É um fariseu que fez a pergunta a Jesus. Os fariseus tinham visto Jesus
calar a boca dos saduceus com uma de suas sábias respostas. Os fariseus e
os saduceus eram rivais. Tendo Jesus silenciado os saduceus, os fariseus
viram nisso uma ocasião propícia para atrair Jesus para o partido deles
para, oportunamente, claro, apanhá-lo em algum laço. A pergunta que os
fariseus fazem a Jesus exprime perfeitamente a preocupação maior deles:
observar os mandamentos de Deus. Daí a importância, aos olhos deles, de
conhecer o maior dos mandamentos. Aquele que conseguisse observá-lo
perfeitamente seria também o maior, pensam eles, aos olhos de Deus.
Mas Jesus não se deixa manipular. Diante deles Jesus admite, de fato, a
existência de um mandamento maior e diz qual é, ou seja, “amarás ao
Senhor teu Deus de todo o teu coração”, citação textual do Pentateuco.
Aliás, diz que são dois os mandamentos maiores, enquanto o segundo se
assemelha ao primeiro: “amarás o teu próximo como a ti mesmo”. E vai
mais além, acrescentando que no fundo não existem outros mandamentos,
existem somente estes, porque juntos são suficientes e exaurem toda a Lei
e os Profetas, quer dizer, destes dois mandamentos depende tudo aquilo
que está escrito na Bíblia.
Um mandamento maior? Sim, aliás, dois mandamentos, mas,
curiosamente, dois mandamentos que não são outra coisa que convites ao
amor, mandamentos transformados em amor. O Evangelho não diz se o
fariseu ficou satisfeito com a resposta de Jesus, ou se, talvez, tenha se
sentido preso na armadilha, ele que havia planejado laçar Jesus. O
Evangelho também não diz se o fariseu compreendeu e se instruiu com o
que Jesus disse, mas podemos imaginar que ele teria mais facilmente
compreendido e se deixado instruir se lhe tivesse ocorrido desde a
juventude observar escrupulosamente uma pequena norma de amor ao
próximo prescrita na lei mosaica que diz: “não armarás ciladas ao teu
irmão”. Mas o que fazer para desenvolver sentimentos de amor para com
Deus e para com o meu próximo? Não se diz que o amor não se ordena,
que se ama alguém ou não se ama, e que amar alguém por dever é a pior
coisa que alguém pode impor a si mesmo, aquilo que, no final das contas
não é convincente e jamais correspondido. O amor-mandamento é um
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mandamento impossível, aos olhos do bom fariseu, uma perfeição que o
supera. Seria mais simples, mais seguro haver prescrições de coisas que eu
posso fazer, e outras coisas que eu devo evitar..., enfim uma moral de “isso
pode”, “aquilo não pode”.
Resumindo toda a Lei na lei do amor, Jesus desarticulou totalmente a
moral fácil, ainda que aparentemente rigorosa, mas no fundo superficial,
do fariseu. Os mandamentos de Jesus pertencem a uma outra ordem, e a
prática desses mandamentos escapa inteiramente ao homem no qual o
coração de pedra não tenha sido transformado em coração de carne, e não
tenha sido também habitado pela ternura do Espírito Santo.
Pois é, se pelo menos nos fosse pedido de observar somente este
primeiro grande mandamento e não aquele segundo que é semelhante ao
primeiro... Talvez graças a alguma disciplina interior, se poderia ter êxito
em centrar-se sobre uma certa ideia de Deus, espremer do próprio coração
sentimentos de respeito, de temor, de admiração, até mesmo algum
suspiro de amor, em relação a um Deus Altíssimo, Onipotente, que cria e
governa o universo. Tudo isso de que o fariseu seria talvez humanamente
capaz, estaria ainda muito longe do amor que Jesus lhe sugere em sua
resposta.
Amar um Deus distante, a rigor, se poderia; mas como amar, real e
verdadeiramente, este próximo ao nosso lado, sempre um pouco
importuno, rival, intrigante, pérfido, ás vezes traidor? Como amá-lo, não só
de boca, mas também com coração e atitudes? O fariseu tem razão:
semelhante moral supera toda moral possível. É de uma outra ordem. É
um mandamento inteiramente novo, que pressupõe um coração
radicalmente recriado, transformado pela ternura de Deus, isto é, pelo
Espírito Santo em pessoa, um coração no qual o amor de Deus foi
derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado (Rm
5,5).
A perfeição que Jesus anuncia não é aquela que se poderia chegar o
mais zeloso dentre os fariseus, e sim a perfeição de Deus: “Sede perfeitos
como o vosso Pai celeste é perfeito” e também “sede misericordiosos”, ou
seja, transbordante de ternura como o vosso Pai celeste transborda de
ternura” (Lc 6,36). AMÉM.
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XXX Domingo do Tempo Comum