EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NAS ESCOLAS: APRENDENDO A RESGATAR O PATRIMÔNIO CULTURAL Allana Pessanha de Moraes* apmuenf @yahoo.com.br Resumo Neste trabalho se discute a importância da Educação Patrimonial no processo educacional, como propulsora de práticas preservacionistas do Patrimônio Cultural. De um modo em geral, a pouca valorização do Patrimônio Cultural, se dá pelo desconhecimento que a maior parte da população possui do tema que não é tratado nas escolas. Este trabalho decorre de minha inserção no Projeto de Extensão: “Patrimônio Cultural: aprendendo a conhecer. Proposta para uma ação de Educação Patrimonial”, e da pesquisa para minha monografia de final de curso na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). Palavras-Chaves: Educação Patrimonial, Patrimônio-Cultural, Cultura CULTURAL HERITAGE EDUCATION IN THE SCHOOLS: LEARNING HOW TO RESCUE THE CULTURAL HERITAGE Abstract In this article is discussed the importance of the Cultural Heritage Education in the educational process, as propellant of practical preservacionistas of the Cultural Heritage. In a way in general, to little valorization of the Cultural Heritage, if gives for the unfamiliarity that most of the population I possessed of the subject that is not tried in the schools. This work elapses of my insertion in the Project of Extension: “Cultural Heritage: learning to know. Proposition to an action in Cultural Heritage Education, and of the research for my course end monograph in the UENF. Keywords: Cultural Heritage Education, Cultural Heritage, Culture * Bacharel em Ciência da Educação pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro 1 EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NAS ESCOLAS: APRENDENDO A RESGATAR O PATRIMÔNIO CULTURAL Allana Pessanha de Moraes Introdução Este trabalho é fruto da pesquisa que realizei como parte de um projeto de extensão1 enquanto bolsista que se desdobrou em meu trabalho de conclusão de curso em Ciência da Educação2. Desta pude colher alguns resultados que serão pertinentes ao desenvolvimento deste texto3. A necessidade de trabalhar o Patrimônio Cultural nas escolas fortalece a relação das pessoas com suas heranças culturais, estabelecendo um melhor relacionamento destas com estes bens, percebendo sua responsabilidade pela valorização e preservação do Patrimônio, fortalecendo a vivência real com a cidadania, num processo de inclusão social. No Brasil o órgão governamental que cuida do Patrimônio é o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, nascido como secretaria durante o governo Vargas – SPHAN. Este órgão vem atuando no sentido de concretizar esse processo de resgate pela sociedade de seu Patrimônio Cultural e acredita que pelo processo educacional estas práticas se efetivarão. Para tanto, preparou um Guia Básico de Educação Patrimonial, contendo propostas para o desenvolvimento de ações que auxiliem e contribuam para o (re)conhecimento das pessoas no referente às questões do Patrimônio cultural. Neste sentido, no presente trabalho pretende-se discutir o conceito de Educação Patrimonial e fornecer subsídios para a implementação de ações de reconhecimento do Patrimônio Cultural 1 Projeto de Extensão: “Patrimônio Cultural: aprendendo a conhecer. Proposta para uma ação de Educação Patrimonial”, coordenado pela Professora Simonne Teixeira, Laboratório de Estudos do Espaço Antrópico-LEEA, na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. 2 Monografia apresentada em 25/10/2005, com o título: “Educação Patrimonial: Uma proposta curricular” na mesma Universidade citada anteriormente. (ver referências bibliográficas). 3 Importa ressaltar que, parte das observações deste texto foram apresentadas e publicadas nos anais do evento “Primeras Jornadas Del Mercosur y Segundas Bonarenses sobre Patrimonio Cultural y Vida Cotidiana” em La Plata, província de Buenos Aires, Argentina sob o título: “Educación Patrimonial: aprendiendo a conocer el Patrimônio Cultural” em novembro de 2004, publicada em anais do evento (ver referências bibliográficas). 2 no município de Campos dos Goytacazes, Estado do Rio de janeiro, cidade rica em prédios históricos e manifestações culturais que vem se perdendo através dos tempos. A metodologia de Educação Patrimonial pode ser aplicada em vários âmbitos, mas neste trabalho o destaque dar-se-á nas escolas, já que este tema tem como característica o enfoque interdisciplinar, além de destacar a importância da inserção deste nos currículos escolares como tema transversal. Também poderão observar as inúmeras formas de trabalho que podem ser desenvolvidas, que, além de prazeroso pode ser instigante. Com o objetivo de apreender o conhecimento dos estudantes no referente às questões patrimoniais e promover uma ação pedagógica no município de Campos dos Goytacazes, para disseminar a noção de Patrimônio Cultural e contribuir para seu entendimento e sua preservação, foi necessário delimitar o número de escolas para início de pesquisa. A partir disto, selecionou-se três escolas, o Colégio Nilo Peçanha foi escolhido por se tratar de um prédio tombado recentemente pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural). A Escola Municipal Marechal Artur da Costa e Silva e o Colégio Dom Otaviano de Albuquerque vieram a integrar o projeto em virtude da colaboração de duas professoras destas escolas no mesmo. Selecionadas as escolas, partiu-se para a escolha das séries que deveriam responder a dois questionários. Optou-se por alunos de 6a, 7a e 8a séries do ensino fundamental. São estudantes que estão sendo “preparados” para ingressarem no ensino médio. Os resultados dos questionários foram tabulados e o resultado obtido foi importante para as reflexões deste trabalho e prosseguimento do projeto. Com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), pude analisar suas propostas para o trabalho com os temas transversias e as variadas formas de se desenvolver a interdisciplinaridade. Ressaltando que este foi o ponto de destaque de meu trabalho monográfico, ao passo que o desenvolvimento de atividades com a Educação Patrimonial é inteiramente interdisciplinar, como foi dito anteriormente. Conceito de Patrimônio Faz-se necessário um pequeno esboço histórico da noção de Patrimônio, para compreender melhor o desenvolvimento deste trabalho. 3 O vocábulo Patrimônio refere-se, originalmente, à herança paterna, ou seja, aos bens materiais transmitidos de pai para filho. Daí o termo, ainda hoje, referir-se à herança familiar. A extensão do uso do termo como herança social aparece na França pós-Revolucionária, quando o Estado decide tutelar e proteger as antiguidades nacionais às quais era atribuído significado para a história da nação. O conjunto de bens entendidos como herança do povo de uma nação foram então designados como Patrimônio Histórico. Importante observar que em sua acepção original, incluía não apenas os bens imóveis, mas também os bens móveis, tais como acervos de museus e documentos textuais (TEIXEIRA et alli, 2004, p. 02). A consolidação dos Estados Nacionais durante o século XIX impôs a necessidade de fortalecer a história e a tradição de cada povo, como fator gerador de uma identidade própria. Esta ação assentada na sobreposição dos referenciais nacionais sobre os regionais e particulares e, enquanto escolha oficial, pressupôs exclusões, num processo vigorosamente homogeneizante (RODRIGUES, 2001, p. 16). Como conseqüência, a escolha e classificação de bens que deviam servir de referencial para toda a nação estariam a serviço da afirmação e reafirmação do Estado (TEIXEIRA et alli, 2004, p. 02). As definições para o Patrimônio Cultural tendem a se tornar mais abrangentes, sobretudo a partir dos anos 80, assumindo definitivamente uma visão mais holística de cultura. Esta nova perspectiva ganha um aliado de peso na direção do IPHAN: Aloísio Magalhães, que produz um profundo redimensionamento do debate em relação às políticas culturais de preservação. Durante sua administração se consolida um novo olhar a respeito do Patrimônio Cultural. É baseado nesse olhar que se pretende pautar as ações deste trabalho, valorizando a cultura regional e estando abertos para incorporar novos tipos de Patrimônio que possam ser reconhecidos. Diretrizes do IPHAN para as práticas de Educação Patrimonial O IPHAN vem concentrando seus esforços na proteção dos bens patrimoniais do País, redigindo uma legislação específica, preparando técnicos e realizando tombamentos e restaurações que asseguraram a permanência da maior parte do acervo arquitetônico e urbanístico brasileiro, bem como do acervo documental, etnográfico, das obras de arte integradas e dos bens móveis. Em sua luta pela proteção do patrimônio cultural, estendeu sua ação à proteção dos acidentes geográficos notáveis e das paisagens agenciadas pelo homem (IPHAN, 1999). 4 Este Órgao vem promovendo ações educativas e de exercício da cidadania efetivas, por meio de divulgação da importância do Patrimônio Histórico-Cultural para todos os indivíduos. Por isto, este órgão vem propondo a implementação de um Programa de Educação Patrimonial. Para tanto elaborou um Guia Básico de Educação Patrimonial, contendo conceitos, critérios, objetivos, metodologias, sugestões de atividades e bibliografia que deverão orientar a elaboração e desenvolvimento de ações que auxiliem e contribuam para a “Educação” das pessoas no referente às questões do Patrimônio Cultural, colaborando para sua preservação. Educação patrimonial: você já ouviu falar? Esta indagação surge das observações de pessoas que quando ouvem falar deste tema, não compreende o que seria em si Educação Patrimonial. Isto revela o quanto o assunto está ausente ou distante da sociedade, em particular do cotidiano escolar.Por isto será apresentado um pequeno histórico sobre a Educação Patrimonial, compreendendo sua intenção e abordagem educacional no trato com as noções e práticas patrimoniais. A Educação Patrimonial, tradução do Heritage Education – expressão inglesa, surge no Brasil em meio a importantes discussões da necessidade de se aprofundar o conhecimento e a preservação do Patrimônio Histórico-Cultural. Foi exatamente em 1983 que se iniciam efetivamente as ações de Educação Patrimonial por ocasião do 1º Seminário sobre o “Uso Educacional de Museus e Monumentos”, no Museu Imperial de Petrópolis, RJ. O princípio básico da Educação Patrimonial: Trata-se de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no Patrimônio Cultural como fonte primária de conhecimento individual e coletivo. A partir da experiência e do contato direto com as evidências e manifestações da cultura, em todos os seus múltiplos aspectos, sentidos e significados, o trabalho de Educação Patrimonial busca levar as crianças e adultos a um processo ativo de conhecimento, apropriação e valorização de sua herança cultural, capacitando-os para um melhor usufruto desses bens, e propiciando a geração e a produção de novos conhecimentos, num processo contínuo de criação cultural (HORTA; GRUMBERG; MONTEIRO, 1999, p. 06). Desta forma, a Educação Patrimonial em suas formas de mediação, possibilita a interpretação dos bens culturais, tornando-se um instrumento importante de promoção e vivência da cidadania. Conseqüentemente, gera a responsabilidade na busca, na valorização e preservação do Patrimônio. 5 O Patrimônio Cultural no processo educacional: Ações que podem ser alcançadas com as práticas de Educação Patrimonial O processo educativo, em qualquer área de ensino/aprendizagem, tem como objetivo levar os alunos a utilizarem suas capacidades intelectuais para a aquisição e o uso de conceitos e habilidades, na prática, em sua vida diária e no próprio processo educacional. O uso leva à aquisição de novas habilidades e conceitos (HORTA, 2004, p. 03). A Educação Patrimonial consiste em provocar situações de aprendizado sobre o processo cultural e, a partir de suas manifestações, despertar no aluno o interesse em resolver questões significativas para sua própria vida pessoal e coletiva. O patrimônio histórico e o meio ambiente em que está inserido oferecem oportunidades de provocar nos alunos sentimentos de surpresa e curiosidade, levando-os a querer conhecer mais sobre eles. Nesse sentido podemos falar na “necessidade do passado”, para compreendermos melhor o “presente” e projetarmos o “futuro”. O estudo dos remanescentes do passado motiva-nos a compreender e avaliar o modo de vida e os problemas enfrentados pelos que nos antecederam, as soluções que encontraram para enfrentar esses problemas e desafios, e a compará-las com as soluções que encontramos, para os mesmos problemas (moradia, saneamento, abastecimento de água, etc). Podemos facilmente comparar essas soluções, discutir as causas e origens dos problemas identificados e projetar as soluções ideais para o futuro, um exercício de consciência crítica e de cidadania (ibid, p. 03). As escolas podem e devem participar deste processo de apropriação, através de visitas a museus, arquivos e bibliotecas públicas. No caso específico do município de Campos dos Goytacazes, estas práticas podem se tornar difíceis, apesar desta cidade possuir importância histórica, pela existência de um rico acervo (uma das maiores coleções de edifícios ecléticos no Brasil), conta com um precário estado de conservação. Devido a ausência absoluta de uma política pública de preservação para estas Intistuições. A cidade conta apenas com um Museu4, um Arquivo público5 e uma Biblioteca Municipal. Além disto, a Secretaria de Educação não desenvolve ações de cunho pedagógico (educativa e participativa) que envolva a comunidade escolar. Mas há inúmeras outras ações, que podem ser utilizadas pelos professores, por exemplo, utilizarem objetos culturais na sala de aula ou nos 4 Este Museu está instalado numa sala da Biblioteca Municipal, sem condições de exibir adequadamente seu acervo ou desenvolver projetos continuados. 5 O Arquivo Público Municipal localiza-se a 25km do centro da cidade, em local de difícil acesso, não estando integrado ao cotidiano da sociedade. 6 próprios locais onde são encontrados, como peças chave no desenvolvimento dos currículos e não simplesmente como mera ilustração das aulas. A interdisciplinaridade da Educação Patrimonial nos currículos escolares A educação patrimonial nada mais é do que uma proposta interdisciplinar de ensino voltada para questões atinentes ao patrimônio cultural. Compreende desde a inclusão, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, de temáticas ou de conteúdos programáticos que versem sobre o conhecimento e a conservação do patrimônio histórico, até a realização de cursos de aperfeiçoamento e extensão para os educadores e a comunidade em geral, a fim de lhes propiciar informações acerca do acervo cultural, de forma a habilitá-los a despertar, nos educandos e na sociedade, o senso de preservação da memória histórica e o conseqüente interesse pelo tema (ORIÁ, 2005). Entretanto o trabalho com o Patrimônio Cultural e Histórico é mais facilmente compreendido no âmbito das áreas/disciplinas que mais comumente abordam o tema, como a História ou os Estudos Sociais. Trabalhar o Patrimônio, por meio de outras áreas/disciplinas, nem sempre é imediatamente percebido, pelos professores das demais disciplinas do currículo escolar (HORTA, 2005, p. 3). Outra dificuldade encontrada freqüentemente pelos professores é a de pensar interdisciplinarmente, porque toda a sua aprendizagem realizou-se dentro de um currículo compartimentado. Eles não se sentem aptos a desenvolver projetos temáticos, que pressupõem intenso trabalho coletivo e podem implicar a perda da predominância de tarefas e avaliações individualizadas (OLIVEIRA, et alli, 2003, p. 105). Além disto, os currículos escolares são comumente sobrecarregados, com disciplinas que competem entre si por limitação do tempo em sala de aula e pelas normas oficiais estabelecidas. Os objetos patrimoniais, os monumentos, sítios e centros históricos, ou o Patrimônio imaterial e natural, são um recurso educacional importante, pois permitem a ultrapassagem dos limites de cada área/disciplina, e o aprendizado de habilidades e temas que serão importantes para a vida dos alunos. Desta forma, podem ser usados como motivadores para qualquer área do currículo ou para reunir áreas aparentemente distantes no processo ensino/aprendizagem (HORTA, 2005, p. 3). Transversalidade e Interdisciplinaridade A transversalidade mantém uma relação com a interdisciplinaridade, bastante difundida pela Pedagogia. São maneiras de se trabalhar o conhecimento buscando uma reintegração de 7 aspectos que ficaram isolados uns dos outros pelo tratamento disciplinar. “Com isso, busca-se conseguir uma visão mais ampla e adequada da realidade, que tantas vezes aparece fragmentada pelos meios de que dispomos para conhecê-la e não porque o seja em si mesma” (GARCIA, 2002). Segundo os PCNs, interdisciplinaridade e transversalidade são: A interdisciplinaridade questiona a segmentação entre os diferentes campos de conhecimento produzido por uma abordagem que não leva em conta a inter-relação e a influência entre eles – questiona a visão compartimentada (disciplinar) da realidade sobre qual a escola, tal como é conhecida, historicamente se constitui. Refere-se, portanto, a uma relação entre disciplinas. A transversalidade diz respeito à possibilidade de se estabelecer, na prática educativa, uma relação entre aprender na realidade e da realidade de conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões da vida real (aprender na realidade e da realidade) (1997, p. 40). Na prática pedagógica esta relação é necessária, pois os temas transversais promovem uma compreensão abrangente dos diferentes objetos de conhecimento, bem como a percepção da implicação do sujeito de conhecimento na sua produção, superando a dicotomia entre ambos. “Por essa mesma via, a transversalidade abre o espaço para a inclusão de saberes extra-escolares, possibilitando a referência a sistemas de significado construídos na realidade dos alunos” (ibid, p. 40). Acreditamos que alguns assuntos são transversais às diversas disciplinas e o debate em torno do patrimônio histórico-cultural constitui um deles. Interessa tanto aos profissionais da educação, das áreas de história, e de geografia e por que não, da literatura. A química e a biologia não podem ficar de fora (...) (FIGUEIREDO, 2002, p. 52). Cabe destacar que os PCNs inovaram ao trazer maneiras de se trabalhar a transversalidade e a interdisciplinaridade nos currículos escolares, ressaltando que a temática da Educação Patrimonial está prevista Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino de História. Por isto ressalta-se a importância deste trabalho nas escolas, propondo aos professores, diretores, secretários, etc. a importância da temática Educação Patrimonial nos currículos escolares como forma de pulsão da comunidade escolar e circundante nas práticas de valorização e preservação do Patrimônio Histórico-Cultural. Desta forma provoca uma reflexão acerca da função da escola, sobre o que, quando, como e para que ensinar e aprender, dando destaque a temas sociais urgentes. 8 Há um agravante que necessita ser explanado antes de se tomar tais medidas de inserção desta temática nos currículos, prestar atenção na formação dos futuros educadores (quer eles de quaisquer área ou nível) nesta questão é essencial. Reconhece-se que os professores formados nas universidades sejam elas públicas ou particulares, têm um preparo limitado e, em muitos casos, nenhuma formação específica sobre as temáticas referentes às discussões e reflexões relativas ao Patrimônio (FIGUEIREDO, 2002, p. 52). Desta forma todo um esquema de ações necessita ser posto em prática. Uma delas é fornecida por Paulo Freire: (...) a educação ou ação cultural para a libertação, em lugar de ser aquela alienante transferência de conhecimento, é autentico ato de conhecer, em que os educandos – também educadores – como consciências ‘intencionadas’ao mundo, ou como corpos conscientes, se inserem com os educadores – educandos também – na busca de novos conhecimentos, como conseqüência do ato de reconhecer o conhecimento existente (1984, p. 99). Nesse sentido, o trabalho transversal e interdisciplinar deve ser mais difundido de maneira em geral em todas as escolas. Pois, para se trabalhar com a Educação Patrimonial é imprescindível estes dois temas. Conseqüentemente estará propiciando um resultado coeso e enriquecedor, numa atuação integradora das disciplinas obrigatórias, além de permitir a todo o instante o desenvolvimento de tais ações dentro e fora da sala de aula. Primeiras iniciativas de Educação Patrimonial em Campos dos Goytacazes Vimos que o termo Patrimônio Cultural, tradicionalmente procura dar conta dos bens entendidos como pertencentes a um povo ou nação, que na atualidade procura incluir os bens referenciais de toda a sociedade. A Educação Patrimonial se apresenta como um campo propício ao desenvolvimento do conceito de Patrimônio Cultural, permitindo a absorção de novos referenciais para sua seleção e a democratização das práticas culturais. Desta forma, como metodologia, a pretensão foi de desenvolver uma ação pedagógica com alunos de 6a, 7a e 8a séries do ensino fundamental, inicialmente em três escolas públicas do município de Campos dos Goytacazes, o Colégio Estadual Nilo Peçanha, a Escola Municipal Marechal Artur da Costa e Silva e o Colégio Dom Otaviano de Albuquerque. Tornando-se necessário traçar o perfil das mesmas. 9 As escolas apresentam um perfil diferenciado se comparadas. O Colégio Nilo Peçanha que tem seu prédio tombado pelo INEPAC – órgão de preservação do estado do Rio de Janeiro – localiza-se no centro da cidade, próximo aos principais terminais rodoviários, municipais e intermunicipais, recebendo estudantes de diferentes distritos e lugares, da cidade. A Escola Municipal Marechal Artur da Costa e Silva situa-se em Guarus e atende a comunidade circundante, oriunda da maioria de famílias carentes. O Colégio Dom Otaviano incorporou-se ao projeto no segundo ano e está localizado no distrito de Ururaí, uma área afastada do centro e que também atende a alunos carentes da área próxima. É interessante notar que esta comunidade está estreitamente relacionada à Usina que ali se encontra. Partiu-se então para a elaboração de questionários, onde foram aplicados para um total de 394 alunos destas escolas, com intenção de apreender a realidade e seu conhecimento sobre o Patrimônio Cultural. No primeiro questionário não se mencionou o termo Patrimônio, e as questões abordavam a realidade cultural do aluno, a participação em festividades da cidade, em brincadeiras, os lugares visitados e algumas questões sobre os recursos utilizados pelos alunos no seu dia-a-dia. A ênfase restringiu-se aos aspectos da realidade cultural dos estudantes. No segundo questionário, já se perguntava diretamente sobre Patrimônio Cultural, seu conhecimento sobre o assunto, sua importância, etc. de forma a entender melhor a sua relação com o tema. Cabe ressaltar que o primeiro questionário contou de 11 perguntas, pelo qual destaquei três resultados. O segundo questionário compõem de 7 questões e destaquei um resultado. A escolha destes resultados se deu em razão das respostas dadas pelos alunos tratarem diretamente do tema desta memória. Com a comparação dos dois, pode-se entender um pouco como se situa a questão entre os estudantes. De acordo com os dados, 43% afirmam nunca terem ouvido falar de Patrimônio cultural, mas baseados nas informações do segundo questionário percebe-se que há uma certa apropriação do conceito de patrimônio tradicionalmente usado no Brasil. Afirma-se como conceito tradicional, aqueles baseados nas idéias constituídas na primeira fase de trabalhos do IPHAN que enfatiza as construções e objetos mais tradicionais, todos vinculados à cultura das elites. Os valores considerados de cunho popular e imaterial só foram 10 incorporados posteriormente e somente nos dias atuais vêm passando por um processo de valorização. A maioria dos alunos (75%) considera obras de arte como Patrimônio, o que confere com as respostas dadas à questão sobre “o que considera cultura” feita no primeiro questionário. Neste, 87% afirmaram considerar obras de arte como cultura, o que demonstra certa lógica de pensamento, privilegiando a concepção elitista da obra de arte erudita. De acordo com os dados, outros tipos de Patrimônio menos “privilegiados” no Brasil, como livros, lendas, artesanato, escolas, festas populares, documentos históricos e casas de pessoas importantes recebem mais de 50% (afirmam que é Patrimônio). Mas, quando questionados sobre o Patrimônio na cidade de Campos, não com opções para marcar, mas sim para escrever a resposta, os mais citados foram edificações de maior visibilidade na cidade como Liceu, Fórum, Casa de Cultura Vila Maria, Palácio da Cultura e Teatro Trianon, que pode ser relacionado ao fato de outros tipos de Patrimônio mais tradicionais como solares 39% e casas de pessoas importantes, 53% também receberam uma boa porcentagem. Importa notar que não são, em geral, elementos espacialmente localizados próximos aos alunos os citados. Por exemplo, pouquíssimos alunos de uma das escolas (o Colégio Estadual Nilo Peçanha), citou-a como Patrimônio. Outros tipos são também considerados Patrimônio, mas não são lembrados na hora de citar. Tomando-se, por exemplo, as festas populares, 50% afirmam serem estas Patrimônio Cultural e no questionário I, respondeu-se que festas como São Salvador (padroeiro da cidade), carnaval e festa junina são bastante freqüentadas, mas nenhuma é relacionada quando se fala em Patrimônio na cidade. Parece não haver uma relação entre conceito e vivência, isto é, não é feita uma relação direta entre o que é considerado Patrimônio e o que está presente no cotidiano. Não existe uma apropriação simbólica. O mesmo acontece com outros itens como lendas e folclore (citadas como Patrimônio) e outras manifestações culturais presentes no cotidiano dos alunos (pelo menos algumas delas) que não são citados como Patrimônio Cultural. Destacamos as bandas e fanfarras que fazem parte do cotidiano escolar, tendo a participação de muitos, mas o não (re) conhecimento como Patrimônio. Todos estes dados revelam que a maioria dos estudantes não possuem um reconhecimento identitário com seu Patrimônio. Averiguou-se nos questionários que suas respostas respaldam os 11 processos históricos de uma política cultural que preservou os bens de “pedra e cal”, esquecendo da importância das tradições, saberes e práticas populares, ou seja, o Patrimônio Imaterial. A partir de minhas reflexões como Pedagoga, bolsista de pesquisa em extensão e conforme estudos de minha formação específica, teço as seguintes considerações. É necessário a promoção de uma ação pedagógica que direcione aos estudantes estes conceitos de Patrimônio e sua importância. É (re)conhecendo a identidade cultural que se passa a valorizar e preservar aquilo que reconhece como seu. Porém, antes desta ação pedagógica com os estudantes, deve-se inserir os professores nesta prática, trabalhando os principais conceitos relativos ao tema, num processo interdisciplinar e transversal. Em suma, a Educação Patrimonial pode e deve ser incluída nos currículos escolares, levando à comunidade escolar ao resgate e preservação do Patrimônio Cultural. Conclusão A partir da leitura de bibliografia específica pude constatar a preocupação dos autores e de alguns órgãos de preservação do Patrimônio Cultural no Brasil em difundir e valorizar o acervo cultural do País. Neste contexto, a Educação Patrimonial configura-se como uma proposta ainda pouco difundida, embora reveladora de um trabalho que pode tornar-se facilitador do conhecimento crítico por parte das comunidades e indivíduos com relação ao seu Patrimônio Cultural, fortalecendo o sentimento de pertencimento. Neste sentido, destaca-se a atuação do IPHAN na preocupação de implementar ações específicas, colaborando com a confecção do Guia Básico de Educação Patrimonial e outras publicações. Em sua luta pelo Patrimônio Cultural vem elaborando propostas educacionais para efetivar seu trabalho em conjunto com a população, por isto vem atuando na área da Educação Patrimonial. Porém, cabe às Secretarias de Educação (municipal, estadual e federal), mas sobretudo a municipal, pois é quem deveria ter interesse em implantar programas educativos de preservação do seu próprio Patrimônio Histórico-Cultural. A partir disto, constatou-se a necessidade de contribuir para a valorização do Patrimônio Cultural na região, entendido de modo mais amplo, incorporando inclusive os bens imateriais. 12 Deste modo deu-se início à proposta de desenvolver uma ação pedagógica (referentes às práticas patrimoniais e culturais) com alunos e professores, em três escolas públicas do município de Campos dos Goytacazes. Através dos questionários aplicados pôde-se perceber e intuir o conhecimento de estudantes de 6a a 8a séries em relação ao Patrimônio. O dado mais importante observado foi o conteúdo das respostas que valorizam, sobretudo, os bens de “pedra e cal”, sendo que poucos consideram manifestações culturais imateriais como Patrimônio. Esta observação reforça a necessidade de ampliar a idéia de Patrimônio em ações pedagógicas, rompendo com o modelo historicamente estabelecido. Neste sentido, acredito que a prática de Educação Patrimonial faz-se necessária em todos os âmbitos, tais como museus, bibliotecas, arquivos, etc., mas de maneira efetiva nas escolas desde a alfabetização, para que estas ações possam ser realizadas de maneira continuada. Então, proponho a inserção deste tema nos currículos escolares como tema transversal, visando um trabalho integrado e interdisciplinar. Tal proposta não é tarefa fácil. Porém, a partir de minhas observações nas escolas, constatei a necessidade de difundir este tema com os professores, apresentando suas várias formas de se trabalhar nas escolas com as disciplinas obrigatórias. Os objetos patrimoniais, os monumentos, sítios e centros históricos, ou o Patrimônio imaterial e natural, são um recurso educacional importante, pois permitem a ultrapassagem dos limites de cada área/disciplina, e o aprendizado de habilidades e temas que serão importantes para a vida dos alunos. Desta forma, podem ser usados como motivadores para qualquer área do currículo ou para reunir áreas aparentemente distantes no processo ensino/aprendizagem. É importante considerar que a Educação Patrimonial contribui muito na formação de professores e estudantes, tornando esses sujeitos ativos e conscientes, tornando-os atentos com seu entorno, “no mundo e com o mundo” e exercendo de fato sua cidadania. 13 Referências bibliográficas AMORIM, Rômulo Alves de. Educação Patrimonial e Patrimônio: as representações sociais do Professor de História do ensino Fundamental, da 5a à 8a série, das redes municipais do Recife e do Cabo de Santo Agostinho. 235 f. Dissertação (Mestrado em Educação). 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