PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP Tatiana de Fátima Domingues Bruno A Função Educativa do Serviço Social: Espaço de “Educar-a-Ação” MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL SÃO PAULO 2009 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP Tatiana de Fátima Domingues Bruno A Função Educativa do Serviço Social: Espaço de “Educar-a-Ação” MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre sob a orientação da Professora Doutora Maria Carmelita Yazbek. SÃO PAULO 2009 Banca Examinadora _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ Para Bruno, companheiro de alma. AGRADECIMENTOS Agradeço esta Força – Mãe, gestadora contínua, que me sustenta, ampara, acolhe e nutre em todas as dimensões do meu viver. Aos meus pais, meus primeiros mestres, amigos que preenchem a minha vida de admiração e gratidão. Ao Bruno pela paciência, compreensão, apoio e estímulo neste processo que com sua presença afetiva torna minha caminhada leve e preenchida de amor. À CAPES – Coordenadoria para Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior pela concessão da bolsa de mestrado, sem a qual este estudo seria inviabilizado. À Carmelita Yazbek, querida e amiga, obrigada pelo seu acolhimento, carinho e dedicação nos momentos de orientação. Obrigada por ter aprendido tanto com você e por me permitir voar. Ao Programa de Estudos Pós Graduados em Serviço Social da PUC-SP pela contribuição generosa do corpo docente e discente na perspectiva da construção de uma pedagogia emancipatória. À Prefeitura de Santo André, na Secretaria de Inclusão Social pelo acolhimento e disponibilidade para a pesquisa. Aos assistentes sociais participantes do grupo focal pela real contribuição e entrega ao processo de investigação. À banca de qualificação: Professora Maria Lúcia Martinelli, Professora Isaura Isoldi Castanho e Oliveira e Priscila Cardoso pelas contribuições valiosas que direcionaram este trabalho. À equipe do “Diagnóstico dos Municípios de Diadema e Mogi das Cruzes” do IEE – Instituto de Estudos Especiais da PUC-SP. À mim mesma por sempre ter tido coragem de bancar os meus sonhos. RESUMO Esta dissertação trata da compreensão da função educativa do Serviço Social em sua atuação no PAIF – Programa de Atenção Integral às Famílias no município de Santo André. Partiu do entendimento das pedagogias, estudo desenvolvido por Abreu (2002) no âmbito do Serviço Social e da contextualização do Serviço Social como profissão instituída para amenizar os conflitos entre capital e trabalho, contextualizando-a desde sua gênese aos dias atuais. O estudo remeteu a organização da cultura em suas diferentes manifestações na qual o assistente social também é inserido, entendendo o seu trabalho com importante característica na organização e manifestação da cultura. Entretanto, a intencionalidade da ação profissional determina se o profissional é um intelectual orgânico comprometido com as classes subalternas ou se está comprometido com os interesses do bloco dominante, apreendendo ainda, o movimento contraditório existente nestas mediações. Esta pesquisa teve por base a análise de dados primários e secundários, coletados por mais de um instrumento de investigação, como entrevista semi estruturada com as gestoras do PAIF em Santo André e grupo focal com os assistentes sociais envolvidos no programa, além de pesquisa bibliográfica e documental. Pode-se concluir que o processo educativo/pedagógico é desvendado no cotidiano profissional como manifestação das apreensões ético-politicas e teórico- metodológicas pelo profissional em sua relação com o projeto ético-político eleito pela categoria profissional. Mais do que educar o outro, o que se aponta é um espaço de Educar-a-Ação profissional continuamente pelo assistente social. Palavras – Chaves: Serviço Social, educativo, pedagogias, socioeducativo. ABSTRACT This discourse is about the understanding of the Social Service educational function in your performance in PAIF - Programa de Atenção Integral às Famílias in Santo André municipal district. From the understanding of the pedagogies, study developed by Abreu (2002) in the Social Service ambit and contextualization of the Social Service as profession instituted to ease the conflicts between capital and work, contextualizing, from your genesis to the current days. The study sent the organization of the culture in your different manifestations in which the social assistant is also inserted, understanding your work with important characteristic in the organization and manifestation of the culture. However, the intentionality of the professional action is determined if the professional is an organic intellectual committed with the subordinate classes or it is committed with the interests of the dominant block, still apprehending, the existent contradictory movement in these mediations. This survey had for base the analysis of primary and secondary data, collected for more than an investigation instrument, as interview semi-structured with the managers of PAIF in Santo André and focal group with the social assistant involved in the program, besides bibliographical and survey documental. It can be ended that the educational process / pedagogic it is unmasked in the daily professional as manifestation of the apprehensions ethical-politicize and theoreticalmethodological for the professional with your relation with the ethical-political project chosen by the professional category. More than to educate the other, which points is continually a space of professional Educate-to-action for the social worker. Key words: Social Service, educational, pedagogies and social education. SUMÁRIO Introdução ................................................................................................................. 9 1. Temática Abordada ............................................................................................ 10 2. Referencial Teórico e Procedimentos Metodológicos ................................. 15 3.Estrutura da Dissertação ................................................................... 19 Capítulo I O Serviço Social e o educativo, o socioeducativo e as pedagogias: entendendo conceitos ................................................................................................................. 21 1.1 Educativo e Socioeducativo ............................................................................. 30 Capítulo II O PAIF em Santo André ......................................................................................... 42 2.1 Programa de Renda Mínima de Santo André – Família Cidadã ...................... 44 2.2 Programa de Atenção Integral a Família – PAIF Santo André ................. 46 Capítulo III Função Educativa do Serviço Social: Espaço de Educar-a-Ação ...................... 59 3.1 Expressões da Função Educativa/Pedagógica nos Programas de Transferência de Renda ......................................................................................... 74 3.2. Expressões da Função Educativa/Pedagógica nos Grupos Socioeducativos .............................................................................................. 78 3.3 Expressões da Função Educativa/Pedagógica na Política de Assistência Social de Santo André ..................................................... 87 Considerações Finais Quando o Fim é o Recomeço de um Novo Ciclo ................................................. 90 9 INTRODUÇÃO “Não seja o de hoje Não suspires por ontens... Não queira ser o de manhã. Faze-te sem limites no tempo. Vê a tua vida em todas as origens. Em todas as existências. Em todas as mortes. E sabes que será assim para sempre.” Cecília Meireles A minha trajetória profissional marcou fatalmente o meu interesse pelo tema em questão. O Serviço Social é uma profissão que me inquieta pelo enorme desafio em que se apresenta cotidianamente. Já no período de estágio na graduação, atuei no Programa Fortalecendo a Família - PFF em São Paulo, com a proposta de acompanhar famílias através de grupos socioeducativos. Trabalho instigante, tema tão pouco estudado em sala de aula... Socioquê?? Muitos questionavam. O PFF era um programa de atendimento a famílias através de grupos socioeducativos. A proposta era, além do atendimento direto a 13.000 famílias, a construção de uma metodologia de atendimento. Muitos altos e baixos percorreram um ano e meio deste estágio, porém o considero impar no aprendizado que me proporcionou e motivou a construção do meu Trabalho de Conclusão de Curso: ―Existe contribuição do assistente social na construção da autonomia do seu usuário? – Um recorte do Programa Fortalecendo a Família‖, defendido em junho de 2004. Como assistente social, continuei a trabalhar com grupos socioeducativos de famílias no Programa de Assistência Social a Família - PROASF da Prefeitura de São Paulo. Período de muitas dificuldades, pois as certezas que tinha como estudante parecia desaparecer ao peso de minha responsabilidade como profissional e da precarização do serviço governamental ofertado. Em 2005, iniciei no Cedeca Interlagos, trabalho com adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas em meio aberto. Novamente o termo socioeducativo estava presente em meu cotidiano profissional e questionava o que de fato poderia traduzir tal expressão, principalmente num trabalho tão contraditório e ambíguo como o realizado com adolescentes em conflito com a lei. 10 Período após, assumi a coordenação do Programa Ação Família na mesma instituição. Novo programa de atenção a família da Prefeitura de São Paulo, o Ação Família trazia a figura do Agente de Proteção Social que é um agente comunitário responsável por visitar as famílias atendidas e verificar suas condições de vida e vulnerabilidades. Entretanto, os Agentes de Proteção Social não possuíam formação em qualquer área e enfrentavam situações precárias nas comunidades em que viviam se assemelhando em muito a realidade das famílias quais atendiam. Este fato causou uma identificação paralisante e o trabalho ficou muito aquém do esperado. Enquanto assistente social e coordenadora do Programa, decidi fazer atendimento individual com cada Agente de Proteção Social e ali verifiquei situações de drogadição, violência sexual, questões psiquiátricas e médicas, precarização financeira, situações graves de habitação, etc., enfrentadas pelos Agentes e fiz diversos encaminhamentos, acompanhamentos, entendendo que os Agentes eram usuários em potencial, apesar da exigência de um trabalho profissional sobre eles. O exercício profissional no papel de gestora ampliou perspectivas e pontos de vista, modificando o meu olhar. O desejo de entender questões do meu cotidiano profissional fez-me pleitear o Mestrado de Serviço Social na PUC-SP em 2006 e assim retomar minha vida acadêmica. Novo olhar, velhas perguntas! Ainda angustia-me o tal trabalho socioeducativo... Para quê serve? Como deve ser feito? Qual a contribuição do Serviço Social neste espaço? E é com estas inquietudes que a pesquisa em questão foi realizada, mediação entre realidade e teoria, na busca de traduções, aproximações, deste movimento dinâmico. 1. TEMÁTICA ABORDADA Entre o modismo e a necessidade, o assistente social é frequentemente chamado a realizar trabalhos educativos. Com o advento do SUAS – Sistema Único 11 de Assistência Social1, que traz em suas propostas a centralidade da família e a necessidade do trabalho socioeducativo nas instâncias municipais, a expansão dos programas de transferência monetária que também trazem forte apelo ao acompanhamento socioeducativo do beneficiário com vistas à sua autonomia. Os grupos de acompanhamento vêm se multiplicando e muitas indagações giram em torno da questão. O ―tal‖ socioeducativo é expressão muito usada e debatida na atualidade. assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, terapeutas ocupacionais e educadores em geral são contratados para efetivar o ―tal‖ socioeducativo em seu cotidiano profissional. Fato é que, poucos se atrevem a esclarecer o que venha a ser o trabalho socioeducativo, quais conteúdos ele abrange e para quais objetivos se destina. Entre visões generalistas que consideram tudo socioeducativo (palestras, conversas, cursos e até a forma de recepcionar a população, de escutá-la e de encaminhá-la) a visões mais restritas que adotam metodologias como a de grupo operativo, de Pichon Rivière ou a pedagogia da autonomia de Paulo Freire, os atendimentos acontecem muitas vezes de forma espontaneístas. O Serviço Social vem no decorrer da história buscando respostas às demandas da sociedade. A profissão se instituiu no Brasil na década de 40 como um dos mecanismos existentes para amenizar o conflito existente entre capital e trabalho. As propostas de intervenção neste período têm o objetivo de adequação e enquadramento do usuário, marcadas pela ideologia da Igreja. Já neste período, o assistente social tem características educativas em sua ação profissional, como nos aponta Magalhães: “O problema das massas proletárias era de “educação”. As elites deviam conduzir as massas, transformando-as em cidadãos, isto é, ao nível cultural. (...) Surge neste contexto a institucionalização do Serviço Social, como profissão marcada por esta perspectiva aristocrática de educação. Propõe a formação de quadros de profissionais, “agentes funcionais” responsáveis pelo controle e direção dos programas de assistência social. O objeto central de 1 O Sistema Único de Assistência Social – SUAS é deliberação da IV Conferência Nacional de Assistência Social e tem como pressuposto a Política Nacional de Assistência Social – PNAS que objetiva a construção coletiva do redesenho da política através da sua implementação. 12 trabalho consiste nas camadas “pauperizadas” e marginalizadas da sociedade. O ato de assistir essas “massas pobres” e incultas tem como intenção promover ajustamentos sociais, evitar focos de conflitos que ameaçam o equilíbrio da sociedade” (1981: 46) As ações profissionais já contavam com um viés educativo desde sua gênese com o objetivo de adequar a população evitando conflitos sociais. As primeiras manifestações originárias no seio da Igreja tinham o compromisso da ―ajuda‖, explicitando viés assistencialista caritativo. Além do atendimento individualizado utilizado prioritariamente para ―diagnosticar‖ o problema -, existiam também os grupos de operários, grupos de mães ou clube de mães, ambos com um forte vínculo com a Ação Católica. Já a partir da década de 50, surgem os grupos de profissionais envolvidos nas propostas de Desenvolvimento de Comunidade – DC linha de trabalho tão explorada no Serviço Social neste período. Em todos estes grupos, foi grande a contribuição e a organização por parte dos assistentes sociais que buscavam melhoria nas condições de vida da população, além de uma adequação moral da família e do trabalhador. De lá para cá, mudanças ocorreram, principalmente as que marcam o movimento de Reconceituação no âmago da profissão e que propõem o materialismo histórico dialético como base teórica do Serviço Social, buscando romper com o conservadorismo e sua vertente teórica positivista, e tendo ainda, a fenomenologia que por fim se apresenta como uma nova roupagem deste pensamento conservador. Neste período, estratégias de ação positivistas que adotam o tripé ―indivíduo, família e comunidade‖ e estratégias com bases nas matrizes norte-americanas pautadas no ―diagnóstico‖ são fortemente questionadas e a partir da busca de ruptura sob influências do novo referencial teórico marxista, dá-se espaço para uma nova ação educativa, a ―educação popular‖. A educação popular ganha espaço na academia, influenciada prioritariamente por Paulo Freire como uma estratégia de construir junto com as classes subalternas, possibilidades de autonomia e consciência política. Busca romper com a visão fragmentária e de cunho moral das ações educativas ligadas aos grupos já existentes. 13 Em entrevista para a Revista Serviço Social e Sociedade, Paulo Freire é questionado se há assistentes sociais nos grupos de educação popular, coordenados por ele na PUC-SP e ele responde: “Sim, sim. Eu não diria que em todos estes grupos, em todos não, mas em grande medida tenho visto os assistentes sociais trabalhando no campo da alfabetização e da pós-alfabetização, no serviço social especifico, na ação comunitária, etc., quer dizer há uma boa presença de assistentes sociais nesse conjunto de equipes com os quais estou trabalhando.” (1980: 72) Não apenas no trabalho coordenado pelo Professor Freire, mas em outros tantos pelo Brasil, há um envolvimento dos assistentes sociais com a educação popular, neste momento embrionário, com características messiânicas, vanguardistas, entendendo a educação popular como um chamado. “É fundamental ter clara a posição do chamado “educador popular”. Colocar-se a serviço das classes subalternas, não assumindo a direção e o controle do processo educativo, é uma premissa que merece destaque." (MAGALHÃES, 1981:48) Durante toda a década de 80, a educação popular aconteceu nas periferias das cidades, nas associações de bairro, nos sindicatos, igrejas e se mesclava entre as propostas interventivas institucionais e voluntarismo profissional. Ações estas, engrossadas pelo momento áureo dos movimentos populares por conquista de direitos básicos como saúde, educação, moradia. É, porém, na década de 90 que o termo socioeducativo passa a ser usado e mais amplamente debatido com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Lei esta que rompe com o caráter punitivo do antigo Código de Menores e propõe Medidas Socioeducativas para adolescentes que estão em conflito com a lei. Entretanto, o conteúdo das ações socioeducativas não está explicitado na lei, que apresenta apenas grifos para que visem o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários dos adolescentes. Neste mesmo decênio, as políticas de Garantia de Renda Mínima surgem no país. O pioneiro no âmbito federal é o Bolsa Escola que garante apenas o repasse do subsídio financeiro às crianças selecionadas em idade escolar e com freqüência assídua na escola, como uma forma de cercear a evasão. Em 1995, em âmbito 14 municipal surge o Programa Municipal de Garantia de Renda Familiar Mínima – PMGRFM de Campinas que traz como proposta além do repasse financeiro, o acompanhamento socioeducativo às famílias beneficiárias. Esta experiência foi divulgada e multiplicada em todo o país, pois trazia em si um caráter inovador da junção do repasse financeiro com o acompanhamento socioeducativo através de grupos mensais coordenados por uma dupla de técnicos: um assistente social e um psicólogo. Os municípios elaboram e implementam programas de transferência de renda quando em 2003, com a posse do presidente Luis Inácio Lula da Silva, intensificamse as discussões em torno de um Sistema Único de Assistência Social - SUAS garantindo comando único nas ações e eliminação da sobreposição e pulverização de ações. Em 2004 é regulamentado o SUAS que tem a função de organizar em todo o território nacional as ações socioassistenciais, definindo e organizando a Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004, aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência Social2. Desde então, estados e municípios vem empenhando esforços para a implementação do SUAS, onde as ações de assistência social passam a ser organizadas em Proteção Social Básica e Proteção Social Especial. A Proteção Social Especial tem por objetivos prover atenções socioassistenciais a famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e/ou psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas socioeducativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras. Já a Proteção Social Básica tem como objetivos prevenir situações de risco, por meio do desenvolvimento de potencialidades, aquisições e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de vulnerabilidade social, decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos, dentre outros) e/ou fragilização de vínculos afetivos — relacionais e de pertencimento social. O Programa de Atenção Integral à 2 Por meio da resolução N° 145/2004. 15 Família – PAIF é o principal programa da proteção social básica e acontece dentro do espaço do Centro de Referência de Assistência Social – CRAS. O PAIF tem por objetivo contribuir para a prevenção de situações de risco de indivíduos e famílias, busca propiciar o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários e o favorecimento do convívio familiar. Parte do reconhecimento do protagonismo das famílias, fomentando-o e promovendo potencialidades e aquisições destas. As atividades oferecidas pelo PAIF vão desde atendimentos individuais e visitadas domiciliares a grupos socioeducativos, reflexivos, de convivência, de geração de renda. Por se consolidar como num espaço impar para a atuação do assistente social e o exercício de atividades educativas ou socioeducativas com a população usuária, o PAIF desenvolvido pelo município de Santo André – SP foi escolhido como espaço para esta pesquisa. O objetivo desta pesquisa é compreender qual a função educativa existe no trabalho do assistente social no Programa de Atenção Integral a Família – PAIF e como esta é evidenciada no cotidiano profissional. 2. REFERENCIAL TEÓRICO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS “Escolher um método significa, em outras palavras, optar por uma trajetória teórica que deverá auxiliar na compreensão do movimento de um objeto de estudo situado concreta e materialmente na realidade.” (SILVA, 2000:28) Para o desenvolvimento da pesquisa é fundamental que seja estabelecido previamente o referencial teórico-metodológico, bem como explicitar o método que orienta a produção do conhecimento. A metodologia desta pesquisa está pautada na dialética de Marx, tradição teórica esta que parte da realidade como dado fundamental para a reflexão num movimento constante e ininterrupto. 16 “A razão não constrói, mas reconstrói o real e a sua dinâmica, apanhando todas as mediações possíveis que também possuem uma existência concreta e material. Os homens são para Marx, seres ativos, porém não como Hegel os concebia; eles fazem história sob determinadas condições sendo, ao mesmo tempo, sujeito o objeto do mesmo processo. Esta unidade-diversa permite a transformação e a auto-educação simultânea dos homens e da própria realidade, expressando um movimento dialético ininterrupto que, necessariamente, unifica, mas não identifica o pensamento e a realidade. A ontologia materialista é acompanhada, então, por uma nova articulação lógica que não supervaloriza a razão, mas a considera como parte importante de um processo indivisível com o mundo material. A totalidade, edificada neste contexto, é sempre parcial, pois o pensamento não é capaz de captar exatamente o movimento da realidade.” (SILVA, 2000:30) A realidade é, portanto, dado fundamental para a construção do conhecimento, porém, é dinâmica e o pensamento humano, por sua vez, não é capaz de acompanhar o movimento do real em sua totalidade. Entretanto, sendo o homem sujeito e objeto de sua história, particular e coletiva, a reflexão crítica subtraída do movimento da realidade é a possibilidade de construção de novas alternativas que reafirmem a ação-sujeito do homem. Neste sentido, o cotidiano não é descolado da teoria, mesmo quando esta é e, sempre será, inacabada para responder a todos os questionamentos posto na cotidianidade. Faz parte do processo histórico, a participação coletiva na construção do conhecimento onde as inquietações são trazidas à tona, na incessante busca de respostas. O método, mais do que instrumentais e regras, é o movimento da teoria, o alicerce daquilo que se quer sistematizar e devolver para a realidade. É o caminho escolhido para a pesquisa, a seta que aponta a visão de homem, de mundo e de sociedade como pressuposto fundamental para análise. É necessário e, não menos importante, instrumentos e técnicas para a coleta de dados. Neste sentido, a escolha que se estabelece é que esta pesquisa tenha caráter qualitativo. Isso porque o interesse posto pelos objetivos da investigação é identificar e conhecer a função educativa existente no trabalho do assistente social e como esta é evidenciada no cotidiano profissional a partir de experiências com o 17 PAIF. O interesse da pesquisa é apreender uma característica do modo de ser do Serviço Social. (...) tanto a realidade quanto a relação humana são qualitativos. Implicam em sons, aromas, cores, arte, poesia, linguagem, os quais só podem ser alcançados pela mediação do sujeito e predominantemente de modo qualitativo, pois demandam atribuição de significados. Tal tarefa apenas o sujeito é capaz de realizar, pois significados se constroem a partir da experiência. (MARTINELLI, 2006:11) O desafio posto é à luz dos conceitos teóricos levantados, penetrar a realidade destes profissionais e poder reconstruir idéias, conceitos, entendendo as condições objetivas e subjetivas que estes dispõem para a execução de seu trabalho. O universo da pesquisa é o Programa de Atenção Integral à Família – PAIF desenvolvido nos Centros de Referência de Assistência Social – CRAS do município de Santo André. Os sujeitos da pesquisa são os assistentes sociais que atuam como técnicos ou gestores do programa. Desta forma, delimita-se uma amostra probabilística intencional. A Prefeitura de Santo André conta com 4 CRAS implantados que são desenvolvidos em sistema de co-gestão em parceria com Organizações Não Governamentais. Ao todo são 16 assistentes sociais, servidores públicos e contratados, envolvidos com o trabalho. O PAIF em Santo André atende prioritariamente as famílias que se encontram em situação de risco pessoal e social e, as que não cumprem as condicionalidades dos Programas de Transferência de Renda Bolsa Família e Renda Cidadã. A investigação junto aos sujeitos se deu através de entrevistas semiestruturadas com roteiro pré-definido e utilização de gravador para a reprodução fiel do conteúdo, realizadas com as duas gestoras do programas, assistentes sociais. A escolha da entrevista é justificada porque “além de permitir captar melhor o que as pessoas pensam e sabem, observam também a sua postura corporal, a tonalidade da voz, os silêncios, etc.” (MARSIGLIA 1999: 27). 18 Foram entrevistadas a responsável pelo setor de Proteção Social Básica e a Diretora do Departamento de Assistência Social. A receptividade para com o tema foi muito boa e as questões do roteiro (que propositalmente fazia o entrevistado responder quase que a mesma pergunta por diferentes possibilidades) trouxeram novas inquietações tanto na pesquisadora, como nas entrevistadas que por ora paravam e observavam para elaborar situações tão cotidianas, que por vezes passam despercebidas do processo reflexivo. Outra opção metodológica foi a realização de grupo focal. O grupo focal permite ao pesquisador observar a interação dos indivíduos em determinado tema, conhecendo as semelhança e as diferenças entre as opiniões e experiências expressas. A escolha dos grupos focais é justificada porque “(...) são fundamentalmente uma maneira de ouvir as pessoas e apreender com elas. Grupos focais criam linhas de comunicação... um amplo processo de comunicação que conecta os mundos do pesquisador e dos participantes.” (MORGAN in Berthoud, 2004:44). O objetivo deste instrumento é de captar as diferentes opiniões acerca do tema e como o conjunto de trabalhadores assistentes sociais daquele espaço compreendem a questão apresentada e como a observam no cotidiano. “Segundo Powell e Single (1996, p.449), um grupo focal „é um conjunto de pessoas selecionadas e reunidas por pesquisadores para discutir e comentar um tema, que é objeto de pesquisa, a partir de sua experiência pessoal‟ Kitzinger (1994, p.103) diz que o grupo é focalizado, no sentido de que envolve algum tipo de atividade coletiva – como assistir um filme e conversar sobre ele, examinar um texto sobre algum assunto, ou debater um conjunto particular de questões.” (GATTI, 2005: 7) Para o aquecimento, foi dado ao grupo um papel com a questão: Você acha que o Serviço Social tem uma questão educativa no seu cotidiano? Por quê? Antes, porém, foi esclarecido ao grupo o objetivo daquele encontro e o que seria um grupo focal, enfatizando que o objetivo não era criar consensos, mas averiguar as diferentes opiniões. Também foram explicitado os objetivos da pesquisa e o papel da pesquisadora naquele momento, que não era o de realizar uma 19 entrevista coletiva e sim prioritariamente ouvir e acolher ao grupo, fazendo intervenções pontuais. O grupo, que iniciou tenso, foi se soltando pouco a pouco e chegou a momentos de discussões calorosas. Entretanto, como é comum do ser humano, que socialmente constantemente busca aprovações externas, houve vários movimentos espontâneos de tentar criar consenso ou de confirmar qual seria a opinião do grupo entre seus participantes O encontro terminou com o compromisso da pesquisadora de apresentar os resultados da pesquisa para aquele coletivo e com relatos do quanto estes momentos são importante na vida profissional, pois, é em espaços como estes que podemos elaborar o cotidiano, adicionando a este a reflexão crítica. Pelo encontro ter ocorrido logo após o segundo turno do processo eleitoral para prefeito (2008), em que, o resultado apresentava a perda da atual gestão do Partido dos Trabalhadores, muitos participantes ao final do encontro relatavam o cansaço, a apreensão quanto ao futuro e a vontade de distanciar o seu trabalho destes incômodos políticos. Este movimento revelou também, a relação de confiança que se estabeleceu entre a pesquisadora e os sujeitos pesquisados. E, este fato, pode ou não ter influenciado a coleta de dados. Fez parte também da coleta de dados a análise de documentos que direcionaram o trabalho destes profissionais, pesquisas em sites tanto da prefeitura de Santo André, quanto do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome - MDS e pesquisa bibliográfica. 3. ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO Esta dissertação está divida em três capítulos mais as considerações finais da pesquisadora. O primeiro capítulo discorre sobre o alicerce teórico buscado pela pesquisadora para a discussão do tema. Fortemente marcado pelo estudo das pedagogias de Abreu (2002), este capítulo não traz apenas as considerações teóricas construídas pela categoria, mas o entendimento da pesquisa sobre estas e 20 sua definição sobre o termo socioeducativo, tão empobrecido e esvaziado de significado. O segundo capítulo aborda o cenário em que a pesquisa foi realizada que é o município de Santo André na Secretaria Municipal de Inclusão Social. Discorre sobre as características do município e o caminho de construção até o PAIF, trilhado por esta secretaria. O terceiro e último capítulo traz uma análise profunda do material coletado através do grupo focal e das entrevistas à luz da teoria já disseminada. Trata-se do condensamento das descobertas realizadas pela pesquisadora em seu processo de aproximação ao objeto de estudo. As considerações finais buscam não o encerramento do tema, mas o inicío de um novo ciclo onde há a possibilidade do encaminhamento das questões prementes para o debate profissional. 21 CAPÍTULO I O SERVIÇO SOCIAL E O EDUCATIVO, O SOCIOEDUCATIVO E AS PEDAGOGIAS: ENTENDENDO CONCEITOS Com sua gênese marcada pela implantação do sistema capitalista na sociedade atual, o Serviço Social nasce como profissão que tem o desafio de amenizar as tensões criadas entre o capital e o trabalho. Sofre em seu início grande influência da igreja católica e da moral cristã, já que as primeiras ações ocorriam no âmbito da igreja com o intuito caritativo de ―ajudar‖ os pobres e miseráveis. A história do Serviço Social como profissão e suas bases de origem, nos auxiliam a compreendê-lo em seu movimento de construção histórica, desvendando seu modo de ser. Desta forma, o Serviço Social constituí-se como profissão que tem nas expressões da questão social3 a matéria-prima para o trabalho profissional. É através da questão social que as demandas profissionais surgem na sociedade capitalista. “A matéria-prima do trabalho do assistente social (ou da equipe interprofissional em que se insere) encontra-se no âmbito da questão social em suas múltiplas manifestações – saúde da mulher, relações de gênero, pobreza, habitação popular, urbanização de favelas, etc. – tal como vivenciadas pelos indivíduos sociais em suas relações sociais quotidianas, às quais respondem com ações, pensamentos e sentimentos.” (IAMAMOTO 2003:100). É, portanto, profissão inscrita na divisão sócio-técnica do trabalho, pois possui matéria-prima (expressões da questão social), e, cria e produz serviços de utilidade social; atende a uma necessidade da sociedade. Todavia, o assistente social, apesar de se caracterizar como um profissional liberal, vende sua força de trabalho para órgãos públicos e privados, por não deter em si todos os meios para concretização de seu trabalho, tornando-se assim mais um trabalhador assalariado. 3 “Questão Social apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação de seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade”. (IAMAMOTO, 2003:27) 22 Como profissão, possuí Código de Ética (1993) que atualmente preconiza valores voltados para a ―liberdade, a autonomia e a plena expansão dos indivíduos sociais‖, assumindo posicionamento político a favor da equidade e da justiça social. Os valores impressos num Código de Ética Profissional anunciam a proposta desta profissão para a sociedade, os valores que sustenta e a intencionalidade de sua ação. “Esquematicamente, este projeto ético-político tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor central – a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de escolher entre alternativas concretas: daí um compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais” (NETTO, 1999:104) O Código de Ética do Assistente Social explicita um projeto ético-político adotado pelos agentes profissionais, apontando a busca de uma homogeneidade na forma de pensar e de ser da profissão. Os projetos profissionais constituem a autoimagem de uma profissão e existem porque cada profissão tem o seu papel social e tem uma intencionalidade de ação. As profissões dentro da sociedade não se constituem de forma neutra, sempre há uma intenção em sua função social, um objetivo a ser alcançado. Desta forma, o projeto profissional é construído pelos sujeitos coletivos e através deste, a categoria profissional elege “valores éticopolíticos e opções teórico-metodológicas em consonância com um projeto societário, tendo por base a prática profissional dos sujeitos desta ação.” (CARDOSO, 1999:95). Essa teleologia própria da profissão, nos revela um campo tencionado por dois pólos: primeiro diz respeito à função social da profissão que é reproduzir relações sociais4 tendo como um de seus mecanismos amenizar os conflitos existentes entre o capital e o trabalho, conflitos marcados pelas diferenças de classes e pelas desigualdades na distribuição da riqueza socialmente construída. O outro pólo diz respeito ao projeto de profissão construído coletivamente que é evidenciado entre outros elementos no Código de Ética profissional e aponta um novo projeto societário diverso ao capitalismo. Desta forma, a profissão vive 4 “Assim, a reprodução das relações sociais é a reprodução da totalidade do processo social, a reprodução de determinado modo de vida que envolve o cotidiano da vida em sociedade: o modo de viver e de trabalhar, de forma socialmente determinada, dos indivíduos em sociedade.” (IAMAMOTO, 2001:72) 23 contemporaneamente a contradição entre o objetivo de sua função social e o objetivo de seu projeto profissional. No entanto, é importante frisar que nem sempre foram estes valores adotados pela profissão em seu percurso histórico. Já houve outros projetos profissionais que evidenciavam outros valores e intencionalidades, voltados muitas vezes para a neutralidade da ação e a adequação do homem na sociedade. Abreu (2002) aponta que o Serviço Social tem uma história marcada por perfis pedagógicos que imprimem uma prática educativa do assistente social no desenvolvimento de sua intervenção profissional. Seguindo uma análise gramsciana, a autora entende que as primeiras ações profissionais já eram ligadas a uma pedagogia. Entendendo a pedagogia para além da educação formal como uma forma de expor a cultura, o modo de pensar e de agir, que forma uma ordem intelectual e moral, uma hegemonia5 de determinada classe; a autora aponta perfis pedagógicos que no processo histórico influenciaram o exercício do assistente social. Perfis estes, marcados por “determinações históricas e configurações particulares da referida prática que demarcam a mediação profissional em processos de organização da cultura na dinâmica da sociedade.” (ABREU, 2002: 83). Os perfis pedagógicos apontados por ela são: a pedagogia da ajuda, a pedagogia da participação e o movimento de construção da pedagogia emancipatória. Partindo do contexto norte-americano e europeu, onde os avanços da indústria e dos meios de produção alteraram significativamente todas as formas de ser da sociedade nas primeiras décadas do século XX, a autora desenvolve o entendimento sobre a pedagogia da ajuda contextualizando-a num processo de organização da cultura dominante onde a questão social é enxergada como questão moral, reduzindo-a as manifestações individuais. A intrínseca relação do Serviço Social com a Igreja faz com que a primeira vertente filosófica da profissão se transforme num arranjo teórico doutrinário, moralizador, compatível com a perspectiva conservadora que impregna as ações educativas do assistente social neste inicio. Neste sentido, apesar de ter sido um 5 Segundo SIMIONATTO, Gramsci entende a hegemonia também “como “direção intelectual e moral”, afirma que esta direção deve exercer-se no campo das idéias e da cultura, manifestando a capacidade de conquistar o consenso e de formar uma base social. Isso porque não há direção política sem consenso.” (1995: 43) 24 avanço a valorização do aspecto técnico instrumental sob a orientação positivista, importando o chamado ―Diagnóstico Social” de Mary Richmond6, as bases técnicocientifícas são centradas na dimensão individual na perspectiva da reforma moral e reintegração social do indivíduo. Richmond desenvolve ainda, metodologias interventivas como o Serviço Social de Caso. Este processo de teorização dos métodos interventivos da profissão está diretamente relacionado ao cenário que revelava abertura do mercado de trabalho para o assistente social, exigindo novo padrão de profissionalização da ação. O Serviço Social brasileiro importa a tecnologia norte-americana em sua busca de profissionalizar sua prática, atendendo assim às novas demandas do mercado de trabalho nacional. ―(...) considerando, sobretudo, o agravamento da questão social e as exigências postas pelo novo padrão produtivo e de trabalho; vinculase, pois, à necessidade histórica de imprimir às referidas práticas um cunho “educativo”, “ressocializador”, mediante inculcação de um novo código de conduta individual, familiar e política do trabalhador e sua família, adequado às necessidade de produção e reprodução social.” (ABREU, 2002: 39-40) A aplicação, entretanto, desta tecnologia no contexto brasileiro, aconteceu de forma desconectada da realidade uma vez que o país não contava com um sistema de seguridade social mínimo – base fundamental para a operacionalização da ―ajuda‖ psicossocial individualizada ao trabalhador – restando-lhe ações fragmentadas e pontuais. Outro ponto relevante são as ações vinculadas à Igreja, como por exemplo, a Ação Católica que possuía trabalho junto aos operários com o objetivo de organizálos, quando não ―educá-los‖. Sob a roupagem da ―ajuda‖, o assistente social tinha neste contexto a função concreta de manter a reprodução material e subjetiva da força de trabalho dentro das condições impostas pelos altos índices de acumulação do capital, imprimindo um conformismo nas classes subalternas com a difusão da idéia de naturalização das desigualdades sociais como inerentes à pessoa humana. 6 O “Diagnóstico Social” é uma das primeiras formulações teóricas da profissão, de origem norte americana e que trata da sistematização da prática profissional vinculada aos processos de diagnóstico e tratamento. 25 A partir da década de 50, porém, intensifica-se na América Latina uma aproximação à ideologia desenvolvimentista que marca uma mudança no cenário econômico e político, impulsionando um novo perfil pedagógico: a pedagogia da participação. A ideologia desenvolvimentista “(...) envolve a proposta de crescimento econômico acelerado, continuado e auto-sustentado. O problema central a resolver constitui-se em superar o estágio transitório do subdesenvolvimento e do atraso.” (IAMAMOTO, 2001: 340). Entendendo estes estágios como um período histórico ainda não alcançados nos países ―em desenvolvimento‖, no caso o Brasil. As experiências profissionais buscam neste período enfatizar a participação popular e assumem com maior intensidade o Serviço Social de Grupo e o Desenvolvimento de Comunidade – DC. Entretanto, a preocupação com a participação popular não trouxe um rompimento com o Serviço Social tradicional e com o entendimento da questão social como questão moral. “Tais redefinições não significaram rompimento com a perspectiva histórica, nem com a base conservadora de explicação da questão social, que sustentam o Serviço Social em sua formulação denominada tradicional. Mas, a reafirmam, aperfeiçoando-a, refinando o cunho tecnicista positivista da intervenção profissional, consubstanciado na tendência à naturalização da vida social e no seu corolário, a psicologização das relações sociais, ao mesmo tempo em que, contraditoriamente, apontam elementos para a superação. (ABREU, 2002: 111) O tradicionalismo assume nova roupagem assumindo a participação e o lócus da comunidade como seus eixos centrais. Iniciam-se processos de ―integração‖ e ―promoção‖ sociais, e a ―ajuda‖ individualizada é pouco a pouco substituída pela auto-ajuda ou ajuda mútua nos processos participacionistas; entendendo que depende da ação/participação do trabalhador para que ele se desenvolva, saindo da situação de dependência e do assistencialismo. Continua, porém, a sustentar a cultura do conformismo para a força de trabalho, obedecendo assim, a ideologia dominante e sua necessidade de exploração da mão de obra para aumento do capital, ou seja, são estratégias utilizadas para a dominação e o controle social pelo capital que buscam ocultar mecanismos autoritários, inibindo também a aproximação da ameaça do comunismo naquele período. 26 Importante frisar que os perfis pedagógicos assinalados como a pedagogia da ajuda e a pedagogia da participação, compõem para Abreu perfis subalternizantes, tendo a ideologização da assistência como ―assistência educativa‖. Ela aponta, ainda, que, “tais estratégias pedagógicas tendem a dissimular as formas de reprodução do trabalhador nos limites precários da política social” (2004:52). São perfis consolidados e arraigados à prática profissional do assistente social, reforçando sua função social de reproduzir material e subjetivamente a força de trabalho neste contexto limítrofe, amenizando conflitos. Este processo só é possível por meio da coerção e do consenso das classes subalternas, como aponta Iamamoto: “(...) Radicalizando uma característica de todas as demais profissões, o assistente social aparece como o profissional da coerção e do consenso, cuja ação recai no campo político.” (2000:42) Os espaços de participação ora citados, são espaços eminentemente políticos onde não apenas o assistente social, mas ele prioritariamente, exerce um poder perante os usuários de seus serviços, freqüentemente induzindo à produção de consensos. Entretanto, num movimento contraditório, estes espaços de participação abrem também lacunas para a crítica à hegemonia construída pela classe dominante e provocam união a outros movimentos que emergem no contexto nacional, como os de militância política que surgiram no contexto de ditadura militar. As décadas de 60 e 70 são marcadas pelo período de ditadura militar onde a participação é fortemente regulada pelo Estado. Os programas de governo deste período seguem os moldes desenvolvimentistas e apontam para a cultura de ―bem estar social‖. Apesar do Estado de Bem Estar não ter sido implementado no Brasil, acreditava-se que, seguindo o modelo europeu, o país se desenvolveria chegando ao Estado de Bem Estar, trazendo ordem a nação e consolidação do projeto capitalista. No Serviço Social, este período é marcado também por uma heterogeneidade do projeto profissional, quando um grupo de profissionais questiona criticamente as bases teóricas e filosóficas adotadas até então, e propõe um rompimento com o conservadorismo assumindo um posicionamento histórico-materialista. Este 27 momento é denominado de ―Movimento de Reconceituação do Serviço Social‖ 7 e conseqüentemente entra em consonância com a busca por um novo perfil pedagógico. Este movimento da profissão traz também, questionamento quanto ao método utilizado até então, método este que fragmentava teoria e prática, em que os instrumentos e técnicas tinham um caráter tecnicista, pondo em cheque o famoso tríade ―Caso, Grupo e Comunidade‖ como nos aponta Neto: “Para economizar tempo e espaço: do estudo Caso, Grupo e Comunidade, o máximo que se pode extrair, em termos de „estratégias de ação profissional‟ ou para „operacionalizar os conhecimentos teóricos‟, é um conjunto de indicações referidas a âmbitos de intervenção restritos e institucionalizados e nada mais. Poderão ser arroladas técnicas, mais ou menos eficientes, conforme cada âmbito; poderão ser formalizados processos ideais de abordagem mais ou menos abrangentes em e para cada âmbito – mas todos irredutíveis a um padrão unificado de procedimentos em face da totalidade social que se revela em cada um deles” (Netto, 1984: 8) A crítica se refere substancialmente ao distanciamento do processo de formação profissional, em contemplar a operação histórico-crítica e prático-análitica, enquadrando simplesmente procedimentos às necessidades imediatas da intervenção profissional, sem conectá-los à totalidade social, à realidade em seu movimento dialético e constante. O grande desafio é que o método para o Serviço Social fosse resultado do domínio da teoria social crítica, intrinsecamente gestado junto a esta, pondo abaixo todo e qualquer ―modelo de intervenção‖ pré-estabelecido e desconectado da realidade. É neste contexto, do Movimento de Reconceituação Profissional, que emerge o terceiro perfil pedagógico apontado por Abreu, que é o movimento de construção de uma pedagogia emancipatória pelas classes subalternas. Este movimento é em sua gênese fortemente marcado pela Teologia da Libertação, movimento da Igreja Católica que utiliza bases marxistas, porém, sem romper com o pensamento cristão. 7 Para aprofundamento da questão consultar: NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social : uma análise do Serviço Social no Brasil pós-64. São Paulo: Cortez, 1994. 28 Entende-se que a autora aponta esta pedagogia como um movimento de construção por representar uma contra hegemonia à cultura dominante, marcando um campo tencionado politicamente entre caminhos de avanços e retrocessos. “Ancorados, predominantemente, no viés marxista da Teologia da Libertação e desta com as formulações pedagógicas de Paulo Freire – aporte identificado por vários estudos no conjunto dos processos de luta na América Latina – setores da categoria dos assistentes sociais conseguem fazer avançar os esforços profissionais de vinculação ao movimento de construção de uma pedagogia emancipatória pelas classes subalternas” (ABREU 2002:131) As Comunidades Eclesiais de Base são uma das expressões concretas deste perfil pedagógico e representam ―uma ampla rede de organização, conscientização e politização das bases” (Wanderley in Abreu 2002:112) num período em que a participação popular foi efetivamente acolhida por alguns movimentos dentro da Igreja, uma vez que, a democracia era característica distante da realidade social do país. Evidente que este movimento contra hegemônico não foi algo isolado. Uniuse às experiências da revolução cubana e dos movimentos sociais da América Latina que buscavam transformações político-culturais e mudanças estruturais e econômicas na perspectiva emancipatória das classes subalternas. É a busca por uma nova concepção de mundo, homem e sociedade; é o questionamento radical da estrutura social imposta, mesmo que as respostas para estas questões, neste momento, ainda careçam de amadurecimento. Este perfil pedagógico, entretanto, também apresenta distorções em seu desenvolvimento no meio profissional, segundo Abreu. O primeiro ponto refere-se ao superdimencionamento da participação popular na construção do projeto profissional do Serviço Social, o que levou a profissão a certo pragmatismo. Distanciou-se das referências teóricas originais, utilizando do marxismo sem recorrer às fontes originais de Marx e, entendendo que apenas o compromisso ideológico com as classes subalternas seria a possibilidade da conquista da unidade com o referencial teórico supracitado. Um segundo ponto a ser considerado, refere-se ao messianismo profissional, que a autora aponta como “um descompasso entre os avanços no campo político- 29 ideológico, sobretudo no que se refere à intencionalidade da prática profissional e à efetiva análise das condições objetivas dessa mesma prática.” (ABREU, 2002:148) É a marca idealista do Serviço Social que enxerga o exercício profissional como uma militância antiburguesa e capaz por si só da transformação social, desconectado das reais possibilidades impostas pela realidade e desconsiderando que a transformação será realizada por toda a sociedade e não apenas por uma profissão. A educação popular, tendo como um dos moldes o freiriano, é multiplicada na prática também dos assistentes sociais, iniciando pela educação de adultos com o intuito de aumentar o nível intelectual e cultural das massas, aumentando assim, seu grau de organização e de possibilidades de construção de uma cultura que lhes diga respeito. Importante frisar que Paulo Freire foi um precursor da educação popular e abriu caminho importante para tais práticas, entretanto, não foi o único a trabalhar tais estratégias, visto que o Serviço Social teve também influências latinoamericanas como Natálio Kisnerman. As décadas de 80 e 90 são marcadas para a profissão pela implementação do currículo mínimo para as faculdades de Serviço Social, além das reformulações dos códigos de ética em 19868 e 1993 e a lei que regulamenta a profissão, também em 1993, ambos os instrumentos que buscam apontar uma hegemonia do projeto profissional adotado: “Os projetos profissionais apresentam a auto-imagem de uma profissão, elegem os valores que a legitimam socialmente, delimitam e priorizam os seus objetivos e funções, formulam os requisitos (teóricos, institucionais e práticos) para o seu exercício, prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e estabelecem as balizas da sua relação com os usuários de seus serviços, com as outras profissões e com as organizações e instituições sociais, privadas e públicas (entre estas, também e destacadamente com o Estado, ao qual coube, historicamente, o reconhecimento jurídico dos estatutos profissionais). (Netto, 2000:95) Os três perfis pedagógicos: a pedagogia da ajuda, a pedagogia da participação e o movimento de construção da pedagogia emancipatória; desenvolvidos por Abreu, se caracterizam como pontos de análise para a 8 O Código de Ética de 1986 foi um marco importante para a profissão por apontar uma com o conservadorismo. Entretanto, ele comete um equívoco ao firmar o compromisso profissional com uma classe social (a trabalhadora) e não com valores éticos a serem sustentados e perseguidos. Este movimento pode fatalmente dividir a sociedade entre bons e maus e, por este motivo ele foi reformulado em 1993 expressando compromisso com valores como liberdade, democracia e autonomia à serem impressos na ação profissional. 30 compreensão da função educativa existente no trabalho do assistente social e como esta é evidenciada no cotidiano profissional a partir de experiências dos assistentes sociais no PAIF. Faz-se, entretanto, necessário, entendermos a relação educativo e socioeducativo no exercício profissional. 1.1 – Educativo e socioeducativo Partindo do pressuposto já desenvolvido, entende-se que toda ação profissional contém em si um perfil pedagógico e que por isso possui características educativas. Na perspectiva gramsciana a ação educativa se situa no âmbito de sua análise dos intelectuais. Gramsci considera todos os homens como intelectuais, como se segue: “Para Gramsci (1977:15-16), porém, „em qualquer trabalho físico; mesmo no mais mecânico e degradado existe um mínimo de qualificação técnica, isto é, um mínimo de atividade intelectual criadora‟. Neste sentido, „todos os homens são intelectuais, mas nem todos desempenham na sociedade a função de intelectuais‟, ou seja, não existe atividade humana da qual se possa excluir toda a intervenção intelectual, não se pode separar o homo faber do homo sapiens.” (SIMIONATTO, 1995: 57) Para ele todo trabalho contém em si um conhecimento aplicado e desta forma todos os homens são intelectuais, o que não quer dizer que todos desempenhem tal função socialmente. Entretanto, define-se como intelectual a função social imediata, não considerando a totalidade da ação que, por mais que não utilize do conhecimento cientifico ou intelectual, utiliza-se do conhecimento construído para tal ação e apreendido coletivamente. “Quando se distingue entre intelectuais e não-intelectuais, faz-se referência, na realidade, tão somente à imediata função social da categoria profissional dos intelectuais, isto é, leva-se em conta a direção sobre a qual incide o peso maior da atividade profissional específica, se na elaboração intelectual ou se no esforço muscular-nervoso.” (GRAMSCI, 1979: 06) Gramsci dividiu os intelectuais em duas categorias: intelectuais orgânicos e intelectuais tradicionais. Os intelectuais orgânicos são originários dos grupos sociais essenciais (burguesia e proletariado), os quais ―[...] (nascem) no terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, (tais grupos criam) para si, ao mesmo tempo, de um modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que 31 lhe dão homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econômico, mas também no social e no político [...]” (GRAMSCI, 1979: 03). O intelectual orgânico tem a função de trazer homogeneidade à classe qual se filia e de contribuir na luta pela direção social e cultural desta classe, é orgânico pela proximidade e organicidade9 com que se relaciona com a classe e possuí papel fundamentalmente político. Os intelectuais tradicionais já preexistiam “[...] como representantes de uma continuidade histórica que não fora interrompida nem mesmo pelas mais complicadas e radicais modificações das formas sociais e políticas” (GRAMSCI, 1979:03), tendo como representantes maior os eclesiásticos. Todo o grupo que pretende assumir papel dominante socialmente, se embrenha numa luta pela assimilação e conquista ―ideológica‖ dos intelectuais tradicionais. De acordo com Simionatto (1995) é comum atrelar a figura do Intelectual Tradicional como sendo conservador, o que nem sempre é verdadeiro. O papel do intelectual traz um conteúdo eminentemente educativo, pois trabalha no âmbito da cultura, na difusão do conhecimento e do saber com vistas à consolidação de um projeto da classe fundamental qual se vincula. “O intelectual exerce funções de direção econômica, social e cultural que se expressam tanto nos níveis de elaboração como de difusão do saber da classe que representa. O papel do intelectual é o de investigar, educar, organizar a hegemonia e a coerção e, ainda homogeneizar a consciência de classe.” (IAMAMOTO, 2000: 44) Neste sentido, pode-se também pensar no assistente social como um intelectual orgânico que tenha um compromisso, e uma identificação – muitas vezes de origem – com as classes subalternas. Claro que existem intelectuais orgânicos voltados aos interesses das classes dominantes, segundo a análise gramsciana, isso porque o intelectual pode ter valores que o vincule às classes dominantes, 9 “A concepção de organicidade é inerente à formação mesma das suas competências e das funções que desenvolvem no interior do modo de produção capitalista, inclusive o encaminhamento das lutas junto às classes a que está vinculado. Estar vinculado organicamente a uma classe não significa agir de fora, externamente, de maneira mecânica. Significa, sim, participar efetivamente de um projeto junto às classes fundamentais: burguesia e proletariado.” (SIMIONATTO, 1995: 58-59) 32 neste sentido sua ação será a de criar hegemonia para a manutenção destas classes. Entretanto, o intelectual orgânico quando comprometido com as camadas subalternas, quando vinculado a valores democráticos e emancipatórios é, um profissional que manifesta o caráter político em sua ação, que está constantemente persuadindo, organizando idéias e pessoas com vistas à transformação social. Não é o intelectual em si que irá gerar a transformação, mas a sua participação política e a sua capacidade de articulação social. O trabalho do assistente social é polarizado pelos interesses das classes fundamentais, contribuindo para a homogeneidade do projeto destas classes: “O profissional de Serviço Social é aqui, também considerado na sua condição de intelectual. Para caracterizá-lo busca suporte em Gramsci, para quem esta categoria não se constitui um grupo autônomo e independente das classes fundamentais; ao contrário tem o papel de dar-lhes homogeneidade e consciência de sua função, isto é, de contribuir na luta pela direção social e cultural dessas classes na sociedade. Trata-se do „organizador, dirigente e técnico‟ que coloca a sua capacidade a serviço da criação de condições favoráveis à organização da própria classe a que se encontra vinculado.” (CARVALHO e IAMAMOTO, 2001:87) Entender o assistente social como um intelectual é compreender que o seu trabalho profissional se dá no campo político-ideológico como apontado por Iamamoto: “Seu trabalho situa-se predominantemente no campo políticoideológico: o profissional é requerido a exercer funções de controle social e de reprodução da ideologia dominante junto aos segmentos subalternos, sendo seu campo de trabalho atravessado por tensões e interesses de classes. A possibilidade de redirecionar o sentido de suas ações para rumos sociais distintos daqueles esperados por seus empregadores – como, por exemplo, nos rumos na construção da cidadania para todos; da efetivação de direitos sociais, civis, políticos; da formação de uma cultura pública democrática e da consolidação da esfera pública – deriva do próprio caráter contraditório das relações sociais que estruturam a sociedade burguesa. Nelas encontram interesses sociais distintos e antagônicos, que se refratam 33 no terreno institucional, definindo forças sociopolíticas em lutas para construir a hegemonias, definir consensos de classe e estabelecer formas de controle social a elas vinculadas.” (IAMAMOTO, 2003, 98) O lugar social da profissão, no campo político-ideológico, com o papel de amenizar os conflitos entre o capital e o trabalho através coerção e da reprodução da cultura dominante, confere ao assistente social a posição de intelectual na sociedade. Entretanto, entender o movimento contraditório de seu trabalho profissional, que pode também utilizar de sua relativa autonomia (IAMAMOTO, 2003) para redirecionar sua ação para ações democrática e que fortaleçam as classes subalternas tornando-se imprescindível a compreensão do caráter político da profissão. “Os assistentes sociais ao realizarem suas funções profissionais, seja ao nível de Secretárias de Governo, dos bairros, das instâncias de organização e mobilização da população, das organizações nãogovernamentais (ONGs), exercem a função de um educador político; um educador comprometido com a política democrática ou um educador envolvido com os “donos do poder””. (IAMAMOTO, 2003:79) Traz, o assistente social, de forma marcada e expressiva a sua função como um educador que tem grandes chances de ser moralizador, controlador, disciplinador ou um educador comprometido com a luta democrática e com seu projeto ético-político profissional. Gramsci no desenvolvimento de sua análise, também se dedicou a entender a educação, não apenas a educação formal que também é alvo de seus estudos, mas, e principalmente, a educação popular tendo o partido político primazia como agente operacionalizador desta ação educativa. Educação esta oposta às características da educação burguesa que propõe processos educativos com vistas para a manutenção e ampliação do capitalismo disseminando valores individualistas, consumistas e de propriedade. Fala-se de uma educação que proponha fundamentalmente processos críticos, de reconstrução histórica, prático e participativo; “um processo educativo antiautoritário, essencialmente aberto e criativo.” (NOSELLA, 2002: 89) 34 “Trata-se como se vê, de uma educação essencialmente prática e historicista que rompe com as concepções metafísicas e abstratas, pois não existe um “ordenador” fora das práticas humanas nem mesmo uma relação independente da relação como o homem; como também não é concebível o indivíduo humano fora da sua classe social ou fora da luta entre as classes. É no interior das lutas, na forma que modernamente se desenvolvem, que acontece o processo educativo do novo cidadão. Por ser um processo de classe e, portanto, social, o novo educador coletivo é o Partido que, visível ou invisivelmente, faz os diagnósticos, organiza as atividades educativas, levanta prioridades e avalia resultados.” (NOSELLA, 2002: 89) Evidente que o momento histórico, apontava para Gramsci o partido político com real possibilidade de construir uma nova sociedade, para ele, os intelectuais desempenham a sua função no partido político. Os partidos políticos possuem papel importante no âmbito da política e também apontam influência na organização da educação e da cultura na sociedade. Com forte vínculo junto aos movimentos sindicais e populares, os partidos vêm sofrendo nos últimos tempos as mudanças que afetaram significativamente estes movimentos. A reestruturação produtiva que alargou ferozmente o desemprego em massa e gerou por conseqüência o enfraquecimento dos movimentos sindicais, somada a privatização do Estado, a desarticulação dos movimentos sociais, a desproteção social e a expansão do mercado financeiro; trouxeram aos partidos políticos um readequamento na ação e no discurso ora assemelhando-se entre si (independente de posição política), ora defendendo proposta simplórias e inviabilizadas, dada a complexidade da sociedade atual. Desta forma, outros atores tomam o campo educativo com vistas à transformação social. Pode-se aqui mencionar os Conselhos de Direito, de peso e real importância na regulação da política social hoje, na luta por direitos e no controle do Estado, pode-se falar de organizações do terceiro setor comprometidas com a luta democrática, os Movimentos dos Sem Terra nas áreas rurais e dos Sem Teto nos centros urbanos que bravamente sobrevivem ao caos. Todavia, diante do foco desta dissertação, um ator importante na operacionalização da ação educativa defendida por Gramsci é o projeto ético-político profissional eleito pela categoria dos assistentes sociais. No entanto, 35 ―[...] a cruzada antidemocrática do grande capital, expressa na cultura do neoliberalismo (que, entre nós, é conduzida por setores políticopartidários que se dizem vinculados a um projeto social societário socialdemocrata) é uma ameaça real ao projeto profissional do Serviço Social.” (NETTO, 2000: 107) Não se defende aqui o projeto profissional como uma entidade de vida própria, mas como a direção social e política para onde aponta a profissão. Evidente que a ação educativa seja efetuada pelos agentes profissionais em seu cotidiano, ocupando muitas vezes espaços contraditórios, com condições objetivas bastante limitadas. Nos últimos anos, o assistente social vem sendo requisitado para operacionalizar a ação educativa em seu exercício profissional através de trabalhos tidos como ―socioeducativos‖. São trabalhos de acompanhamento a famílias, adolescentes, jovens e idosos que, prioritariamente, através de grupos, desenvolve atividades na ótica do reconhecimento do direito e do exercício da cidadania. Quanto ao termo socioeducativo passa a ser amplamente divulgado a partir da década de 90 com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que extingue o antigo Código de Menores e passa a trabalhar com o adolescente autor de ato infracional através de Medidas Socioeducativas. O ECA explicita quais são as Medidas Socioeducativas (advertência, obrigação de reparar o dano; prestação de serviço à comunidade, liberdade assistida, semi-liberdade e internação), mas, não aponta como estas ações devem ser desenvolvidas. Devem, no entanto, ter por objetivo o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, conforme preconiza a lei. Apesar de ganhar nova conotação, buscando eliminar o caráter estritamente punitivo da legislação, as Medidas Socioeducativas inevitavelmente ainda trazem em si a adequação do adolescente autor de ato infracional ao meio social em que vive. “Um segundo aspecto refere-se à própria nominação – também ambígua – do termo socioeducativo quando associado aos programas de transferência de renda. O termo socioeducativo é o mesmo que rege medidas legais junto aos adolescentes em conflito com a lei. Ressalte-se com esta identificação que o termo é identificado com um contexto que se vincula à noção de problema e de norma. Essa terminologia é construída no campo da normatização.” (Vitalle, 2008) 36 A tentativa de unir o termo educação ao velho termo social traz a idéia de uma educação socializadora para aqueles que dela precisam e assim podemos entender que se trata de uma forma velada de adequação social. Fato é que o termo socioeducativo está banalizado e é utilizado sem ressalvas, como se seu significado já fosse compartilhado por todos. Nos textos que fazem uso do termo socioeducativo na atuação com grupos, socioeducativo não é conceituado, destrinchado; mas utilizado como pressuposto de um entendimento comum. Considerando as polêmicas em questão e após exaustiva pesquisa em busca de conceituar o termo, partiu-se para a pesquisa de campo no intuito de verificar o que os agentes profissionais entendem por socioeducativo e como este acontece em seu cotidiano. Atentando-se para a proposta do grupo focal, onde cartões disparadores com um tema para discussão eram sorteados, chegou inevitavelmente à vez de discutir o tema: ―Socioeducativo é...‖. Ao se deparar com a questão, o grupo fez longo silêncio, os integrantes se entreolharam, um deles começou a assobiar, para fugir da discussão. O silêncio começou a pesar até que uma participante exclamou em alto e bom tom: “Gente é um social educativo! (risos)” O grupo descontraiu, todos riram com a obviedade da colocação da colega. E encorajada por esta, outra participante se manifestou: “Tudo que envolve o educativo e o social é difícil de explicar porque não tem receita, é processo. São relações, interações e não tem receita.” Quando a participante menciona que não há receita, ela faz uma junção em explicitar o que é o socioeducativo com a forma de como este se operacionaliza. Falar de relações, interações, desperta a reflexão sobre a importante participação do Serviço Social no processo de reprodução das relações sociais10: 10 Para CARVALHO e IAMAMOTO a definição de relações sociais compreende: “[...] cabe reafirmar que a reprodução das relações sociais não restringe a reprodução da força viva de trabalho e dos meios objetivos de produção (instrumentos de produção e matérias- primas). A noção de reprodução engloba-os, enquanto elementos substanciais do processo de trabalho, mas também, os ultrapassa. Não se trata apenas da reprodução material no seu sentido amplo, englobando produção, consumo, distribuição e troca de mercadorias. Refere-se à reprodução das forças produtivas e das relações de produção na sua globalidade, envolvendo também a 37 “Assim, a reprodução das relações sociais é a reprodução da totalidade do processo social, a reprodução de determinado modo de vida que envolve o cotidiano da vida em sociedade: o modo de viver e de trabalhar, de forma socialmente determinada, dos indivíduos em sociedade.” (IAMAMOTO & CARVALHO, 2001: 72) Para o Serviço Social o trabalho socioeducativo é uma mediação profissional que tem como pano de fundo a participação no processo de reprodução das relações sociais, sem dúvida, envolvendo o campo minado de forças, como aponta CARVALHO e IAMAMOTO: “Reproduz também, pela mesma atividade, interesses contrapostos que convivem em tensão. Responde tanto a demandas do capital como do trabalho e só pode fortalecer um ou outro pólo pela mediação de seu oposto. Participa tantos dos mecanismos de dominação e exploração como, ao mesmo tempo e pela mesma atividade, da resposta as necessidades de sobrevivência da classe trabalhadora e da reprodução do antagonismo, nesses interesses sociais, reforçando as contradições que constituem o móvel básico da história.” (2001:75) Este movimento revela a totalidade do exercício do trabalho do assistente social que envolve também as atividades socioeducativas. E mesmo que estas atividades sejam realizadas também por outras disciplinas profissionais, como a psicologia, a pedagogia e as ciências sociais, também implicam este caráter de reprodução das relações sociais, principalmente no que tange os trabalhos da política de assistência social, como é o caso do PAIF. Aquecidos pelas colocações anteriores, o grupo focal estabelece uma discussão a respeito do socioeducativo, relatada a seguir: “– Eu penso no grupo, mas eu também penso no individual. Eu penso em todas as possibilidades de intervenção que é reflexivo, que você vai além do que a pessoa está te pedindo. O porquê você está nesta condição? E fazer uma análise de sociedade com ela num atendimento individual, o que é possível. Agora os frutos de um trabalho socioeducativo individual e grupal são diferentes. O grupo ele é muito mais efetivo, proporciona um crescimento das pessoas do reprodução da produção espiritual, isto é, das formas de consciência social jurídicas, religiosas, artísticas ou filosóficas, através das quais se toma consciência das mudanças ocorridas nas condições materiais de produção”. 38 grupo, eu acredito muito mais no grupal do que no individual, mas ele é possível no individual.” “– Eu concordo. Neste sentido, de que o socioeducativo intenciona a sua intervenção, seja no atendimento individual ou de grupo.” “– Tudo é educativo! Ele pode ser educativo para te alienar, te manter onde está ou para provocar transformação.” “– Sim. Para mim todas as ações, intervenções podem ser socioeducativas. Agora quando você fala de função educativa você fala de raiz, como este profissional se reconhece. Você se reconhece como educador? Se você se reconhece como um educador você terá uma função educativa, agora dificilmente quem não se reconhece como educador exercerá uma função educativa. Entende a diferença de socioeducativo para mim? Socioeducativo é a intervenção em si que pode ser individual, pode ser coletivo.” Diante das colocações dos participantes, percebe-se que a nomenclatura educativo, socioeducativo se misturam, tornado-se sinônimos muitas vezes e, referese a um modo de intervenção profissional para estes assistentes sociais. Um deles explicita a necessidade do profissional se reconhecer um educador e menciona que o socioeducativo intenciona a ação profissional. As gestoras entrevistadas também seguiram uma linha de raciocínio parecida em sua explanação, quando questionadas sobre o que é o socioeducativo: “[...] o termo socioeducativo seria ações, estratégias, dinâmicas que você utiliza para desenvolver um trabalho com as famílias de forma participativa, onde as pessoas se sintam não como aquele grupo em que eu vou para ouvir alguém falar, isso é uma palestra, em alguns momento você tem conteúdos e você vai levar os conteúdos. Mas, o socioeducativo ele tem uma das atribuições importante a serem feitas, de você poder proporcionar que as pessoas sintam no grupo como espaço onde elas constroem o conhecimento a partir de coisas que elas têm, potencialidades que elas têm e não onde eu só estou te passando conhecimento. Acho que seria isso.” “Proporcionar a reflexão, por exemplo, da sua vida familiar, a partir desta reflexão as questões que podem ser modificadas, que questões são próprias de mudança de comportamento da própria família, que 39 questões são próprias de uma estrutura que precisa ser apoiada, recursos que essas famílias têm que acessar para anunciar seus acessos de direitos, fortalecimento de repasses financeiros, pensar o quanto as pessoas e famílias, crianças e adolescentes, estão nesta situação por conta de uma estrutura opressora, do quanto você pode transformar estas relações no seu cotidiano, fortalecendo essas pessoas, lutando pelos seus direitos, participando ativamente, sendo propositivos dentro das escolas, tendo uma postura de questionamento: porque que as crianças são ruins? Porque as crianças não querem ir para a escola? É as famílias que são negligentes, entendeu? Eu acho que este é um objetivo importantíssimo, a família entender que ela não é negligente, ela é fruto de um processo de exclusão permanente e, que ela tem sim, uma série de questões de que ela precisa mexer, mas que é próprio do processo que ela esta vivendo.” Também definem o socioeducativo como uma intervenção profissional, uma ação. Entretanto, não se trata de qualquer ação, mas de uma ação crítica, reflexiva e que possa fomentar mudanças, possa ampliar a percepção dos usuários para um entendimento mais totalizante da realidade em que estão inseridos. O usuário tornase, peça fundamental de participação e construção do atendimento qual está inserido, seja grupal ou individual. Trata-se de uma intervenção que é construída com o outro a partir do conhecimento trazido pelo usuário (sua realidade, suas relações, suas estratégias de vida) e do acúmulo do assistente social: “[...]. eu acho que para o Serviço Social principalmente você utiliza de conhecimentos, de educação popular que você tem, da psicologia, em fim, de vários conhecimentos que na nossa formação a gente adquire para poder proporcionar espaços onde o conhecimento seja construído a partir do teu conhecimento e a partir do conhecimento e potencialidades que as pessoas trazem nas suas vivências no dia-adia.” Entende-se que o nome ―socioeducativo‖ foi ganhando peso na tentativa de diferenciá-la da educação formal ou até mesmo da alfabetização para adultos. Tem força de se definir como social antes de mesmo de se definir como educativa para explicitar de ante mão o campo no qual estabelece relação, que é o social. 40 “Eu acho que socioeducativo é conseguir o processo de reflexão, de crítica permanente da pessoa. Por isso que é educativo, mas é social, são pro social, para todos os aspectos que eu quero levar o educativo, outra forma, novas formas de ver e se relacionar para todos os aspectos da vida daquela pessoa. Eu acho que tem essa amplitude o socioeducativo. Talvez deva ter determinações teóricas um pouco mais concreta, eu tô falando um pouco do meu ponto de vista.” Mal sabe a colega que o tema carece e muito de produções teóricas e por este motivo é interessante observar que sua conceituação para esta pesquisa necessitou do processo de investigação de campo, da interação da pesquisadora com os sujeitos pesquisados, para coletivamente construir o que será o socioeducativo. Parece que a unidade teoria-prática prevaleceu neste caminho. Não se quer, todavia, elaborar um conceito que se configure como verdade absoluta e rígida do que é o trabalho socioeducativo. Entendendo também, que cada vez mais se trata de uma atividade interdisciplinar e complexa. O foco desta pesquisa, porém, é buscar no cotidiano o socioeducativo desenvolvido pelos assistentes sociais, é olhar para estas atividades com o olhar do Serviço Social, a luz de suas produções teóricas e de seu projeto ético-político profissional. O momento atual torna esta investigação fundamental dado o advento do SUAS e da abertura de um espaço de trabalho para os assistentes sociais no PAIF. No SUAS o acompanhamento socioeducativo às famílias passa a integrar as ações do assistente social no contexto da política de assistência social nos territórios através do PAIF. Muitas vezes este acompanhamento se refere a ações junto às famílias que não estão cumprindo as condicionalidades dos programas de transferência de renda e/ou famílias que estejam em situações de risco. Em um dos documentos do MDS sobre o desenvolvimento do SUAS 11, a atividade socioeducativa é abordada exclusivamente em grupo e é definida como “No Grupo Socioeducativo (GSE). Enfatiza-se a difusão de informação e a articulação com a comunidade. O GSE trabalha temas básicos e atividades de interesse das famílias promovendo a informação e o empoderamento das famílias para a superação de problemas, bem como mobilizando para ações de interface 11 “Orientações para o acompanhamento das famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família no âmbito do Sistema Único de Assistência Social – SUAS . Versão preliminar.” 41 intersetoriais. Poderá se constituir em um espaço de discussão de potencialidades e projetos das famílias, articulado com o trabalho comunitário. Todas as famílias serão convidadas ao GSE, tendo prioridade aquelas em descumprimento de condicionalidades. A participação não é obrigatória (obrigatório é o cumprimento das condicionalidades). Haverá pelo menos um GSE, em funcionamento contínuo, em cada território, dependendo do número de famílias atendidas.” (2006: 55) Esta definição do trabalho socioeducativo é bastante reducionista. Primeiro porque privilegia apenas a difusão da informação e a articulação com a comunidade como conteúdo do trabalho socioeducativo. Segundo, porque possuí foco no resultado e não no processo, ou seja, no cumprimento das condicionalidades e no empoderamento das famílias. Estes resultados podem ou não acontecer como expressão de um processo marcado por inúmeras mediações. No entanto, o espaço do PAIF configura-se para o assistente social como um espaço privilegiado de ação, inclusive no exercício de atividades socioeducativa e onde novas investigações e propostas metodológicas podem ser feitas. Atualmente, devido ao arraígamento da expressão socioeducativo no cotidiano profissional, é difícil substituir esta expressão por outra. E sendo assim, cabe uma elucidação quanto ao conteúdo da expressão, afinando entendimentos. Em resumo, o socioeducativo se caracteriza como uma intervenção profissional que tem como campo de atuação as relações sociais em seu processo reprodução; trata-se de uma atividade que prioriza o processo coletivo, que pode utilizar-se de metodologias próprias, entretanto, deverá pautar-se fundamentalmente em processos críticos, de reconstrução histórica, prático e participativo; que proponha espaços democráticos, essencialmente abertos e criativos. 42 CAPÍTULO II O PAIF EM SANTO ANDRÉ Localizado na região conhecida como o Grande ABC, região Metropolitana de São Paulo, Santo André é uma cidade que se destaca pelas ações inovadoras na área da assistência social. O Grande ABC é composto por sete municípios sendo Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. A denominação ABC vem pelas iniciais de Santo André, São Bernardo e São Caetano, municípios expressivos na região. Banhada pela represa Billings e pelo rio Tamanduateí, a região possui 814km², sendo metade do território tomado por áreas de mananciais. Na época do Brasil colonial, a região serviu de passagem para as tropas da colônia portuguesa. Posteriormente, seu início é marcado, no século XVI, pelo povoado da Vila de Santo André de Borda do Campo, hoje cidade de Santo André. Muito tempo depois, a região toma destaque como um dos maiores pólos industriais do Brasil, nas décadas de 60 e 70, por abrigar metalúrgicas automobilísticas, o que dinamizou a economia local. O grande número de trabalhadores, impulsionou também os movimentos sindicais que tomaram grandes proporções neste período. Com uma área territorial de 174 Km² e uma população acima de 648 mil habitantes, Santo André possuí sua economia ainda focada na indústria, porém com considerável abertura nas últimas décadas para o setor de serviços. Possuí grande parte do seu território protegido por áreas de mananciais, sendo 56% do território total. A história de Santo André caminha junto à história nacional, ganhando destaque pela economia marcada pela presença crescente no período desenvolvimentista de indústrias na região. A economia local trouxe singularidade para o modo de ser da população andreense, assim como do Grande ABC, com a movimentação dos movimentos sindical nas décadas de 60-70. Essa movimentação trouxe repercussão nacional até os dias atuais como aponta Cywinski: 43 “As histórias da região do ABC e da cidade de Santo André se cruzam e se singularizam pelo desenvolvimento industrial e também pelo papel significativo que tiveram nos últimos 25 anos, o movimento sindical e os movimentos sociais da região, influenciando significativamente nos rumos políticos e sociais do país. Na década de 1980, nas primeiras eleições pós-ditadura, os municípios de Diadema, São Bernardo do Campo e Santo André elegeram prefeitos do Partido dos Trabalhadores. Em 1996, 5 dos 7 municípios do Grande ABC – Santo André, São Bernardo do Campo, Diadema, Mauá e Ribeirão Pires – tinham prefeitos e prefeita do PT. E na década de 2000, por duas vezes – em 2002 e 2006 – Luis Inácio Lula da Silva, ex-líder sindical e um dos fundadores do PT, é eleito presidente da república.” (2007: 58) O primeiro prefeito eleito no município foi do Partido dos Trabalhadores, e influenciado pelo movimento sindical e pelos movimentos sociais, Santo André abre uma militância política e uma característica de gestão pública, marcada principalmente pela gestão do prefeito Celso Daniel, assassinado em 2000. Na década de 1990, o município passa a perder economicamente, espelhado na crise nacional. É neste período que as indústrias fogem da região metropolitana de São Paulo para o interior, além do ―encolhimento‖ da mão de obra devido à reestruturação e modernização tecnológica dos meios produtivos. A situação social se agrava em Santo André, marcada principalmente pelo alto índice de desemprego. Se o ABC se configurava como a ―terra prometida‖ atraindo trabalhadores do Brasil inteiro em busca de bons empregos, essa característica vai pouco a pouco se distanciando da realidade enfrentada pela região. “Segundo dados da Fundação SEADE/1997, 4%, aproximadamente 7.200 famílias de Santo André, configuravam grupos com renda média mensal de 1,65 salários mínimos e com 5,17 membros por família o que apenas lhes permitia uma renda mensal média per capita inferior a 1/3 do salário mínimo, valor insuficiente – segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) – para cobrir as necessidades básicas da vida de uma pessoa. Esse condicionante situa a família em condições de indigência.” (Cywinski, 2007: 64) A autora aponta ainda, que a situação de risco social destas famílias agravouse, uma vez que 1/3 dos membros desses grupos familiares tinham de 0 a 19 anos, 44 além do que, esses grupos familiares encontravam-se em territórios de favelas e nos loteamentos irregulares do município. Os dados estatísticos apontam que os decênios de 90 e 2000 foram marcantes no agravamento da vulnerabilidade social de famílias no município de Santo André, impulsionado entre outros fatores, pelo desemprego em massa. A pesquisa de Cywinski revela que na década de 1990 o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística apontou Santo André com um crescimento abaixo da taxa da região do Grande ABC. Entretanto, dados da prefeitura local, informam que o município “apresentou um padrão de crescimento populacional caracterizado pela perda da população nas áreas mais consolidadas da cidade e ampliação da população nas regiões periféricas.12” (2007: 65) Diante deste contexto, em 1997 o Prefeito Celso Daniel assume a gestão de Santo André e, num conjunto de esforços com as lideranças políticas locais (sociedade civil e poder público), busca a implementação de políticas públicas voltadas para a proteção social, o exercício da cidadania e a inclusão de segmentos populacionais distante do acesso a bens e serviços. Uma importante estratégia de intervenção é o Programa de Renda Mínima de Santo André – Família Cidadã que se discorrerá a seguir. 2.1 – Programa de Renda Mínima de Santo André – Família Cidadã Santo André se apresenta como o segundo município do Brasil a implantar um Programa de Transferência de Renda em 1998 com o Programa de Renda Mínima de Santo André – Família Cidadã (PRMSA-FC), ação inovadora que tinha como proposta o trabalho intersecretarial dentro do território de atuação. Este programa estava vinculado ao Programa de Urbanização Integral de Favelas, configurando ações integradas de cunho intersecretarial em determinado 12 “[ ...] Em 1997, a cidade tinha 138 núcleos de favela, com aproximadamente 120 mil moradores, ou o correspondente a 18,5% da população do município.” (Cywinski, 2007: 65-66) 45 território, ou seja, além da transferência de renda, o programa pautava ações voltadas para a habitação, saúde, educação e desenvolvimento local. “Além da transferência de renda às famílias e do apoio a escolarização dos filhos e adolescentes, o PRM trabalha individual e coletivamente com as famílias, conectando-as a uma série de serviços e oportunidades decorrentes de ações públicas que estariam sob responsabilidade de várias secretarias de governo (Desenvolvimento Econômico e Geração de Renda, Habitação e Desenvolvimento Urbano e Educação, Saúde, Cidadania e Ação Social, Cultura e Participação Social). As ações juntos as famílias seriam desenvolvidas de maneira integrada entre várias áreas da administração e implementadas nos locais/territórios de moradia das famílias.” (Cywinski, 2007: 72) As ações do PRMSA-FC marcam a Política de Assistência Social no município que busca ações intersecretariais e integradas, partindo de um território de ação. O PRMSA-FC partia de um território, onde as ações eram concentradas com vistas a uma mudança significativa. Inicialmente o programa adentrou a favela de Sacadura Cabral, território marcado por vulnerabilidade e risco13, atendendo 105 13 Por vulnerabilidade entende-se“um somatório de situações de precariedade, para além das precárias condições socioeconômicas (como indicadores de renda e escolaridade ruins) presentes em certos setores censitários. São considerados como elementos relevantes no entendimento da privação social aspectos como a composição demográfica das famílias aí residentes, a exposição à situação de riscos variados (como altas incidências de certos agravos à saúde, gravidez precoce, exposição à morte violenta, etc.) precárias condições gerais de vida e outros indicadores”. (Centro de Estudos da Metrópole, 2004:12). Nesse universo entende-se “que a vulnerabilidade implica em susceptibilidade à exploração; restrição à liberdade; redução da autonomia e da autodeterminação; redução de capacidades; fragilização de laços de convivência; ruptura de vínculos e outras tantas situações que aumentam a probabilidade de um resultado negativo na presença de risco”. (Yazbek, 2008) A noção de risco ganha particular relevância no pensamento europeu, no contexto de mundialização de economia que traz consigo a globalização do risco societal “que se associa a um aumento da pobreza e das desigualdades sociais pela emergência ou amplificação de situações de risco social, através de processos por vezes muito complexos de ruptura dos equilíbrios sociais à escala local. O desemprego cíclico, os empregos precários e mal pagos, a insegurança social, a informalização do mercado de trabalho, o trabalho infantil, a sob exploração das mulheres e dos idosos, as várias discriminações do trabalho, as migrações forçadas de famílias à procura de ocupação, a marginalização dos pobres e dos que sofrem incapacidade para trabalhar, a criminalização da droga, da miséria e da revolta, o renascimento dos racismos e da intolerância são apenas 46 famílias daquele núcleo. Pouco a pouco o PRMSA-FC foi se ampliando chegando a atender 1000 famílias em alguns territórios demarcados. “Inicialmente, a gente já tinha uma experiência em Santo André de trabalho com famílias a partir do Renda Mínima. Tínhamos uma experiência que inclusive foi acompanhada pela equipe do IEE, na época em que Mercedes Cywinski era secretária. Onde a gente situava um trabalho de acompanhamento familiar dentro dos núcleos onde estava o projeto Santo André Mais Igual, com 1000 famílias que estavam incluídas nos programas de transferência de renda era feito o trabalho de acompanhamento familiar. Então, esta foi a experiência inicial do trabalho com famílias aqui na cidade de Santo André. Nós vínhamos atuando com este programa na medida em que entravamos nos núcleos habitacionais e era uma ação integrada com outras secretarias, ela tinha esta lógica da intersetorialidade, e as nossas equipes, elas trabalhavam em duplas com estagiários no acompanhamento de famílias.” – Gestora 1 da Secretaria de Inclusão Social de Santo André. Em 2005 inicia-se o processo de implementação do SUAS em todo o Brasil. Este processo trouxe mudanças significativas na política de assistência social dos municípios, tanto na quantidade de beneficiários quanto na padronização dos serviços. Assim nos relata a gestora entrevistada: “[...]. esta experiência de acompanhamento familiar a partir de 1000 famílias, a partir de um lugar fechado, ele acabou se desconstruindo, porque aí nós passamos a atender as famílias na cidade toda, nossa meta era universalizar para o conjunto de família que tivesse no corte do instituto PNAD e aí a gente começou a se perguntar como é que nós vamos fazer o acompanhamento familiar, ele vai ser dentro, então, dos territórios, na lógica já dos CRAS.” (Gestora 1) A lógica a ser seguida preconizada pelo Governo Federal era de acompanhamento as famílias a partir dos CRAS através do PAIF, programa qual concentra a observação desta pesquisa. 2.2 – Programa de Atenção Integral a Família – PAIF Santo André alguns dos Sinai .do sistema econômico em que vivemos, o capitalismo globalizado.” Carapinheiro,2002:13) (Hespanha e 47 O Programa de Atenção Integral a Família – PAIF é o principal serviço de Proteção Social Básica14, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social – SUAS e foi criado em 18 de abril de 2004 (Portaria nº 78) pelo Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome – MDS como uma reconfiguração do Plano Nacional de Atendimento Integrado à Família (PNAIF) implantado no ano anterior. Tornou-se ação continuada da assistência social, passando a integrar a rede de serviços financiada pelo Governo Federal (conforme Decreto 5.085/2004). Dentro da proposta do SUAS, o espaço para o desenvolvimento do PAIF são os CRAS – Centro de Referência de Assistência Social, um serviço de assistência social descentralizado, caracterizado como porta de entrada para a Proteção Social Básica em regiões de alta vulnerabilidade social e risco, referenciando cerca de 5 mil famílias por região. Nestes moldes, o PAIF absorve pressupostos do SUAS em sua execução e desenvolvimento, dos quais se destacam a matricialidade sociofamiliar e a territorialização. Como matricialidade sociofamiliar compreende a ação voltada para a família, não no sentido de responsabilizá-la por sua situação de vulnerabilidade negando assim a ação do Estado, mas compreendendo-a como um núcleo social básico de acolhida, convívio, autonomia, sustentabilidade e protagonismo social. Preconiza a defesa do direito à convivência familiar, na proteção de assistência social, superando o conceito de família como unidade econômica, mera referência de cálculo de rendimento per capita e a entendendo como núcleo afetivo, vinculado por laços consangüíneos, de aliança ou afinidade, que circunscrevem obrigações recíprocas e mútuas, organizadas em torno de relações de geração e de gênero. Desta forma, a concepção do PAIF objetiva retomar a família – entendida e acolhida em seus mais diferentes arranjos - como unidade básica de possibilidades de superação de vulnerabilidades sociais, a todos os seus demandantes, de variados níveis de proteção social. 14 Segundo a Política Nacional de Assistência Social – PNAS, a proteção social básica tem por objetivos prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza ou privação, como a ausência de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos, dentre outros e, ou, fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de pertencimento social, como discriminações etárias, étnicas, de gênero, por deficiências, dentre outras. PNAS2004. 48 Já o princípio da territorialização significa o reconhecimento da presença de múltiplos fatores sociais e econômicos no território em que esta família está inserida, e, que a levam a uma situação de vulnerabilidade, risco pessoal e social. Mais que um espaço geográfico, no território estão impressos as relações, a dinâmica, a cultura, o modo de ser, os conflitos, as disputas dos indivíduos e famílias. Não se trata de um conceito a mais, mas de conhecer o território e seus movimentos multifacetados no cotidiano, no desenvolvimento do serviço público. Do ponto de vista da gestão, a territorialização busca eliminar fragmentações e pulverizações dos serviços, tornando-se um importante instrumento. Os princípios de matricialidade sociofamiliar e território, entre outros, moldam a atuação do PAIF nos CRAS, programa este de conteúdo substancial da Política Nacional de Assistência Social. De acordo com o Guia CRAS15, são pautadas algumas diretrizes metodológicas para a execução e desenvolvimento do PAIF, tais quais: 1. Articular o conhecimento da realidade das famílias com o planejamento do trabalho; 2. Potencializar a rede de serviços e o acesso aos direitos; 3. Valorizar as famílias em sua diversidade, valores, cultura, com sua história, trajetórias, problemas, demandas e potencialidades; 4. Potencializar a função de proteção e de socialização da família e da comunidade; 5. Adotar metodologias participativas e dialógicas de trabalho com as famílias; Seguindo estas diretrizes, cada município elabora suas estratégias de atendimento de acordo com as particularidades dadas pela realidade regional. Todos os municípios brasileiros receberam tais orientações, além de formações e capacitações de gestores para a implementação da Proteção Social Básica e do PAIF. Cabe ainda destacar, que o SUAS preconiza uma equipe mínima 16 para atuar junto aos CRAS no desenvolvimento do PAIF que conta de forma imprescindível 15 Documento elaborado pelo MDS para orientar a implantação da Proteção Social Básica nos municípios. 49 com assistentes sociais. Este novo espaço de trabalho que surge para a categoria, impulsiona a uma reflexão sobre a atuação dos assistentes sociais e, de acordo com suas diretrizes, o PAIF torna-se um campo privilegiado de atuação profissional. Outro dado importante é a alteração na dinâmica que o SUAS trouxe para a política de assistência social dos municípios, como relata a gestora de Santo André: ―Na época da implantação do PAIF em Santo André, nós, então, vivíamos naquele momento, uma situação de ampliação – e acho que isso não foi só em Santo André, mas a nível nacional – nós tínhamos um momento de ampliação dos programas de transferência de renda de forma significativa e nós passamos de 1000 famílias que a gente acompanhava, para cerca de 18.000 famílias.‖ (Gestora um) Trata se de uma ampliação em 18 vezes o número de beneficiários dos programas de transferência de renda em Santo André o que é muito significativo. Apesar do Governo Federal, encaminhar o cartão magnético diretamente para a casa do usuário; é o município quem tem que cadastrar os usuários, acompanhar o cumprimento das condicionalidades pelas famílias, além de elaborar proposta de acompanhamento sistemático de casos específicos, referenciando estas famílias aos CRAS. Todo este trabalho implica uma logística muito grande que requer um número suficiente de profissionais, além de espaço e recursos materiais. No entanto, Santo André, assim como outros municípios enfrenta dificuldade para a contratação de pessoal com o recurso repassado pelo Governo Federal, o que causa inevitavelmente impactos no trabalho desenvolvido. “Num primeiro momento, financeiramente, utilizar o recurso do PAIF tinha uma série de limitações e entre essas, a principal – e acho que isso é um desafio – a questão de não contratar equipe técnica usando recurso federal. Isso daria um gasto a todos os municípios, eu acredito, porque você passava a ter um subsídio de co-financiamento para ampliar as equipes técnicas. Então, nós pensamos que se de um 16 De acordo com a Norma Operacional do SUAS – NOB RH (2006) a composição e equipe mínima de referencia no CRAS é : Município Pequeno Porte I Famílias Referenciadas Até 2.500 Pequeno Porte II Até 3.500 Médio e Grande Porte, Metrópoles e DF Até 5.000 Técnicos de Nível Superior 2 (um assistente social e um psicólogo) 3 (dois assistentes sociais e um psicólogo) 4 (dois assistentes sociais e dois psicólogo) Técnicos de Nível Médio 2 3 4 50 lado a gente não tinha como montar tantos CRAS quantos necessários na cidade e contratar quantas equipes fixas fossem necessárias, por outro lado nós entendíamos que este recurso podia potencializar um trabalho com famílias nestas regiões.” (Gestora 1) Com o objetivo de resolver este impasse, a secretaria assume o modelo de co-gestão no município, em que é estabelecido uma parceria com Organizações Não Governamentais – ONGs para a contratação de profissionais e execução do serviço: “[...] em cada CRAS tem servidor direto da prefeitura e equipe contratada pela organização parceira e com uma direção que quem dá a coordenação, quem define as diretrizes deste trabalho é sempre necessariamente os servidores. Então, em tudo a gente está mais na frente pra definir, decidir sempre com os servidores que a gente considera os gestores do serviço e a equipe contratada vai acompanhar, vai executando também. Mas, para não perder o foco mesmo, o servidor que está lá no CRAS não perder o foco de que a ação é responsabilidade nossa, de que aquela porta aberta é uma responsabilidade pública municipal. Isso exige um jogo de cintura.” (Gestora 2) Evidente que este arranjo traz conflitos, principalmente na construção da identidade do serviço ofertado, já que nem sempre ONG e poder público possuem os mesmos princípios e valores. Além disso, a PNAS preconiza que o serviço seja ―público estatal‖ e diante de uma co-gestão este principio pode ficar ameaçado. Os CRAS e o PAIF são serviços da Secretaria de Inclusão Social que tem o Departamento de Assistência Social – DAS, que conta com as equipes de Proteção Social Básica e Proteção Social Especial, além do programa Santo André Mais Igual. No Setor de Proteção Social Básica está a coordenação dos CRAS no município, bem como, de todas as ações e serviços da proteção social básica. Atualmente o município conta com 4 CRAS nas áreas de maior vulnerabilidade sendo: CRAS Centro, responsável também pelo cadastramento das famílias nos Programas de Transferência de Renda; CRAS Cidade São Jorge; CRAS Vila Luzita; CRAS Recreio da Borda do Campo. 51 Estão envolvidos no trabalho 16 assistentes sociais entre concursados e contratados pelas ONGs, na ocasião da pesquisa. A seguir, a gestora relata como está a estrutura do PAIF em Santo André: “Como é que a gente vem trabalhando na lógica do PAIF? Nós temos uma equipe de acolhida, esta equipe tem sido a responsável também por fazer toda a relação com o território, o diagnóstico, a mapeação. A gente tem conseguido trabalhar, não ainda de uma forma ideal, mas estamos avançados, na articulação dos atores, desde as organizações não governamentais como governamentais, uma equipe local que tem realizado encontros mensais. E com as famílias a gente vem atuando, principalmente as atividades do PAIF, elas foram ficando no primeiro momento da entrada da equipe fixa no CRAS e, do referenciamento das famílias. Nós priorizamos fazer um caminho que naquele momento a gente achava importantíssimo, mas que por um lado ele foi um desafio para as nossas equipes que era de priorizar o referenciamento nos CRAS das famílias em situação de risco, entendendo que as famílias em situação de risco precisavam estar acompanhadas pelo CREAS dentro das especificidades de risco, mas que elas moram no território e seria importante que elas ali no território tivessem um apoio, um fortalecimento dos seus acessos, principalmente no envolvimento das atividades socioeducativas, essa foi a forma como a gente foi conduzindo. Ao fazer isso, levou para a equipe dos CRAS um momento de muita dificuldade porque de repente eles se viram com situações de muita complexidade, e aí a gente precisou inclusive de um processo de reavaliar... peraí, né!? Nós não queremos que a equipe do CRAS se debruce sobre as especificidades porque isso continua no CREAS, mas isso mexeu com a equipe, porque a equipe de repente teve que lidar com algumas situações que eles até então, não vivenciavam em sua rotina cotidiana, de alguns riscos que apareciam.” Pelo fato de Santo André possuir uma história na assistência social marcada por ações intersecretariais e integradas, o PAIF já em seu início tem uma equipe territorial do Programa Santo André Mais Igual17 que conta com representantes de 17 Segundo a Prefeitura de Santo André “o Programa Santo André Mais Igual consiste na aplicação conjunta e simultânea, num mesmo território da cidade, de 19 programas sociais voltados à inclusão social, os quais são gerenciados de forma descentralizada e participativa, favorecendo a complementaridade das ações e permitindo 52 outras pastas, como saúde, educação, habitação, para discutir e encaminhar questões locais. Este aspecto é um avanço, comparando a outros municípios que primeiro concentram esforços no atendimento dos CRAS para então inserir ações em rede e, que muitas vezes tem grande dificuldade de contar com representantes de o próprio poder público. Um aspecto bastante ousado desta gestão é a opção de atender nos CRAS, através dos grupos socioeducativos, prioritariamente as famílias em condição de risco acompanhadas pelo CREAS. Um dado de realidade que pouco a pouco vem se manifestando é que Proteção Social Básica e Proteção Social Especial não são separadas sistematicamente no cotidiano das famílias atendidas e nos territórios de atuação. Então naquele momento, a equipe entendeu que apesar da família ser acompanhada pelo CREAS, ela estava referenciada pelo CRAS em seu local de moradia e necessitava deste suporte local. Este caminho trouxe aos profissionais muita angústia e um questionamento do seu papel enquanto CRAS, como se segue no diálogo do grupo focal: “ – Essa discussão de CRAS e CREAS precisa acontecer. Aumentar a equipe do CREAS é urgente porque a gente que é CRAS é porta aberta e você pega todo o tipo de demanda, muitas situações de violação de direito. Estamos atendendo as demandas do CREAS também. É arriscar demais a equipe que está no território, o trabalho que vem acontecendo lá, porque são situações de risco, violência, ameaça de morte. E a equipe fica lá...” “ – É que a nossa origem de CRAS a gente começou atendendo famílias em risco. Mesmo que não fosse, o serviço é porta aberta, mas começamos assim. “ – Mas, neste processo a gente vem aprendendo muito. O que ficou escancarado para mim numa capacitação: „vocês são centro de REFERÊNCIA, não são centro de ATENDIMENTO‟. Isso mudou muito para mim, compreender melhor. E é um processo que está em construção mesmo. A gente tem que ter a santa paciência.” um diagnóstico mais preciso e uma leitura mais global das famílias atendidas, de forma a alcançar uma maior eficácia e efetividade no conjunto das políticas desenvolvidas visando alavancar um padrão de inclusão digno para essas comunidades.” 53 Há uma especificidade para o atendimento de risco e violência. A preocupação da profissional aponta para o CRAS como um serviço que está no território e que os profissionais se tornam inevitavelmente conhecidos da comunidade. Se há uma situação de ameaça de morte e a família busca acolhida no CRAS, a comunidade possivelmente saberá que ela foi atendida por aquela equipe de referencia e, desta forma, é o profissional quem fica em situação vulnerável no território. Outra questão que se levanta é a respeito da especificidade do atendimento do assistente social nos CRAS. Se a história ―condenava‖ o profissional a ações assistencialistas como a distribuição de cestas básicas, remédios, hortenses e próteses; com a implementação do SUAS estas ações se tornam cada vez mais pontuais ou inexistentes. Uma hipótese para tal fenômeno é a ampliação dos Programas de Transferência de Renda em nível nacional. Entretanto, existem novas ações a serem realizadas como o atendimento as violências, violações de direito, situações de risco que exigem do profissional um olhar e uma atuação voltados para estas questões, o que pode mexer inclusive com a formação do assistente social: “[...] eu acho que também a gente não pode no trabalho do dia-a-dia dos CRAS e do PAIF ficar muito preocupada em ter uma formação (especifica) porque, não sei se é por conta da nossa realidade, o fato é que começar com grupos de risco levou a uma angústia das equipes que todo mundo tinha que ter formação para trabalhar... eu tenho, então, que ter grupos de trabalho terapêutico, por exemplo, então, é algo assim de buscar, de fortalecer a formação de nossas equipes no trabalho de acompanhamento familiar. Mas, eu acho que a nossa formação já nos proporciona espaços de reflexão e de troca e de construção do conhecimento, e só isso, se a gente fizer um trabalho integrado aos grupos, não de superioridade, de quem olha de cima, mas de quem está junto com aquele grupo e que acredita que aquele grupo tem uma potencialidade, que acredita...porque eu acho que a gente tem alguns pré julgamentos : “ah! “essas mães que tem os filhos na rua são mães que não querem participar do grupo” ou “são mães que não vão achar saída para estas situações” né? E quando você começa a vivenciar uma experiência com estas famílias, você observar que tem muitas potencialidades adormecidas.”(Gestora 1) 54 De fato a profissão tem um novo cenário que exige a construção de novas respostas. O SUAS passa a ser operacionalizado e o contato eminente com a realidade traz descobertas e desafios, anteriormente inimagináveis. Todavia, o que se aponta cotidianamente é a urgência dos assistentes sociais romperem com o tradicionalismo, criando um caráter investigativo em sua ação, distanciando-se de respostas prontas ou conhecidas e receitas interventivas. “Eu acho que o PAIF ele tem uma potencialidade muito forte de que se você estiver despojada e romper com o tradicional. Se você ficar a tarde toda dentro do CRAS, esperando que a família venha, atendimento individual... Eu acho que a gente ainda, neste momento, não sei ainda dimensionar qual é, mas ainda tem um conflito, você fica nos CRAS, você espera as pessoas vir te procurar ou você entra no território e começa a atuar lá dentro, ver onde as pessoas estão, reconhecendo seus espaços, reconhecendo suas potencialidades?” (Gestora 1) Configurar-se como um serviço de porta aberta emerge uma polêmica ainda não solucionada na política de Assistência Social: o CRAS nos remete a um Plantão Social dos tempos de outrora? A PNAS preconiza que o Plantão Social fique no CREAS como Proteção Social Especial, entretanto, quando surgir um caso de risco no CRAS de uma família já referenciada, este não deve atender? E se atender, como resguardar a equipe local? O caminho que se aponta é de construção, entendendo a realidade de cada município. Entretanto, para o Serviço Social, aponta-se um momento de se aprofundar em questões que anteriormente eram consideradas específicas de alguns assistentes sociais apenas. A violência, o risco social e a violação de direitos fazem parte do dia a dia dos CRAS e se faz necessário o entendimento destas questões que muitas vezes ficavam num segundo plano profissional, já que as condições objetivas e materiais das famílias eram as que tomavam grande parte do atendimento. Hoje, a ampliação dos Programas de Transferência de Renda – PTR dinamizou os territórios ampliando o leque de demanda dos CRAS. Instala-se uma nova cultura, onde a família já não questiona mais a cesta básica, mas busca informações de como se inserir nos PTR e faz parte do atendimento do CRAS colocar estes programas na ótica do direito e da cidadania. 55 Por não se tratar de uma política universal, é evidente que os profissionais ainda se deparam com situações degradantes, onde a necessidade financeira e material é urgente. Todavia, este cenário vem mudando pouco a pouco, abrindo espaço para novas demandas. Apesar de em sua fala a gestora considerar que todo o assistente social pela sua formação possui condições de proporcionar espaços reflexivos e de construção do conhecimento junto com as famílias, é interessante observar as condições objetivas que os profissionais têm para tanto, inclusive questionando como esta abordagem pode ser feita no território, com a atuação fundamental da equipe do CREAS e resguardo da equipe local. Também cabe questionar a demanda imposta ao CRAS que vem de outras instâncias governamentais e que diante de uma equipe reduzida, impõem dificuldades para a realização de um trabalho continuado: ― – Nós trabalhamos com a bola da vez. Por exemplo: a bola da vez agora é o Pró-Jovem, pára tudo e vamos fazer todos os cadastros do Pró-Jovem. Não tem continuidade...” “ – A gente pouco discute e pouco planeja, é tudo no emergencial, mesmo. O que eu vejo é isso, é pouco conversando e as atividades acabam sendo individualizadas, mesmo.” “ – Não há trabalho periódico. Não é um trabalho que tem metodologia, que é sistematizado. São trabalhos pontuais, uma coisa contínua não tem.” Romper com o tradicional no serviço dos CRAS impõe aos profissionais uma atuação crítica, reflexiva, de construção em parceria com o usuário de espaços de participação e de alternativas, mas, impõe também um novo modelo de gestão que abra espaço para um trabalho planejado, sistematizado e avaliado continuamente, com equipes suficientes para a realização do trabalho e que paute momentos de supervisão e de formação, respaldando assim, o trabalho de campo. “Esse encontro mensal que a gente faz é nosso, gestão com a equipe, é mais para garantir planejamento do trabalho, não deixa de ser uma capacitação. Mas, este outro, mais formal é com a Profª. Mercedes, são seis meses de supervisão e capacitação que ela está concluindo agora em outubro. Esta sim tem a característica de capacitação e ela é muito legal. Vale a pena investir em trazer uma pessoa, no nosso caso a Mercedes tem sido excelente, mas, uma pessoa para ajudar as equipes a fazer esta reflexão, para refletir 56 sobre o trabalho. Mesmo que a gente pare para ler um texto, ter uma pessoa com este objetivo especifico é diferente, é um investimento que vale a pena.”(Gestora 2) Construir espaços de capacitação, supervisão e planejamento levanta a perspectiva de romper com a ótica do imediatismo e obter um elo entre trabalho de campo e gestão, com seus avanços e especificidades, garantindo condições de trabalho compatíveis com os objetivos a serem perseguidos pelas equipes. Evidente que estas dificuldades não são exclusivas de Santo André, mas revela um momento nacional da política de assistência social. Atualmente o PAIF em Santo André está concentrando esforços em ações coletivas, em formar grupos socioeducativos: ―E um passo que a gente está agora com mais dedicação são as questões mais grupais, mais de fortalecimento destas famílias não só no atendimento individual, na liberação de benefícios, na inserção de programas, mas o que o PAIF propõe como diretriz maior: as atividades grupais, proporcionar uma convivência mais grupal e comunitária...” (Gestora 2) Todos os CRAS do município estão organizando os grupos socioeducativos, além disso, contam com o programa Pró-Jovem Adolescente, a acolhida – o atendimento individual ou grupal para orientação, encaminhamentos e contra-referência; porta de entrada para o contra turno escolar do município (as inscrições e triagem para vagas são realizadas nos CRAS) e oficinas para a comunidade com o objetivo de geração de renda. “Nós temos pouco tempo de trabalho, nós fizemos sim o exercício de ir para o trabalho coletivo, os grupos socioeducativos e nós estamos até com formação voltado para este tema. Só que tem diversas coisas no meio do caminho, estamos com uma equipe super reduzida. A gente tem feito este trabalho de rede, claro que precisa avançar, precisa ampliar, mas já fizemos reuniões com a saúde, com a educação.” (participante Grupo Focal) Não se pode negar o esforço do município para a implementação do SUAS, na busca constante de responder demandas, avançar na proposta da PNAS e superar as dificuldades objetivas. 57 Um sujeito fundamental neste processo, mesmo que a distância, é o MDS com publicações, orientações e capacitações para os municípios: “Nós estamos num momento usando como referência muito fortemente a Política de Assistência Social, o SUAS, a forma como está organizado, o porquê da centralidade na família, o porquê da importância do território, o porquê da importância da análise das informações, dos dados de realidade daquela região, quais são as situações de risco, formas de buscar conhecimento com as outras secretarias.” (Gestora 1) “A gente tem pegado mais textos do próprio governo federal que vem falando do SUAS, sobre o PAIF, sobre os CRAS. Recentemente a gente retomou, até como processo de construção mesmo, o texto sobre o PAIF. Porque a gente começou a avaliar: Tudo bem, nós avançamos várias ações, mas é isso, a gente avança, avança, avança, mas a demanda... A porta aberta na comunidade trás tantas demandas que espera aí, vamos retomar aqui quais são as diretrizes maiores que a gente quer perseguir com este trabalho. Tem uma porta aberta, tem um público que demanda o tempo todo, mas tem diretrizes que eu também quero imprimir neste trabalho. Então, é um texto sobre o PAIF... de vez em quando a gente vai lá à NOB-RH, NOB-SUAS, até porque o governo federal tem produzido textos de muita qualidade, qualidade técnica, de escrita, os documentos do SUAS, NOB-RH, sobre o PAIF, outros assuntos, é legal. É uma produção muito legal, nunca o governo federal produziu tantos textos com tanto peso, tanta qualidade que te ajude a refletir e num curto espaço de tempo. Então, o que a gente mais tem utilizado de material teórico são os textos do governo federal. “ (Gestora 2) O material desenvolvido pelo MDS é rico e aponta diretrizes para o trabalho. Entretanto, trata os temas de forma conceitual e genérica, até porque a realidade do Brasil é bastante diversa e cada região possui suas particularidades que surgirão, evidentemente, no trabalho. Os municípios também possuem responsabilidade crítica diante do material ofertado; de munir o MDS com uma análise crítica da realidade em que vivem, aprofundando pontos que são discorridos genericamente e que só obtêm sentido quando entrecruzados com vidas, territórios e relações. Outro ponto, refere-se ao papel profissional do Serviço Social e da Psicologia nestes espaços, o conhecimento competente de sua área de atuação é 58 elemento fundamental para que a discussão interdisciplinar ocorra. Neste sentido, a evolução da política de assistência social nos aponta um cenário complexo que exige formação profissional continuada e um movimento incessante em busca da unidade teoria e prática. Todavia, estes profissionais observam este momento com bastante otimismo: “A minha leitura é que enquanto profissional de Serviço Social a gente está vivendo um momento áureo, para a assistência social um momento histórico. Como a gente viveu momentos no Serviço Social, acho que estamos vivendo um agora. Daqui há 10, 20 anos é que a gente vai dizer o quanto este momento é promissor e está marcando a história do Serviço Social. É de fato implementado os serviços como política, conhecidos e implementados. Vai demorar ainda um tempo, mas de fato a profissão ganha, os profissionais, ganham , o publico à que ela se destina ganha e este momento para mim, vai ficar como um momento histórico. É o Serviço Social antes do SUAS /PAIF e o Serviço Social pós este momento.” (Gestora 2) Este é o momento em que a ―prima pobre‖ da seguridade social assume as rédeas na construção de uma nova história, marcada pelo embate político e pelo enfrentamento de reais dificuldades. Um novo momento para a assistência social se aponta, entrecruzando num momento impar para o Serviço Social que é desafiado a ir além do assistencialismo, construindo uma nova forma de ser e uma nova cultura para a profissão. 59 CAPÍTULO III FUNÇÃO EDUCATIVA DO SERVIÇO SOCIAL: ESPAÇO DE EDUCAR-A-AÇÃO “Estar vivo é estar em conflito permanente, produzindo dúvidas, certezas questionáveis. Estar vivo é assumir a educação do sonho do cotidiano. Para permanecer vivo, educando a paixão, desejos de vida e morte, é preciso educar o medo e a coragem.” Madalena Freire Durante o caminho desta pesquisa, muitas foram as dúvidas, inquietações e questionamentos. O que se iniciou como certeza, pouco a pouco foi se desconstruindo, tornando-se poeira e dúvida e o que iniciou nebuloso e obscuro, devagar foi tomando tônus de lucidez. Para o grupo focal a discussão sobre a função educativa do Serviço Social foi polêmica e enriquecida do debate. Observa-se que o tema apesar de aparentar ter entendimento tácito, no decorrer do diálogo as diferenças foram emergindo. Parecia se tratar do ―calcanhar de Aquiles‖ para o Serviço Social, como um aspecto da profissão que implica processos e desdobramentos: “É uma das funções da profissão mais difícil, porque compreende um processo. Eu entendo que esta função equivale ao projeto éticopolítico profissional... é difícil porque precisa caminhar junto com o projeto ético político da profissão que é tratar da questão social mesmo. Então, como tratar com a população que a gente atende que, tem uma visão tão complicada – todos nós temos – por causa da mídia e uma série de coisas e, vem sempre com uma questão mais emergencial, são famílias de baixa renda. Então, é uma questão difícil compreender o porquê está nesta situação. Eu coloco a questão educativa nesta dimensão, eu não vejo só como uma questão de organização da população, atividades, ajuda individual ou em grupo, não é só isso, se reportando ao nosso projeto eu vejo algo a mais a ser contemplado.” (Participante Grupo Focal) 60 Nesta colocação, a profissional faz referência à cultura dominante que busca suas formas de hegemonia através da mídia e de seus intelectuais; cultura esta da qual todos nós sofremos alguma influência inevitavelmente. Aponta o projeto ético-político profissional como uma diretriz mestra para a manifestação desta dimensão educativa e, sendo assim, coloca a função educativa para além da ajuda individual e coletiva. Retomando Abreu, observamos que as pedagogias, trabalhadas e detalhadas no primeiro capítulo desta dissertação, são categorias históricas para análise da cultura e da função educativa do Serviço Social. Entretanto, nas últimas décadas, estas pedagogias vêm se metamorfoseando, sofrendo significativas alterações que afetam a vida produtiva e a sociedade capitalista como um todo. Em especial, a pedagogia da ajuda e da participação, pedagogias estas envolvidas com o movimento de hegemonia da classe dominante, foram influenciadas pelo projeto neoliberal, sustentado como solução para a crise do capital: “As bases sócio-históricas da função pedagógica do assistente social na sociedade brasileira vêm sendo tensionadas, a partir dos anos 90, pelas estratégias político culturais acionadas pelas classes fundamentais na luta pela hegemonia no país – luta esta travada nos marcos da crise estrutural do sistema capitalista, instaurada nas três últimas décadas deste século. O entendimento de fundo é que a referida crise traduz o esgotamento em termos mundiais do padrão fordista/keynesiano de produção e regulação estatal – isto é, do padrão societário instaurado sob o chamado Estado de Bem – Estar – cujas saídas profundamente neoliberais o forjadas ordenamento pelo capitalista capital, inflexionam mundial, mediante alterações na divisão internacional do trabalho, na configuração dos Estados nacionais, nos processos produtivos e de trabalho, no mercado, no consumo, nas relações entre classes sociais e entre estas o Estado e o mercado, ou seja, no conjunto da vida social em todo mundo e em cada formação particular. Essas alterações colocam a necessidade do estabelecimento de um novo equilíbrio de forças, sob hegemonia de certas classes, em que se insere a organização/reorganização da cultura, a partir de determinado princípio educativo.”(ABREU, 2002:163) 61 Com a crise do padrão fordista/keynesiano, na busca de artimanhas mais sutis, o toyotismo18 toma espaço nos meios de produção e na organização político cultural. O toyotismo acumula técnicas diferenciadas para a gestão da força de trabalho e organização da produção pautadas nos programas de controle de qualidade, na participação do trabalhador como responsável pelo sucesso / insucesso da empresa, na flexibilização dos contratos de trabalho. Toda esta tecnologia faz parte de uma ampla reestruturação produtiva, tecnológica e política, segundo Abreu. Neste caminho de análise, retomando a fala da assistente social, participante do grupo focal que, menciona a função educativa como ―uma das funções da profissão mais difíceis, porque compreende um processo” e porque a população atendida chega com ―uma visão tão complicada – todos nós temos – por causa da mídia e uma série de coisas‖, pode-se entender que esta visão ―complicada‖ está relacionada com a crise cultural qual vivemos na sociedade atual, marcada pelos desdobramentos da crise do capital. “[...] sem ainda a consolidação de um novo equilíbrio de forças, ou seja, de um novo compromisso social, base de uma nova cultura – nova sociabilidade – instaura-se então, hoje, uma crise cultural. Para Bihr (1998:163), a crise cultural traduz-se na „crise do sentido‟, ou seja, revela-se na „incapacidade própria das sociedades capitalistas desenvolvidas, de propor/impor a seus membros uma ordem significante‟. A saber, um conjunto de referências estável e coerente, no qual e pelo qual eles possam ao mesmo tempo construir sua identidade, comunicar-se e participar da práxis social, em síntese, dar sentido à sua existência tanto individual quanto coletiva.” (ABREU 2002:170) Pelos moldes que se compactua a sociedade atual, há uma busca de sentido à vida cotidiana. O individualismo e o consumismo, valores soberanos das classes dominantes, são pouco a pouco esvaziados de sentido e questionados por parte da população. O forte consumismo, com o acirramento da pobreza e da desigualdade, é inviabilizado financeiramente por grande parte da população que não tem acesso a bens e serviços. O individualismo vem sendo questionado por valores como solidariedade e ajuda mútua. Desta forma, fica instaurada uma crise cultural do 18 Processos de produção inspirados nas experiências da fábrica japonesa Toyota. 62 sentido e do significado para os membros da sociedade atual e, com o acirramento do neoliberalismo, aponta-se para um novo ordenamento dessa cultura, tendo “como princípio educativo fundante, a obtenção de um „novo‟ conformismo em que as estratégias participacionistas no âmbito da produção e da reprodução social e o movimento de autonomação/ auto-ativação do processo produtivo e individualização das relações de trabalho constituem os vetores principais‖(ABREU, 2002:175). Trata-se da ideologia... “[...] do colaboracionismo e cooperação entre classes fundada na retórica da superação dos antagonismos entre capital e trabalho – base do estabelecimento de novas relações sociais. Restaura-se o mercado como instância mediadora societal insuperável e instaura-se a tese do Estado mínimo como única alternativa e forma para a democracia (Netto,1993), ao mesmo tempo em que a ordem do capital é apontada como único horizonte societário e a tecnologia como sujeito privilegiado da história.” (ABREU, 2002:175) E seguindo a análise, a profissional diz: “É difícil (para o usuário) compreender o porquê está nesta situação (de vulnerabilidade)”. Aqui se questiona até que ponto os usuários que chegam aos assistentes sociais querem saber o porquê enfrentam tal situação? E se pensarmos na crise cultural mencionada e na inflexão para um novo ordenamento cultural, pautado também no modo de produção toyotista, em que se imprime nos membros da sociedade o peso da responsabilidade pelos sucessos e fracassos (individuais e coletivos), tanto usuário como profissional são influenciados de alguma forma por este movimento e, inevitavelmente, se responsabilizam por este processo. Um se responsabiliza por se encontrar em situação de miserabilidade, outro por não obter solução concreta e imediata para esta questão. Neste caminho, outra participante faz sua intervenção no grupo focal: “É uma das funções mais importantes da profissão, mas essa função socioeducativa dentro da assistência social é bastante difícil, pelo menos é o que eu sinto hoje em relação à implantação do SUAS e dos CRAS e, até mesmo pela necessidade das famílias que chegam e toda a limitação que nós temos. A questão educativa fica num segundo plano, nós temos um objetivo, mas e a família que chega? Mas, é uma função importantíssima que a gente não pode jamais perder.” 63 Esta profissional também traz um conteúdo de dificuldade e limitação no exercício da função educativa do assistente social, no entanto a considera de extrema importância. Interessante contrapor a fala destas duas profissionais com a fala da gestora do programa, verificando as diferentes expectativas impressas no discurso. As técnicas expressam o peso da dificuldade de modificar valores e a limitação profissional nesta ação. Já a gestora fala de como entende esta ação educativa e como ela tem a função de oferecer novas possibilidades para as famílias: “[...] o trabalho educativo ele tem por objetivo que as famílias possam retomar os seus projetos de vida, mas que você possa também, oferecer uma cesta de possibilidades que facilitem para que as pessoas acessem seus projetos que estão esquecidos justamente por não vislumbrar saída.” (Gestora 1) A gestora espera que o técnico assistente social ao realizar sua função educativa dentro dos CRAS , possa ―oferecer um cesta de possibilidades‖ para os usuários facilitando assim seus acessos. Evidente que se trata de uma visão bastante ambiciosa e é importante o entendimento do movimento contraditório desta ação. Se por um lado há concretamente as dificuldades apontadas pelas profissionais, por outro, há a possibilidade de construir alternativas. Talvez a ―cesta de possibilidades‖ e a paralisação diante da dificuldade e da limitação, possam ser substituídos pelo processo de atendimento que configura diversos desdobramentos e em meio a uma cultura contrária e imposta, o profissional possa entender de forma crítica o seu trabalho neste espaço e fomentar com o usuário a construção de saídas individuais e coletivas. Um dos integrantes do grupo focal discordou do discurso de dificuldade e limitação das duas primeiras colegas e discorreu: “Independente de como a família chega o que muda é como a gente responde a esta forma de como ela chega. Ela não tem a obrigação de entender toda a política de assistência, ela está numa situação que a levou buscar determinado serviço que ela sabe que existe ou que pode existir. Ela pode ter algum direito, às vezes nem sabe se tem. As formulações anteriores a esta formulação de política eram muito paternalistas, assistencialistas, de dependência. Aí é que entra o projeto ético-político, com valores de autonomia, de cidadania, etc. 64 Até o processo entre aspas de “dar” (alguma coisa). Você deu, a pessoa retorna e cada vez que ela retorna, ela vai compreendendo que pode dar passos outros e acessar outros caminhos, pode ter outras oportunidade e você também aprende coisas com isso. E é processo, porque não é via de mão única, é mão dupla e faz compreender, inclusive, a dimensão do nosso trabalho que está além da intervenção em si. A própria demanda, a realidade, a questão social está nos ensinando a também dar passos que supere este entrave inicial, este impacto inicial do dou ou não dou, faço ou não faço, isso é meu papel, isso não é. Principalmente, quando a gente faz isso junto, supera junto, eu enquanto profissional, você enquanto cidadão. É neste sentido que é um processo.” (participante grupo focal) Interessante observar como os profissionais apresentam dificuldades de compreender o movimento de contradição e buscam ―verdades‖ acerca do que é esta função educativa analisando apenas uma ou outra dimensão da questão, separadamente. O grupo seguiu em debate, alguns integrantes entendiam o processo como importante, mas difícil e limitado, como já apontado; outros como uma função possível e expressa em todas as relações profissionais mediada por processos e por mudanças. Neste caminho, outra integrante retrucou a fala do colega: “Mas, aí você está falando de uma situação. Eu estou falando de uma coisa macro, da nossa função também mantenedora da situação das pessoas, exatamente neste caso, a gente trabalha para o governo, que vem de uma política neoliberal, é neste sentido que eu estou tratando. Como num trabalho socioeducativo, a gente vai caminhando no sentido das famílias compreenderem que a pobreza é uma coisa desta estrutura?” (participante grupo focal) As questões macros são cenários onde o cotidiano se expressa. A contextualização histórica da sociedade atual e a crise contemporânea são elementos importantes para analisar, entender e encaminhar o cotidiano profissional, um aspecto não pode ser separado do outro de forma estanque como ―coisas macros‖ e ―coisas micros‖. Ambos os aspectos se entrecruzam e um dá sentido ao outro. No método marxiano totalidade e contradição são categorias importantíssimas. Não apenas categorias para a análise especifica de um tema, 65 mas, categorias ontológicas e sociais que explicam a forma de ser do homem na realidade, na historicidade do tempo. Totalidade entendida aqui não como a soma das partes, e sim como a possibilidade de olhar o todo e as partes apreendendo as múltiplas mediações e relações entre si. Contradição entendida não apenas como negação, mas como o movimento dialético e dinâmico que contem em si a negação e afirmação concomitantemente. Este método não é preconizado por Marx como um método de pesquisa e análise de dados apenas; é fundamentalmente um método de compreensão da realidade. Desta forma, observa-se na discussão do grupo focal que estas categorias não são relevadas como partes inerentes da realidade. O movimento contraditório das relações sociais e da própria função social do assistente social é substituído pelo significado imediato que o cotidiano tem para estes profissionais, ou seja, o que é expressivo: a forma de realizar um atendimento versus a contextualização social marcada pelo neoliberalismo. E, mesmo com entendimentos em que se defendem pontos divergentes, o grupo foi capaz de elencar aspectos importantes de um mesmo processo. A discussão toma volume, um dos integrantes discorda que para falar da função educativa se use o termo socioeducativo e segue o diálogo: “ Mas, não é o trabalho socioeducativo, é a função educativa do profissional a questão! A função educativa do profissional é mais ampla que o trabalho socioeducativo em si. “ O que ela trouxe é interessante que é a função do profissional de manter as pessoas na pobreza, onde a gente está colocado dentro deste sistema. E aí eu penso que só pelo viés da função socioeducativa nossa...” “ Não é função socioeducativa, é função educativa!!!” “ Socioeducativa, educativa... é a mesma coisa.” “ Não, não, não! Não é. Quando eu penso em socioeducativo, eu penso nas atividades, nos grupos. A função educativa, eu penso, é como a função do professor, é claro que ele tem uma função educativa. Mas, quando se fala em Serviço Social, não se pensa em função educativa, se pensa em assistência! Quando se fala de um médico, se pensa na função médica, de saúde, quando se pensa no professor se pensa na função educativa. Mas, no nosso papel, 66 quando fala em função socioeducativa está linkando com o grupo socioeducativo, com a atividade em si. Já função educativa é mais ampla, é assim: Para quê você existe enquanto profissional? Aí que está! É por isso que não é a mesma coisa.” Este diálogo nos remete ao entendimento das pedagogias. Como já trabalhado no primeiro capítulo, o termo socioeducativo é banalizado no contexto profissional e utilizado como sinônimo de educativo e, há concordância com o assistente social que define socioeducativo como a intervenção em si. Já o principio educativo está relacionado à função, a forma de ser da profissão e remete a uma pedagogia. Se considerarmos o compromisso assumido pela categoria profissional e expresso no projeto ético-politico em sustentar e defender valores emancipatórios, temos uma proximidade ao movimento de construção de uma pedagogia emancipatória. O movimento de construção de uma pedagogia emancipatória também sofreu um redimensionamento, segundo Abreu. Atualmente esta via sofre influências de duas tendências: “Uma tendência circunscreve os compromissos profissionais com as lutas das classes subalternas no âmbito da defesa dos direitos civis, sociais e políticos, da democracia e justiça social, portanto, nos limites das conquistam que consubstanciaram a experiência do chamado Estado de Bem Estar, muitas vezes apresentadas como o fim último da intervenção profissional. A outra tendência estabelece o compromisso profissional com as lutas das classes subalternas no sentido da superação da ordem burguesa e construção de uma nova sociedade – a socialista – a qual supõe a ultrapassagem das lutas no campo dos direitos, nos limites da chamada democracia burguesa.” (ABREU, 2002:206) É imperativo que a categoria profissional reconheça o seu vínculo com o movimento de construção de uma pedagogia emancipatória e dentro desta dimensão possa apreender o movimento que há entre as duas tendências citadas por Abreu. A luta por direitos políticos, civis e humanos, por democracia e equidade social é importantíssima no contexto atual, todavia, é imprescindível que haja a superação da acomodação de construir um ―Estado de Bem Estar‖, apenas, para a visualização e a luta para a construção de uma nova sociabilidade. 67 Na pesquisa de campo observou-se que a realidade é fortemente esgarçada pelo acirramento da desigualdade social e a obtenção de ―alguns‖ direitos satisfeitos, já satisfaz também o agente profissional. Todavia, é nos desdobramentos do discurso e da ação que a categoria pode não perder de vista a perspectiva de construção de outra sociabilidade, aspecto apontado também pelo projeto profissional. Sociabilidade esta que será construída coletivamente, em conjunto com os diferentes atores da sociedade e não apenas por uma profissão. E neste sentido, qual é a função educativa/pedagógica do assistente social? “[...] a função pedagógica do assistente social vincula-se a capacitação, mobilização fundamentalmente, e processos participação de populares, reflexão, mediante identificação de necessidades, formulação de demandas, controle das ações do Estado de forma qualificada, organizada e crítica. Nesse processo, cabe a esse profissional, dentre outras atribuições, viabilizar o „acesso às informações que possam contribuir para o entendimento do funcionamento da máquina pública, dos procedimentos administrativos, da legislação pertinente, das instâncias de decisão do planejamento urbano, etc.‟(Marco, 2000:158). Fundamentalmente a intervenção do assistente social, numa perspectiva emancipatória, volta-se para o rompimento de práticas identificadas com a cultura tuteladora/clientelista da relação entre Estado e sociedade, contribuindo para o surgimento de uma nova e superior cultura.” (ABREU, 2002: 216) O entendimento da função educativa/pedagógica do assistente social numa perspectiva emancipatória, pressupõe uma visão crítica da realidade, dos processos de trabalho, considerando o projeto profissional como valores necessários para intencionalizar sua ação. É função educativa/pedagógica marcada por processos e pelo cotidiano, pela consideração das condições objetivas e subjetivas para a intervenção profissional. Indica um profissional que tenha um compromisso com a disseminação de informações para a população usuária sobre os desdobramentos da intervenção profissional e principalmente sobre o conjunto de fatores que interferem nesta intervenção, como a máquina pública, a legislação vigente, os mecanismos e espaços de participação, a leitura da realidade, questões econômicas e sociais, entre outros. O processo de disseminação da informação é um processo 68 eminentemente político e que fatalmente aponta uma intencionalidade da ação. Disseminar informação para quê e por quê? “[...] porque nós assistentes sociais temos uma característica de levar informação para a população e eu acho que a informação por si só, sendo de qualidade, ela tem um caráter educativo. Porque a gente percebe que esta população que não teve acesso a uma educação formal e está aleijado de vários outros acessos econômicos, culturais, a informação já ajuda num processo educativo se ela for de qualidade, se ela for bem direcionada às necessidades dessa população. E acho também que o caráter de nossas atividades, o trabalho grupal, o contato de assistente social com as famílias também deve ter este enfoque de levar informação para os usuários poderem repensar os próprios conhecimentos, as informações que recebem, eles podem fazer a leitura crítica sobre as informações que recebem, são verdadeiras? Não são? Servem? Não servem?... Que informações servem ou não serve para eles? Eu acho que o contato do profissional assistente social com a população usuária deve ter esse caráter educativo também, é informativo, é acesso aos serviços, mas é educativo também. É informativo, de acesso aos serviços, mas educativo também no sentido de proporcionar informações com qualidade, direcionada para as necessidades da população.” (Gestora 2) A gestora de Santo André entende a função educativa com a perspectiva de disseminar informações voltadas para os interesses das classes subalternas. No processo de construção de uma pedagogia emancipatória, disseminar a informação é também colocar-se fundamentalmente como um intelectual orgânico, comprometido com a organização das classes subalternas, identificando suas necessidades e formulando demandas, conforme apontado no primeiro capítulo desta dissertação. “Na nossa própria fala, na nossa postura, a gente já demonstra para o usuário aquilo que você acredita a respeito da emancipação, da autonomia dele e desta forma, eu acredito, que já é uma função educativa. Claro que é um trabalho de formiguinha. As pessoas que nos procuram falam: olha eu só vim aqui porque não teve jeito, porque eu estou precisando mesmo. Então, demonstra o quanto ela tem vergonha de fazer uso da assistência, vergonha de ser pobre.” (participante grupo focal) 69 Compreender o trabalho do assistente social na perspectiva da construção da pedagogia emancipatória é apreender os movimentos da realidade entre condições objetivas e subjetivas e usar da relativa autonomia para realizar intervenções que favoreçam a organização dos usuários e fortaleçam suas lutas. É pautar o atendimento na ótica do direito e não do favor e da ajuda como a profissional explicita. Se o usuário se sente constrangido de utilizar tal serviço, faz parte das atribuições profissionais esclarecer que este serviço não é caridade, nem benemerência, tornando-se cada vez maior o número de usuários destes serviços devido aos rumos que a sociedade atual vem tomando, aprofundando as desigualdades sociais. “Se o assistente social entende a função educativa como parte do seu ser, como raiz, ela se expressa em todas as suas atividades. A função não é um instrumento, uma técnica: „agora eu vou fazer um atendimento educativo, agora não, vou usar de outra técnica‟, não é isso. Quando está na raiz, ela é na forma como você se coloca, se relaciona, numa reunião de coordenação aparece, não se camufla porque está inerente a sua ação. Esta função educativa ela se expressa no fazer, se expressa nas opções que você faz. Infelizmente o nosso volume de trabalho faz com que muitas vezes você tenha que atender em toque de caixa, isso sim limita, impossibilita qualquer intervenção socioeducativa. Limita de você sentar e refletir com a pessoa na situação que ela se encontra, como ela se encontra.” (participantes Grupo Focal) Este participante traz em sua fala as condições objetivas e subjetivas do trabalho do assistente social. Explicita que a função educativa deve ser entendida como raiz, como parte da consciência do assistente social enquanto profissional e assim, esta será expressa em todas as suas atividades. Entretanto, há também as condições objetivas que é o modo de ser da profissão e, de forma mais explicita, representa também a função social do assistente social na sociedade de amenizar os conflitos entre capital e trabalho. Revela também as condições de trabalho que os profissionais enfrentam atualmente: o reconhecimento social deste trabalho, o volume de trabalho ao qual os assistentes sociais são submetidos, a obrigação de responder prontamente as mais diversas demandas, além da precariedade das formas de contratação dos assistentes sociais que recebem cada vez salários mais baixos. 70 Entende-se que as condições objetivas e as condições subjetivas apresentadas ao assistente social no seu trabalho cotidiano são uma unidade diversa do trabalho profissional. Unidade porque não há condições objetivas sem condições subjetivas e por vezes esta unidade diversa se manifesta de forma contraditória, até porque, a dinâmica da realidade traz avanços e retrocessos ao trabalho profissional. Nem sempre as melhores condições objetivas garantem um resultado satisfatório para o trabalho, isso se torna um paradoxo, pois estamos acostumados a apreender as questões que se dão apenas no imediato. Perceber os aspectos subjetivos que envolvem a ação profissional é um exercício que depende também da correlação de forças políticas imersas no contexto profissional. São condições objetivas os eventos e as circunstâncias sociais e históricas que determinam a direção social na atuação profissional. Determinação esta, que ultrapassa a intenção, vontade ou consciência dos profissionais. “Isso supõe, como diretriz de trabalho, considerar a profissão sob dois ângulos, não dissociáveis entre si, como duas expressões do mesmo fenômeno: como realidade vivida e representada na e pela consciência de seus agentes profissionais expressa pelo discurso teórico-ideológico profissional como sobre o atividade exercício profissional; socialmente a determinada atuação pelas circunstâncias sociais objetivas que conferem uma direção social à prática profissional, o que condiciona e mesmo ultrapassa a vontade e/ou consciência de seus agentes individuais. (IAMAMOTO, 2001:73) Temos como exemplo de condições objetivas a ideologia neoliberal dominante, as formas de reprodução e manifestação da questão social gerando novas demandas, a precarização do trabalho do assistente social em seus diversos aspectos desencadeado pela precarização do trabalho, o modo de inserção da profissão no capitalismo monopolista e suas relações, ou seja, a forma como a profissão se consolidou, atendendo contraditoriamente aos interesses do capital e do trabalho. Neste ponto compreendemos o modo de ser da profissão; sua identidade e sua construção histórica. “Portanto, essa profissão traz consigo duas dimensões: uma „objetiva‟, modo de ser, e outra „subjetiva‟ modo de pensar, que estão intrinsecamente ligadas, interligadas, pois traz nessa relação uma contradição de complementaridade, uma unidade contraditória, sendo indissociáveis. Estas dimensões é que possibilitam desvelar o 71 significado social do Serviço Social, caracterizando e imprimindo a direção à prática profissional. A 1 define o modo de inserção da profissão na sociedade, na sua relação com as classes sociais, destas com o Estado e o conjunto da sociedade, ou seja, como forma a de enfrentamento da questão social. A 2 , define o „modo de pensar‟, ou seja, o conteúdo teórico-metodológico, ético-político que informa esta prática. Tal processo constitutivo do caráter técnico da profissão, atribuindo ao mesmo tempo a dimensão política inerente a esta prática.” (CARDOSO, 1999: 42) O grande desafio que se dá no cotidiano profissional do assistente social é reconhecer as condições objetivas existentes e não paralisar nelas. “Eu acho que outro desafio também é como é que as nossas equipes se repensam na forma de ser relacionar com as pessoas, com as famílias; o olhar dessas pessoas, o enxergar as suas potencialidades, o trabalhar o reconhecimento das lideranças, o não olhar só os problemas, olhar de cima, mas para envolver-se na dinâmica dos bairros, Então, este eu acho que é um desafio muito grande, porque nós temos uma história, né!? E quando a gente pensa qual é a dimensão educativa do trabalho do assistente social hoje na política de assistência social, eu acho que nós ainda temos uma história de relação com as pessoas que ainda é uma relação muito do „eu sei o que é melhor para você‟ e‟ te digo o que é melhor‟ ou „você depende de mim para te incluir em programas e benefícios‟. Mas, falta uma proximidade de reconhecimento das pessoas enquanto pessoas que tem autonomia, que vivem em situação de risco, mas a gente rotula as pessoas, a gente acha que as pessoas não tem saída, não tem resposta e quando a gente vai avaliar a situação que as pessoas estão no dia-a-dia a gente percebe o quanto elas estão aí, o quanto as pessoas são solidárias umas com as outras, como elas criam redes, quanta potencialidade tem no território.” (Gestora 1) Como apontado pela Gestora, é reconhecer que temos uma história, uma função social, mas que podemos usar de nossa ―relativa autonomia‖ (IAMAMOTO, 2003) para construir novas possibilidades nestes espaços, construir a pedagogia emancipatória num movimento de conquista e ação. Pressupõe o rompimento com o conservadorismo, com outras pedagogias como a da ajuda, onde se entende a relação entre assistente social e usuário como uma relação de ajuda e a pedagogia 72 da participação que pauta a participação por ela mesma, marcando a democracia burguesa, desvinculada de um caráter político. “A relativa autonomia que dispõe o assistente social decorre da natureza mesma desse tipo de especialização do trabalho – atua junto a indivíduos sociais – e não com coisas inerte dispondo de uma interferência, pela prestação de serviços sociais, na reprodução material e social da força de trabalho.” (IAMAMOTO, 2003:98) Ou seja, é o assistente social quem conhece a vida e a dinâmica dos usuários, se relaciona com estes. Em um atendimento individual ou coletivo é o assistente social o facilitador da intervenção, podendo intencionáliza-la para os interesses que quiser, é desta relativa autonomia que Iamamoto trata. Neste sentido, ao pensarmos na função educativa/pedagógica do assistente social, imediatamente visualizamos o trabalho deste profissional junto às classes subalternas de informação e formação, como se o profissional fosse ―educar‖ a população usuária de seus serviços. Porém, com o desenvolvimento desta pesquisa, compreende-se que disseminar a informação, bem como organizar os interesses e as necessidades das classes subalternas traduz-se em um aspecto importante da função educativa/pedagógica. Outro aspecto desta mesma função está relacionado com a capacidade profissional de educar a sua própria ação através da análise crítica, do entendimento do movimento contraditório da realidade, da reflexão entre condições objetivas e subjetivas, da apreensão dos valores perseguidos pelo projeto ético-político profissional. A função educativa do assistente social expressa à construção de uma pedagogia emancipatória e um espaço de educar-a-ação profissional junto ao movimento de lutas e conquistas das classes subalternas, dos usuários de seus serviços. “[...] coloca-se a necessidade de uma capacitação profissional permanente, adequada às exigências de um trabalho crítico, coerente e consequente face à perspectiva histórica do citado movimento. Este trabalho supõe a criação/recriação de modalidades interventivas correlatas a estas exigências, como construção coletiva, da qual participam os demais sujeitos envolvidos. Neste sentido, a profissão busca responder aos compromissos com os interesses e necessidades das classes subalternas na destruição da cultura 73 dominante e construção de uma nova cultura, mediante atuação profissional qualificada teórica, técnica e, principalmente, éticopolítica.” (ABREU, 2002:220) Quando o assistente social se coloca de forma alienada a este processo ele simplesmente reproduz discursos institucionais, seja da igreja, da instituição que o contratou ou do bloco dominante. Perde a característica crítica de sua intervenção, distância-se dos movimentos que buscam a transformação desta sociabilidade e não se capacita profissionalmente. É engolido pelas demandas institucionais, buscando respostas imediatas, tornando o produto do seu trabalho motivo de desmotivação e frustração, distante dos valores eleitos pela categoria profissional. Neste processo, é fundamental a capacitação profissional como forma de despertar o profissional para a reflexão crítica e para acompanhar as produções da categoria, tanto teórico-técnico como ético-político. “Assim, as exigências quanto à capacitação profissional apresentamse numa dupla dimensão: a de contribuir para a mobilização, capacitação e fortalecimento da participação de segmentos da referida classe na construção de alternativas de lutas, em face de seus interesses e necessidades de subsistência e sua contribuição como sujeito político na formação da classe para si; e a de produzir e socializar conhecimentos sobre manifestações da questão social em torno das quais se articulam e se dinamizam formas de lutas, contribuindo para o desvendamento das contradições e tendências do movimento social, a estas se antecipando com propostas e alternativas de intervenção.” (ABREU, 2002:220) Capacitação como forma de elucidar sobre quais interesses este profissional tem legitimado em seu exercício profissional. Muito mais do que ―educar‖ o outro, a preocupação do assistente social deve se voltar para educar-a-ação profissional, num processo de formação continua e na perspectiva de construção da pedagogia da emancipação. 74 3.1 – Expressões da Função Educativa/Pedagógica nos Programas de Transferência de Renda A Garantia de Renda Mínima para famílias em situação de extrema pobreza é idéia defendida desde o inicio do século XX. No Brasil, quem inseriu a discussão no senado foi o Senador Eduardo Suplicy. O primeiro projeto de lei foi aprovado em 1991 que preconizava um projeto de Garantia de Renda Mínima para pessoas e famílias com renda mensal inferior a aproximadamente R$ 400,00 (valores da época). Este projeto não chegou a ser implementado, entretanto, outras ações de transferência de renda monetária de nível municipal e estadual foram pouco a pouco tomando o cenário nacional. No Brasil, as ações pioneiras foram dos municípios de Campinas, Ribeirão Preto e Santos e do Programa Bolsa Escola no Distrito Federal 1995, programas estes que já preconizavam a transferência monetária diretamente às famílias juntamente com a articulação de políticas educacionais. Os Programas de Transferência de Renda constituem-se em ferramentas importantes “para a diminuição da indigência, da pobreza e da desigualdade no país, conforme vem indicando estudos recentes em relação aos quais dois aspectos precisam ser considerados. Um primeiro seria o significado real, mesmo de caráter imediato, que esses programas representam para as famílias beneficiárias, ao permitir a aquisição ou ampliação de uma renda, inexistente ou insignificante, proveniente do trabalho, até porque o mercado de trabalho, no Brasil, é por demais excludente, não permitindo o acesso de grande parte da população. Nesse sentido, esses programas, para muitas famílias, são a única possibilidade de uma renda, mesmo que muito baixa. Por outro lado, esses programas podem propiciar condições progressivas, mesmo que, a longo prazo, de inclusão de futuras gerações formadas pelas crianças e adolescentes das famílias beneficiárias que são requisitadas a freqüentar escola, postos de saúde, sair da rua ou do trabalho penoso e degradante, podendo, portanto, elevar o número de anos de escolaridade do futuro trabalhador brasileiro.” (Silva, 2008) 75 Em 2003 os PTR foram unificados pelo programa Bolsa Família e atualmente fazem parte da política de assistência social, sendo suas ações descentralizadas e as famílias referenciadas pelos Serviços de Proteção Social, principalmente nos CRAS. Nos municípios da Grande São Paulo, grande parte das famílias acompanhadas pelo PAIF são beneficiárias do programa Bolsa Família através de grupos socioeducativos. Além disso, é na esfera do município que a gestão do programa acontece no que tange a administração e organização dos cadastros, a disseminação de informações a respeito dos critérios de elegibilidade e o acompanhamento da contrapartida social. O Programa Bolsa Família possui significativo papel atualmente no Brasil e segundo pesquisa recente, em 2006 o programa atendeu 11.120.363 famílias o que corresponde a 99,2%19 de atendimento das famílias pobres do país e cobrindo 99,93% dos municípios brasileiros20. Apesar de ainda apontar polêmicas, como um valor de repasse baixo, os critérios de elegibilidade e as condicionalidades sociais, o Bolsa Família sem dúvida dinamizou a realidade dos territórios brasileiros. Desta forma, tanto o Bolsa Família como outros PTR de esfera estadual e municipal são espaços de ação do assistente social, seja nas secretarias de governo, seja nos CRAS o que envolve inevitavelmente uma ação educativa/ pedagógica. Seja a forma de conduzir um cadastro, de orientar as famílias quanto os critérios de elegibilidade do programa e das condicionalidades, seja na condução de atividades grupais, evidencia a ação educativa/pedagógica do assistente social e a qual pedagogia esta está vinculado. O primeiro fator a ser considerado revela que de forma macro estes programas podem estar vinculados a uma perspectiva emancipatória buscando a superação da pobreza e o rompimento de seu ciclo vicioso para futuras gerações através de condicionalidades que priorizam a permanência de crianças na escola, ao invés de estarem submetidas a trabalhos degradantes. Todavia, é necessário não 19 Segundo dados da PNAD 2001/IBGE Dados preliminares da pesquisa realizada pelo Grupo de Avaliação e Estudo da Pobreza e de Políticas Direcionadas à Pobreza – GAEPP, uma cooperação entre as universidades PUC-SP, UFMA e PUC-RS. 20 76 perder de vista a cultura do conformismo que gradativamente vai se instalando e que aponta uma perspectiva de manutenção das famílias e indivíduos ao seu estado de pobreza, garantindo-lhes o mínimo para a subsistência, possuindo caráter compensatório e de alivio imediato, sem uma perspectiva de superação. Este universo deve ser analisado criticamente, observando as reais condições que dispõem as famílias para o cumprimento das condicionalidades sociais, como a disponibilidade de uma política educacional efetiva e real atenção do Sistema Único de Saúde para as necessidades desta população. Outro ponto crítico e que está diretamente relacionado aos assistentes sociais é a seletividade das famílias para os referidos programas. O grupo focal trouxe considerações sobre este ponto: “Em todos estes anos de formada, eu passei por muitas crises. Porque a gente tem aquela fase de negar o imediato, de negar o concreto, a ajuda material, mas é necessário. Nossa, profissão, nosso papel também estão relacionado a isso, à sobrevivência, ao imediato. Mas, nem por isso você vai ficar só nele. E esta função educativa é processual, é construção e desconstrução. Junto às famílias que a gente atende, algumas questões estão muito cristalizadas. Então as pessoas chegam até a gente com idéias que só com o tempo, só com a convivência você pode ir quebrando, algumas questões culturais. Querendo ou não, a gente lida com critérios socioeconômicos, o nosso atendimento também é baseado nisso. Então, você pega uma família que saiu do Bolsa Família por conta da per capta ser superior e você tem que trabalhar com uma série de coisas, inclusive com você mesma, para você poder colocar para aquela pessoa o porquê ela foi excluída do programa. É sempre um conflito porque na verdade quando você vai explicar a situação, como é que você diz que tem gente mais desgraçada do que ela? Falando o português claro. R$ 121,00 21 já está fora!” (participante Grupo Focal) Este papel profissional de selecionar a pobreza faz parte da história do Serviço Social. E se em tempos de outrora ele era um aspecto que garantia poder ao profissional perante o usuário, hoje ele é motivo de constrangimento profissional. Quando a assistente social aponta que nestas situações ela tem que trabalhar inclusive com ela mesma, significa que esta ação pesa profissionalmente porque 21 A participante faz referência à per capta do Programa Bolsa Família no ano de 2008 que era de R$ 120,00 77 vem na contramão do que a categoria prega para si, sendo muitas vezes uma ação de exclusão, de negação de acesso que, numa contextualização mais ampla é premente, uma vez que muitas famílias ainda se encontram em situação de pobreza mesmo com uma per capita um pouco acima do que o preconizado pelo programa. Até porque o valor ofertado pelo Programa, em si analisando como uma categoria isolada, não é capaz de configurar o enfrentamento da situação real vivida pela família. “A gente nem acredita nisso, mas tem que fazer. Você tem trabalhar com a pessoa e com você. Você tem que trabalhar outras questões com ela, a questão dos direitos... aí ela diz: „dona eu tô precisando, eu preciso‟ . E você tem que trabalhar todas estas questões com ela. Então, eu acredito que o nosso papel é educativo, mas é junto com a pessoa, é junto com quem você atende. E é muito difícil você quebrar esta questão cultural que nossa profissão tem até hoje.” (participante Grupo Focal) Aqui a profissional expressa a real importância de reconhecer o usuário também como sujeito. Se por um lado ele é objeto de um sistema que depende de uma massa miserável para sua persistência, por outro, o usuário é sujeito da ação e possui um arsenal de ―meios de sobrevivência‖ que construiu ao longo de sua trajetória. Não que se negue a ótica do direito e a perspectiva de uma redistribuição de renda de fato. Entretanto, qualquer ação educativa/pedagógica, principalmente configurada dentro do movimento de construção de uma pedagogia emancipatória, deve desenvolver-se junto com o usuário, reconhecido como sujeito e, somando esforços a outros movimentos da sociedade para uma luta cada vez mais coletiva. “Esta perspectiva interventiva coloca para os assistentes sociais novas e desafiadoras demandas, sobretudo configurando-se que, em relação aos referidos programas de renda mínima articulados à educação, o avanço do processo de construção da prática profissional – numa perspectiva emancipatória – defronta-se com o velho e agora revigorado fantasma da seletividade/elegibilidade. O desafio que se coloca para os assistentes sociais é o de fortalecer via prática político-profissional, processos concretos de luta, de articulação de forças, no sentido de ampliar cada vez mais a incorporação de vastos segmentos e de suas necessidades nas políticas estatais, processos esses vinculados às lutas direcionadas para criar/recriar alternativas de política econômica que, de fato, 78 garantam condições de trabalho e salários dignos para vastos segmentos das classes subalternas, como base da autonomia financeira no atendimento de suas necessidades básicas de subsistência.” (ABREU, 2002: 218) O desafio é que o profissional não paralise diante deste novo conformismo social, resumindo sua ação aos critérios dos Programas de Transferência de Renda. É necessária uma análise crítica e ampla que reconheça o caráter coletivo da luta por uma redistribuição de renda e por critérios que de fato atendam as necessidades das populações empobrecidas, não como um socorro imediato e pontual, mas como uma possibilidade de superação, rompendo ciclos geracionais e articulado a outras políticas públicas e a um Sistema de Proteção Social. Uma estratégia que pode potencializar politicamente a população usuária são os grupos socioeducativos, ponto que se discorre a seguir. 3.2 – Expressões da Função Educativa/Pedagógica nos Grupos Socioeducativos Os grupos socioeducativos ganham destaque atualmente na Política de Assistência Social que preconiza atividades grupais com as famílias referenciadas pelos CRAS através do PAIF. Fatalmente, os grupos são planejados e conduzidos por assistentes sociais em parceria com psicólogos e com estagiários de ambas as áreas. Todavia, o assistente social busca referencias em outras disciplinas para a condução dos grupos socioeducativos, mesmo com a profissão possuindo uma história marcada por este tipo de intervenção. O Serviço Social tem um histórico de trabalho com grupos e as primeiras sistematizações apontam a metodologia ainda pautada no ―Diagnóstico Social‖ que, mesmo em grupo, caracterizava-se pelo olhar individual, na perspectiva da reforma moral e reintegração social do indivíduo. “Natálio Kisnerman (1977), analisando a fase inicial do Serviço Social de Grupo, refere-se várias vezes à “tendência” individualista com que era utilizado o Serviço Social de Grupo e diz [que] nesta fase o 79 método centra-se no indivíduo e não no grupo como um todo”. (CAVALCANTE, 1979:61) É realizado, neste período, um diagnóstico preliminar do ―cliente‖ na fase em que antecede a sua inserção no grupo. Após análise deste diagnóstico, o ―cliente‖ é encaminhado para um grupo de tratamento. O tratamento consiste no alcance pelo ―cliente‖ de metas estabelecidas pelo assistente social, com base em seu diagnóstico. “Afirma que de acordo com a natureza do diagnóstico, o assistente social ao trabalhar com um grupo deve escolher um tratamento. Este requer um planejamento que implica na adoção de um certo tipo de grupo, seja este recreativo, de aprendizagem, de trabalho terapêutico, ou outro. Conseqüentemente adota uma estrutura para a ação: autocrática, paternalista, permissiva, participativa. Selecionará; técnicas de condução, de motivação, de entrevista, bem como a forma de determinação do momento oportuno para ataque do problema, tipo de ajuda que a instituição pode facilitar, etc.” (RODRIGUES, 1979:18) No entanto, esta forma interventiva com grupos passa a ser questionada pela profissão por considerá-la restritiva e isolada da realidade social. Abriu-se assim, espaço para concepções de grupo partindo de uma visão desenvolvimentista, onde o assistente social se distancia do aspecto terapêutico, assumindo o Desenvolvimento de Comunidade em sua atuação com grupos, como aponta Rodrigues: “Falar em grupo de tratamento significa limitar e empobrecer a intervenção psico-social do Serviço Social, ou ainda, produzir uma teoria alienada da realidade concreta de atuação dos profissionais. Significa sonegar o Serviço Social toda uma área de atuação desenvolvimentista, que lhe é fundamental, isto é, atingir uma clientela já integrada para sua maior expansão e participação na construção da sociedade.” (RODRIGUES, 1979: 23) O apelo posto pelos grupos no âmbito do Desenvolvimento de Comunidade – DC era o da participação. O ―cliente‖ era chamado à participação através dos grupos para assim construir compromisso e engajamento nas questões que atinge sua comunidade, buscando soluções. 80 “Em geral, para o desenvolvimento da participação, utiliza-se de sessões grupais contínuas, mas espaçadas. Não existe um tempo fixo de duração. O grupo se mantém junto enquanto perdura a necessidade de participação naquele programa ou atividade. Se extingue na medida em que o programa não exige mais a participação ou os membros do grupo amadurecem e desejam outros níveis de participação.” (RODRIGUES, 1979:33) Neste momento, as técnicas de intervenções nos grupos não são claramente sistematizadas e explicitadas. Reforça-se a importância de atuação nas comunidades e os grupos ganham flexibilidade na sua formação, tempo e sistemática de encontros. O fundamental objetivo a ser perseguido pelo assistente social, bem como pelos membros do grupo é a participação. Na década de 80, já há apontamentos sobre a crise de DC, devido a uma influência da educação popular. “(...) nessa situação de crise de DC, parece estar emergindo uma tendência de apropriação de DC por Educação Popular, desde que ambos os processos fundamentam-se numa pedagogia centrada na participação de grupos, estratos sociais e comunidades, e visam contribuir à transformação da realidade social. (GONÇALVES, 1981:58) Na educação popular, porém, os grupos se misturam as outras formas de atuação junto às classes subalternas, como a educação para adultos, e, são aglutinados aos movimentos sociais. Distancia-se cada vez mais de procedimentos teórico-metodológicos uma vez que estes, são considerados “destinados a preestabelecer ou induzir de cima para baixo os modos de atuar da população” (GONÇALVES, 1981:66). Aos poucos, a discussão teórico-metodológica sobre grupos vai se distanciando da atuação dos assistentes sociais e das universidades. A discussão é completamente esvaziada das universidades com o último currículo disciplinar do curso de Serviço Social. “Na história do Serviço Social tinha sim um trabalho socioeducativo mas dentro de caixinhas, grupo, comunidade, assim. Não tinha o socioeducativo de grupo que nós temos hoje. Entretanto, na faculdade, nós estudamos os textos sobre grupo e trabalho com comunidade da década de 60, não tem nada atual. E buscamos fazer 81 uma leitura destes textos com o olhar de hoje, uma leitura crítica.” (participante Grupo Focal) Este ―buraco‖ teórico-metodológico foi sendo preenchido pelos profissionais com ações pautadas em outras disciplinas, muitas vezes de caráter terapêutico e ahistórico, desconsiderando bases teóricas substanciais e coerentes com o projeto ético-politico profissional. O Movimento de Reconceituação do Serviço Social questionou as ações profissionais de ordem conservadora e tradicional ligadas a manutenção da ordem vigente. Com a crítica, as ações grupais se esvaziaram, engrossando os movimentos sociais das décadas de 70/80 e a profissão se distanciou de criar novas tecnologias, pautadas numa perspectiva emancipatória de intervenção coletiva, grupal. O grupo focal ―esquenta‖ a discussão deste aspecto da profissão, no diálogo a seguir: “ O Movimento de Reconceituação jogou a água da bacia com o bebê dentro, foi tudo embora, tinha coisas interessantes que você acabou perdendo. Então, a gente tem que pegar textos lá de trás e fazer uma releitura. Entender os instrumentos e em que perspectiva eles foram construídos para adequar hoje. A Yolanda Guerra diz que tudo que está ao nosso redor é instrumento, mas qual a nossa intencionalidade? Como é que eu intenciono o instrumento para que ele cumpra o fim que eu pré-estabeleci? Porque a gente não pode reintencionalizar alguns instrumentos que são importantes para a nossa atuação? Porque a gente teve que jogar tudo fora? Muita coisa é o que a gente está fazendo hoje aqui. Não tem problema que foi a Mary Richmond que criou, um exemplo, só que eu estou utilizando com outra intencionalidade. “ “ Discordo. Tem coisas que não dá para a gente utilizar hoje. Essa coisa do diagnóstico, do tratamento, não dá. É muito funcionalista.” “ Tem coisas que são funcionalistas sim, mas, que a gente tem que usar. Às vezes é necessário fazer um diagnóstico, para implantar um projeto, entender um território, avaliar. E isso é funcionalista. Mas, nem tudo que é funcionalista é ruim.” “ Discordo. Porque aí você coloca a questão social no saco e começa a individualizar tudo.” 82 “ Mas, e o SUAS, não foi construído com bases no SUS? Quer modelo mais funcionalista que este?” “ OK! Uma coisa é fazer um diagnóstico de uma região, um projeto, outra coisa é pegar um indivíduo e fazer um diagnóstico dele para adequá-lo”. “ Mas, eu não tô falando disso!!” “ Eu também não!!” “ Agora eu não acho que só porque é funcionalista a gente tem que mudar as palavras, não é mais diagnóstico, é relatório agora.” “ Mas, a Mary Richmond traz a questão do diagnóstico e tratamento no atendimento individual. Tem um viés terapêutico.” “ Não é disso que eu estou falando. Eu estou falando de intencionar os instrumentos que você usa.” “ Mas, este diagnóstico na Mary Richmond não tem nem como eu intencionar...” “ Nem fiz esta defesa!” “ Esquece a Mary, mas um projeto por exemplo é funcional. Você faz um diagnóstico, fala dos seus recursos, já prevê as suas metas. E a gente faz isso. A instituição é funcionalista, o departamento de Assistência é funcionalista e ponto final. E como nós, que somos dialéticos, agimos aqui? Esta é a contradição, como é a sua função educativa dentro de uma instituição fatalmente funcionalista? Esta é a grande contradição!” Observa-se o quanto a discussão foi calorosa e embebida da polêmica ainda não resolvida no meio profissional. Os profissionais se perdem na busca de responder as questões profissionais cotidianas. Ou seja, em sua rotina, o assistente social, faz grupos socioeducativos, visitas domiciliares, relatórios, projetos, diagnóstico institucional, entre outras tarefas. E qual é o alicerce teórico destas atividades? Como isso se encaminha no meio profissional? Fatalmente principalmente há quando um os distanciamento profissionais da teoria insistem em à prática cotidiana, intencionalizar algo profundamente tradicional como o ―Diagnóstico Social‖. Na verdade, a profissão tem se esquecido ao longo destes últimos anos de sistematizar o cotidiano e produzir 83 conhecimento acerca dos instrumentos e técnicas utilizados pelos assistentes sociais à luz de uma teoria crítica. Encontrar um referencial teórico que tratasse do grupo em consonância com o referencial teórico trabalhado nesta pesquisa não foi tarefa simples visto que grande parte dos autores que discorrem sobre grupo o trata de forma terapêutica e ahistórica. Matín-Baró, psicólogo social de El Salvador, usou referenciais marxistas para escrever sobre grupos, explicitando a sua experiência de luta política junto à população mais pobre de seu país. Martins (2006) faz uma síntese do pensamento de Baró, para ele grupo é: “uma estrutura de vínculos e relações entre pessoas que canaliza em cada circunstância suas necessidades individuais e/ou interesses coletivos. Ressalta ainda que um grupo é uma estrutura social: uma realidade total, um conjunto que não pode ser reduzido à soma de seus membros. A totalidade do grupo supõe alguns vínculos entre os indivíduos, uma relação de interdependência que é a que estabelece o caráter de estrutura e faz das pessoas membros. Assim, segundo o autor, um grupo constitui um canal de necessidades e interesses em uma situação e circunstância específica, afirmando com isso o caráter concreto, histórico de cada grupo.” (MARTINS, 2006:03) Para que haja grupo é necessária a construção do vínculo entre as pessoas que se agrupam. As pessoas são atraídas para um grupo por interesses individuais ou coletivos ou a soma destes dois. O grupo deve ser enxergado em sua totalidade: a expressão subjetiva dos membros e a sua estrutura social que, está diretamente relacionada à estrutura maior de nossa sociedade. Possuí dimensão histórica, que é a concretude do grupo que se constituí no território ao qual pertence, além de uma dimensão ideológica objetiva, criada por uma realidade social e que tem peso na organização da vida das pessoas. “Un grupo es, en primer lugar, una estructura social. El grupo es uma realidad total, un conjunto que no puede ser reducido a la suma de sus constitutivos. Una família és más que un hombre, una mujer y um niño; um batallón es más que un centenar de hombres armados; esse más viene dado em ambos casos por los conjuntos que formam, las totalidades que contituyen. La totalidade del grupo supone unos vínculos entre los individuos , uma relación de interdependência que es la que estabelece el carácter de estrutura y hace de las personas miembros. Se habla de uma estructura social primeiro porque, como ya se ha indicado, condición essencial para la 84 existencia de um grupo és la participacion de vários individuos ; pero el carácter social de la estructura grupal radica precisamente em que surge como produto de la referencia mutua y necessitante de sus miembros y/o de sus acciones.” (Martín-Baró, 1999:206) O grupo constitui-se como uma manifestação da realidade total na qual está inserido. No grupo as manifestações da questão social que atingem seus membros emergem em suas múltiplas expressões. É entendido também como um espaço eminentemente contraditório e sofre as determinações econômicas, institucionais e ideológicas da sociedade qual está inserido. Ao mesmo tempo, observando o poder que o grupo dispõe diante de outros grupos sociais, ele pode construir estratégias de resistência a estes determinantes sociais, numa ação contra-hegemônica. “Esta concepción del grupo nos lleva a examinar los fenómenos grupales al interir de la historia de una forma dialéctica. De ahí que los principales parâmetros para el análisis de un sean tres: (1) la identidad del grupo, es decir, la definiciín de lo que es y lê caracteriza como tal frente a outros grupos; (2) el poder que se dispone el grupo em sus relaciones com los demás grupos más la significacion social de lo que produce esa actividad grupal.” (Martín-Baró, 1999: 208) Identidade, poder e atividade grupal são os três aspectos apontados por Martín-Baró para a análise de grupos. São aspectos imbricados entre si na relação concreta dos grupos e que podem identificar o tipo de grupo constituído (primários, funcionais ou estruturais22). Esta concepção de grupo, por suas bases teóricas, está em consonância com o movimento de construção de uma pedagogia emancipatória e mais do que isto, em consonância com o projeto político profissional. Vale relevar que o trabalho com grupos é eminentemente indisciplinar, entretanto, para se construir a interdisciplinaridade é fundamental que o profissional assistente social tenha domínio e competência em sua disciplina de atuação. “A interdisciplinaridade é construída através de discussão e diálogo entre as disciplinas que compõem o trabalho. É necessário observar as 22 Resumidamente, para Martín-Baró o grupo primário refere-se ao pequeno grupo onde os vínculos existentes são interpessoais, dotado basicamente de características pessoais e existem para a satisfação das necessidades básicas. Por grupos funcionais entende-se um grupo que têm um vínculo social, seu poder é ainda relativamente pequeno, mas atua na capacitação e na satisfação das necessidades do coletivo. E por grupo estruturais, entendese uma identidade grupal marcada pelos interesses objetivos da comunidade total, qual pertence, possuí maior poder e atuam na satisfação dos interesses de uma determinada classe social, na luta de classe. 85 diferenças e as semelhanças que estes olhares encontram no decorrer do processo, observar a visão de homem e de mundo de cada disciplina e não homogeneizá-las, mas considerar as diferenças, convivendo com estas e abrindo possibilidades para o novo. Neste aspecto torna-se fundamental o profissional ser competente em sua especificidade para poder explicitá-la e compartilhá-la com o grupo interdisciplinar de trabalho, fomentando uma discussão.” (DOMINGUES, 2004:67) E neste ponto é frágil a atuação dos assistentes sociais, pois pouco discutem, sistematizam e refletem sobre suas técnicas de intervenção e sua instrumentalidade, não construindo propostas para o diálogo com outras disciplinas. Entretanto, os profissionais participantes do grupo focal reconhecem a importância do trabalho do assistente social com grupos, revelado neste diálogo: “ Grupo é troca, é fortalecimento, é convivência. Grupo é a possibilidade de transformação.” “ A coisa mais bonita que eu aprendi com grupo é como de fato você aprende com o outro! Eu acho isso a coisa mais bonita!” “ Grupo encontra caminho, tem autoria própria, como o grupo se defende. Como grupo é forte, é forte mesmo! “ “ O Grupo se auto-fortalece, ele se reconhece. Um grupo é um grupo, não é um amontoado de pessoas.” Os profissionais revelam em sua fala que o grupo, apesar de ser inserido numa cultura dominante, preenche o trabalho cotidiano do assistente social de esperança, de aprendizado, de construção coletiva, potencializando o assistente social como um facilitador, distanciando-o do papel de detentor do poder, tornando mais leve o exercício profissional. Todavia, cabe destacar que, de acordo com o referencial teórico preconizado, grupo não é um amontoado de pessoas. Neste sentido, a PNAS atualmente preconiza atividades grupais e não necessariamente a formação de grupos. As atividades grupais têm um caráter pontual, ou seja, algumas pessoas se reúnem para a execução de determinada tarefa: uma oficina profissionalizante, uma palestra ou assistir um vídeo. Não se pode considerar tais ações como a formação de grupos socioeducativo, pois não há constância, convivência e vínculo entre os membros dos grupos. 86 “ Os grupos socioeducativos eles só existem a partir do momento que há a convivência, um período de convivência, criação de vínculos, etc. As demais atividades grupais são ações grupais, mas não são grupos socioeducativos. Saber disso em formação foi um alento para a gente, pois estávamos sofrendo muitas pressões para montar os grupos socioeducativos. E não é assim gente! Não dá para colocar tudo no mesmo balaio!.” “ A oficina não é um grupo socioeducativo, ela pode estar dentro de um grupo socioeducativo, mas não é o grupo em si.” “ O CRAS em que estou só tem ações pontuais. Não tem a convivência, então não tem grupo socioeducativo, não cria objetivos comuns.” Santo André lida com a questão dos grupos com bastante lucidez, diferentemente do que se observa em outros municípios. Este talvez seja um dos resultados do processo de capacitação qual o município vem investindo. Há uma pressão por parte dos gestores das diferentes esferas por atividades grupais ou a formação de grupos. Apesar das atividades grupais de caráter pontual terem importância como possibilidade de melhoria da qualidade de vida das famílias, de fato, resultados substanciais só ocorrerão a partir da formação de grupos nos territórios e que estes grupos não fiquem limitados ao tempo estabelecido pelos programas assistenciais, mas possam criar vida própria. “O CRAS em que eu atuo não conseguiu ainda organizar grupos socioeducativos, iniciar o atendimento grupal. E eu falo isso com muito pesar, muito pesar mesmo, porque o atendimento individual ele pesa na prática, ele cansa.” (participante Grupo Focal) Neste sentido, o investimento público deve focar na formação de grupos socioeducativos e não apenas na execução de atividades grupais, o que implica inclusive em garantir equipe profissional suficiente para atendimento de tal demanda. Impõe inverter a ótica de resultado para a ótica da construção coletiva mediada por processos. Cabe ainda, ao assistente social apreender este espaço como privilegiado para a construção de uma pedagogia emancipatória e desenvolver teóricometodológico e ético-político novos, conhecimentos para fomentar a discussão da categoria profissional. 87 3.3 – Expressões da Função Educativa/Pedagógica na Política de Assistência Social de Santo André O desenvolvimento desta pesquisa foi moldado pela política de assistência social do município de Santo André, seus atores e sua forma de operacionalizar o PAIF. Santo André possui uma história, já apresentada no segundo capítulo desta pesquisa, marcada pelos movimentos sindicais das décadas de 70/80 os quais dinamizaram as relações políticas da cidade. No que se refere à política de assistência social, é observado o compromisso das gestoras entrevistadas em implantar o SUAS e garantir um serviço de qualidade às famílias atendidas. Obviamente que ainda há pontos frágeis no processo, principalmente no que diz respeito ao número reduzido de profissionais e as mais diferentes demandas que sobrecarregam as equipes. “Então, eu acho que a gente, enquanto, direção investiu muito de que todos nós aqui, quer assistentes sociais, quer atendentes, quer operacionais, quer motoristas; todos nós temos um papel educativo e temos um papel de oferecer um serviço onde as pessoas se sintam como pessoas portadoras de direito. Eu acho que tem um risco grande em instituições tão duras que a gente encontra, principalmente no serviço público... E se a gente não toma cuidado isso ocorre e, os atendimentos acabam ficando de uma forma que acaba reforçando a relação de que as pessoas são coitadas, que elas se sintam diminuídas por estar precisando deste serviço.” (gestora 1) A marca impressa é de um município que soube ousar e prova disto é iniciar o atendimento dos grupos socioeducativos pelas famílias em situação de risco. Estratégia marcada pela coragem de encarar os problemas e enfrentá-los, o que às vezes é raro se comparado a outros municípios. O ―tiro‖ que poderia sair pela culatra, trouxe a equipe técnica um amadurecimento para discutir a profissão, a política de assistência social e suas estratégias de atuação. O grupo focal refletiu o que é Santo André e, apesar da dificuldade de encontrar argumentos para a discussão de temas tão polêmicos como 88 o socioeducativo e a própria função educativa/pedagógica do assistente social, o espaço do grupo foi preenchido pelo debate. O que chama atenção neste processo é que a construção de uma pedagogia emancipatória perpassa inclusive o modo de ser dos gestores e sua forma de atuação. É fundamental que o gestor reconheça a função educativa/pedagógica de sua atuação se distanciando da postura de um buracráta-administrador, construindo uma análise crítica em seu cotidiano profissional: “Eu acho que sim (que estou distante do processo educativo). Eu acho porque assim, primeiro há alguns anos eu não atendo mai,; raramente, uma situação ou outra, a população. Muito menos nos CRAS, na porta aberta, não tenho mais este contato direto com a população. Então, eu posso tentar garantir em algum documento ou posso tentar garantir no trabalho que eu tenho com os técnicos, com as equipes que eu dirijo. A contribuição que eu posso dar hoje é isso. Se eu acredito nesse caráter educativo, no processo de reflexão, de opinião crítica, eu preciso exercitar isso inclusive com os técnicos, com as equipes que eu coordeno até para que elas possam realmente na prática exercitar isso também. Então, na medida em que eu faço reuniões com os técnicos – isso eu faço bastante – com as equipes, eu tenho que garantir que estas reuniões tenham este caráter educativo também, que levem eles a decisões, a reflexões, a se posicionar mais como atores no trabalho e que eu não seja só uma mera repassadora: olha tem que ser feito isso, isso e isso. Mas de atuar com a população eu me sinto um pouco distante, não tenho mais acesso à população pela característica do meu trabalho e nem a população tem mais acesso a mim.” (Gestora 2) Nesta fala da gestora, o que aponta é que o espaço privilegiado para a ação educativa do assistente social é o contato imediato com a população usuária. Todavia, o gestor tem uma função educativa importante porque pode potencializar o profissional assistente social para uma capacitação continuada, construindo com as equipes processos que saiam do imediato e fomentar a reflexão crítica. Por não se contaminar pela imediaticidade do cotidiano, o gestor tem um papel fundamental na construção de mediações junto à equipe técnica. Desta forma, o que se compreende é que, apesar do gestor assistente social não ter o contato direto com a população, o seu trabalho pode ter foco para que esta população tenha suas necessidades e demandas organizadas para a construção de estratégias de enfrentamento. Este olhar transforma as relações ao passo que, o 89 resultado é conseqüência do processo de construção coletiva e não o fim último da ação. É nesta perspectiva que se engrossa o movimento de construção de uma pedagogia emancipatória, quando se distancia dos valores sustentados pelo bloco dominante na busca por mediações refletidas, históricas e sustentadas pela construção de um novo modo de ser e de uma nova sociabilidade. 90 CONSIDERAÇÕES FINAIS QUANDO O FIM É O RECOMEÇO DE UM NOVO CICLO “Se as coisas são inatingíveis... ora! Não é motivo para não querê-las... Que tristes os caminhos, se não fora A presença distante das estrelas!” Mário Quintana O caminho descoberto e para qual aponta esta pesquisa por vezes parece inatingível. A cultura dominante, as formas de persuasão, as estratégias de exploração da sociedade atual nos faz sentir pequenos e inexpressivos. Olhar para a massa de usuários dos serviços do assistente social, massa esta que aumenta a cada dia, multifacetada pelas manifestações da questão social; é sentir-se uma gota solitária em meio ao oceano. Entretanto, o desafio posto faz despertar para a coragem e a lucidez de apreender que este sistema social e econômico está fadado ao caos, pois não é capaz de sustentar o bem mais precioso do ser humano, acima de qualquer consumo ou variante do marcado financeiro, que é a própria vida. Que as milhares de gotas espalhadas pelo oceano possam se aglutinar, se condensar e assim, mais do que acabar com o sentimento de solidão, possam precipitar uma onda de transformação. São gotas os agentes profissionais que comungam com o projeto ético-político profissional, os diferentes movimentos sociais que sobrevivem bravamente, os sujeitos desta sociedade que lutam por direitos humanos, civis e políticos e, mais do que isto, vislumbram outra forma de ser no mundo. O primeiro capítulo desta dissertação discorreu sobre as bases teóricas, não apenas da pesquisa, mas, do Serviço Social. As pedagogias como forma de ser da profissão, apontam que o exercício profissional é embebido do caráter educativo, mesmo que o agente profissional não seja consciente deste aspecto. Entretanto, mesmo que o exercício profissional possua um caráter educativo, nas diferentes 91 formas de atuação do assistente social, não significa que este é desenvolvido numa perspectiva emancipatória. O termo socioeducativo, esvaziado de significado, foi dissecado na busca de uma compreensão que atendesse à profissão. Ao final deste caminho investigativo chega-se à conclusão que o trabalho socioeducativo é uma intervenção profissional que tem como campo de ação as relações sociais em seu processo de reprodução e pode contribuir de forma significativa para a organização das classes subalternas, disseminação informação na direção do fortalecimento de uma nova e superior cultura. Isso desde que rompa com o caráter disciplinador e conservador que tais práticas vêm adquirindo no contexto profissional. O trabalho socioeducativo de forma geral prioriza ações coletivas e utiliza-se de metodologias próprias, entretanto deverá pautar-se fundamentalmente em processos críticos, de reconstrução histórica que proponha espaços democráticos e participativos, essencialmente abertos e criativos. Neste sentido, o caminho apontado é de coerência teórica entre o trabalho socioeducativo e o projeto éticopolítico do assistente social, eliminando ações espontaneístas e ecléticas. O desafio, entretanto, refere-se a um número considerado de profissionais, que mesmo não assumindo um debate claro, expressam no seu fazer profissional a dificuldade de traduzir o referencial teórico adotado em instrumentos e técnicas de ação. E desta forma, se estabelece uma busca desenfreada por ―dinâmicas‖, ―formulários‖, ―metodologias‖ e instrumentos de todos os tipos. O Serviço Social é uma profissão de caráter eminentemente interventivo e imersa num cenário complexo. O trabalho socioeducativo muitas vezes é preenchido pelo imediato gerando uma busca por respostas, por metodologias e técnicas de atendimento que tragam mais ―eficiência‖ aos serviços prestados. Toda esta eficiência poderá muitas vezes ser traduzida em dados quantitativos e não qualitativos; desconectados de uma reflexão teórica. “Se não se captar o trabalho a partir de uma ontologia de raiz materialista-histórico e a instrumentalidade do processo de trabalho (Cf. Marx, 1985ª, 1994; Lukács, 1979), mas, também, se não se aprender a natureza e o significado sócio-histórico da profissão (Iamamoto, 1982), se não se compreender que a profissão envolve 92 questões de saber e de poder (Faleiros, 1989, p.85) e sua particularidade é o sincretismo (Netto, 1991), se não se considerar a consciência como produto histórico do ser social no seu processo de trabalho, se não se captar os processos de alienação do mundo burguês, se não se ponderar sobre a interconexão de ambos na intervenção profissional (Martinelli, 1989), então, a questão da instrumentalidade do Serviço Social se reduzirá aos conteúdos, aos repertórios e aos procedimentos técnicos-operativos da profissão, tal como naquela concepção „técnico-intrumentalista‟... “ (GUERRA, 2004:112) Diante da escolha teórica profissional, não é possível discutir instrumentalidade, instrumentos e técnicas, como o trabalho socioeducativo, reduzidos em si mesmos, de intenção imediata. A realidade torna urgente o debate sobre instrumentalidade, pois os profissionais atuam no cotidiano construindo suas estratégias de ação. Todavia, a perspectiva de totalidade e a coerência teórica são alicerces fundamentais para tal discussão. Cabe, ainda, na perspectiva do trabalho socioeducativo, a iniciativa e a competência para dialogar com as diferentes disciplinas, já que, o socioeducativo é eminentemente interdisciplinar e não se defende um debate endógeno do tema. O diálogo competente com outras disciplinas visa o amadurecimento das bases teóricas e da intencionalidade dessas ações. Amadurecer é planejar o trabalho socioeducativo para além de um amontoado de dinâmicas e construir junto com a população usuária um trabalho que tenha significado para as classes subalternas, reconhecendo suas necessidades, potencialidades e estratégias de vida. Os processos de organização da cultura abrangem a totalidade da sociedade, desenvolvendo-se historicamente intencionando as múltiplas relações políticopedagógicas. A pedagogia da ajuda e da participação são mais presentes no cotidiano profissional do que se possa imaginar. Mescladas pelas mudanças atuais, que incluem um incrível avanço tecnológico, apresentam-se de forma tácita no discurso e na ação de assistentes sociais preocupados com a eficiência e eficácia de sua atuação profissional. 93 Segundo Abreu: “As metamorfoses operadas nas pedagogias da “ajuda” e da “participação” conformam uma reatualização da função pedagógica tradicional do assistente social, na sociedade brasileira, referidas ao ajustamento, integração e promoção sociais, mediante incorporação de novos elementos e mediações que refuncionalizam essas pedagogias no processo de organização da cultura a partir da orientação neoliberal. Trata-se da função histórica de ocultamento não só das dimensões econômicas e políticas da assistência no processo de reprodução da força de trabalho e no exercício do controle social, mas, fundamentalmente, como desdobramento dessas dimensões, a dissimulada manutenção do trabalhador em permanente estado de necessidade material e de dominação políticoideológica.” (2002: 226) Neste sentido, cabe questionar a intencionalidade da política de assistência social que vem sendo implantada no país e, principalmente, o PAIF como o principal programa de Proteção Social Básica. O que se observa no âmbito do PAIF e da Proteção Social Básica é um disputa na busca de sentido e significado para a ação. Se o CRAS é a porta de entrada para acesso a serviços assistências é, também, onde as mais diversas manifestações da questão social se apresentam e como lidar com esta complexidade? Se por um lado o CRAS pode ser um mero ―balcão‖ de atendimentos , focado no controle e enquadramento do usuário, por outro lado, ele possui potencialidades para apoiar projetos emancipatórios, sendo um espaço da comunidade e com a comunidade trilhar novos caminhos, pressionando gestores públicos para a realidade em questão. Seguindo esta direção, o segundo capitulo tratou de dimensionar o espaço da pesquisa, o município de Santo André através da Secretaria Municipal de Inclusão Social. Discorreu sobre a história do município sob o aspecto da assistência e as diretrizes fundamentais do PAIF. Neste ponto, os assistentes sociais, sujeitos desta pesquisa, já trouxeram sua contribuição dando vida, cor e sabor ao SUAS. A Proteção Social Básica possui caráter preventivo para o não agravamento das vulnerabilidades e riscos socais das famílias. Entretanto, os territórios de abrangência dos CRAS estão submersos na degradação da vida e das relações 94 sociais de forma acirrada, o que nos faz questionar qual ação preventiva é possível realizar mediante o caos? As condições objetivas impostas ao assistente social, configurando-o como um trabalhador assalariado, mal remunerado, muitas vezes esquecido nos territórios de atuação com as mais diferentes e complexas demandas, fazem com que, este profissional tenha uma postura crítica tênue, sendo engolido pela cultura do conformismo, reduzindo-se a um ―assistente de benefícios sociais‖. Apesar da real importância do reconhecimento deste movimento, é imprescindível que à luz do método marxiano se olhe para o assistente social não só como objeto, mas, também como sujeito de sua ação e de sua história. É nas mediações da contradição que a pedagogia da emancipação vem sendo construída na perspectiva de uma nova sociabilidade. Sociabilidade esta que não se sustente na exploração do trabalho, na exploração do meio ambiente desprovida de qualquer consciência sustentável, no acirramento das desigualdades sociais. Trata-se, então, de seguir para além da luta por direitos e não estacionar na ilusão da retomada de um ―Estado de Bem Estar Social‖. [...] a luta por direitos recoloca-se, na atualidade, num fronte em que a necessidade de resistência e enfrentamento das políticas econômicosociais de cunho neoliberais passa pela desmistificação da retórica dominante. Esta retórica incorpora as conquistas constitucionais para implementar medidas contrárias à perspectiva histórica das lutas sociais das classes subalternas. Sob esta perspectiva, as referidas conquistas colocam-se como um momento de um processo mais amplo de superação da ordem do capital e da construção de uma nova sociedade – a socialista” (ABREU, 2002:229) Este processo envolve luta e conquista e não está restrito à profissão, envolvendo outros atores da sociedade que se afinam pelos valores e objetivos de transformação social. Nesta perspectiva, insere-se o terceiro capítulo com a proposta que o assistente social, mais do que ―educar‖ o usuário, possa educar-a-ação profissional através de um continuo processo de capacitação, marcado pela leitura crítica da 95 realidade e pelo reconhecimento do movimento contraditório impressos na totalidade da ação profissional. Trata-se da construção de uma práxis23 profissional que parte de referenciais teóricos numa perspectiva intencional de transformação. É inerentemente ação como práxis que é, e, fatalmente crítica por ser imbuída da totalidade, da contradição, da historicidade e da mediação, elementos que a constitui. Que o assistente social em seu cotidiano possa se aproximar de uma práxis profissional, se distanciando assim da alienação profissional, impressa em um pragmatismo acrítico. É um caminho que não possui receitas prontas, mas, que aponta a disponibilidade do profissional em sair da ―zona de conforto‖ reconhecendo e nutrindo um seu papel altivo profissional que, deveria ser o de intelectual orgânico com um compromisso assumido na organização da cultura, das necessidades e demandas das classes subalternas. 23 “Etimologicamente Práxis, um termo grego, significa ação. Não se trata, porém, de uma ação ingênua, arbitrária, espontânea, mas, sim de uma ação dotada de uma vontade, direcionada para uma finalidade, imbuída de uma intencionalidade: trata-se de uma ação que parte de uma pré-figuração ideal do resultado que deseja atingir.” MARTINELLI, 2007 96 REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ABREU, Marina Maciel. A dimensão pedagógica do Serviço Social: bases históricoconceituais e expressões particulares na sociedade brasileira, in Revista Serviço Social e Sociedade número 79. São Paulo: Cortez Editora, 2004. ___________________. Serviço Social e organização da cultura: perfis pedagógicos da prática profissional. São Paulo: Cortez, 2002. ANTUNES, Ricardo. Adeus Trabalho? São Paulo: Cortez Editora. 1996. ARANHA, Maria Lúcia Arruda e MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à filosofia – 2a ed. São Paulo: Moderna Editora, 1993. BARROCO, Maria Lúcia. ―Os fundamentos sócio-históricos da ética‖ in Curso de Capacitação em Serviço Social e Política Social. 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Em nenhum momento da pesquisa a sua identidade será revelada e todas as informações fornecidas são sigilosas. Quando finalizada, esta dissertação se tornará pública e mesmo assim, sua identidade continuará resguardada, garantindo assim confidencialidade. Atenciosamente, Tatiana de Fátima Domingues Bruno 105 Consentimento Eu ........................................................................................................, declaro que li o Termo de Consentimento e concordo em fornecer as informações solicitadas através de entrevista e / grupo focal que serão gravados. Diadema, _____/______/________ ___________________________________________ Entrevistado __________________________________________ Entrevistadora 106 Roteiro de Entrevista 1. Onde e quando você se formou? 2. Você entende que o Serviço Social tem uma função educativa em seu cotidiano? Por quê? 3. Você consegue evidenciar isso em sua prática? Como? 4. E no trabalho com grupos socioeducativos, como você enxerga o papel do assistente social? 5. O que para você é um grupo? 6. Você poderia, por favor, definir o termo socioeducativo para o Serviço Social? 7. Por favor, fale de sua atuação com grupos socioeducativos no PAIF? 8. Em quê você acredita que o Serviço Social contribuí nos grupos socioeducativos? 9. Você planeja os encontros dos grupos? Este planejamento está baseado em quê? 10. Para você, qual o objetivo do trabalho socioeducativo com grupos de família? 11. Você recebeu em sua formação profissional capacitação para exercer este trabalho? 12. Você entende que há uma relação entre teoria e prática na sua atuação com grupos? Por quê? 13. Em qual teoria está baseado a sua atuação com grupos? Por quê? 107 Roteiro Grupo Focal 1. Apresentação de cada um, quando e onde se formou, qual o trabalho que exerce atualmente em Santo André. Temas disparadores sorteados pelos participantes: 2. O que é o PAIF em Santo André? 3. O Serviço Social tem uma dimensão educativa? Como ela se expressa na prática cotidiana? 4. Socioeducativo é....... 5. A história do Serviço Social e o trabalho socioeducativo. 6. A formação profissional e a função educativa do assistente social. 7. O significado dos grupos socioeducativos.