SERÁ O DESPORTO UM
DIREITO FUNDAMENTAL?
Alírio Carvalho de Araújo Júnior¹
Perspectiva Amazônica - Santarém - PA. Ano I. Vol. 2 p. 20-32 ago. 2011
RESUMO
O propósito do presente trabalho é fortalecer a ideia de que o desporto pode ser um direito fundamental. Por isso,
vamos expor breve noção sobre os direitos fundamentais, a fim de localizar subsídios para definí-los. Explanamos ainda sobre as diversas dimensões de direitos fundamentais, assim como do conteúdo material aberto dos
direitos fundamentais. Concernente ao desporto, discorremos sobre seu conceito, que está subdividido em desporto educacional (game), desporto de participação (play) e desporto de rendimento (sport). Para a presente
pesquisa, ressaltamos a importância do princípio da dignidade da pessoa humana. Constituímos uma conexão
entre o desporto e o princípio da dignidade da pessoa humana, por intermédio das amarras fundamentais da
saúde e da educação. Por fim, vislumbramos a possibilidade de o desporto ser um direito fundamental.
Palavras - chave: Possibilidade. Desporto. Direito fundamental.
RESUMEN
El propósito del presente trabajo es fortalecer la idea de que el deporte puede ser un derecho fundamental. Por
eso, vamos a explicar brevemente el concepto de los derechos fundamentales con el fin de localizar las subvenciones para definirlos. Explanamos ademais acerca de las diversas dimensiones de los derechos fundamentales,
así como de lo contenido material abierto de los derechos fundamentales. En relación al deporto, nos habló de su
concepto, que esta subdividido en deporto educacional (game), deporto de participación (play) y deporto de
rendimiento (sport). Para la presente pesquisa, resaltamos la importancia del principio de la dignidad de la persona humana. Constituimos una conexión entre el deporto y el principio de la dignidad de la persona humana,
por intermedio de las amarras fundamentales de la salud y de la educación. Por fin, vislumbramos la posibilidad
del deporto ser un derecho fundamental.
Palabras – llave: Posibilidad. Deporto. Derecho Fundamental.
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Advogado. Graduado pelo Centro Universitário de Santarém CEULS/ULBRA. Pós graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários IBET de São Paulo-SP
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1 INTRODUÇÃO
Arrazoar a ideia de que o desporto pode ser um direito fundamental não é tarefa simples, justamente por
conta do ineditismo do assunto. Entretanto, no presente trabalho, tentaremos explanar e adensar essa possibilidade.
Procuramos expor breve noção sobre os direitos fundamentais, a fim de descobrir subsídios para definilos. Traduziremos o conceito de desporto, que está subdividido em desporto educacional (game), desporto de
participação (play) e desporto de rendimento (sport). Por fim, trataremos sobre a problemática central do trabalho, indagando sobre a possibilidade do desporto ser um direito fundamental.
Esperamos que o resultado obtido neste trabalho possa, de algum modo, contribuir para fortalecer a base
doutrinária acerca do tema, proporcionando subsídios para a efetiva proteção do bem mais importante do ser
humano, a vida digna.
2.1 NOÇÕES DE DIREITOS FUNDAMENTAIS
É missão difícil e complexa conceituar de modo preciso os direitos fundamentais. Como bem elucida José
Afonso da Silva (2001, p. 179), eles passaram por diversas designações no curso da história: direitos naturais,
direitos humanos, direitos do homem, direitos individuais, liberdades fundamentais entre outros. Em razão disso, Paulo Afonso Linhares afirma que “comporta grandes dificuldades a tarefa de se estabelecer um conceito de
direitos fundamentais” (LINHARES, 2002, p. 54).
Todavia, Robert Alexy, proporcionando linhas gerais a esse conceito, afirma que “os direitos fundamentais podem ser definidos como aquelas posições que, do ponto de vista do direito constitucional, são tão relevantes, que seu reconhecimento ou não-reconhecimento não pode ser deixado à livre disposição do legislador ordinário” (ALEXY, 1997, p. 412).
Porém, a peculiaridade de cada sistema constitucional deve ser observada com a intenção de ganhar significado. Nesse prumo, recolhemos fundamento em José Joaquim Gomes Canotilho ao doutrinar que a “compreensão de uma lei constitucional só ganha sentido útil, teorético e prático, quando referida a uma situação constitucional concreta, historicamente existente num determinado país” (CANOTILHO, 1991, p.80).
Portanto, dando foco ao sistema constitucional brasileiro sobre conceito de direitos fundamentais de
Robert Alexy, Ingo Wolfgang Sarlet define direitos fundamentais da seguinte forma:
Os direitos fundamentais são, portanto, todas aquelas posições jurídicas concernentes às pessoas, que do
ponto de vista do direito constitucional positivo, foram, por seu conteúdo e importância (fundamentalidade em sentido material), integradas ao texto da Constituição e, portanto, retiradas da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos (fundamentalidade formal), bem como as que por seu conteúdo e significado, possam lhes ser equiparados, agregando-se à Constituição Material, tendo, ou não, assento na Constituição formal (aqui considerada a abertura material do catálogo) (SARLET, 2003, p. 85).
Nosso objetivo não é exaurir a conceituação acerca do tema, mesmo por que fugiríamos de nosso propósito, mas de encontrar meios para reconhecer os referidos direitos.
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2 DIREITOS FUNDAMENTAIS
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2.2AS DIMENSÕES (GERAÇÕES) DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Os direitos fundamentais de primeira dimensão são os chamados direitos da liberdade. Segundo os ensinamentos de Paulo Bonavides (2006, p. 563), esta dimensão foi a primeira a constar de instrumentos normativos
constitucionais por conta do reconhecimento dos direitos civis e políticos do cidadão, proveniente do constitucionalismo do Ocidente, tais como “os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e a igualdade perante a lei”
(SARLET, 2003, p. 52).
Os direitos de primeira dimensão são oponíveis ao Estado. No entanto, é oportuno lembrar que o titular
desse conjunto de direitos é o indivíduo nas suas relações de ordem privada, onde o Estado deve se abster, proteger, e não intervir.
Destarte, os aludidos direitos, como explana Paulo Bonavides, “são por igual direitos que valorizam primeiro o homem singular, o homem das liberdades abstratas, o homem da sociedade mecanicista que compõe a
chamada sociedade civil, da linguagem jurídica mais usual” (BONAVIDES, 2006, p.564).
Em relação aos direitos de segunda dimensão, estes emergiram em meio à crise do liberalismo, pois pouco
adiantava a liberdade do indivíduo perante o Estado se aquele vivia em condições subumanas. Por conta disso,
surgiram movimentos reivindicando do Estado uma conduta ativa na promoção da justiça social. Nesse sentido,
é o magistério abaixo:
Anota distintiva destes direitos é a sua dimensão positiva, uma vez que se cuida não mais de evitar a intervenção do Estado na esfera da liberdade individual, mas, sim, na lapidar formulação de C. Lafer, de propiciar um 'direito de participar do bem-estar social'. Não se cuida mais, portanto, de liberdade perante o
Estado, e sim liberdade por intermédio do Estado (SARLET, 2003, p. 52).
Os direitos em comento, ainda com os ensinamentos de Ingo Wolfgang Sarlet, “caracterizam-se, ainda
hoje, por outorgarem ao indivíduo direitos a prestações sociais estatais, como assistência social, saúde, educação, trabalho, etc., revelando uma transição das liberdades formais abstratas para as liberdades materiais concretas” (SARLET, 2003, p. 52).
Observamos que os diretos fundamentais de segunda dimensão não envolvem apenas os direitos positivados, mas também as chamadas liberdades sociais. Esses direitos especiais impõem ao Estado uma atuação prestacional voltada para a satisfação das carências individuais e da coletividade.
Vale ressaltarmos, que os direitos fundamentais até agora assegurados tinham como destinatário a pessoa
humana na dimensão individual. Mas, a terceira dimensão dos direitos fundamentais se volta para proteção do
homem enquanto membro da sociedade ou de grupos humanos (família, nação, paz, meio ambiente, qualidade
de vida), enquanto ser coletivo. Para explicitar este superlativo sentido, trazemos lição a seguir:
A nota distintiva destes direitos de terceira geração reside basicamente na sua titularidade coletiva, muitas vezes indefinida e indeterminável, o que se revela, a título de exemplo, especialmente no direito ao
meio ambiente e qualidade de vida, o qual, em que pese ficar preservada sua dimensão individual, reclama novas técnicas de garantia e proteção. A atribuição da titularidade de direitos fundamentais ao próprio
Estado e à Nação (direito à autodeterminação, paz e desenvolvimento) tem suscitado sérias dúvidas no
que concerne à própria qualificação de grande parte destas reivindicações como autênticos direitos fundamentais (SARLET, 2003, p. 54).
Não distante a possibilidade de real positivação, reconhece a doutrina que a grande maioria dos direitos de
terceira dimensão ainda possuem baixa normatividade no arcabouço do direito constitucional. Em contrapartida, estes direitos se tornam frágeis e vulneráveis, dependentes de outras fontes e do direito internacional. Isto de
fato tem ocorrido, pois é crescente o número de tratados e convenções celebrados sobre eles.
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Os direitos fundamentais possuem dois tipos de fundamentos: a fundamentalidade formal e a fundamentalidade material. Segundo Ingo Wolfgang Sarlet (2003, p. 82-3), a fundamentalidade formal está intimamente
ligada ao direito constitucional positivo e deriva de três aspectos: a) ser parte da Constituição escrita; b) ter limites formais e materiais para modificação; c) ser normas de eficácia plena. A fundamentalidade material, embora
possua um sentido formal, é decorrente dos valores substanciais e princípios implícitos na Constituição.
Relembrada a nota de fundamentalidade dos direitos fundamentais, pensamos ser importante destacar a
abertura do conteúdo material de nossa Constituição, que está formalmente prescrita no art. 5°, § 2°2. Assim, há
permissão de “inclusão em nosso sistema jurídico de outros direitos e garantias não expressamente nela previstos, podendo, inclusive, derivarem de tratados internacionais” (BORGHEZAN, 2006, p. 108).
Logo, percebe-se que o rol de direitos fundamentais explícitos em nossa Carta Política, “apesar de exaustivo, não tem cunho taxativo” (SARLET, 2003, p. 86), mas sim exemplificativo, o que enseja a possibilidade de
reconhecimento de novos direitos fundamentais, cujos conteúdos sejam materialmente substanciais. No entanto, o aludido reconhecimento deve estar em pleno ajuste com art. 5º, § 2º da Constituição Federal. Nessa esteira
anotamos manifestação de Miguel Borghezan:
Arelação de direitos fundamentais inseridos na Constituição é exemplificativa, não esgotando as possibilidades materiais deles. Podem outros ser reconhecidos por via de Tratados Internacionais em que o Brasil seja parte, ou ainda, derivar da interpretação do Supremo Tribunal Federal quando decorrentes do
regime e dos princípios constitucionalmente adotados (BORGHEZAN, 2006, p. 108).
Na direção do discorrido supra, o Supremo Tribunal Federal já manifestou sua interpretação sobre o dispositivo em comento, o que pode ser visto neste recorte de recente decisão:
O art. 5°, §2°, da Carta Magna, expressamente estabeleceu que os direitos e garantias expressos no caput
do mesmo dispositivo não excluem outros decorrentes do regime dos princípios por ela adotados, ou dos
tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. Habeas Corpus 94702. Min. Rel. Ellen Gracie, j. 07.10.2008, DJU, 23.10.2008).
Diante da compreensão expressa, na doutrina e na jurisprudência, podemos afirmar que a Constituição
Federal de 1988, proporciona abertura no conteúdo material para novos direitos fundamentais, expressos (tratados internacionais) ou implícitos no sistema constitucional, decorrentes do regime e princípios por ela adotados.
É justamente por meio desta última construção que pensamos ser possível defender a ideia de que o desporto
pode ser reconhecido como um direito fundamental em nosso ordenamento jurídico, na matriz constitucional.
3 O DESPORTO
3.1 CONCEITO DE DESPORTO
Diferentemente do que ocorre com os direitos fundamentais, o desporto é facilmente conceituado pela
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“Art. 5º, § 2º. Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. (BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em
05 de outubro de 1998. Disponível em <www.planalto.gov.br>.Acesso em 31.05.2011).
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2.3 O CONTEÚDO MATERIALABERTO DOS DIREITOS FUNDAMETAIS
doutrina. Para que não haja dúvidas sobre o conceito, ele encontra-se positivado no art. 3º da Lei nº
9.615/983, desta forma explicitada por Álvaro Melo Filho:
De qualquer modo, o art. 3º da lei 9.615/98, condensando a natureza e as finalidades do desporto, dilarga
para enfocá-lo como meio de promoção do homem e melhoria da sociedade, desdobrando-o em deporto
educacional, desporto de participação e desporto de rendimento (MELO FILHO, 2001, p. 36).
Em virtude dessa compreensão emerge uma tripartição da prática do desporto, classificado pela sociologia em três categorias: a) desporto educacional (game); b) desporto de participação (play); c) desporto de rendimento (sport).
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3.1.1 Desporto educacional (game)
Nesta concepção, o desporto é entrelaçado com a educação pois, conforme a natureza e a modalidade, a
prática desportiva ganha relevância no processo de criação, desenvolvimento e educação do cidadão. Uma sociedade democrática não pode deixar de utilizá-lo como exemplo em relação aos processos de educação integral.
Portanto, o desporto educacional “nada mais é que parte das atividades corporais sem as quais não há educação
global, nem equilíbrio psicossomático, direitos e necessidades do cidadão contemporâneo” (MELO FILHO,
2001, p. 37).
Importante realçar que um dos intentos do desporto educacional é evitar a seletividade e a hipercompetitividade de seus praticantes. Visa, na realidade, buscar o mais–ser do homem por meio da prática de determinada
modalidade desportiva, considerando-se que no desporto educacional inexiste modalidade prioritária. Todas,
indistintamente, são de exacerbada relevância, desde que favoreçam a “saúde, a aptidão, as qualidades motoras,
as possibilidades de comunicação, a criatividade, o desenvolvimento da personalidade e da cidadania” (MELO
FILHO, 2001, p. 38).
3.1.2 Desporto de participação (play)
Aqui o desporto ganha fundamentos que visam assegurar efetiva participação nos bens e benefícios desportivos, na busca de massificar os valores de solidariedade, cooperação e fraternidade ganhando densidade na
dimensão social. Por consequência, a práxis do desporto de participação consiste em atividades físicas aceitas
por diversas classes sociais que, por intermédio delas, efetivam processos de interação e congregação de valores. Logo, o desporto de participação, “pode ser traduzido como qualquer atividade espontânea, voluntária, sem
regras fixas, que proporciona o prazer e diversão sem finalidade ou sentido além e fora de si” (MELO FILHO,
2001, p. 36).
3.1.3 Desporto de rendimento (sport)
O desporto de rendimento, também é conhecido pelas expressões, desporto-performance, desporto de alto
nível, desporto-espetáculo e desporto de competição. Aessência do desporto nesta categoria está na prática da
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BRASIL. Lei n. 9.615 de 24 de março de1998. Institui normas gerais sobre o desporto e dá outras providências. Disponível em <www.planalto.gov.br>. Acesso em
31.05.2011
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atividade física voltada para a competição, seja consigo mesmo ou contra outros desportistas, devendo ser
praticada de conformidade com regras preestabelecidas e aprovadas pela entidade reguladora de cada modalidade. Portanto, o desporto de rendimento detém em seu âmago a disputa sobre quem é o melhor, o mais forte, independentemente do adversário ou do obstáculo a ser vencido, sendo importante apenas a glória de vencedor.
4 SERÁ O DESPORTO UM DIREITO FUNDAMENTAL?
Para haver possibilidade de se distinguir o desporto como um direito fundamental, temos que fazer a conexão deste com o princípio da dignidade da pessoa humana. Para que isso se torne efetivo, usaremos dois sustentáculos materiais do aludido princípio, a saúde e a educação.
É de acentuada magnitude o princípio da dignidade da pessoa humana, tendo o Constituinte optado por
colocá-lo como o principal fundamento axiológico da República Federativa do Brasil. Desse modo, a intenção
manifestada na Constituição é fazer com que a pessoa seja o “fundamento e fim da sociedade” (MIRANDA,
1988, p. 167). Nesse sentido, também é o posicionamento de Fernando Ferreira dos Santos, ao ressaltar que “importa concluir que o Estado existe em função de todas as pessoas e não estas em função do Estado” (SANTOS,
1999, p. 39).
A propósito destaca Robert Alexy que, apesar de não ver nele um princípio absoluto, o princípio da dignidade da pessoa humana contamina os demais princípios constitucionais existentes no sistema, o que, de certa
forma, dá a entender constituir-se no primado central.
“A impressão de ser uma norma absoluta resulta do fato de que existem duas normas de dignidade da
pessoa, é dizer, uma regra da dignidade da pessoa, como assim também do fato de que existe uma série de
condições sob as quais o princípio da dignidade da pessoa, com um alto grau de certeza, precede a todos
os demais princípios” (ALEXY, 1997, p. 109, Tradução livre).
Em vista disso, é correto afirmar que a maior presença do feixe de poderes que conformam o princípio da
dignidade da pessoa humana tem importância decisiva para que um direito possa vir a ser reconhecido como
fundamental. Essa compreensão é sentida nesta passagem de Carlos Roberto Siqueira Castro:
“Ao bem dizer, no que toca aos direitos fundamentais do homem, impende reconhecer que o princípio da
dignidade da pessoa humana tornou-se o epicentro do extenso catálogo de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, que as constituições e os instrumentos internacionais em vigor em pleno terceiro milênio ofertam solenemente aos indivíduos e às coletividades” (CASTRO, 2006, p. 136).
Prossegue o autor, assegurando que o postulado da dignidade da pessoa humana, por meio de sua fecundidade é responsável por gerar outros direitos fundamentais. Isto decorre do elevado grau de importância que ele
tem para o reconhecimento da nota de fundamentalidade material de um direito fundamental. Nesse sentido,
destacamos que, “a rigor, o postulado da dignidade da pessoa humana constitui-se no direito prolífero por excelência, tendo gerado nas últimas décadas várias famílias de novos direitos que angariam status de fundamentalidade constitucional” (CASTRO, 2006, p. 144).
Sendo assim, o conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana é componente basilar para caracterizar e reconhecer direitos fundamentais em nosso sistema jurídico. Logo, se o desporto possuir os elementos
caracterizadores do referido princípio, haverá possibilidade deste ser reconhecido como um direito fundamental.
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4.1 ADIGNIDADE DAPESSOA HUMANA
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4.2 DESPORTO E EDUCAÇÃO
É adequado asseverar que a educação é um dos pilares do princípio da dignidade da pessoa humana, por
sua vez, é um dos fundamentos da República, art. 1º, III, da Constituição. Via de consequência, a educação é um
direito fundamental, sendo assim reconhecida expressamente em nossa Carta Magna, por intermédio do art. 6º.
De outra parte, não vislumbramos que a educação possa ser completa sem ligar-se firmemente ao desporto. Para
visualizar os contornos e a intensidade é necessária uma sintética investigação desta conexão.
Como primeiro sinal dessa ligação, é oportuno realçar o conteúdo expresso (ou pelo menos implícito) da
decisão do Supremo Tribunal Federal ao afirmar claramente que “o direito ao acesso à cultura, ao esporte e ao
lazer, são meios de complementar a formação dos estudantes” (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 1.950-3. Min. Rel. Eros Grau, j. 03.11.2005, DJU, 02.06.2006.). Portanto, o tribunal guardião de nosso sistema constitucional, reconhece de plano a importância do “esporte”, que caracterizamos como desporto, no processo educacional.
Na mesma definição, Álvaro Melo Filho (1995, p. 50) acentua que “o desporto desempenha um importante papel no processo educativo, ou seja, é parte indispensável para a educação completa do homem”.
Aduzimos que é por intermédio “da ação desportiva na escola, a maior participação da população no movimento desportivo, no exercício do direito à prática do desporto” (SILVA, 2006, p. 488), que mais densamente,
emoldura-se a formação educacional completa. Nessa direção, põe-se o entendimento do STF de que cabe “ao
Estado a adoção de todas as providências tendentes a garantir o efetivo exercício do direito à educação, à cultura
e ao desporto” (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 1.950-3. Min.
Rel. Eros Grau, j. 03.11.2005, DJU, 02.06.2006).
Em conformidade com essa ideia, podemos afirmar que o desporto é conexo com a educação. Entretanto,
devemos caracterizar alguns motivos pelos quais esta conexão se torne visível, evidenciando a importância do
desporto no processo educacional do ser humano.
Nesse sentido, a atividade desportiva não se esgota meramente no aspecto físico, fisiológico ou motor.
Inclui o psicológico, o emocional, o humor, enfim, ensina valores para o ser humano viver em sociedade, tais
como, “a solidariedade, a amizade, a emulação leal, a tolerância e a cooperação, em face das ressonâncias e
repercussões do ato desportivo”. Assim, torna-se fundamento e instrumento na luta “contra a exclusão, as desigualdades, o racismo e a xenofobia, servindo de escola da vida” (MELO FILHO, 1995, p. 34). Por conseguinte,
observa-se que estes elementos materiais e psicossomáticos fazem do desporto, como ressalta Álvaro Melo
Filho (1995, p. 36), mecanismo elevado e indissociável da educação global.
Ainda dentro do tema educação e desporto, não se pode olvidar o tratamento que recebem na fase escolar
formal, pois é durante essa fase que adquirimos e consolidamos os valores que moldam nossa personalidade,
que podem no futuro modificar a sociedade para melhor.
Em vista disto, há que ser ressaltada a substancial lição de Nilda Teves Ferreira ao realçar a importância da
escola nas grandes mudanças sociais, “a história mostra que em nenhum país do mundo as grandes transformações
sociais começaram pela escola, mas mostra também, que não acontecem sem passar por ela” (FERREIRA, 2001, p.
37). Portanto, a adequada prática do desporto nas escolas formais é de suma relevância para o desenvolvimento do
processo educacional intelectual. Neste diapasão é a lição de Walderez Nosé Hassenplug, que colacionamos a seguir:
“Aeducação pelo esporte emerge em nossa consciência em toda sua inteireza, em sua multidimensionalidade, como uma via privilegiada para a formação integral do ser humano, ou seja, como prática que propicia o desenvolvimento pessoal cognitivo, social e produtivo das novas gerações, pois entende que todas
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as crianças e todos os adolescentes devem ser educados a partir de seus potenciais para que transformem a
si mesmos e as suas circunstâncias” (HASSENPFLUG, 2004, p. 50-51).
Concluímos, neste quadrante, que o desporto tem papel fundamental no processo educacional global do
ser humano, tendo em vista favorecer criação de condições materiais psíquicas sólidas para efetivar novos
rumos para a sociedade que, por seu turno, devem ser pautados sob os valores da justiça da dignidade humana,
buscando atingir os objetivos fundamentais de nosso Estado Democrático de Direito (art. 3º da Constituição
Federal de 1988).
O desporto também possui conexão com a saúde, que, tal qual a educação, consubstancia-se num dos pilares do princípio da dignidade da pessoa humana, ambos fundamentos da República que se conectam diretamente com o direito a vida. Este fato reforça a possibilidade do desporto ser reconhecido como um direto fundamental, sendo oportuno pesquisar os liames desta correlação.
Ao pensar em saúde, de imediato começamos a imaginar hospitais, pessoas enfermas, planos de saúde,
etc. Entretanto, com o atrelamento dela com o desporto, certamente essa tendência esvaziará, tendo início, nessa
ocasião, a cultura definitiva da prevenção para não ter que remediar. Compartilhando essa linha de pensamento
restritivo, anotamos lição de MarcoAurélio Paganella:
“À primeira vista, quase sempre, associa-se o Direito à Saúde somente como o direito de ir a um hospital e
de ser prontamente atendido, bem como de ter um corpo médico da melhor qualidade à disposição para
consultar a qualquer hora e a preços módicos, pleito este inequivocamente consentâneo, porém, ressaltase, deveras difícil quanto à sua obtenção (PAGANELLA, 2007)”.
Em consequência, o desporto deve ser utilizado pelo ser humano como um instrumento para promoção da
dignidade, pois oportuniza um elevado nível de saúde, tanto corporal quanto mental, fomentando ótima convivência social com todos. Nessa direção são os ensinamentos de Álvaro Melo Filho, demonstrados na seguinte
passagem:
“O desporto favorece o desenvolvimento corporal e mental harmônico, implanta hábitos sadios, estimula
as tendências de liderança, fortalece o aprendizado das regras de convivência e consolida o sentimento de
coesão comunitária e de identificação social” (MELO FILHO, 2001, p. 50).
Por ser assim, o desporto vai se transformando num grande elemento da evolução social, “cuja atividade
se dá a promoção e o desenvolvimento do lazer social, propiciando saúde e integração sócio-cultural dos indivíduos” (PARENTE FILHO, 1989, p. 45). Portanto, o desporto, além de proporcionar a saúde, serve de liame na
construção de paz e integração entre os povos.
Cumpre ressaltar que, cabe ao Estado “garantir o efetivo exercício do direito à educação, à cultura e ao
desporto” (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 1.950-3. Min. Rel.
Eros Grau, j. 03.11.2005, DJU, 02.06.2006.), mas, para que isso ocorra, deve-se quebrar o paradigma de que os
recursos aplicados no desporto são tidos como gastos desnecessários do dinheiro público, passando a entender
como “autêntico investimento social” (MELO FILHO, 2001, p. 51). O fim é melhorar a qualidade da saúde, da
educação e, consequentemente, implantar a cultura de prevenção das enfermidades por intermédio do desporto,
com ganhos grandiosos para a vida digna.
Álvaro Melo Filho, ressalta essa importância porque “sem dúvida, o gasto com desporto é investimento
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4.3 DESPORTO E SAÚDE
social pois contribui, significativamente, para reduzir o número de leitos nos hospitais e de cárceres nos
presídios” (MELO FILHO, 2001, p. 51-52). Logo, deve-se inserir o desporto entre os elementos substanciais a
saúde dos seres humanos. Certas atividades, lúdicas inclusive, inúmeras vezes são utilizadas como tratamento
de algumas enfermidades relativas à saúde física e mental. Todavia, não vislumbramos com frequência a preocupação de atuação preventiva.
Por outro lado, a iniciativa privada, ciente do elevado papel que o desporto exerce, inclusive como atividade lúdica, no convívio social, começa a se mobilizar no sentido de estimular seus trabalhadores a praticar alguma atividade desportiva. É que o ser humano, se estiver no pleno gozo de sua saúde, certamente irá render muito
mais no exercício da atividade laboral, gerando, consequentemente, maiores lucros para a empresa. Nesse sentido, Nilda Teves Ferreira discorre sobre um dos grandes empresários contemporâneos:
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“Bill Gates, que em sua indústria de criação de softers, mantém um espaço aberto para atividades lúdicas.
O que ele espera de seus trabalhadores não é trabalho reiterativo, que apenas reproduza antigos modelos.
É criação, é arte, é inovação e, neste caso, a liberdade e, com ela, o lúdico são fundamentais”
(FERREIRA, 2001, p. 43).
Parece-nos que, o desporto é fator importante para prevenir enfermidades e manter a saúde física e mental.
De modo pertinente, Marco Aurélio Paganella observa que “sendo a saúde uma condição essencial para se viver
bem e com dignidade; e, sendo o direito à vida um direito fundamental, logo, o direito à prática esportiva passa a
ser, portanto, um direito fundamental” (PAGANELLA, 2007).
4.4 O DESPORTO PODE SER UM DIREITO FUNDAMENTAL
É elevada e engrandecedora a possibilidade de o desporto ser reconhecido como um direto fundamental.
Entretanto, pensamos que esse reconhecimento deve ser procedido por meio de interpretação sistemática. Como
destacado, a nossa Carta Magna está aberta à recepção de novos direitos fundamentais decorrentes do regime e
dos princípios, inclusive dos implícitos.
Desse modo, vislumbramos que o constituinte originário, ao redigir o art. 5º § 2º, da Constituição, teve a
intenção deliberada de facilitar que o direito acompanhasse, com maior dinamismo, o constante processo de
mudança de nossa sociedade. Sendo assim, tem-se por norma expressa que os direitos fundamentais “podem ter
assento em outras partes do texto constitucional ou residir em outros textos legais nacionais ou internacionais”
(SARLET, 2003, p. 89).
Contudo, para que o desporto possa vir a ser reconhecido como um direito fundamental procuramos estabelecer, no presente trabalho, que o desporto contribui de modo importante e essencial para a educação e a saúde,
fortalecendo a dignidade humana. Vale observar que, a educação básica (fundamental) e a saúde são direitos fundamentais expressamente indicados no art. 6º da Constituição. Embora dotados de eficácia plena (art. 5º, §1º, da
Constituição), o texto constitucional não especifica o que dever ser feito para concretizar cada um desses direitos.
Nesse sentido, ressaltamos escólio de Ana Paula de Barcellos (2002, p. 169), quando afirma que boa parte
das normas contidas no art. 6º da Constituição têm natureza jurídica de princípio ou subprincípio, não havendo
especificação integral de cada um daqueles direitos, um modo pelo qual será procedido seu cumprimento. Complementando o entendimento, correlacionamos a lição abaixo:
“Encontramos a norma do art. 6º da CF, que enuncia os direitos sociais básicos (educação, saúde, trabalho, etc.), encerrando com a expressiva formulação 'na forma desta Constituição', deixando, portanto, em
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Em vista disso, com entendimento de Martinho Neves Miranda (2007, p. 26), podemos vislumbrar que o
desporto é um dos instrumentos que dão cumprimento aos elementos que compõem o piso vital mínimo para
uma existência digna, de conformidade com o sistema e os valores constitucionais.
Pensamos ser, neste ambiente e contexto, que se pode melhor reconhecer a nota de fundamentalidade material do desporto como direito fundamental. A contribuição decisiva do desporto para promoção da saúde e da
educação como direitos fundamentais amplos e de todos, um dever do Estado, confere substância e conteúdo
concreto a esse 'novel' componente da dignidade humana. Exemplificativamente, o desporto considera a essencialidade dos meios preventivos na proteção e promoção da saúde física e mental, favorecendo o trabalho, o
desenvolvimento motor, a higidez física dos diversos sistemas corporais, enfim, realizando a grandeza saudável
integral do ser humano. No âmbito da educação, o desporto fundamenta e confere densidade a diversos processos educacionais importantes para a vida humana farta e abundante. A manutenção e o desenvolvimento das
capacidades psico-intelectuais dependem muito do desporto. Aconsistência dos processos de construção educacional, a disciplina e a concentração são imensamente adensados com desporto. A sociabilidade e a solidariedade são grandemente favorecidas pelo desporto. Nesse diapasão, parece certa a justificação material do desporto
como direito fundamental, na medida em que promove o desenvolvimento integral físico e psíquico, fortalecendo a dignidade humana, condição central, imprescindível, irrenunciável e inalienável da vida de todos nós.
Importante considerar que o desporto não é um elemento interno, embora possa, lato sensu, ser visto como
parte integrante da educação e da saúde humana. Assim, é de todo coerente afirmarmos que a dignidade da pessoa humana tem conteúdo material aberto, admitindo a contribuição derivada da descoberta de novos direitos
fundamentais, inclusive implícitos na Constituição. Nesse sentido, empresta-lhe mais ampla justificação Ingo
Wolfgang Sarlet (2003, p. 102), ao afirmar que boa parte dos direitos sociais radica tanto no princípio da dignidade da pessoa humana (saúde, educação, etc.), quanto nos princípios que, entre nós, consagram o Estado Social
de Direito.
A fundamentalidade formal do desporto como direito fundamental tem sua nota inicial constante no art.
217 da Constituição, quando enuncia que “é dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e nãoformais, como direito de cada um”. Contudo, as práticas desportivas englobam todas as modalidades de desporto (play, game e sport). Mas não é este aglomerado completo e reunido que conforma o desporto como direito
fundamental, e nesse ponto divergimos em parte de MarcoAurélio Paganella (2007). Para nossa visão, o desporto de rendimento, não integra o desporto como direito fundamental, visto que sua prática desborda, se afasta,
enfim, não se enquadra nos processos necessários e essenciais a saúde (física e mental) e a educação fundamental (básica) da pessoa humana. Por lógica consequência, nos parece insuficiente a indicação isolada do art. 217
da Constituição para configuração da fundamentalidade formal do desporto como direito fundamental.
Os processos de reconhecimento de normas implícitas4 podem complementar a justificação formal e
recepção constitucional desse direito social fundamental, que promove o valor igualdade. Derivando completamente das normas-princípios fundamentais da educação e da saúde mais amplas e gerais, o desporto somente,
4
“4. Para encontrar 'princípios implícitos', pode-se partir de regras ou de princípios (mais gerais) já conhecidos. Na primeira hipótese, procede-se por indução, levando
em conta os escopos, as intenções e os valores perseguidos e consagrados pelo ordenamento jurídico no momento em que ele reconhece a(s) regra(s) tomada(s) como
paradigma. Na segunda, busca-se chegar, por dedução, até princípios mais específicos que colaboram para a realização dos princípios gerais, como acontece com o
princípio da imparcialidade do juiz em relação ao princípio do devido processo legal”. (GUASTINI, Riccardo. apud BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Sobre o
reconhecimento e a fundamentação de normas implícitas no direito brasileiro. Revista dos Tribunais, vol. 829, novembro de 2004, p. 90-102).
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aberto a possibilidade de se considerarem incluídos, no âmbito dos citados direitos sociais, alguns outros
dispositivos dispersos no corpo do texto constitucional, nomeadamente os insertos nos títulos 'Da Ordem
Econômica' e da 'Ordem Social'” (SARLET, 2003, p. 90-91).
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enquanto as promove para engrandecer a vida e materializar a dignidade, caracteriza-se como essencial
substancialmente. Logo, não será o desporto de rendimento (sport), que caracterizará o direito fundamental que
buscamos. Ele estará certamente dentro das duas outras categorias associadas, nos chamados desporto educacional (game) e de participação (play). É necessário aprofundar mais os estudos para bem delimitar as fronteiras,
para o completo reconhecimento desse novo direito fundamental.
Por enquanto, o localizamos entre as práticas desportivas educacionais, orientadas conforme a fase biológica da vida (infância, adolescência, adulta e idosa), que não obedece a critérios cronológicos iguais para todos.
As áreas da saúde é que orientarão os enquadramentos, de acordo com as capacidades e níveis de desenvolvimento. Assim como não é qualquer água que se caracteriza como direito fundamental5, não será em qualquer
desporto que se perceberá a presença das notas de fundamentalidade formal e material. Será aquela prática desportiva orientada que facilita a educação e favorece a saúde, promovendo o desenvolvimento integral do físico e
do psíquico, de modo equilibrado, elementos essenciais para a dignidade humana.
Aqui sobressai o método de interpretação conforme a Constituição, em complementação ao sistemático,
para prestigiar os valores nela modelados e assegurados. Sobre o tema citamos Gilmar Ferreira Mendes que,
tomando por base construções jurídicas do Tribunal Constitucional Alemão, aliadas à concepção de otimização
constitucional, assim escreve:
“A despeito da falta de uma disciplina legal, essa forma de decisão adquiriu peculiar significado na jurisprudência do Tribunal graças à sua flexibilidade, que permite uma renúncia ao formalismo jurídico em
nome da idéia de justiça material e da segurança jurídica” (MENDES, 1999, p. 229-235).
A intenção é promover a concretização dos valores constitucionais maiores da nação não apenas por meio
da norma escrita, expressa, mas também “mediante analogia, redução, ou mediante derivação de premissas normativas constantes da própria Constituição” (MENDES, 1999, p. 229-235). Nossa visão, nesta altura, considera
que o art. 217 da Constituição, isoladamente, não consegue caracterizar o desporto como um direito fundamental. Neste trilho é a compreensão deAntônio Cláudio da Costa Machado:
“É evidente que as promessas constitucionais estampadas no art. 217 são genéricas e demandam concretização jurídica por parte dos nossos legisladores e administradores, o que significa que a Constituição
impõe ao Poder Público a implementação de políticas públicas para tornar realidade o nosso direito à
prática do desporto” (MACHADO, 2008).
Em vista disso, devemos atrelar o desporto aos valores materiais constitucionais sociais da saúde e da educação, na medida em que se mostram essenciais ao desenvolvimento integral (físico e psíquico) da pessoa humana, favorecendo-lhe o atributo maior da dignidade.
Concluímos de modo preliminar, portanto, por meio da interpretação conforme a Constituição e sistemática, da abertura do sistema constitucional (art. 5º § 2º) e do sistema, princípios e valores da Constituição Federal
de 1988, que o desporto pode ser reconhecido como um direito fundamental implícito de nosso sistema jurídico.
5
“Dessa rápida resenha legislativa e do conjunto de normas representadas, resta extreme de dúvida que, para as pessoas do povo e para o direito, além das naturais
exigências de saúde pública, a água potável é bem jurídico diferenciado das águas ditas comuns, livres na natureza, tendo em vista exigências de pureza e qualidade
pelo Poder Público, para poderem atender com segurança os elevados fins e usos a que se destinam.” (BORGHEZAN, Miguel. O acesso à água potável: um direito
fundamental?. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Estado do Pará (UFPA). Santarém, 2006, p.53.).
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Ao fim deste trabalho acreditamos corroborar, de forma positiva, para possibilidade concreta do desporto
ser reconhecido como um direito fundamental, possuindo conexões diretas com o princípio da dignidade da
pessoa humana.
Conseguimos, depois de sintética investigação concernente aos direitos fundamentais, encontrar subsídios para reconhecê-los. Conceituamos o desporto e nele encontramos elementos embasadores indispensáveis
para a possibilidade de ser visto e reconhecido como um possível direito fundamental. Na problemática central
do trabalho, versamos sobre a conexão do desporto (educacional e participativo) com o princípio da dignidade
da pessoa humana, por intermédio da saúde e da educação. Tudo isto, para atingirmos o objetivo principal da
presente pesquisa.
Sendo assim, de forma preliminar reconhecemos que existe de fato a possibilidade jurídica de o desporto
(educacional e participativo) ser reconhecido como um direito fundamental implícito, na conjugação do art. 217
da Constituição com as normas-princípios fundamentais da educação e da saúde (fundamentalidade formal). A
nota de fundamentalidade material liga esses valores substanciais (saúde e educação) à dignidade da pessoa
humana, tendo em vista que o desporto é instrumento relevante para promover a igualdade de todos, física e psiquicamente, na direção do desenvolvimento integral.
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SERÁ O DESPORTO UM DIREITO FUNDAMENTAL?