora esse grupo não fosse composto por países igualmente opostos aos dois lados da Guerra Fria (HOBSBAWM, 2008), eles possuíam um objetivo comum de conquistar o desenvolvimento por meios próprios. Assim, era interessante a esses Estados se unirem e formarem uma aliança, de modo a alcançar tais metas. Entre os objetivos do movimento, estava a busca pela paz e a criação de uma nova ordem política e econômica internacional, diferente da bipolaridade, respeitando a autodeterminação e a liberdade de perseguir o desenvolvimento e a participação no cenário internacional de maneira independente, além da forte condenação ao colonialismo (SRIVASTAVA, 1995). Dessa forma, a busca conjunta pela resolução dos problemas seria vital para a manutenção do movimento, já que ações individuais dificilmente seriam suficientes para alcançar os objetivos. Motivados pela herança da Conferência de Bandung, que marcou o início da manifestação desse terceiro grupo de Estados nas relações internacionais (SARAIVA, 2001) e pelo momento de tensão mundial oriunda da Guerra Fria, era importante que os Não Alinhados se reunissem para discutir e buscar formas de alcançar seus objetivos, além desse grupo de países ser favorável também ao diálogo entre EUA e URSS para lidar com os perigos oriundos da rivalidade e encorajar as negociações entre elas (ALLISON, 1998). Desse modo, a Conferência de Belgrado, em 1961, após um encontro preparatório no Cairo, Egito, seria um ambiente propício para discutir as questões levantadas pelos membros do movimento, como o desarmamento e a neutralidade. O encontro seria importante também para que os países de Terceiro Mundo tivessem espaço para expor seus problemas e pontos de vista e, dessa forma, alcançar maior visibilidade entre um grupo de países que apresentavam situações semelhantes, além de buscar a cooperação e a coexistência de uma maneira pacífica (VUCINICH, 1969). A decisão pela neutralidade partia também de um desejo dos líderes dos países do grupo de buscar a dignidade em suas so- Movimento dos Não Alinhados ciedades, para superar as humilhações sofridas durante o período colonial. Muitos dos cidadãos do Terceiro Mundo já haviam aceitado que viviam em países inferiores, e o MNA, por meio do não alinhamento e da não participação na Guerra Fria, buscava recuperar a dignidade dos cidadãos, como meio também para reforçar a solidariedade (THOMAS, 2001). Portanto, a Primeira Conferência dos Países Não Alinhados, ou Conferência de Belgrado, serviria não apenas como o início oficial do movimento, mas também como um espaço onde o Terceiro Mundo passaria a ter mais visibilidade e voz para discutir problemas que afetam grande parte do planeta, como a ameaça nuclear. Além disso, como a ordem internacional estava sob constante ameaça, a atitude de buscar uma solução deveria partir dos países que não produzem essa ameaça, mas sofrem os efeitos dela, uma vez que esses países não possuíam rivalidades com os blocos, mas sofreriam as consequências de possíveis conflitos. A Conferência de Belgrado surge nesse contexto de tensões como um ambiente para esse grupo de países discutirem como se chegar a essas soluções (KÖCHLER, 1982). Nesse contexto também se cristalizavam os princípios do MNA e o desejo desses países por buscar um papel distinto na política internacional, e mais ativo na resolução de conflitos (THOMAS, 2001). Embora o Movimento dos Não Alinhados contasse com a participação de vários países, de diferentes continentes, era muito importante que eles mantivessem o foco para alcançar os objetivos comuns, uma vez que havia grandes diferenças entre os membros e a situação internacional de bipolaridade entre EUA e URSS não era favorável à manutenção de um grupo neutro. Dessa forma, era vital que o movimento mantivesse uma agenda bem delineada para garantir seu próprio futuro. Além disso, o surgimento do Movimento dos Não Alinhados foi um momento crucial em relação à crise da ordem internacional vigente à época, pois a formação de um grupo institucionalizado e não alinhado representava um terceiro ponto de vista, em um contexto dividido entre capitalistas e socialistas. (KÖCHLER, 1982). 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACHARYA, A. Bandung revisited: the legacy of the 1955 asian-african conference for international order. Singapura: NUS Press, 2008. ALEXANDER, Y; FRIEDLANDER, R. A. Self-Determination: National, Regional, and Global Dimensions. Boulder: Westview Press, 1980. 601 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 Movimento dos Não Alinhados ALLISON, R. The Soviety Union and the strategy of non-alignment in the Third World. Cambridge: Cambridge University Press, 1988. JACKSON, R.; G. SORENSEN. Introdução às relações internacionais. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. BEST, A. et al. International History of the Twentieth Century. New York: Routledge, 2004. JUDT, T. Pós-Guerra: uma história da Europa desde 1945. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008. KARNAL, L. et al. História dos Estados Unidos. São Paulo: Contexto, 2011. BETTS, R. F. Decolonization. New York: Routledge, 1998. KEKKONEN, Urho. Neutrality: The Finnish Position. Finland: Oy Weilin+Göös Ab, 1970. BHATIA, B.M. Famines in India: A study in Some Aspects of the Economic History of India with Special Reference to Food Problem. Delhi: Konark Publishers Pvt. Ltd, 1985. BICALHO, L. Descolonização da Ásia e da África. Campinas: Universidade de Campinas, 1985. 602 KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências. 9 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1999. KEOHANE, Robert. Lilliputians’ Dilemmas. Wisconsin: University of Wisconsin Press, 1969. BROWN, I. Studies on Non-Alignment. The Journal of Modern African Studies. Cambridge, v.4, p. 517-527, dez., 1966. KISSINGER, H. A. Diplomacy. Nova York: Simon & Schuster, 1994. COHEN, B, J. The Question of Imperialism: The Political Economy of Dominance and Dependence. New York: Basic Books, 1973. KÖCHLER, H. The principles of non-alignment: third world centre. Londres: Redwood Burn Ltd., 1982. CHATTERJEE, Partha. Colonialismo, Modernidade e Política, Histórias ao Sul. Salvador: Ed. UDUFBA, 2004. KRASNER, S. Sovereignty. Organized hipocrisy. Nova Jersey: Princeton University Press, 1999. CHESNAUX, J. A Ásia Oriental nos Séculos XIX e XX. São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1966.COHEN, Benjamin. A Questão do Imperialismo. Rio de Janeiro: Zahar, 1976. LINCOLN, E. Non-Aligned Nations summit meeting, Belgrade. JFK Presidental Library and Museum s.d. Disponível em: <http://www.jfklibrary.org/Asset-Viewer/ Archives/JFKPOF-104-004.aspx>. Acesso em: 10 ago. 2012. MOVIMENTO DOS PAÍSES NÃO ALINHADOS. Declaração de Belgrado, 06 set. 1961. FANON, F. Os Condenados da Terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. FRIENDEN, J. A. Capitalismo global: história econômica e política do século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008. LINHARES, M.. Descolonização e lutas de libertação nacional. In: FERREIRA, J.; FILHO, D.; ZENHA, C. (org). O século XX: o tempo das dúvidas: do declínio das utopias às globalizações. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. LISKA, G.. Nations in Alliance: The Limits of Interdependence. Baltimore: John Hopkins Press, 1968. GIDDENS, A. The Third Way: The Renewal of Social Democracy. Cambridge: Polity, 1998. GUHA, R.; SPIVAK, G. Selected Subaltern Studies. Nova Iorque: Oxford University Press, 1988. LITRENTO, O. L. O Princípio da Autodeterminação dos Povos: Síntese da Soberania e o Homem. São Paulo: Livraria Freitas Bastos S.A., 1964. MAGDOFF, H. Imperialismo: da Era Colonial ao Presente. Rio de Janiero: Zahar, 1979. HERZ, J. Idealist Internationalism and the security dilemma. World Politics, v. 2, p. 157-180, 1950. MIGNOLO, W. D. Colonial and Postcolonial Discourse: Cultural Critique or Academic Colonialism? Latin American Research Review, v. 28, n. 3, p.120-134, 1993. HOBBES, T. Leviatã. São Paulo: Martins Fontes, 2003 (1651). MOSJOV, L. Dimensions of Non Alignment. Belgrado: Jugoslovenska STV Arnost, ND. HOBSBAWM, E. Era dos extremos: O breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. PAINTER, David. Origins of the Cold War: an international history. New York: Routledge, 2005. HOFFMAN, G. et al. Yugoslávia and the New Comunism. New York: Twentieh Century Fund, 1962. PRENSA LATINA. Los países no alineados. Praga: Agencia de Prensa Orbis, 1981. HOSKINS, H. L. Nationalism in the Middle East. World Affairs, World Affairs Institute, v. 115, p. 4-6, Primavera, 1952. RAIC, D. Statehood and the Law of Self-determination. Leiden: Brill Academic Publishers, 2002. HUBERMAN, L. et al. Cuba – Anatomia de uma Revolução. Rio de Janeiro: Zahar, 1961. SAID. E. H. Orientalismo (1979). São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 2009. HUMAN RIGHTS WATCH. The Rwandan Genocide: How It Was Prepared. abr. 2006. SANTOS, T. dos. et al. Os impasses da globalização: hegemonia e contra-hegemonia. São Paulo: Loyola, 2003. 603 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas | 2013 SARAIVA, J. F. S. (org.). Relações Internacionais: dois séculos de História: entre a ordem bipolar e o policentrismo (de 1947 aos nossos dias). Brasília: IBRI, 2001. SCHWEINITZ, K.. The Rise and Fall of British India. London: Methuen & Co. Ltd, 1983. SPIVAK, G. C. Can the Subaltern Speak? In: NELSON, C; GROSSBERG, G (eds.) Marxism and the interpretation of culture. London: Macmillan, 1988. SRIVASTAVA, R. India and the Nonaligned Summits: Belgrade to Jakarta. Nova Delhi: Northern Book Centre, 1995. SUÁREZ, Luis. Paises no alineados. México: Fondo de Cultura Economica, 1975. STEIN, Arthur A. Why Nations Cooperate: Circumstance and Choice in International Relations. Nova Iorque: Cornell University Press, 1993. TARLING, N. Britain and the Bandung Conference of 1955. Cambridge: Cambridge University, 1992. 604 THE OXFORD ENGLISH DICTIONARY. OED Online. Oxford University Press. 30 April 2007 <http://dictionary.oed.com/>. Acesso em: 20 dez. 2012 THOMAS, D. C. The Theory and Practice of Third World Solidarity. Westport: Greenwood Publishing Group, 2001. VARELLA, M. D. Direito Internacional Público. 4 ed. São Paulo, Ed. Saraiva, 2012. VIGEVANI, Tullo. Terceiro Mundo (Conceito e História). São Paulo: Editora Ática, 1990. VIZENTINI, Paulo. A Guerra Fria. In: REIS Filho, Daniel Aarão; FERREIRA, Jorge; ZENHA, Celeste. (Org.). O século XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. VUCINICH, W. S.; TOMASEVICH, J. Contemporary Yugoslavia. Los Angeles: University of California Press, 1969. ZOUBIR, Y. H. The United States, the Soviet Union and Decolonization of the Maghreb. Oxfordshire: Taylor & Francis Ltd, 1995.