○
○
○
○
○
○
○
○
iBIZ
2008
Informática para a África
Martin Dwomoh-Tweneboah
Linfield College, Zimbábue/Estados Unidos
RESUMO
No alvorecer do século XXI – na Era da Informação –, as Tecnologias de
Comunicação e Informação (TCIs) criam desafios profundos e oportunidades
à África, tanto dentro como fora do continente. Em anos recentes, as TCIs
penetraram muitos setores; porém, o desenvolvimento dessas tecnologias e
sua infraestrutura na África ainda estão muito distantes dos países desenvolvidos em virtude de políticas mal administradas, regulamentos,
infraestrutura pobre, falta de investimento de capital, baixa taxa de alfabetização, alto custo da banda larga e várias questões sociais. Este artigo
discute algumas prospecções realizadas em anos recentes com o objetivo de
melhorar os sistemas de comunicação no continente, bem como alguns
projetos desenvolvidos na África pela Igreja Metodista Unida.
Palavras-chave: África - Tecnologias de Comunicação e Informação – Igreja
Metodista Unida.
RESUMEN
En el alba del siglo XXI – en la Era de la Información – las Tecnologías de
Comunicación e Información (TCI) crean retos profundos y oportunidades
para África, tanto dentro como fuera del continente. En años recientes, las
TCI penetraron muchos sectores; todavía, el desarrollo de esas tecnologías
y su infraestructura en África aun están mucho distantes de los países desarrollados debido a políticas mal administradas, reglamentos, infraestructura
pobre, falta de inversión de capital, bajo índice de alfabetización, precio alto
de banda ancha, y varias cuestiones sociales. Este artículo también discute
algunas prospecciones hechas en años recientes con vista a mejorar los
sistemas de comunicación en el continente, así como algunos proyectos
desarrollados en África por la Iglesia Metodista Unida.
Palabras clave: África – Tecnologías de Comunicación y Información –
Iglesia Metodista Unida.
○
Introdução
○
○
A Tecnologia de Comunicação e Informação (TCI) é um fator fundamental para o desenvolvimento social e econômico; porém, existe uma
grande discrepância entre o desenvolvimento e a infraestrutura de
tecnologia de TCI entre os países africanos e as nações desenvolvidas.
Muitas pessoas nas nações desenvolvidas têm acesso fácil à informação
por meio da internet, e-mail e telefone em virtude do acesso a redes com
alto desempenho, as quais ainda são subdesenvolvidas ou inexistentes na
maior parte da África. Embora a informática tenha começado a penetrar
em muitos setores, inclusive na educação, saúde, negócios, governança
e desenvolvimento rural, muitos países africanos ainda são limitados,
com uma infraestrutura de comunicações inadequada. Melhorias na velocidade da internet durante a última década, tal como medidas pela
Universidade de Stanford, indicam que a África é a região com o mais
lento processo de melhorias, ficando sempre atrás do resto do mundo.1
Oferecer tecnologia e conectividade na África não é algo que uma
única nação ou organização possa fazer sozinha. Todas as nações do
continente devem envidar um esforço conjunto e coletivo para encontrar
uma solução. Como mostraram Kwankam e Ningo, 2 nossa visão não
deveria se limitar a alcançar o que existe no mundo desenvolvido. Isso só
manteria a propagação da lacuna, da diferença, entre eles e nós. Segundo,
continuaria a criar problemas de conveniência, adaptabilidade e outros
que, por sua vez, continuariam a consumir nossos escassos recursos.
Para evitar que a África se torne um grande lixão ou uma grande
área para a desova de tecnologia obsoleta e desnecessária, seria preciso
estabelecer diretrizes adequadas para fabricantes de equipamentos,
distribuidores, provedores de serviços e usuários. Tais diretrizes devem
ter o apoio dos governos para que sejam efetivas e deveriam cobrir os
seguintes aspectos:
• aquisição de tecnologia informática;
• uso e aplicação da tecnologia;
• desenvolvimento de recursos humanos;
• regulamentação/desregulamentação e administração.
A falta de infraestrutura na maioria dos países africanos pode ser
vista como uma desvantagem. As nações africanas são limitadas por
uma estrutura construída com tecnologia obsoleta que talvez exija um
enorme investimento de capital e um processo extensivo para ser substituída. É preciso adotar uma abordagem mais proativa de modo a ofe-
Embora a
informática tenha
começado a
penetrar em muitos
setores, muitos
países africanos
ainda são limitados
Oferecer tecnologia
e conectividade na
África não é algo
que uma única
nação ou organização possa fazer
sozinha
1
2
38
Internet-End-To-End Monitoring, Sub-Sahara Case Study. Disponível em: https://
confluence.slac.stanford.edu/display/IEPM/Sub-Sahara+Case+Study.
KWANKAM, S.; NINGO N. Information technology in Africa: a proactive approach and
the prospects of leapfrogging decades in the development process. In: Proceedings of
internet Society’s Seventh Annual Conference, INET’97.
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
recer uma solução que possa atender às necessidades das pessoas no
continente. A simples adoção do modelo do mundo desenvolvido não
conduzirá necessariamente a uma expansão equitativa em toda a sociedade, e a divisão entre os grupos de elite minoritários e as massas
pobres será ampliada. Deve-se adotar uma estratégia de comunicação
customizada, a fim de permitir que a informação alcance as regiões
rurais, remotas, além-fronteiras e grandes áreas geográficas, combinando-se os sistemas existentes e novas tecnologias quando necessário, de
modo a garantir sistemas de comunicação de baixo custo e seguros.
Para se assegurar a implantação adequada e o desenvolvimento da
indústria africana de Tecnologia da Informação (TI), é necessário que se
concentre em setores nos quais a capacidade institucional já existe. Exemplos de tais setores são: educação, saúde, negócios, finanças, instituições
de governo e meio ambiente. Uma pesquisa realizada pela Universidade
de Harvard mostra que o acesso à internet é tão desejável para os estudantes na África, que eles despendem tempo e recursos consideráveis para
poder adquiri-lo. Muitos dos estudantes entrevistados recorrem a serviços
privados, pagando altas taxas em lan houses para poderem estudar e aprender, já que não há conexão de internet em suas universidades.3
Entre 2000 e 2007, o
uso da internet
cresceu quase 900%
A conectividade da internet na África comparada com o
resto do mundo
Estatísticas mundiais sobre o uso da internet, apresentadas pela
World internet Stats, mostram a África com uma penetração aproximadamente três vezes mais baixa do que qualquer outra região. Entre 2000
e 2007, porém, o uso da internet cresceu quase 900%, tornando a África
um enorme mercado potencial para a tecnologia da internet.
WORLD INTERNET USAGE AND POPULATION STATISTICS
World Regions
Population
Population Internet Usage,
% Population
(2007 Est.)
% of World
Latest Data
(Penetration)
Usage
Usage
941.249.130
14,2 %
44.361.940
4,7 %
3,4 %
882,7 %
% of World Growth
2000-2007
Africa
Asia
3.733.783.474
56,5 %
510.478.743
13,7 %
38,7 %
346,6 %
Europe
801.821.187
12,1 %
348.125.847
43,4 %
26,4 %
231,2 %
Middle East
192.755.045
2,9 %
33.510.500
17,4 %
2,5 %
920,2 %
North America
334.659.631
5,1 %
238.015.529
71,1 %
18,0 %
120,2 %
Latin America/Caribbean
569.133.474
8,6 %
126.203.714
22,2 %
9,6 %
598,5 %
Oceania / Australia
33.569.718
0,5 %
19.175.836
57,1 %
1,5 %
151,6 %
6.606.971.659
100,0 %
1.319.872.109
20,0 %
100,0 %
265,6 %
WORLD TOTAL
3
http://www.arp.harvard.edu/AfricaHigherEducation/On-line.html.
○
○
○
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
39
Internet Usage Statistics for Africa
(Africa internet Usage and Population Stats)
INTERNET USERS AND POPULATION STATISTICS FOR AFRICA
AFRICA REGION
Total for Africa
Population
Pop. %
Internet Users,
Penetration
% Users
Use Growth
(2007 Est)
in World
Latest Data
(% Population)
in World
(2000-2007)
941.249.130
14,2 %
44.234.240
4,7 %
3,5 %
879,8 %
Rest of World
5.665.721.036
85,8 %
1.217.798.457
21,5 %
96,5 %
241,6 %
WORLD TOTAL
6.606.970.166
100,0 %
1.262.032.697
19,1 %
100,0 %
249,6 %
Source: www.internetworldstats.com
40
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
INTERNET USAGE STATISTICS FOR AFRICA
AFRICA
Population
(%) Users
Use Growth
(2007 Est.)
internet Users internet Users, % Population
Dec/2000
Latest Data
(Penetration)
in Africa
(2000-2007)
Algeria
33.333.216
50.000
2.460.000
7,4 %
5,6 %
4.820,0 %
Angola
12.263.596
30.000
172.000
1,4 %
0,4 %
473,3 %
Benin
8.078.314
15.000
700.000
8,7 %
1,6 %
4.566,7 %
Botswana
1.815.508
15.000
60.000
3,3 %
0,1 %
300,0 %
Burkina Faso
14.326.203
10.000
80.000
0,6 %
0,2 %
700,0 %
Burundi
8.390.505
3.000
60.000
0,7 %
0,1 %
1.900,0 %
Cameroon
18.060.382
20.000
370.000
2,0 %
0,8 %
1.750,0 %
Cape Verde
423.613
8.000
29.000
6,8 %
0,1 %
262,5 %
Central
4.369.038
1.500
13.000
0,3 %
0,0 %
766,7 %
African Rep,Chad
9.885.661
1.000
60.000
0,6 %
0,1 %
5.900,0 %
711.417
1.500
21.000
3,0 %
0,0 %
1.300,0 %
Comoros
Congo
3.800.610
500
70.000
1,9 %
0,2 %
13,900,0 %
Congo, Dem. Rep.
68.008.922
500
180.000
0,3 %
0,4 %
35.900,0 %
Cote d’Ivoire
18.373.060
40.000
300.000
1,6 %
0,7 %
650,0 %
496.374
1.400
11.000
2,2 %
0,0 %
685,7 %
80.335.036
450.000
6.000.000
7,5 %
13,6 %
1.233,3 %
551.201
500
8.000
1,5 %
0,0 %
1.500,0 %
Djibouti
Egypt
Equatorial Guinea
Eritrea
4.906.585
5.000
100.000
2,0 %
0,2 %
1.900,0 %
Ethiopia
76.511.887
10.000
164.000
0,2 %
0,4 %
1.540,0 %
Gabon
1.454.867
15.000
81.000
5,6 %
0,2 %
440,0 %
Gambia
1.688.359
4.000
58.000
3,4 %
0,1 %
1.350,0 %
Ghana
22.931.299
30.000
609.800
2,7 %
1,4 %
1.932,7 %
Guinea
9.947.814
8.000
50.000
0,5 %
0,1 %
525,0 %
Guinea-Bissau
1.472.780
1.500
37.000
2,5 %
0,1 %
2.366,7 %
Kenya
36.913.721
200.000
2.770.300
7,5 %
6,3 %
1.285,2 %
Lesotho
2.125.262
4.000
51.500
2,4 %
0,1 %
1.187,5 %
Liberia
3.195.931
500
1.000
0,03 %
0,0 %
100,0 %
Libya
6.036.914
10.000
232.000
3,8 %
0,5 %
2.220,0 %
Madagascar
19.448.815
30.000
110.000
0,6 %
0,2 %
266,7 %
Malawi
13.603.181
15.000
59.700
0,4 %
0,1 %
298,0 %
Mali
11.995.402
18.800
70.000
0,6 %
0,2 %
272,3 %
Mauritania
3.270.065
5.000
30.000
0,9 %
0,1 %
500,0 %
Mauritius
1.250.882
87.000
300.000
24,0 %
0,7 %
244,8 %
Mayotte (FR)
208.783
–
–
–
–
n/a
Morocco
33.757.175
100.000
6.100.000
18,1 %
13,8 %
6.000,0 %
Mozambique
20.905.585
30.000
178.000
0,9 %
0,4 %
493,3 %
○
○
○
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
41
continuação INTERNET USAGE STATISTICS FOR AFRICA
AFRICA
Population
internet Users internet Users, % Population
(%) Users Use Growth
(2007 Est.)
Dec/2000
Latest Data
(Penetration)
in Africa
Namibia
2.055.080
30.000
80.600
3,9 %
0,2 %
168,7 %
Niger
12.894.865
5.000
40.000
0,3 %
0,1 %
700,0 %
Nigeria
135.031.164
200.000
8.000.000
5,9 %
18,1 %
3.900,0 %
802.911
130.000
220.000
27,4 %
0,5 %
69,2 %
9.907.509
5.000
50.000
0,5 %
0,1 %
900,0 %
7.543
–
1.000
13,3 %
0,0 %
0,0 %
Reunion (FR)
Rwanda
Saint Helena (UK)
Sao Tome & Principe
Senegal
Seychelles
(2000-2007)
199.579
6.500
29.000
14,5 %
0,1 %
346,2 %
12.521.851
40.000
650.000
5,2 %
1,5 %
1.525,0 %
81.895
6.000
29.000
35,4 %
0,1 %
383,3 %
Sierra Leone
6.144.562
5.000
10.000
0,2 %
0,0 %
100,0 %
Somalia
12.448.179
200
94.000
0,8 %
0,2 %
South Africa
43.997.828
2.400.000
5.100.000
11,6 %
11,5 %
Sudan
39.379.358
30.000
3.500.000
8,6 %
7,9 %
Swaziland
1.133.066
10.000
41.600
3,7 %
0,1 %
316,0 %
Tanzania
39.384.223
115.000
384.300
1,0 %
0,9 %
234,2 %
Togo
5.701.579
100.000
320.000
5,6 %
0,7 %
220,0 %
Tunisia
10.276.158
100.000
1.618.440
15,7 %
3,7 %
1.518,4 %
Uganda
30.262.610
40.000
750.000
2,5 %
1,7 %
1.775,0 %
Western Sahara
Zambia
Zimbabwe
TOTAL AFRICA
46.900,0 %
112,5 %
11.566,7 %
382.617
–
–
–
–
0,0 %
11.477.447
20.000
500.000
4,4 %
1,1 %
2.400,0 %
12.311.143
50.000
1.220.000
9,9 %
2,8 %
2.340,0 %
941.249.130
4.514.400
44.234.240
4,7 %
100,0 %
879,8 %
Source : www.internetworldstats.com
Fatores que afetam o desenvolvimento de TI na África
Embora haja um reconhecimento crescente sobre o impacto de longo alcance das
telecomunicações e do networking nas economias de países africanos, vários problemas
restringem sua difusão por instituições públicas. A escassez de recursos financeiros e
humanos, o desconhecimento sobre a disponibilidade de ferramentas potenciais, a baixa
infraestrutura de telecomunicações, rígidos regulamentos e monopólio governamentais,
alto custo da banda larga, baixo nível de alfabetização, questões socioeconômicas e
culturais, alto custo de software comercial e as rápidas mudanças na tecnologia são
fatores que afetam o desenvolvimento da informática na África.
42
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
BAIXO
NÍVEL DE INFRAESTRUTURA
O subdesenvolvimento da infraestrutura de telecomunicações continua a ser um dos principais problemas no desenvolvimento das TCIs
na África. A difusão de telecomunicações na África é a mais baixa do
mundo. A baixa densidade da infraestrutura de TCI, a congestão e os
custos são impedimentos significativos ao uso da tecnologia. Como
resultado, o acesso à TCI e a exposição do usuário à tecnologia estão
limitados. A maioria dos usuários depende de lan houses ou instituições
para ter acesso à internet e ao e-mail.
REGULAMENTOS
DO GOVERNO E MONOPÓLIO
A liberalização do setor de TCI na maioria dos países africanos
nos últimos 10 anos conduziu a um crescimento rápido em algumas
áreas da tecnologia, especialmente a tecnologia celular. Porém, em
alguns países o governo ainda mantém um rigoroso controle das instâncias reguladoras, impondo tarifas altas e completo monopólio sobre o setor de telecomunicações. Em consequência disso, a exposição
do usuário à tecnologia é limitada. As políticas de Telecom variam
consideravelmente na África, as tarifas são várias vezes mais altas que
as do mundo desenvolvido. Elas não só ficaram rígidas, mas também
se transformaram em uma percebida ameaça ao desenvolvimento
socioeconômico. Mesmo com as filas de conexão que duram de três a
quatro anos em alguns países na África e com uma lucratividade com
margens muito altas, as políticas inadequadas e a incompetência da
administração de telecomunicações na maioria dos países bloqueiam
o cumprimento do direito à comunicação, o desenvolvimento
socioeconômico e o acesso universal. Por exemplo, no Zimbábue, a
Universidade da África usa VSAT para ter conexão à internet e paga
7.500 dólares/mês por um downlink de banda larga de 1024KB e um
uplink de 512KB, porque não obtiveram autorização para operar diretamente uma antena parabólica.
CUSTO ALTO DE BANDA LARGA
Outro importante fator limitador do acesso é o alto custo das conexões internacionais à estrutura da telecomunicação global. Para as
universidades, os centros de pesquisa e as bibliotecas que podem
dispor de conectividade da internet, os custos de banda larga são
normalmente milhares de vezes mais altos do que os custos para as
universidades no mundo desenvolvido. Todas as universidades da
África Subsaariana pagam, juntas, mais de 3 milhões de dólares/mês
a concessionárias. Devido à falta de estrutura de fibras óticas nacionais e internacionais, a maioria dos países na África depende de
tecnologia de satélite para ter conexão.
○
○
○
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
43
A maioria dos usuários
depende de lan houses
ou instituições para ter
acesso à internet
e ao e-mail
Devido à falta de
estrutura de fibras
óticas nacionais e
internacionais, a
maioria dos países na
África depende de
tecnologia de satélite
para ter conexão
BAIXOS
NÍVEIS DE ALFABETIZAÇÃO
Os usuários de informação na África têm os mais baixos níveis de
alfabetização. Mais da metade da população da África é analfabeta.
Mais da metade dos alfabetizados não pode reunir as informações necessárias para solucionar seus problemas em virtude da falta de recursos e de tecnologia apropriada.
QUESTÕES
A ausência quase total
de uma cultura de
informação continua
impedindo que o
progresso obtenha
acesso universal
Uma área que pode
ter um grande
impacto sobre a
informática na África
é o software de fonte
aberta
SOCIOECONÔMICAS E CULTURAIS
A maioria dos usuários luta para sustentar a vida cotidiana. A disponibilidade de centenas de idiomas locais sem interface com os recursos de conhecimento globais torna o acesso à informação ainda mais
difícil. A ausência quase total de uma cultura de informação continua
impedindo que o progresso obtenha acesso universal. O desenvolvimento cego de tecnologia sem a avaliação completa de fatores que influenciam o comportamento de aceitação do usuário é um dos principais assuntos a serem considerados em virtude da cultura particular da
região. As colocações socioculturais, o acesso e a disponibilidade de
infraestrutura são fatores importantes na aceitação ou não das
tecnologias e são razões para a variação no comportamento do usuário.
O fato de a internet oferecer uma rica fonte de informações e ser eficaz
para a comunicação não significa que devamos nos concentrar principalmente na tecnologia baseada na internet. Afinal de contas, quantas
pessoas têm o luxo de uma refeição por dia, para não falar do luxo da
eletricidade e da água limpa? A introdução de novas tecnologias e as
eficiências que as acompanham requerem a contratação de expatriados.
Na maior parte da África, questões ligadas à afiliação tribal frequentemente criam um ceticismo que conduz à resistência e à baixa utilização
das novas tecnologias. Os usuários tendem a ficar mais satisfeitos com
tecnologias adaptadas à sua cultura.4
DESENVOLVIMENTO
DE SOFTWARES DE FONTE ABERTA E SEU USO NA
ÁFRICA
Uma área que pode ter um grande impacto sobre a informática na
África é o software de fonte aberta. O uso deste software ajudará a preencher a lacuna tecnológica a um custo aceitável. O desenvolvimento e o
uso do software de fonte aberta (SFA) continuam a crescer na África à
medida que as instituições procuram alternativas viáveis ao software
proprietário de alto custo. Os governos na África devem considerar o
software de fonte aberta como uma alternativa séria ao software comercial, da mesma maneira que o Brasil o fez em 2000, não só como local
para a implementação do software, mas, ainda mais importante, como
promotores da filosofia por trás do movimento de fonte aberta.
4
44
RAVINDER RENA. Information technology and development in Africa: the case of Eritrea.
World Press Desk, nov. 2006.
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
Ao adotar o uso da fonte aberta, governos, organizações e usuários
devem assegurar que sua implantação produzirá valor. Devem também
ter a capacidade adequada para implantar, usar e mantê-la, além de
oferecer suporte por meio de políticas significativas e fortes. Há várias
iniciativas para promover o uso do software de fonte aberta.
A Fundação de Software Gratuito e de Fonte Aberta para a África
(The Free Software and Open Source Foundation for Africa – Fossfa) 5 foi
lançada no dia 21 de fevereiro de 2003, em Genebra, durante a reunião
da WSIS PrepCom2. O trabalho da Fundação concentrou-se em três
áreas temáticas:
1. fonte aberta no governo;
2. fonte aberta na saúde;
3. fonte aberta na educação.
Os benefícios do software gratuito e aberto, entre outros, incluem:
•
•
•
•
•
redução dos custos e da dependência de tecnologias e habilidades
importadas;
disponibilidade do software para indivíduos, empresas e governo;
acesso a dados do governo sem barreira de softwares e formatos
proprietários;
possibilidade de personalizar o software para os idiomas e as culturas locais;
menores barreiras para a entrada de negócios de software.
O projeto RULE – Run Up-to-date Linux Everywhere (Uso do Linux
Atualizado em Todo Lugar)6 - tem como objetivo a criação de uma distribuição de um Linux muito leve para escolas e outras organizações
em países em desenvolvimento que não podem dispor de sistemas
modernos de computação. O Ubuntu, patrocinado pelo Canonical Ltd,
de propriedade do sul-africano Mark Shuttleworth,7 tem como objetivo
prover um sistema operacional estável e atualizado para o usuário
comum, que tem como foco a usabilidade, as liberações regulares e a
facilidade de instalação.
O projeto AVOIR – African Virtual Open Initiatives and Resources (Iniciativas e Recursos Abertos Virtuais da África)8 – é uma iniciativa que está
desenvolvendo a capacidade em engenharia de softwares de fonte aberta por meio de uma rede de universidades africanas para a construção
de softwares gratuitos e de fonte aberta.
5
6
7
8
http://www.fossfa.net.
http://www.rule-project.org.
h t t p : / / w w w. u b u n t u . c o m .
http://avoir.uwc.ac.za.
○
○
○
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Ao adotar o uso da
fonte aberta, governos,
organizações e usuários
devem assegurar que
sua implantação
produzirá valor
O Open Medical Record System [Sistema de Registro Médico Aberto]
(OpenMRS) 9 é uma estrutura desenvolvida pela comunidade de um
sistema de registro médico eletrônico de fonte aberta que auxilia as
instituições de saúde que têm recursos limitados. Até o momento, o
OpenMRS foi implementado em vários países africanos, inclusive na
África do Sul, Quênia, Ruanda, Lesoto, Zimbábue, Moçambique,
Uganda e Tanzânia.
O Projeto Aspiração10 conecta e fortalece comunidades virtuais de
usuários e fomentadores de entidades sem fins lucrativos por meio da
Câmara da Fonte Social (Social Source Commons), uma plataforma que
mapeia e documenta as ferramentas de software disponíveis e recursos de informação relacionados para as organizações sem fins lucrativos e comerciais.
Perspectivas para iniciativas de fibra ótica na África
Foram feitas várias iniciativas para conectar o continente africano
com cabos submarinos de fibra ótica que permitam aos países da África
ter acesso ao mercado internacional de telecomunicações. A primeira
dessas iniciativas é o projeto Southern Africa Telecommunication/ West
Africa Submarine Cable /South Africa-Far East Project – SAT3/WASC/SAFE
(Telecomunicação África do Sul/Cabo Submarino da África Ocidental/
Projeto África do Sul–Extremo Oriente), 11 que é uma ligação internacional de grande escala por meio de fibra ótica conectando o continente
africano à Europa e ao Extremo Oriente. O primeiro segmento de SAT3/
WASC conecta Portugal a Cabo, na África do Sul, chegando a oito países costeiros nessa região: Senegal, Costa do Marfim, Gana, Benin,
Nigéria, Camarões, Gabão e Angola. Uma segunda seção, no Oceano
Índico, conecta a África do Sul com a Malásia, atravessando a Mauritânia e a Índia (SAFE). Esperava-se que o projeto fosse baixar os custos de banda larga; porém, os resultados almejados não foram alcançados, porque o projeto está operando como um cartel de monopólio de
provedores de telecomunicação nacionais que cobram preços exorbitantes. Calcula-se que somente 5% da capacidade potencial do SAT3 seja atualmente utilizada. O consórcio SAT-3 conseguiu recuperar seu
investimento em um período de cinco anos porque optou pela estratégia de vender baixos volumes de banda larga a altos custos.12
9
10
11
12
46
h t t p : / / o p e n m r s . o rg .
http://www.aspirationtech.com.
BIDOLI, M. Submarine cable system linked to the world. Financial Mail, 7 Jun. 2002.
JENSEN, M. Open access: lowering the costs of international bandwidth in Africa. In:
Association for Progressive Communications (APC). Issue Papers Series, 2006.
Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
Um projeto novo, o Sistema Cabo Submarino da África Oriental
(EASSy), tem o objetivo de conectar países da África Oriental com o
resto do mundo por um sistema de cabos de fibra ótica de alta largura
de banda. O projeto foi construído com a esperança de ser completado
ao final de 2008. Planeja-se que o EASSy alcance desde Mtunzini, na
África do Sul, até Porto Sudão, no Sudão, com pontos em seis países e
conectando pelo menos cinco países do interior da África. O cabo
EASSy de 9.900 km completará a volta de fibra ao redor da África e
eliminará a dependência de sistemas de satélite de alto custo para levar
serviços de dados e voz. Esse é considerado um marco fundamental no
desenvolvimento da infraestrutura de informação na região. A implantação do projeto está um tanto lenta e causa frustração entre alguns
governos na região porque os stakeholders, investidores e governos estão
divididos em relação a questões de acesso e preço. A Telkom, uma
importante parceira na EASSy, ameaçou retirar-se do projeto, por ser
forçada a reduzir as taxas que cobra dos operadores rivais para usar sua
largura de banda de SAT-3.
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O Sistema Cabo
Submarino da África
Oriental (EASSy) tem o
objetivo de conectar
países da África
Oriental com o resto do
mundo por um sistema
de cabos de fibra ótica
de alta largura de
banda
(http://www.nokiaphoneblog.com)
O Sistema Submarino da África Oriental e as áreas de
acesso a países do interior
Fonte: WBG Regional Communications Infrastrucutre
Nota de setembro de 2005
Desde seu início, em 2002, o projeto SAT/WASC/SAFE tem criado
muitas oportunidades para os países africanos. O projeto aumentou o
acesso aos serviços de Tecnologia de Informação e Comunicação para
as nações beneficiárias. Por exemplo, o maior acesso à internet de banda
larga aumentou a velocidade da transmissão de dados, voz e outras
aplicações de multimídia interativa em países como Camarões, Gana,
Nigéria e Senegal. De acordo com a pesquisa da International Finance
Corporation, o SAT/WASC criou um ambiente de habilitação para os
quatro países, possibilitando realizações em consultoria de rede, administração de sistemas, produção de software e indústrias de
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Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
processamento de dados, entre outros.13 Apesar dos avanços nas conexões de fibra ótica em anos recentes, o custo da largura de banda ainda
permanece alto, porque os projetos são controlados por um cartel de
provedores de comunicação privados e nacionais que mantêm um
monopólio restritivo sobre suas operações.
A TECNOLOGIA CELULAR MELHORA A COMUNICAÇÃO NA ÁFRICA
Numa conferência de dois dias em Ruanda sobre como melhorar a
infraestrutura de informática na África, Touré de Hamadoun, secretário-geral do Sindicato de Telecomunicação Internacional (STI) das Nações Unidas, enfatizou que os líderes da África estão criando o ambiente regulador certo.14 Uma área que está vendo melhorias dramáticas
é a da tecnologia de telefones celulares. Nos últimos anos, a África observou um salto dramático na densidade de telefones. Nos últimos três
anos, a África teve o crescimento mais alto do mundo no uso do celular, que, segundo cálculos, foi o dobro da média global.
De acordo com as Estatísticas de Telefones Celulares de 2006,
publicadas pelo Times of Refreshing Ministries,15 dos 2,4 bilhões de usuários de celular no mundo, 59% moram em países em desenvolvimento,
fazendo com que a telefonia celular seja a primeira tecnologia de telecomunicação na história a ter mais usuários no mundo em desenvolvimento que no mundo desenvolvido. Na África, há 94 novos assinantes por
minuto contra 46 novos assinantes por minuto na América de Norte.
O PROJETO DE INFORMÁTICA DA IGREJA METODISTA UNIDA NA ÁFRICA
Um projeto-piloto em Moçambique, patrocinado pela Junta Geral de
Ensino Superior e Ministério em cooperação com as Comunicações
Metodistas Unidas, está programado para iniciar suas operações em
março de 2008. A Universidade da África servirá como instituição âncora, oferecendo cursos de MBA on-line, Treinamento de Rede CISCO,
e Alfabetização de Informática Básica (conhecido popularmente na
África como a Carteira de Motorista de Computadores Internacionais
(ICDL)). A fase I já está montada e consiste de um laboratório de
informática/sala de aulas com 15 oficinas de trabalho e um servidor,
equipamentos audiovisuais, equipamentos de rede, uma biblioteca com
três oficinas de trabalho e conexão de internet com tecnologia VSAT.
Além disso, todo o edifício comercial da Conferência Anual foi
conectado à rede. Em cooperação com as Comunicações Metodistas
13
14
15
JENSEN, M.; Soderberg, B. Investment opportunities in west Africa/ICT and internet
services: regional analysis. In: International Finance Corporation, 2003.
Africa: continent ready for information technology investment. UN Summit Told. In:
UN News Service. New York, 30 Out. 2007.
2006 Cell Phone Statistics. In: Times of Refreshing Ministries. Disponível em: http://
www.revivaltimes.com/cellphonestats.html.
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Nos últimos três anos, a
África teve o crescimento mais alto do mundo
no uso do celular
Unidas, a Conferência Anual terá seu próprio nome de domínio e um
servidor da rede para publicar suas atividades. Também foi instalado
um servidor de correio para proporcionar ao pessoal um e-mail individual para facilitar a comunicação dentro e fora do escritório.
Projeto de Educação a Distância em Moçambique.
Plano da Rede: Fase I
A fase II do projeto permitirá conferências de vídeo, telefonia VOIP
e também conectará os outros centros da Igreja à Conferência Anual.
Estudos de viabilidade para um projeto semelhante foi completado na
Costa do Marfím, Nigéria, Sierra Leone, Libéria e República Democrática do Congo. Há uma visita planejada a Angola e África Oriental para
um estudo de viabilidade semelhante.
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Revista de Educação do Cogeime • Ano 17 – n. 32/33 – junho/dezembro 2008
Projeto de Aprendizagem à Distância de Moçambique.
Plano da Rede: Fase II
Por iniciativa do MGEFLD, e quando os fundos estiverem disponíveis, uma infraestrutura semelhante à de Moçambique será montada
nas várias Conferências Anuais para que todos estejam conectados e
prontos para oferecer cursos on-line de formação pastoral, inglês como
um segundo idioma, bem como outros cursos acadêmicos pertinentes,
com a Universidade da África servindo como instituição âncora. No
passado, as atividades da Igreja na África em relação à educação, por
outras denominações, têm se concentrado em um projeto do tipo “tijolo-e-morteiro”. Nesta era da informática, as diretrizes seguidas pela
Igreja para alcançar um público maior e cumprir sua missão e seus
objetivos pelo uso de tecnologia terão um impacto significativo na
melhoria da informática na África.
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As diretrizes
seguidas pela Igreja
para alcançar um
público maior e
cumprir sua missão e
seus objetivos pelo
uso de tecnologia
terão um impacto
significativo na
melhoria da
informática na África
Conclusão
Qualquer esforço para
melhorar a
infraestrutura de TCI
na África deverá se
concentrar primeiro
no desenvolvimento
da infraestrutura de
telecomunicações
Os desafios da era da informação giram em torno de conceitos similares de globalização, que incluem processos sociais, econômicos, políticos, técnicos e culturais, bem como o acesso à informática, à Tecnologia
de Comunicação e Informação (TCI) e ao desenvolvimento de políticas
em geral. Os problemas de TCI na África e as soluções variam de país
para país; assim, os países precisam trabalhar juntos para encontrar uma
maneira de melhorar o desenvolvimento das TCIs na África. Os países
devem desenvolver políticas claras para incorporar, com sucesso, o desenvolvimento de TCIs nos planos estratégicos nacionais que conduzirão
a melhorias na infraestrutura e no acesso. Qualquer esforço para melhorar a infraestrutura de TCI na África deverá se concentrar primeiro no
desenvolvimento da infraestrutura de telecomunicações como já visto nos
vários projetos de conectividade de fibra submarina.
O alto custo da largura de banda continua sendo um grande problema, apesar dos avanços recentes em vários projetos de conectividade de
fibra. Deveriam ser feitos esforços para quebrar o monopólio rígido
mantido por várias companhias de telecomunicação e governos de
modo a permitir o maior acesso a essa infraestrutura e, assim, reduzir
a dependência da tecnologia de satélite.
O uso de softwares de fonte aberta ajudará a diminuir a falta de
tecnologia acessível a um custo aceitável. Os governos na África devem
considerar o software de fonte aberta como uma alternativa séria ao
software comercial, não só como local para a implementação do
software, mas, ainda mais importante, como promotores da filosofia
por trás do movimento de fonte aberta.
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Informática para a África