IV Congresso Argentino do Cuaternário y Geomorfologia
XII Congresso da Associação Brasileira de Estudos do Quaternário
II Reunión sobre el Cuaternário de América del Sur
CONSTRUÇÃO E EROSÃO DE UMA DUNA FRONTAL EM MANGUE SECO, COSTA DOS
COQUEIROS, BAHIA, BRASIL
Liana Maria Barbosa¹, Maíse Ferreira Oliveira²
¹Área de Geociências, Depto. Ciências Exatas, Universidade Estadual de Feira de Santana, Labexa 13.
²Licenciada em Geografia, Colégio Positivo, bolsista FAPESB (2005-2007) ([email protected]).
Convênio CNPq conv. 479.479-2007.0
RESUMO
A Área de Proteção Ambiental de Mangue Seco, no extremo nordeste da costa da Bahia, é caracterizada
pela presença de um campo de dunas ativas, onde foi experimentado um programa de fixação de areia
eólica entre 1983 e 1986. Bordejando a linha de costa, desenvolveu-se uma duna frontal nas proximidades
da vila de Mangue Seco. Nos últimos dez anos, aproximadamente, os processos estão dissecando a duna
frontal e recuando a linha de costa. Palavras-chave: coastal dunes, duna frontal, erosão costeira, fixação
de areia eólica
ABSTRACT
The Environmental Protection Area of Mangue Seco, in the extreme northeastern at the coast of Bahia,
has an active coastal dune field. There, a fixation program was developed in order to obstruct the aeolian
sands between 1983 and 1986. Bordering the shoreline, a foredune developed nearest the Mangue Seco
village. In the last decade approximately, this foredune is suffering dessication and the shoreline is in
erosion.
Keywords: coastal dunes, foredune, coastal erosion, dune fixation
INTRODUÇÃO
Dunas eólicas têm papel relevante nos sistemas costeiros arenosos. De habitat ecológico importante, de
beleza cênica e de utilidade recreativa, os sistemas dunares são atrativos para lazer e turismo. Dunas
frontais (foredunes) formam-se pela deposição de areia eólica associada com vegetação, desenvolvendo
cordões alongados paralelos às praias arenosas (BIGARELLA, 1972, HESP, 1983). Sob ação de ondas de
tempestade, as dunas frontais representam barreiras de proteção contra erosão e inundação costeira
(BAUER & SHERMAN, 1999, HESP, 1990). Sazonalmente, o flanco dorsal do corpo dunar experimenta
erosão devido à forte energia das ondas e posteriormente, recuperar o perfil de equilíbrio, em condições
de balanço sedimentar positivo. Todavia, em situação de balanço sedimentar negativo, a dissecação é o
resultado mais comum (PSUTY, 1993). Neste caso, há recuo da linha de costa e ou perdas de
propriedades em áreas com ocupação humana. Em dunas frontais erodidas na costa da Nova Zelândia
ocorreu uma bem sucedida experiência de contenção com plantio de vegetação nativa. Em dois anos o
flanco dorsal da duna foi colonizado por uma densa cobertura vegetal (DAHM et al., 2005). Na costa sul
da Califórnia, nos Estados Unidos, dunas frontais com boa cobertura vegetal resistiram bem à ação das
ondas de tempestades, geradas com a passagem do furacão “Hugo” (STAUBLE et al. 1990). HESP
(1983) descreve dois tipos de dunas frontais: incipientes e estabilizadas. Dunas frontais incipientes ou
embrionárias, normalmente com vegetação esparsa, são facilmente recortadas durante ação de ondas de
tempestade, favorecendo a formação de leques de lavagens e os corredores de ação eólica. Portanto, a
densidade da cobertura vegetal é importante como obstáculo à ação destrutiva das ondas e do vento. Além
dos fatores naturais (oceanográficos, climáticos), fatores resultantes da ação humana favorecem
facilmente alterações dos sistemas dunares. Em documento oficial dos Estados Unidos (US Department
of Commerce, 1998, p. F-15), a ocupação sobre, defronte ou adjacente aos campos de dunas arenosas
ampliaram processos de erosão costeira (BAUER & SHERMAN, 1999). Portanto, devido ao relevante
papel das dunas frontais, estudiosos têm se debruçado na investigação e construção de modelos numéricos
e simulações computacionais, visando compreensão da morfodinâmica e definição de modelos de tais
feições para proteção costeira e contenção da erosão (JUDGE, 2003). Deste modo, o principal objetivo
deste trabalho é compreender a ineficácia de um plantio vegetal, que propiciou o desenvolvimento de uma
duna frontal na Área de Proteção Ambiental (APA) de Mangue Seco, no extremo nordeste da Bahia (Fig.
1). O programa de fixação entre 1983 e 1986, visou proteção costeira e extrativismo. De acordo com o
Projeto de Gerenciamento Costeiro do Litoral Norte da Bahia (CRA, 2003), esta APA está inserida em
área de alta fragilidade física e de preservação, portanto, “as atividades antrópicas devem ser evitadas ao
máximo, cabendo apenas algum tipo de atividade de baixíssimo impacto, ou usos praticados por
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comunidades tradicionais, devidamente analisados e avaliados” (p. 62), com uma proposta de zoneamento
dentro das seguintes indicações: (a) zona agro-ecológica, (b) zona de urbanização restrita e (c) zona de
preservação da vida silvestre. A zona agro-ecológica proposta para a APA de Mangue Seco corresponde
ao trecho da duna frontal, objeto de nosso estudo.
MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo se fundamenta em trabalhos de campo e interpretação de fotografias aéreas e imagem de
satélite. Para cartografia, tomou-se como base fotografias aéreas pancromáticas (1:62.000, SACS, 1971;
1:25.000, CONDER, 1993) e uma imagem de satélite (World View de alta resolução). Os trabalhos de
campo foram realizados entre novembro de 2004 e março de 2009, em geral, em período de marés de
sizígia. A linha de preamar foi registrada com GPS de mão e os indicadores geomórficos foram
documentados durante as caminhadas, seguindo as recomendações de Vance et al. (1996), Souza et al.
(2005) e Dominguez et al. (2006) para registro das evidências de retrogradação, equilíbrio e progradação.
Deste modo, obteve-se o contorno da planície costeira e os indicadores geomórficos entre a Praia de
Coqueiros e a Praia de Mangue Seco (Fig. 1). Em virtude da ausência de estação meteorológica no local,
registros diários de parâmetros climáticos (ventos, precipitação, insolação e evaporação) foram solicitados
à Estação Meteorológica de Aracaju em responsabilidade do Instituto Nacional de Meteorologia INMET, através da Divisão de Meteorologia de Salvador. Portanto, foram considerados dados de
precipitação, insolação, evaporação e ventos diários, mensais e anuais de responsabilidade do INMET e,
coletados dados locais com anemômetro portátil para obtenção de registros instantâneos de ventos
superficiais em um ponto reconhecido como corredor eólico adjacente à duna frontal (Fig.1).
PARÂMETROS CLIMÁTICO-OCEANOGRÁFICOS
Dados Regionais
Considerando os parâmetros climáticos da Estação Aracaju (INMET), no período de 2001 a 2008, a
variação anual de precipitação foi de 1078mm a 1479mm (média de 1525 mm anuais). Em geral, as
medidas de precipitação superior a 150mm ocorrem nos meses de abril a julho (período chuvoso), ao
passo que registros inferiores a 50mm ocorrem principalmente nos meses de janeiro e de outubro a
dezembro (período seco). Os registros de insolação variam de 160 a 312 horas mensais, com média de 5,3
a 10,4 horas diárias: moderada a alta. Em 2006, a concentração de chuvas no mês de outubro foi
excepcional com 215mm para o trimestre de outubro a dezembro; adicionalmente, ocorreram maiores
tempos de insolação e valores mais negativos para o balanço hídrico. Os ventos dominantes provem do
quadrante leste; maior freqüência de registros de ventos de leste, seguidos de sudeste foram observados
de 2004 e 2005 ao passo que os ao passo que a maior variabilidade direcional ocorreu nos anos de 2006 e
2007 (Fig. 2). As marés apresentam caráter semidiurno em regime de mesomáres, considerando os dados
das Estações Portuárias de Aracaju e de Salvador. Na década de 1980, em régua maregráfica da FEMAR
no interior do canal do Rio Real, o registro médio máximo foi de 2,14m. Os dados regionais das frentes
de ondas (Hogben & Lumb 1967, US NAVY 1978) apresentam de 5 a 7 s de período e, de 1,0 a 1,5 m de
altura. As ondas provenientes de leste dominam com freqüência anual de 40 a 50%, sendo seguidas por
ondas de sudeste e nordeste. A orientação da linha de costa varia de 30° a 55°, favorecendo a ação frontal
dos ventos provenientes de sudeste.
Dados Instantâneos
Os registros instantâneos de velocidade de vento revelam dois conjuntos de dados (Fig. 2): o primeiro
conjunto inclui registros superiores a 50% de ventos eficazes (>4,5 m/s), nas amostragens de 13/11/2004,
03/09/2005 e 09/12/2006; o segundo conjunto inclui em maioria ventos fracos registrados nas
amostragens de 16/12/2005 e 15/09/2007. As maiores velocidades foram registradas na amostragem de
09/12/2006. Ainda assim, tanto os ventos regionais (Estação Aracaju, INMET), quanto os ventos locais
aqui apresentados indicam energia baixa a moderada (Fig. 2). Os padrões instantâneos obtidos e os
regionais mostram que os ventos provenientes do quadrante leste são dominantes e a maior variabilidade
direcional é indicada nos padrões em 2006 e 2007 (Fig. 2). Em todas as datas de observação, a
pluviometria registrou dias sem chuvas ou inferior a 50mm. Os dados de insolação variaram de 160 a 312
horas mensais, com média de 5,3 a 10,4 horas diárias: moderada a alta. Maiores tempos de insolação e
valores mais negativos do balanço hídrico foram registrados em 2006. Isto corrobora com os valores mais
elevados da velocidade dos ventos superficiais registrados in situ.
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Figura 1 – Unidades ambientais e de uso com base em fotografia aérea (CONDER 1993) nas vizinhanças
do campo de dunas de Mangue Seco e a localização do setor de estudo. Legenda: Qt2 – terraço marinho
holocênico, dv – duna vegetada, dfi – duna frontal induzida, la – lençol de areia eólica, i – interduna, l –
laguna, m – mangue, da – duna ativa, p – plantação de coqueiros, ps – plantação de salsa de praia.
MORFOLOGIA
A APA de Mangue Seco situa-se em uma planície de progradação associada com a desembocadura do
Rio Real/Rio Piauí. Com uma extensão de 10,3km (SW-NE), esta unidade de conservação ambiental tem
largura variável de 1,5km a 3,5km (NW-SE). É uma planície marcada pela presença de terraços marinhos,
mangues, lagunas, dunas e praias, onde os parâmetros físicos dominantes incluem ação de: (i) marés - na
borda do canal do Rio Real, com a presença de falésias e pontais arenosos em influência das marés de
enchente, (ii) ondas, com o desenvolvimento de praias arenosas e (iii) ventos, que ao longo da história de
evolução desta planície gerou o campo de dunas ativas com feições de até 23m de altura. Bordejando este
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campo de dunas, os registros locais do coeficiente de dissipação das ondas variam de 0,2 a 0,5 e, alturas
em média de 1,5m. Foram contadas de 3 a 5 zonas de quebra de ondas durantes as observações. Os
sedimentos variam de areia fina a muito fina. As praias apresentam características de dissipativas a
intermediárias. Ao longo da linha de praia, o campo de dunas é marcado por um cordão dunar, que
Barbosa et al. (2004) caracterizou como duna frontal induzida adjacente a uma superfície arenosa
mantiforme, similar ao que Dominguez & Barbosa (2004) descrevem como lençol de areia no campo de
dunas ativas associada à foz do Rio São Francisco. No interior do campo de dunas, individualizam-se dois
setores: (a) o setor a sotavento da duna frontal, caracterizado pela presença de um cordão vegetado (dv),
zonas interdunares (i) e dunas barcanóides/transversais (da) mais elevadas na parte mais interna e (b) o
setor a sotavento do lençol de areia, que apresenta pequenas cristas barcanóides e barcanas isoladas, zonas
interdunares e dunas de precipitação na parte mais interna (da) (Fig.1). Como mencionado anteriormente,
o setor indicado para zoneamento agro-ecológico no Plano de Gerenciamento Costeiro (CRA 2003)
corresponde à duna frontal, objeto principal do presente trabalho (Fig. 1). O histórico deste setor entre
1950 e 1980 está associado com: (i) ocupação humana, com construções de alvenarias para veraneio e
plantio de coqueiros esparsos e (ii) erosão costeira, com variações da linha de costa. Entre 1984 e 1986,
neste local foi efetuado um plantio programado para fixação da areia eólica, medindo 600m de extensão e
250m de largura, cruzando o campo de dunas.
Figura 2 – Ventos: (A) Frequência direcional anual dos ventos com base na Estação Aracaju (INMET);
(B) Velocidades dos ventos instantâneo, registradas com anemômetro portátil nas datas de trabalhos de
campo.
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Registros orais revelam que as espécies vegetais aplicadas foram salsa de praia (Ipomoea pescaprae) e
coco (Cocos nucifera). Em tese, o plantio de coco foi efetuado em malha de 25m x 25m. Com o objetivo
de proteger o plantio, uma cobertura com palhas de coqueiros (técnica local bastante usual) foi
acrescentada. Em uma área menor e no topo do cordão arenoso adjacente (setor NE), foram colocadas
apenas palhas de coqueiro. No experimento, identificou-se que a vegetação nativa desenvolveu-se em
ambas as áreas. Com isto os técnicos concluíram que a cobertura com palha de coqueiro por si só era
eficiente como proteção ao transporte eólico e por conseqüência, para o desenvolvimento da vegetação
nativa. Deste modo, a aplicação de salsa de praia seria irrelevante. Após uma década a fisiografia
modificou, formando-se um cordão dunar externo, que Barbosa et al. (2004) caracterizou como duna
frontal induzida. A obstrução de sedimentos a barlavento, pela vegetação e topografia, permitiu a
migração de areia eólica da porção distal, a sotavento. Contudo, esta areia foi obstruída pela vegetação de
restinga ainda preservada na zona interdunar, favorecendo o desenvolvimento do cordão arenoso (dv)
colonizado por vegetação nativa (Fig. 1). A duna frontal induzida atingiu 5m de altura, 400m de largura e
se estendeu por quase 1200 m, bordejando a linha de praia. Com base em fotografias aéreas de 1993, o
espaçamento entre os coqueiros é variável no flanco barlavento desta duna. No período 2004 – 2009,
feições eólicas piramidais, similares às dunas de sombra, isolados e erodidas nas partes laterais. Nota-se
que a trama das raízes dos coqueiros obstruiu grandes quantidades de areia eólica, porém o topo dunar
mostra uma variabilidade topográfica, que provavelmente facilitou a formação dos corredores de acesso
às ondas e aos ventos e propiciou o processo erosivo. Portanto, indica-se que a variação do espaçamento
entre os coqueiros superior a 25m, é um é um indicador de perda da vegetação, provavelmente pelo
soterramento eólico e pela ação das ondas de tempestade. No trecho a sudeste desta duna frontal,
mantém-se o lençol de areia eólica. Dele, é possível visualizar o perfil da duna frontal (Figs. 3 e 4). Em
período chuvoso, a superfície do lençol de areia apresenta canais de escoamento das águas das zonas
interdunares para a praia. As bordas destes canais variam de poucos centímetros até 1,0m de altura e
largura variável de 16 a 50m. O canal mais largo se situa adjacente à duna frontal (Figs. 3 e 4). As
superfícies erosivas, em seções verticais, exibem o soterramento de lixo depositado anteriormente pelas
ondas de tempestade e ação do vento (lâmpadas incandescentes e fluorescentes, frascos de vidro e de
plástico de bebidas, embalagens de alimentos, de cosméticos, fragmentos de peças eletrônicas, etc.).
Figura 3 – Duna frontal induzida ao fundo e o lençol de areia adjacente; falésia esculpida no flanco dorsal
da duna, fotografia de set.2007.
MORFOMETRIA, INDICADORES GEOMÓRFICOS E FORMAS DE USO
Os indicadores geomórficos mais comuns do setor de estudo até a desembocadura do Rio Real/Piauí
incluem: (a) redução de faixa de praia recreativa, mesmo em horário de preamar de quadratura (“marés
mortas”). Como conseqüência há impedimento da passagem de transeuntes e de veículos entre a foz e as
barracas de praia em Mangue Seco; (b) erosão, com falésias esculpidas nos flancos dorsais de dunas entre
a praia de Mangue Seco e a praia de Coqueiros (Figs. 3 e 4B, 4C e 4D); (c) erosão, com falésias
esculpidas nos flancos dorsais e laterais das dunas na foz. As dunas desenvolvidas no topo do pontal
arenoso avançam sobre a restinga e sobre o mangue desenvolvido na laguna. A erosão expõe a alternância
de sedimentos ricos em matéria orgânica dos mangues recobertos por sedimentos arenosos das dunas e
dos leques de lavagem (washover fans) que ocorrem associados (Fig. 1); (d) Faixas frontais de mangues
destruídas pela ação das ondas, com exposição de bancos lamosos e vegetação seca em posição de vida na
foz. Estas feições estão associadas com dunas e leques de sobrelavagem também erodidos a barlavento e
o evidente recuo da margem direita da Barra da Estância para sudoeste, conforme trabalhos anteriores
(CPRM/CRA 1994, BARBOSA et al. 2004) se aproxima da fisiografia que se exibia em 1955; (e)
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Depósitos de minerais pesados nas margens internas do canal ou na faixa de linha da preamar nas
proximidades da foz; (f) Recuo da zona de desova das tartarugas, como pode ser observado no
acompanhamento das estacas do Projeto Tamar; (g) erosão eólica das dunas dissecadas pelas ondas.
Figura 4 - Indicadores geomórficos: (A) canal recortando o lençol de areia adjacente à duna frontal, (B)
coqueiros caídos defronte à duna, (C) flanco dorsal com a encosta em aparente equilíbrio e (D) flanco
dorsal da duna frontal induzida com exposição das raízes dos coqueiros.
As formas de uso documentadas em Lima (2007) incluem pesca, pastagem, turismo, tráfego de veículos
ao longo da praia e cruzando o campo de dunas. A pesca é artesanal. A passagem de bovinos e caprinos
na zona de influência da preamar é comum e no lençol de areia adjacente à duna frontal. O turismo teve
impulso após 1989 com a divulgação nacional de Mangue Seco através da novela e filme baseados no
romance Tieta de Jorge Amado. Com a chegada do turismo, formaram-se frotas de buggys para passeio
na praia e dunas. O acesso à vila de Mangue Seco é mais freqüente por barco, devido à fisiografia,
tornando-a relativamente isolada. A despeito da dificuldade de acesso por rodovias, há trânsito de
veículos pela praia em período de preamar desde a Praia Costa Azul, situada a sudoeste da Praia de
Coqueiros. O roteiro de passeios de buggys ou de veículos de tração ocorre na praia e no campo de dunas.
O caminho da praia para as dunas é feito através dos corredores naturais entre dunas de sombra ou dos
corredores de erosão que cortam a duna frontal induzida. A pastagem é comum no lençol de areia
adjacente à duna frontal. Neste setor, as construções atuais são de baixo impacto, em geral de palha,
concentradas na praia de Mangue Seco (Fig. 1). Com respeito à dinâmica costeira, verifica-se que em
todos os perfis documentados, a erosão costeira é dominante (Tabela I). Entretanto, nas amostragens de
dezembro de 2006 e setembro de 2007, outros indicadores foram identificados: equilíbrio e acumulação.
Indicando uma variabilidade nos processos costeiros (Fig. 5). A acumulação de areia defronte ao lençol
de areia suavizou a borda deste domínio ao passo que a erosão se estende, alcançando o setor a NE, na
borda do pontal arenoso de Mangue Seco.
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Tabela I – Dinâmica costeira ao longo da linha de preamar nos dias de observação. Legenda: E – erosão,
Eq – equilíbrio, A – acumulação, Df – duna frontal, LA – lençol de areia.
A migração lateral da foz do Rio Real/Rio Piauí, em sua margem direita está documentada. Nos últimos
54 anos ocorreu: (a) entre 1955 e 1990, houve migração lateral da linha de praia para NE, com o
desenvolvimento do pontal arenoso de aproximadamente 2,5km (CRA/CPRM, 1994, Barbosa et al. 2004)
no trecho situado entre as barracas de praia de Mangue Seco; (b) retração lateral do pontal, com migração
da desembocadura no sentido SW em uma taxa estimada em 100 m/ano (Barbosa et al., 2004) e formação
de esporões de maré enchente, favorecendo o desenvolvimento de uma laguna adjacente ao campo de
dunas e o canal do rio Real. Em dezembro de 2008, a distância entre as barracas de praia de Mangue Seco
e a curva da foz é de aproximadamente 800m.
Figura 5 – Processos costeiros entre a Praia de Mangue Seco e a Praia de Coqueiros. E – erosão, Eq –
equilíbrio, A – acumulação
DISCUSSÃO
A questão é: por que a duna frontal induzida de Mangue Seco não resiste às ondas de tempestade e aos
ventos locais de energia baixa a moderada? Tanto os controles naturais quanto as intervenções humanas
corroboraram para a ineficácia desta barreira arenosa como proteção costeira. A fisiografia costeira
associada com desembocadura fluvial é um dos controles ambientais mais fortes na situação analisada.
Zonas associadas com desembocaduras fluviais ou aos braços de mar (inlets) são altamente vulneráveis
aos parâmetros oceanográfico-climáticos, conforme mostram diversos estudos, a exemplo da análise de
clima de ondas no Nordeste do Brasil (Bittencourt et al. 2002, Dominguez et al. 2007), da análise espaçotemporal na costa do estado de Sergipe (Oliveira 2003), na laguna de Ararapira na fronteira São
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Paulo/Paraná (Mihaly & Angulo, 2002) e na própria área de estudo - foz do Rio Real/Piauí no limite
Bahia/Sergipe (CPRM /CRA, 1994, Barbosa et al. 2004, 2005). A morfologia costeira associada com
canais de desembocaduras é facilmente modificada pelas condições hidrodinâmicas (descarga fluvial e
dinâmica costeira) e os riscos costeiros são acentuados quando as intervenções humanas se apresentam
(Barbosa et al. 2004; Dominguez et al. 2007; Qi & Luo, 2008). No caso estudado, as intervenções são de
baixo impacto, a exemplo das barracas de praia e medidas de contenção, a exemplo da fixação eólica, que
em 25anos exibe ineficácia, ademais a migração da desembocadura está documentada, inclusive no plano
de manejo publicado em 1994.
Portanto, pode-se dizer que os controles ambientais importantes para as variações morfológicas
identificadas, estão relacionados com: 1. Dinâmica das ondas – a orientação da linha de praia (de Az40° a
Az55°) favorece ação frontal das ondas provenientes de sudeste. Isto contribui para a remoção de
sedimento do flanco dorsal da duna pelas ondas, removendo os sedimentos e gerando o balanço negativo
de areia para a face da praia. A ampliação da energia das ondas é facilitada, ao passo que a recomposição
do perfil de equilíbrio é dificultada, devido (a) à profundidade das raízes, que torna a base da falésia
relativamente rígida e (b) a rugosidade do terreno na faixa de preamar pela queda dos troncos e raízes
dispostos na base da falésia. 2. Deriva litorânea de sedimentos – a deriva litorânea predominante é de NE
para SW, conforme estudo de clima de ondas em Bittencourt et al. (2004). Como na zona da
desembocadura, os sedimentos estão sendo levados pelas marés de enchente para o interior do canal,
gera-se um balanço negativo para a deriva litorânea de sedimentos para sudoeste, e, portanto o resultado é
a dissipação das dunas e transporte eólico no setor das barracas de praia. 3. Cobertura vegetal – a
vegetação aplicada no setor investigado teve papel relevante na construção da duna frontal embrionária,
porém a densidade da cobertura vegetal não se desenvolveu por igual no topo da feição eólica. A trama
radicular da vegetação plantada (salsa de praia e coqueiro) reteve uma quantidade importante de areia
eólica (40.625m3) entre 15 e 20 anos. Porém, a trama radicular do coqueiro especificamente facilitou o
desenvolvimento de montículos arenosos (dunas de sombra e montículos vegetados), que se sobressaíram
no relevo, com a formação de um topo com ondulações e superfície irregular (de 1m a 5m de altura). Esta
variabilidade topográfica e a ação das ondas contribuíram para formação de setores mais rebaixados entre
montículos adjacentes, e, por conseqüência, os corredores de deflação eólica ou de entrada da preamar se
instalaram. 4. Tipo de vegetação inadequada - por não ser uma vegetação halófita, os coqueiros sofrem
mais rapidamente com a ação costeira e o soterramento. Além do que, a limpeza pública – no trecho
defronte às barracas de praia e a duna frontal, as marcas de deixa eram sistematicamente removidas pelo
serviço de limpeza pública. Desta maneira, ausência de lixo marinho (restos de organismos, folhas de
mangue, etc.) para produção de matéria orgânica na borda barlavento da duna frontal, impediu a
restauração natural do meio. 5. Atividades econômicas – a pastagem e o tráfego de veículos entre a Praia
dos Coqueiros e a Praia de Mangue Seco são outros vetores importantes. Enquanto a pastagem dificulta a
expansão vegetal no lençol de areia, os veículos para os passeios turísticos contribuem para ampliar os
corredores de erosão cruzando o lençol de areia e a duna frontal. A instalação de estações de observações
locais está prevista no plano de manejo (CRA/CPRM, 1994) e no projeto de gerenciamento costeiro
(CRA, 2003), que seria bastante útil para as investigações e as medições, inclusive para testes de
simulação de cenários futuros. As condições fisiográficas e os parâmetros climático-oceanográficos
inviabilizam a proposição do Plano de Gerenciamento costeiro mencionado anteriormente, pois, ainda
que o setor estudado seja de “baixíssimo dinamismo urbano”, é de altíssima atividade eólica e
hidrodinâmica. Enquanto as falésias são esculpidas no flanco dorsal da duna frontal, no interior do campo
de dunas (a) há suprimento de areia, desenvolvimento de formas de leito e migração eólica no setor
sudoeste, (b) desenvolvimento de formas de leito, reativação, erosão e fixação de duna no setor nordeste.
No interior do campo de dunas, o setor a sotavento da duna frontal, exibe um cordão dunar vegetado,
dunas dissecadas, corredores de erosão e superfícies de deflação (blowouts), dunas fixadas com salsa de
praia e gramíneas e reativação de dunas mais elevadas. No setor adjacente, defronte ao lençol de areia, há
desenvolvimento de formas de leito e reativação de dunas. Recomenda-se que não seja efetuado trânsito
de buggys ou outro tipo de veículo cruzando o cordão dunar vegetado para que não ocorra perda da
cobertura vegetal e a dissecação da cobertura arenosa não se instale como ocorreu com a duna frontal
induzida.
AGRADECIMENTOS
Os recursos para realização desta pesquisa foram de apoio à pesquisa do Conselho Nacional de Pesquisa
(CNPq) - Convênio CNPq conv. 479.479-2007.0, de bolsas de iniciação científica da Fundação de
Amparo à Pesquisa da Bahia (FAPESB) e da Universidade Estadual de Feira de Santana UEFS.
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CONSTRUÇÃO E EROSÃO DE UMA DUNA FRONTAL